Um artigo seminal, metodológico e reinterpretativo, sobre a tipologia e a classificação empírica dos regimes políticos no mundo e na América Latina, partindo dos modelos oferecidos pelo V-Dem Institute e pela revista The Economist, por Augusto de Franco e Renato Cecchetini, como disponível em minha página na plataforma Academia.edu, no seguinte link:
Regimes políticos na América Latina
Augusto de Franco (com a colaboração de Renato Cecchettini), Inteligência Democrática (05/08/2024)
Como classificar os regimes dos países da América Latina? As melhores classificações dos regimes políticos do mundo são a do V-Dem Institute (V-Dem) e a da The Economist Intelligence Unit (EIU). Poderíamos, simplesmente, aplicá-las a 21 países da América Latina. Mas antes seria interessante ver os problemas dessas classificações.
CLASSIFICAÇÕES DE REGIMES POLÍTICOS
O V-Dem classifica os regimes em quatro tipos: Liberal Democracy (Democracia Liberal), Electoral Democracy (Democracia Eleitoral), Electoral Autocracy (Autocracia Eleitoral) e Closed Autocracy (Autocracia Fechada). O regime brasileiro é classificado como Electoral Democracy. O V-Dem adota seis índices: Democracia Liberal (uma espécie de síntese, chamado LDI), Democracia Eleitoral, Componente Liberal, Componente Igualitário, Componente Participatório, Componente Deliberativo.
The Economist Intelligence Unit classifica os regimes em quatro tipos: Full Democracy (Democracia Plena), Flawed Democracy (Democracia Defeituosa), Hybrid Regime (Regime Híbrido) e Authoritarian Regime (Regime Autoritário). O regime brasileiro é classificado como Flawed Democracy. A EIU adota cinco índices: Processo Eleitoral e Pluralismo, Funcionamento do Governo, Participação Política, Cultura Política e Liberdades Civis.
Comecemos com algumas perguntas problematizadoras: Democracias (apenas) eleitorais são regimes da mesma natureza que democracias liberais? E podem ser chamadas propriamente de democracias? O que fazer com os 58 regimes que o V-Dem classifica como democracias eleitorais (1)? O que fazer com os 48 regimes que a The Economist Intelligence Unit (EIU) chama de democracias defeituosas (flaweds democracies) (2) e, ainda, com os 36 regimes que a EIU chama de híbridos (3)?
Não parecem ser todos a mesma coisa. Ainda que sejam considerados (pelo V-Dem) democracias eleitorais, o regime de Portugal não se parece com o da Bolívia e o regime do Canadá não se parece com o do México. Ainda que sejam considerados (pela EIU) democracias defeituosas, o regime da República Checa não se parece com o do Brasil e, menos ainda, com o da Nigéria (hybrid). Quais as diferenças entre eles?
(...)
Regimes políticos da América Latina
1 e 2 | AUTOCRACIAS FECHADAS | Cuba [1] é uma autocracia fechada, uma ditadura de esquerda típica do século 20 - um regime não eleitoral. O Haiti [2] também é uma autocracia fechada, mas não se pode dizer com certeza que é o mesmo tipo de regime do cubano: não se aplica a ele a distinção (anacrônica) esquerda x direita. O regime do Haiti é o caos político.
3, 4 e 5 | AUTOCRACIAS ELEITORAIS | Venezuela [3] e Nicarágua [4] são autocracias eleitorais ditas de esquerda, que começaram seu processo de autocratização depois de serem parasitadas por uma forma de populismo que surgiu no dealbar do século 21, sobretudo na América Latina (o chamado neopopulismo). El Salvador [5] também é uma autocracia eleitoral, dita de extrema-direita, que começou seu processo de autocratização ao ser parasitado por uma forma de populismo que emergiu a partir da segunda década do século 21 (o chamado populismo-autoritário ou nacional-populismo).
6, 7, 8, 9, 10 e 11 | REGIMES ELEITORAIS PARASITADOS POR POPULISMOS | México [6], Colômbia [7], Honduras [8], Bolívia [9] e Brasil [10] são regimes eleitorais, ainda chamados de democracias (apenas eleitorais, segundo o V-Dem ou defeituosas, segundo a EIU), atualmente parasitados por governos neopopulistas (ditos de esquerda). Não viraram ainda autocracias, mas estão sob risco de entrar em transição autocratizante. Argentina [11] é um regime eleitoral também parasitado por um governo populista (dito de direita). Não se sabe ao certo se é um governo populista-autoritário ou nacional-populista (como o de Orbán, na Hungria). Sabe-se, porém, que o regime argentino não decaiu para uma autocracia, embora possa entrar em risco de.
12, 13, 14, 15, 16 e 17 | REGIMES ELEITORAIS FORMAIS | Panamá [12], Paraguai [13], Guatemala [14], República Dominicana [15], Equador [16] e Peru [17] também são, atualmente, regimes eleitorais formais (democracias apenas eleitorais ou defeituosas), quer dizer, não notadamente parasitados por governos populistas. Não estão sob grande risco - neste momento - de entrar em transição autocratizante e poderiam entrar em transição democrátizante convertendo-se em democracias liberais (embora isso também não seja muito provável no curto prazo).
18, 19, 20 e 21 | DEMOCRACIAS LIBERAIS | Costa Rica [18], Chile [19], Uruguai [20] e Suriname [21] são democracias propriamente ditas, ou seja, democracias liberais - as quatro únicas da América Latina.
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