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domingo, 6 de julho de 2014

De Frederic Bastiat para os socialistas - selecao de Joao Luiz Mauad

De Bastiat para os socialistas

Rodrigo Constantino nos lembra que hoje comemora-se o aniversário de nascimento do grande, do inigualável Frédéric Bastiat.  Como fã de carteirinha daquele imenso personagem histórico, não poderia deixar de prestar também a minha homenagem, na forma de uma mensagem aos esquerdistas, cujas passsagens e ideias, na sua maior parte, foram retiradas do ensaio “Justiça e Fraternidade”, publicado originalmente, em 1848, no Journal des Économistes.
Prezados camaradas socialistas:
Qualquer um que se atreva a defender os princípios do liberalismo nesta nossa sociedade virtualmente arrebatada pela cultura esquerdista, onde o discurso prevalece sobre as atitudes e as versões têm peso maior do que os fatos, é imediatamente tachado de egoísta, ganancioso, sem coração e outras alcunhas não menos ofensivas. As pechas sobre mim lançadas, carrego-as até com certa tranqüilidade, principalmente porque acredito naquilo que defendo. Ademais, não ganho absolutamente nada com essa, digamos, “ideologia política”, exceto, é claro, a satisfação do dever cumprido. Procuro manter, até onde a minha paciência frente à ignorância e a desonestidade intelectual permite, uma atitude tolerante com as opiniões contrárias.
Algumas críticas – talvez o mais correto fosse dizer censuras -, no entanto, ainda machucam um pouco. Não pelo teor das mesmas, já que os argumentos não fogem muito do habitual e praticamente já os conheço todos, mas porque partem de pessoas que me são caras; de gente cujas opiniões têm algum peso. É esses que dirijo estas linhas, na esperança de que possam entender um pouco melhor o meu pensamento.
Antes de mais nada, é necessário dizer que, malgrado não façamos uso dessas palavras rotineiramente, nós liberais também saudamos com emoção as virtudes da caridade, da solidariedade e da justiça. Conseqüentemente, desejamos ver os indivíduos, as famílias e as nações associarem-se e cada vez mais ajudarem-se mutuamente. Comovem-nos, tanto quanto a qualquer mortal de bom coração, os relatos de ações generosas e a sublime abnegação de algumas belas almas em prol dos mais necessitados.
Além disso, a maioria de nós quer muito acreditar nas boas intenções desses que pretendem extinguir dos corações humanos o sentimento de interesse, que se mostram tão impiedosos com aqueles que apelam ao individualismo e cujas bocas se enchem incessantemente das palavras abnegação, sacrifício, solidariedade e fraternidade. Queremos sinceramente admitir que eles obedecem exclusivamente a essas sublimes causas que aconselham aos outros; que eles dão exemplos tão bem quanto conselhos; que colocam as suas próprias condutas em harmonia com as doutrinas que defendem; queremos muito crer que suas palavras são plenas de desinteresse e isentas de hipocrisia, arrogância, inveja, mentira ou maldade.
Sim, pois cada um desses senhores tem um plano para realizar a felicidade humana, sempre apoiados na máxima de que é possível construir e planificar estruturas e relações sociais até alcançar o ideal da sociedade perfeita, da solidariedade, da caridade e da justiça social, ainda que para isso seja necessário o uso dos meios mais obscenos. Por conta desses ideais supostamente altruístas, se dão o direito de acusar aqueles que os combatem de egoístas, mesquinhos, interesseiros, etc. Essa, porém, é uma acusação injusta, pois se nos fosse demonstrado que é viável fazer descer para sempre a felicidade sobre a terra, através de uma organização social fictícia ou simplesmente decretando-se a fraternidade entre os homens, nós os acompanharíamos com imenso prazer.
Se os contestamos, entretanto, é porque temos suas idéias por falsas e seus projetos por tão pueris como desastrosos. Nunca nos foi demonstrado que a caridade se possa impor, pois onde quer que ela se manifeste só pode ser espontânea ou não é caridade. Decretá-la é o mesmo que aniquilá-la. Se a fraternidade suscita vivamente a nossa simpatia é justamente porque atua fora de toda coação legal. Se a lei raramente pode forçar o homem a ser justo, jamais conseguiria forçá-lo a ser abnegado.
