Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;
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terça-feira, 30 de setembro de 2014
Poliica externa companheira: o mundo como palanque - Mac Margolis
Mac Margolis
O Estado de S. Paulo, 28/09/2014
Mac Margolis é colaborador da Bloomberg View e colunista do 'Estado'
Este mundo é um palanque. Que o diga a presidente do Brasil, Dilma Rousseff. Com a corrida presidencial nas últimas semanas e a promessa de um final suado, a líder brasileira fez o que faz todo mandatário que se preze em momentos difíceis: viajou.
Claro, já constava na agenda presidencial a sua participação da 69.ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Afinal, o Brasil é o país que dá início à solenidade anual da ONU, que reúne chefes de Estado e de governo de 193 nações. Restou para a brasileira - ou seus marqueteiros - o lampejo de amarrar a pompa à circunstância e converter a cúpula global em comício.
Seu discurso não encantou. Como oradora, a presidente é uma excelente tecnocrata. Ela, corretamente, chamou atenção para o desequilíbrio nas instituições de governança multilateral, como o Conselho de Segurança das Nações Unidas, para o qual o Brasil reivindica um assento permanente. Exatamente como fez no ano passado, quando Brasília já era voto vencido.
Criticou as grandes potências pela sua queda por soluções militares para os conflitos no Oriente Médio, deixando para a imaginação como seria uma negociação de paz com os encapuzados do Estado Islâmico (EI).
Convocou os pares internacionais para engrossar a luta contra o aquecimento global. Perdeu a oportunidade de explicar porque o Brasil, campeão em derrubada de florestas, não se juntou aos 150 países, 35 empresas, 16 grupos indígenas e 45 grupos da sociedade civil que assinaram o compromisso de reduzir o desmatamento pela metade até 2020, na última Cúpula do Clima.
Na toada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criticou os países ricos ("os louros de olhos azuis", como preferiu seu mentor), pelo colapso mundial após a quebra do banco Lehman Bros., crise pela qual o Brasil teria navegado com louvor.
Pulou a parte da pane na economia nacional, que recentemente embicou em recessão técnica, com inflação em alta e confiança do investidor, cadente.
Tocou apenas de raspão no tema da espionagem das agências americanas, que fez dela uma vítima e dominou seu discurso na mesma sala, no ano passado, e quase deflagrou uma crise diplomática entre Brasília e Washington. Mas esse foi o ultraje de ontem.
Hoje, com o segundo mandato em jogo, Dilma tem outro público a convencer. Por isso, enxergou no colegiado das nações um estúdio itinerante de propaganda eleitoral e seu discurso, um 'Café com a Presidenta' pelo teleprompter alheio.
Combate à desigualdade, aula magna de administração econômica, cerco implacável contra a corrupção e apoio total aos direitos dos homoafetivos: o Brasil do governo Dilma representa tudo isso e mais, afirmou.
Como a presidente brasileira, seus pares latino-americanos também escolheram o pódio internacional como atalho para as urnas.
O presidente boliviano, Evo Morales, que concorre à reeleição em outubro, jogou para a sua base andina ao propor um "tribunal do povo" para julgar os "crimes" do presidente americano, Barack Obama.
A presidente argentina, Cristina Kirchner, que sonha em fazer seu sucessor no ano que vem, aproveitou sua vez ao microfone para bater nos credores "abutres", aqueles que ao recusar os termos do acordo geral da dívida teriam levado seu país à oitava moratória externa desde 1820. "Terroristas não são apenas aqueles que jogam bombas", disse a presidente.
Cristina pegou a casa ainda cheia e atenta. Já Nicolas Maduro, da Venezuela, teve de se contentar com alguns gatos pingados. Maduro, enfim, não é Chávez, o orador dublê de bufão que encantava suas plateias com impropérios e blagues.
Dilma teve recepção melhor, em parte pelo peso do Brasil, em parte pelo horário, pois discursou logo antes de Barack Obama.