Quando a caridade é livre, espontânea e voluntária, a concebemos e aplaudimos. Admiramos tanto mais o sacrifício que é mais completo. Mas quando se propõe a uma sociedade o princípio de que a fraternidade será imposta pela lei, vale dizer, que a repartição dos frutos do trabalho será feita legislativa e arbitrariamente, sem consideração pelos direitos inerentes ao próprio trabalho, quem pode dizer em que medida este princípio atuará? De que forma um mero capricho do legislador não poderá subvertê-lo?
Quando se admite, como regra geral, que o Estado estará encarregado de fazer a fraternidade em favor dos cidadãos, não é difícil antever que todos serão transformados em suplicantes. Que todos se agitarão para reclamar os favores do Estado. Todos terão boas razões para provar que a caridade legal deve ser entendida no seguinte sentido: “as vantagens para mim e as cargas para os outros”. O esforço de cada um será no sentido de arrancar do legislador um fragmento do privilégio “fraternal”. Por certo, as classes menos favorecidas, ainda que tenham os maiores títulos, não terão sempre os maiores êxitos.
Se fosse possível decretar a fraternidade universal; se, como querem muitos, conseguíssemos fazer desaparecer do mundo, por um mero estalar de dedos, o interesse pessoal; se fosse possível estabelecer que não haveria mais egoísmo; se pudéssemos operar o milagre de fazer com que o Estado desse tudo a todos, sem tomar nada de ninguém, que se fizesse, então. Quem não se regozijaria de que a humanidade chegasse à perfeição e à felicidade por um caminho tão curto e tão fácil?
Quem não gostaria de jogar sobre as costas do Estado a subsistência, o bem-estar e a educação de todos? De transformar o Estado nesse ser generoso, criativo, presente em tudo, abnegado em tudo, capaz de amamentar a infância, instruir a juventude, assegurar trabalho aos fortes, dar retiro aos débeis, que pudesse intervir diretamente para aliviar todos os sofrimentos, satisfazer e prevenir todas as necessidades, abastecer de capitais a todas as empresas, de luzes a todas as inteligências, de bálsamo a todas as feridas, de asilo a todos os infortunados?
Quem não gostaria de ver todos esses benefícios fluir da lei como uma fonte inesgotável? Quem não estaria feliz de ver o Estado assumir sobre si toda a pena, toda previsão, toda responsabilidade, todo dever, tudo isto que a providência, cujos desígnios são impenetráveis, colocou de laborioso e pesado a cargo da humanidade, e reservar aos indivíduos de que ela se compõe o lado atrativo e fácil; as satisfações, as certezas, a calma, o repouso; um presente sempre seguro, um futuro sempre sorridente, a fortuna sem cuidados, a família sem cargas, o crédito sem garantias, a existência sem esforços?
Certamente quereríamos tudo isso, se fosse possível. Mas, será possível? Eis a questão. Cremos que existe nesta personificação do Estado a mais estranha e a mais humilhante das mistificações. Que seria então este Ente que toma a seu cargo todas as virtudes, todos os deveres, todas as liberalidades? De onde sacaria seus recursos para derramá-los em benefícios sobre os indivíduos? Não seria dos próprios indivíduos? Como poderiam estes recursos multiplicarem-se passando pelas mãos de um intermediário parasitário e voraz? Não é claro que esse mecanismo é de natureza que absorve muito das forças úteis e reduz muito a parte dos trabalhadores?
A caridade implica sempre a idéia de abnegação, de sacrifício, e por isso não se manifesta sem arrancar lágrimas de admiração. Se transformarem a fraternidade numa prescrição legal, cujos atos sejam previstos e obrigatórios, que restará desta definição? Nada mais que uma coisa: o sacrifício, mas o sacrifício involuntário, forçado, determinado pelo medo do castigo. E, de boa fé, que seria um sacrifício desta natureza, imposto a uns em proveito de outros? Seria caridade? Não, seria injustiça, seria espoliação legal, a pior das espoliações, posto que sistemática, permanente e inevitável.
Eis então a síntese de toda a nossa controvérsia. Enquanto vocês buscam o ideal utópico da sociedade perfeita nos inúmeros planos e esquemas artificiais, nós, por outro lado, encontramos a harmonia na natureza do homem e das coisas. Simplesmente, não concordamos que se coloque a arbitrariedade, o imposto e a coação acima da liberdade individual. Não podemos admitir que se tire, de cada trabalhador, o direito universal e inalienável de utilizar os frutos do próprio trabalho da forma que melhor lhe convier.

Sobre o autor

João Luiz Mauad
Administrador de Empresas e Diretor do Instituto Liberal
João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta do Povo.
Número de entradas : 123

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domingo, 24 de fevereiro de 2013

Mensalao e outras corrupcoes: o que se ve, e o que nao se ve...

O economista Frederic Bastiat ficou famoso pelo seu recurso genial a um tipo de metodologia analítica que ilustra de maneira muito simples, e absolutamente correta, os efeitos visíveis e invisíveis de qualquer medida de política pública que incida sobre os agentes econômicos e seus ativos: o que se vê, e o que não se vê.
De fato, o universo econômico é dominado, como não poderia deixar de ser no mundo contemporâneo, por medidas governamentais. Os Estados, ou os governos, determinam tudo, inclusive a liberação total dos fluxos, se por acaso dominados por uma ideologia liberal, ou libertária, ou o intervencionismo mais completo e absoluto, como nos sistemas comunistas defuntos (nem todos) e nos fascismos enterrados. Ficou, porém, e o keynesianismo é apenas uma variante mais light e insidiosa dessa realidade, o fato da intervenção governamental, para regular, liberar, constranger, taxar, etc.
E qualquer medida econômica possui, justamente, o seu lado visível, que é o que se pretende, sempre com boas intenções, e o seu lado menos visível, até obscuro, que são os efeitos indesejados, imprevistos, até inéditos, que é o que se obtem quando governos iluminados pretendem ditar às pessoas e empresas o que elas podem, ou não podem fazer com os seus ativos.
Em política, também é assim, e mais do que tudo ela tem muitos lados invisíveis que não sabemos como as coisas se deram, exatamente, e só uma pequena parte vem à tona.
Assim é, assim foi, e assim será, com o julgamento mais famoso ocorrido no Brasil contemporâneo, o do Mensalão, pelo qual um bando de meliantes travestidos de políticos foi pego com a boca na botija. O bandido mais condenado, coitado, é provavelmente, o menos culpado de todos, pois é evidente que o famoso operador financeiro da quadrilha do Mensalão não teria feito nada daquilo se não tivesse carta branca do chefe da quadrilha, que deveria ter recebido uma pena três vezes maior.
Assim ocorre, também, com o outro lado da história, sequer presente na história do Mensalão: o chefão maior, o capo di tutti i capi, não apareceu, mas foi ele o responsável final de tudo isso.
O mesmo ocorre no atual escândalo chamado de Rosegate, a amante do capo, que nunca teria feito o que fez se não autorizada, talvez até instruída pelo mesmo obscurso personagem.
Talvez haja um processo rumoroso, talvez não. Talvez o criminoso maior apareça, talvez não. Não sabemos ainda o que vai acontecer.
Uma coisa é certa: nunca saberemos exatamente o que aconteceu, pois os bandidos não vão confessar.
Quem conhece a história toda?
Eles próprios, claro. Mas também tem outros que sabem, que assistiram, que espionaram, que talvez chantageiem os personagens principais, e não apenas em torno desses dois casos tristemente famosos. Tem muitos outros episódios que não sabemos, que sequer desconfiamos e que nunca iremos saber.
Quem sabe algo a respeito? Eu tenho um palpite, apenas isto: um palpite.
Os cubanos sabem de muitas coisas...
Vão revelar? Não em público, apenas para os próprios interessados, para usar na medida de suas necessidades.
E quando a história der as suas voltas, vão queimar os papeis por que isso os compromete também.
Grandes bandidos se esforçam para não deixar pegadas.
É isso. Por enquanto fiquem com uma crônica do Mensalão, que conta apenas uma parte da história...
Paulo Roberto de Almeida 

O jornalismo independente ilumina a paisagem infestada de repórteres invertebrados e colunistas estatizados
Augusto Nunes, 23/02/2013

Na edição impressa de VEJA, comentei o livro do jornalista Merval Pereira sobre o julgamento do mensalão. Segue-se o texto. (AN)

Numa paisagem infestada de repórteres invertebrados, críticos construtivos, colunistas estatizados e analistas que combatem valentemente quem ousa discordar do governo, o espaço ocupado por jornalistas nascidos sob o signo da independência e condenados a amar a verdade acima de todas as coisas parece perturbadoramente acanhado. É mesmo diminuto, mas não há motivos para inquietação.