Do Brasil, emergente titular das Américas, sétima economia do mundo, sócio-fundador do grupo Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul), o mundo talvez imaginasse um discurso à altura. Pena que tenha ouvido mais um programa do horário eleitoral, com tradução simultânea.
segunda-feira, 16 de junho de 2014
Cuba-Coreia do Norte: dois regimes companheiros (e amigos doscompanheiros) - Mac Margolis
Conexão Havana-Pyongyang
Coluna / Mac Margolis
segunda-feira, 24 de março de 2014
Panama: o unico pais a salvar a honra perdida da AL no caso daVenezuela-OEA - Mac Margolis
O Panamá é bom de briga
Mac Margolis
Na diplomacia, o Panamá não é exatamente um peso-pesado. Uma pequena tripa do istmo centro-americano, o país tem a população de Espírito Santo e um PIB menor do que o faturamento do Walmart. Teve seu momento de glória há um século, quando o Theodore Roosevelt traçou o canal do Atlântico ao Pacífico. Hoje, o Canal do Panamá depende de reformas urgentes, mas o diminuto país continua a surpreender.
Agressivo e altivo, o governo panamenho fala quando o resto da região silencia e não foge de brigas com vizinhos graúdos. O estilo choca-se com a comedida diplomacia da América Latina, onde a condescendência é a regra até com vizinhos que atropelam direitos humanos e o único inimigo consensual é Washington.
Pela atitude pouco companheira e a recusa ao nacionalismo barato, o governo panamenho já foi acusado de fantoche dos gringos. Assim foi na semana passada, quando o Panamá pressionou para que a deputada venezuelana María Corina Machado falasse ao Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Líder importante da oposição ao governo de Nicolás Maduro, a deputada pretendia expor ao colegiado regional o que se passa nas ruas conflagradas da república bolivariana, onde pelo menos 31 pessoas morreram em confrontos ocorridos em meio à recente onda de protestos antichavistas.
A OEA vetou María Corina. Talvez pela afinidade latina com o socialismo do século 21 de Hugo Chávez. Ou, quem sabe, para não arriscar a mesada companheira – os 110 mil barris diários de petróleo barato que Caracas envia a 17 países amigos no programa Petrocaribe. Foi a senha para o presidente panamenho, Ricardo Martinelli, que convidou a oposicionista venezuelana para integrar sua delegação nacional na OEA, cedendo-lhe o assento do próprio embaixador. Assim, reprisou um gesto dos anos 80, quando a oposição do Panamá pediu o apoio da Venezuela para expor na OEA a repressão do então ditador Manuel Antonio Noriega. No entanto, não assim foi desta vez. Possessos, os bolivarianos manobraram para sufocar a insurreição. Na sexta-feira, a poucos minutos do início da eunião, o conselho decidiu, por 22 votos a 11, fechar as portas da OEA ao público. Para “não criar um circo”, o Brasil votou com os bolivarianos, trocando a lona pela mordaça.
Sem limites. Pode haver um componente pessoal na rusga entre Caracas e Cidade do Panamá, na qual os dois mandatários só faltam xingar a mãe um do outro. “Lacaio rastejante”, o presidente Maduro chamou seu colega panamenho. “Imaturo”, revidou Martinelli, fazendo graça com o nome do venezuelano, a quem acusou de conduzir seu país “à falência”.
No entanto, não é apenas o fígado que fala. Conservador e capitalista desenvergonhado, o panamenho nunca escondeu seu desprezo pelo enclave chavista, que vai de La Paz a Havana.
Em julho, Martinelli provocou um paroxismo continental quando mandou apreender o cargueiro Chong Chon Gang, que saíra do Porto Mariel, em Cuba, rumo à Coreia do Norte. Oficialmente, o navio carregava açúcar. Os fiscais do canal desconfiavam de cocaína. Acharam uma verdadeiro arsenal.
Especialistas das Nações Unidas encontraram um sofisticado esquema de contrabando de armas. Nos contêineres, havia seis plataformas lançadoras de mísseis, dois caças MiG-21 desmontados, armas e munição. Mesmo assim, o governo de Cuba esperneou, escorado pelos companheiros bolivarianos, que alegaram ingerência por encomenda dos gringos.
A festa de desaforos entre os dois países continua. No início de março, o Panamá pediu à OEA que debatesse os confrontos nas ruas da Venezuela. Maduro deu o coice: expulsou o embaixador panamenho e rompeu o comércio bilateral. A OEA curvou-se à decisão. Os bolivarianos conseguiram calar a deputada María Corina dentro do colegiado já famoso pelo silêncio obsequioso. Fizeram-lhe um imenso favor, levando-a ao palco internacional, o mais novo para-raio da tempestiva revolta contra o chavismo.