Os integrantes dessa linhagem nunca foram muitos. Mas cada um vale por uma multidão, comprova Merval Pereira em Mensalão – O dia a dia do mais importante julgamento da história política do Brasil (Editora Record; 285 páginas; 34,90 reais). “O jornalismo é o exercício diário da inteligência e a prática cotidiana do caráter”, ensinou Cláudio Abramo.

É o que Merval tem feito há mais de 40 anos, ao longo dos quais brilhou como repórter de campo ou exercendo cargos de chefia nas Organizações Globo, no Jornal do Brasil e em VEJA. É o que faz todos os dias em sua coluna no Globo e nos comentários para a GloboNews e para a rádio CBN. Foi o que fez durante os quatro meses e meio em que milhões de brasileiros acompanharam ─ primeiro com ceticismo, em seguida com esperança, enfim com justificado entusiasmo ─ o julgamento da quadrilha que tentou a captura do Estado Democrático de Direito até ser desbaratada em meados de 2005.

Aos 63 anos, eleito há quase dois para a Academia Brasileira de Letras, o jornalista carioca reconstitui essa metamorfose fascinante no livro que reúne 86 artigos publicados na página 4 do Globo, precedidos por um pedagógico prefácio do ex-ministro Carlos Ayres Britto e completados por dois textos, até agora inéditos, que induzem o mais descrente dos leitores a acreditar que o Brasil nunca mais será o mesmo. Começou a mudar ─ para melhor.

Como adverte o posfácio, nenhuma decisão judicial é capaz de iluminar da noite para o dia a face escura de um país. Se no Brasil Maravilha que Lula inventou é possível até erradicar a miséria por decreto, no Brasil real os avanços são mais demorados. O Supremo não erradicou a corrupção. Ao condenar uma organização criminosa comandada por figurões federais, contudo, revogou a norma não escrita segundo a qual alguns são mais iguais que os outros, embora todos sejam iguais perante a lei.

Ao contrário do miserável-brasileiro, o brasileiro corrupto não virou uma espécie extinta. Mas ninguém mais pode considerar-se condenado à perpétua impunidade. Veja-se o escândalo protagonizado por Rosemary Noronha e seus comparsas. Um jipe doado a um dirigente do PT por serviços prestados a uma empresa privada, exemplifica Merval, “equivale à operação plástica para a chefe do gabinete da Presidência da República em São Paulo, em troca talvez de uma audiência marcada”.

Nem existem diferenças notáveis, lembra o autor, entre arranjar emprego para a ex-mulher do político poderoso ou premiar com um cruzeiro marítimo a secretária que diz que conversa com o ex-presidente todos os dias. O caso Rose sugere que o país é o de sempre. Visto de perto, informa aos gritos que as coisas mudaram.

Há um ano, como demonstra o livro, Lula estava em campanha para adiar o julgamento do mensalão ou absolver todos os culpados. Confiante no apoio de gente que nomeou, como o presidente Ayres Britto ou o relator Joaquim Barbosa, enxergou subordinados obedientes onde havia juízes honrados. Decidido a ganhar de goleada, recorreu à chantagem para enquadrar Gilmar Mendes. A vítima do achaque contou o que acontecera e Lula preferiu acompanhar o julgamento pela TV Justiça.

Atropelado em novembro pela Operação Porto Seguro, que apurou as bandalheiras da turma de Rose, o mais falante dos palanqueiros foge da história há mais de três meses. “Depois do julgamento do mensalão, há mais chance de o poderoso de plantão, apanhado com a boca na botija, pagar por seus crimes, até mesmo na cadeia”, constata Merval. É verdade, confirma a estridente mudez de Lula.

sábado, 2 de junho de 2012

O que se vê, e o que não se vê, em política... - Paulo Roberto de Almeida

O que se vê, e o que não se vê, em política...

Paulo Roberto de Almeida

Em trabalho escrito no último dia de maio deste ano de 2012, divulgado no mesmo dia em meu blog, sob o título “Existem países perfeitamente fascistas, sem que se saiba...”, eu tecia algumas considerações sobre certas derivas “culturais”, mas de perigosas consequências práticas, que se manifestavam aqui e ali – segundo minha leitura do noticiário corrente – e que poderiam indicar uma infeliz inclinação involuntária de certos países para o fascismo ordinário, levado por uma série de comportamentos perfeitamente autoritários dos que detinham o poder, mas aceitos inconscientemente pelos que suportam esse poder de mando. Nem o título, nem o trabalho, em si, traziam qualquer referência ao economista Frédéric Bastiat, um liberal do século XIX, bastante conhecido pelos seus “Ensaios de Economia Política” (disponíveis na internet em diversas versões, em francês e em inglês, segundo escolha dos interessados).
No cabeçalho do post, contudo (ver este link do Diplomatizzando: http://diplomatizzando.blogspot.de/2012/05/o-fascismo-que-se-via-e-o-fascismo-que.html), eu fazia referência ao que tornou Bastiat famoso em suas preleções econômicas, em grande medida válidas ainda hoje: o recorrente recurso, em sua argumentação, ao que se vê em economia – preços, créditos, alugueis, juros, enfim, todos os grandes fluxos econômicos, apresentados segundo dados objetivos – mas também ao que não se vê, no mesmo terreno, que são, justamente, as consequências, muitas delas involuntárias, de certas ações humanas, geralmente governamentais, que visam interferir nos fluxos e relações econômicas, supostamente para “provocar” uma melhor situação de bem-estar, mas que invariavelmente acabando trazendo maiores prejuízos à sociedade e aos agentes sociais e econômicos do que se essas ações – por exemplo, fixação política dos juros, protecionismo comercial, subsídios estatais a indivíduos ou a um grupo, limites oficiais à variação dos preços de determinados bens ou dos alugueis, etc. – não tivessem sido tomadas. Ainda pensei em Bastiat, hoje mesmo, lendo a imprensa internacional, ao constatar que, depois de tantos bilhões – em alguns casos trilhões – em recursos públicos despejados no setor financeiro (e portanto acúmulo de dívida pública), na “retomada do crescimento e do emprego”, no “estímulo econômico keynesiano”, enfim, num sem número de medidas adotadas nos principais países em crise (e até em alguns que se vangloriam de não estarem em crise), depois de todo esse ativismo governamental, a economia continua depressiva e teima em não fugir do ciclo de recessão e de baixo crescimento. Até parece que a agitação não resultou em grande coisa, ou talvez em nada, para ser mais exato.
Trata-se do típico exemplo do que Bastiat chamaria do lado que se vê – ou seja, os tais de estímulos keynesianos, ou injeção de recursos para manter uma tal de “demanda agregada” – mas que se esquece do lado que não se vê, e ele vem aqui: de onde pensam os keynesianos que sai o dinheiro para tais estímulos?; quando se diz que o governo vai “estimular o crédito”, para manter o crescimento, de onde acham, esses mesmos tecnocratas governamentais, que sai o tal “crédito”? O crédito, por acaso, nasce nas árvores, vem do ar, fica num grande cofre à disposição dos governantes? Em outros termos: quando alguém lhe disser que o governo vai fazer isso e mais aquilo para não cairmos em recessão, pergunte, com Bastiat, pelo outro lado da história: de onde sairão os recursos para tais e tais medidas? Você já pensou na conta que o governo está deixando para você pagar mais adiante? Na próxima vez, pense nisso: saque seu Bastiat do bolso e diga: “alto lá: quero ver o outro lado, o que não se vê, justamente”. Essa é a melhor maneira de defender o seu bem-estar, e o seu futuro...

Mas hoje não pretenderia falar de economia, e sim de política, na continuidade do meu texto anterior, sobre a existência de países perfeitamente fascistas sem que disso a maior parte das pessoas tome consciência. Quero aplicar a regra de Bastiat aos dizeres, aos comportamentos e às práticas políticas. Assim, quando um político lhe disser “vamos fazer isso, porque é mais democrático, porque beneficia a maioria da população”, saque o seu Bastiat e pergunte pelo outro lado. Vamos fazer o exercício?