É COLUNISTA DO 'ESTADO' E CHEFE DA SUCURSAL BRASILEIRA DO PORTAL DE NOTÍCIAS VOCATIV
domingo, 2 de fevereiro de 2014
O efeito Kicillof, Argentina e Brasil - Mac Margolis
domingo, 26 de janeiro de 2014
Bolivia: em busca do poder nuclear - Mac Margolis
segunda-feira, 23 de setembro de 2013
O paradoxo peruano: crescimento e baixa popularidade - Mac Margolis
Paradoxo peruano
terça-feira, 12 de fevereiro de 2013
Equador: mais excessos de democracia, bananais - Mac Magolis
Mac Margolis
O Estado de S. Paulo, 11/02/2013
No princípio, havia os Pentagon Papers, os documentos sigilosos que escancaram os segredos de Washington na malograda Guerra do Vietnã. O catatau escandalizou o público americano e acelerou o desfecho da Pax Americana do pântano do conflito asiático. Mais recentemente, conhecemos o WikiLeaks, razão social do exército de cibermilitantes dedicado a minar os computadores de governos ricos para descortinar os infames e o arbítrio dos poderosos.
Em comum, tiveram a convicção de que, entre a segurança nacional e o interesse público, prevalece o cidadão. Alguns cidadãos mais que outros, é verdade, já que o Wikileaks, em seu afã de embaraçar o império, acabou colocando em risco a vida de alguns inocentes. Mas a ideia se consolidou: os governantes nada podem ocultar dos governados.
Agora entra em cena o BananaLeaks, a melhor novidade do gênero na Améri- ca Latina .A publicação, que é 100% digital, nasce do mesmo princípio dos seus antecessores - o compromisso de jogar luz aos porões oficiais. Seu lema, estampado no alto da sua página de boas vindas: "Se não queres que ninguém saiba, não o faça".
Seu nome parece piada de mau gosto. Enfim, o Equador, alvo predileto de suas reportagens, é a capital mundial da bananeira e foi a globalização dessa fruta curvilínea que batizou aquele clássico da história latino-americana - a república de bananas.
Mas alguém o está levando a sério. O BananaLeaks tem pouco mais de um mês de existência e já sofreu golpes de mestre. Fundado em janeiro, ele saiu do ar dia 28, alvo de sabotagem de hackers sofisticados e bem financiados. Os rebeldes restauraram o portal com outro endereço na web, mas ele tombou de novo, vítima de outra cibersaraivada tão agressiva quanto anônima. Sua conta no Twitter também foi inutilizada.
Em jogo de gato e rato, os jornalistas do portal, que mantêm suas identidades em sigilo (enfim, nesse jogo de verdades, o véu é para todos!), exportaram seu site para um servidor no Hemisfério Norte e recalibraram o endereço na web. Hoje é bananaleaks.co e já contabiliza uma tempestade de acessos. Mas o que provocou tamanho alvoroço? Uma breve navegada na página não deixa dúvidas. O site, declaram os autores, "concentrará seus esforços em indagar e informar sobre a corrupção estatal, a liberdade de expressão e direitos humanos nos países da região, onde as liberdades e direitos fundamentais estão sofrendo restrições de maneira acelerada e brutal".
A equipe não é exclusivamente equatoriana, mas o governo de Rafael Cor- rea, hoje em campanha acelerada para reeleição, é a pauta predileta da folha eletrônica. Uma reportagem conta que os irmãos Fernando e Vinicio Alvarado, ambos ministros do governo Correa, tiraram diploma de doutorado com a mesma dissertação. Pior, nenhum dos dois seria o autor, pois a tese foi escrita por Fernando Savater, acadêmico espanhol conhecido como estudioso de ética (!). Outros dois doutores da família Alvarado também teriam se servido da mesma tese.
Essa denúncia foi fichinha. Ao final de janeiro, uma manchete no portal acusou o presidente equatoriano de manter duas contas não declaradas na Suíça. Em questão de horas, o site entrou em pane, seguida pela sua conta do Twitter. Mas as indiscrições bananeiras continuam. "Conheça os depósitos secretos nas Bahamas do primo e conselheiro financeiro do presidente do Equador", clama outra manchete. Em outra cutucada, o site postou na íntegra um documentário do colombiano Santiago Villa Chiappe, que acusa Correa de ajudar e aceitar ajuda da guerrilha marxista, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).
A ofensiva contra o BananaLeaks não tem autor assumido, mas sua pegada é bem conhecida. É mais uma agressão aos meios independentes de informação ness epaís andino, inspirado pelo socialismo do século 21 do presidente Hugo Chávez. O mestre bolivariano está ausente há dois meses, acometido pelo câncer num hospital cubano, mas seu estilo de governo - que mistura o rolo compressor com a mordaça - vai muito bem, obrigado.