Em política, o que mais se vê, sobretudo em épocas eleitorais, são promessas, de todos os tipos e tamanhos, de todas as cores para todos os gostos, para todos e cada um, qualquer que seja o custo financeiro das promessas feitas: saneamento, hospitais, escolas, segurança, empregos, aumento de renda, enfim, não há limite para o festival de bondades. A primeira pergunta do nosso exercício de política aplicada, à la Bastiat, seria, portanto, atinente aos meios e instrumentos para a realização dessas promessas, ou seja, começar imediatamente pelo mais simples: “olha aqui candidato: está muito bem o que você nos promete, mas de onde virão os recursos para tudo isso?”. Sim, porque as promessas são baratas, mas sua realização é muito cara. Por isso mesmo, eu tenho em alta conta um blog francês, alojado no site do Institut Montaigne, de Paris, que se chama “Chiffrages et Déchiffrages” (http://www.chiffrages-dechiffrages2012.fr/); ele fornece uma estimação a mais precisa possível sobre o custo envolvido em qualquer promessa de políticos. Já seria um grande progresso se o Brasil viesse a ter algo do gênero em permanência. Seria uma maneira de ver o outro lado, em política e em economia.
Existem outras propostas, também, que são feitas independentemente do período eleitoral, mas uma supostamente se aplica perfeitamente aos gastos de campanha: por exemplo, o tal de financiamento público de campanha política, feito por meio dos partidos políticos. Você seria ingênuo o suficiente para acreditar que o financiamento público impediria, limitaria ou evitaria o financiamento privado (geralmente por parte de empresas interessadas em contratos públicos)? Se olharmos para o outro lado, se poderia facilmente constatar que uma empresa interessada nesse tipo de negócio não pode parar de fazer o que faz, pois do contrário como ela iria garantir novos contratos a partir da posse dos seus “ajudados”? Trata-se de um dado estrutural da maneira de fazer política no Brasil que não parece perto de terminar, com lei ou sem lei de financiamento público.
Ainda nessa esfera das propostas eleitorais, o que dizer das obras públicas, justamente, ou da promessa de criar mais empregos públicos para resolver tal ou qual problema na esfera dos serviços coletivos? O outro lado, que não se vê, já teria de se apresentar logo de partida: o Estado é capaz de fazer qualquer coisa, distribuir uma aspirina que seja, sem que antes ele recolha os recursos ou os bens que pretende “distribuir” em alguma parte? E quando ocorre esse recolhimento preventivo, uma parte, geralmente de 10 ou 15% (mas que pode ser maior), fica no próprio Estado, a título de administração, organização dos serviços, gastos com os “meios”, etc.; o que normalmente ocorre é que os meios se tornam mais importantes do que os fins, pelo menos do ponto de vista da burocracia do Estado, um praga renitente, que tem sua própria razão burocrática.
Tenho um exemplo particularmente idiota, completamente imbecil, de uma ação desse tipo, mas que foi proposta por burocratas – talvez mal intencionados, desde o início, visando provavelmente garantir empregos para os militantes da causa – com o objetivo de estimular a leitura no Brasil (reconhecidamente um país que lê pouco; menos eu, que devo ler por pelo menos cem brasileiros, talvez mais). Pois bem, como esses idiotas conceberam o plano para estimular a leitura, por meio de “agentes de leitura”, a serem espalhados por escolas e bibliotecas públicas? Ora, muito fácil, para os burocratas idiotas como os que tomaram de assalto a máquina pública: bastava instituir um “pequeno imposto” sobre a cadeia do livro para financiar a fabulosa figura do “estimulador de leituras” (geralmente companheiros desempregados, claro, que podem estar precisando de um emprego público qualquer, geralmente estável e com muito pouco trabalho). Não é perfeitamente idiota? O que se apregoa é a necessidade da leitura, e é isso que se vê e se proclama; o que não se vê é que o livro, já bastante caro no Brasil, ficaria um pouco mais caro para fazer com que os brasileiros lessem mais. Não é genial?
Quando algum outro político, ou partido, dizer que pretende “democratizar os meios de comunicação”, comece a pensar no que não se vê: o controle partidário, perfeitamente totalitário, daqueles meios de comunicação que não estão de acordo com as propostas de certos políticos e que até têm a petulância de investigá-los em seus hábitos privados satisfeitos com recursos públicos. Esta é, sem dúvida alguma uma variante do fascismo econômico que já detectamos em certos países no trabalho anterior desta série.
E a mania, consagrada por supremos aplicadores da lei, de instituir cotas para minorias raciais, na suposição de que, primeiro se trata de minorias, segundo que só por essa via as minorias que não são minorias poderão enfrentar a concorrência com as verdadeiras minorias de selecionados pelo mérito? Existe algo mais contrário ao teste de Bastiat do que isso? O que se vê é a “justiça” feita aos que não tiveram oportunidades na vida, por alguma deficiência herdada do meio social, da formação educacional, enfim, das diferenças que caracterizam nossa sociedade; o que não se vê, é a injustiça feita com quem não fez nada além de estudar e se preparar para um concurso qualquer, e que de repente se vê preterido por um cota racial de algum tipo. Existe injustiça maior do que a denegação dos direitos individuais de alguém, em nome de obscuros “direitos coletivos”, que não são exatamente coletivos, já que acabam beneficiando um outro indivíduo, tão individual quanto o primeiro?

Os exemplos poderiam ser multiplicados infinitamente, mas eu termino por uma perfeita manifestação do inconsciente coletivo que pretende beneficiar concretamente determinados grupos de pessoas, mas que não vê, como prejudica a todos, igualmente. Eles existem e se multiplicam no Brasil, infelizmente. Se trata da “bondade” feita por políticos com o dinheiro privado, e que consiste em assegurar meia entrada ou entrada livre para estudantes ou idosos em várias categorias de espetáculos ou serviços, a começar por cinemas e teatros, espetáculos musicais ou esportivos, transportes coletivos e muitas outras áreas que não cabe detectar aqui. Os políticos acreditam, realmente, que estão beneficiando essas categorias? Eles são ingênuos de acreditar no que se vê? Nunca pararam para considerar o que não se vê? Que o preço das meias entradas ou das prestações gratuitas de um serviço qualquer contribui para que o preço médio pago por todos seja bem mais caro na ausência dessas políticas, ou que se acaba induzindo à sobre-utilização de determinados serviços – pode ser até no setor de saúde – que de outra forma poderiam funcionar de modo muito mais racional, e econômico, para o conjunto da população, na ausência desses “estímulos” e subsídios perfeitamente idiotas.
Existe bem mais, do lado que não se vê, do que esse custo acrescido nas prestações que todos pagam, custo incorrido até pelos que não se utilizam desses ou de outros serviços. Se trata da demanda dos empresários afetados pela redução ou gratuidade  no sentido de obter determinadas “compensações” estatais (uma suspensão fiscal, por exemplo), ou então subsídios diretos à manutenção do serviço. Existe aí, ademais do custo direto da medida em si, uma imensa porta aberta para a corrupção, as combinações obscuras, a formação de pequenos e grandes carteis, enfim, todo tipo de patifaria a partir da seleção dos fornecedores de determinados serviços. O que não se vê é geralmente maior, e muito mais prejudicial, do que o que se vê como benefício.
Quando é que os brasileiros vão começar a prestar atenção no lado que não se vê da política corrente?
Seria preciso, provavelmente, organizar um curso elementar de Bastiat aplicado a todos os candidatos a cargos públicos, e também aperfeiçoar a educação política dos brasileiros. Mas esta, evidentemente, é tributária da educação em geral, aquela que supostamente se aprende na escola e que deveria servir para a vida toda. A julgar pelo constato quando ao estado atual – e próximo futuro – da educação no Brasil, ousaria dizer que não existe a menor chance desse quadro ser modificado para melhor no futuro previsível. Tenho razões para ser otimista, ao observar o quadro lamentável de nossa educação pública – e privada, também, pois os professores não são muito diferentes, com exceção das grandes escolas para ricos – e concluir que não há nenhum risco de melhorias positivas qualquer que seja o horizonte de nossas expectativas?
Quem tiver razões de esperança, pode escrever algum ensaio para me contradizer.

Dresden, 2399: 2 Junho 2012.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

A frase da semana: a ficcao do Estado - Frederic Bastiat

O Estado é essa grande ficção pela qual cada um tenta viver às custas de todos os demais.

Fréderic Bastiat (1801-1850)
que acrescentou:
"Para essa situação, só existe um remédio: tempo. As pessoas têm de aprender, por meio da dura experiência, a enorme desvantagem que existe em saquear o próximo".

"A única solução é o esclarecimento progressivo da opinião pública".