Rafael Correa, um presidente popular, deve conseguir sua reeleição no próximo domingo. Tem cacife e caixa suficientes para conquistar votos nas regiões rurais e na periferia, e falta união e força política entre a ala da oposição. Mas a política é sempre uma incógnita e, quem sabe por isso, o melhor é garantir a vantagem, estancando as verdades inconvenientes, de onde quer que vazem.
sábado, 25 de agosto de 2012
Ao meu amigo Amaury de Souza - Mac Margolis
Ao meu amigo Amaury de Souza
Mac
Margolis
O Estado de S. Paulo, 24 de agosto de 2012
Meu amigo Amaury,
Foi de manhã, no outono carioca, que
conheci Amaury de Souza. Eu acabara de chegar no Rio, no início dos anos 80, um
jovem repórter americano, ansioso para abraçar o Brasil. Naquela época, as
matérias eram todas fáceis e as produzia com ligeireza e traçados fortes, sem
meios tons ou segundos pensamentos. Conforme fui ficando e conhecendo melhor o
país, as suas nuances e contorções, a pauta foi se complicando. Devo a Amaury a
correção de rumo. Esse e muitos outros que se seguiram.
À época, Amaury era professor
universitário, recém-chegado de uma temporada nos Estados Unidos e agora lotado
no Iuperj, conhecida faculdade de ciências sociais em Botafogo. Encontrei-o no
seu escritório, uma alcova modesta no segundo piso, abarrotada de livros e
teses que ameaçavam tragar toda a superfície da mesa. Atrás dela,
cumprimentou-me em inglês impecável um homem de gravata e terno alinhado,
trajes que nada combinavam com a universidade espremida e romanticamente
desleixada. Já dava para perceber que naquele espaço não cabiam suas ideias.
Por sua sugestão, saímos para almoçar e
seguimos caminhando, uma corrida de obstáculos pelas calçadas maltratadas do
bairro, ele abrindo caminho e eu, ofegante, no seu rastro. Amaury detestava
perder tempo. O destino era um restaurante mineiro tradicional do Rio, que
assim como a faculdade, já vivera dias melhores. Professor Amaury ia me
decifrando os pratos, o feijão tropeiro, o aroma correto da cachaça e o lugar
de cada um desses ingredientes na cultura nacional. Minha aula de Brasil começara
pelo paladar.
Amaury falou do fim projetado do regime
militar e do redespertar democrático, na época ainda tênue. O Brasil novo
estava em obras, tomado pela primeira campanha de eleições livres para
governador em duas décadas. Logo mais, viria o clamor pelas eleições diretas
presidenciais. Lá, entre tragos e pratos, lancei algumas perguntas a esmo, uma
rajada de ideias cruas e desinibidas sobre o país que pensava conhecer. Amaury,
atento, abanou lentamente a cabeça, como quem acabasse de assistir a um atentado
contra a lógica, e pôs-se a falar, delicado mas firme enquanto tratava de
socorrer minha narrativa torta.
Caminhada, uma boa mesa, um trago e uma
escova nas ideias. Assim começou minha aprendizagem sobre o Brasil. Para minha
sorte, o estágio se estendeu ao longo dos seguintes 30 anos. Daquele dia em
adiante, aprendi que conversar com Amaury era essencial. Escutar mais do que
conversar, é verdade, mas Amaury também tinha o que dizer. Quando o Brasil me
surpreendia e a engrenagem política se mexeu - da abertura democrática ao
impeachment de Collor, do Plano Real ao mensalão - era ele, invariavelmente,
que eu procurava. Perdi a conta de quantas vezes o abordei: Amaury, e agora?
Certa vez, um editor me chamou à
atenção. Será que eu não conhecia nenhum outro analista político do Brasil?
Pior que conhecia, sim. Vários deles e de bom quilate. Mas era a Amaury que eu
acabei retornando, sempre. Pois ninguém me surpreendia como ele, e certamente
nenhum outro dispunha de tanto tempo, muito menos de pachorra, para responder à
minha saraivada de dúvidas.
Não que sempre concordássemos. Em quase
tudo que fazia, Amaury era intenso e contundente, quando não fulminante. Em sua
casa, na mesa do bar ou numa roda de amigos, trovejava impiedoso contra os
absurdos do país. Ora era a máquina pública que demandava impostos escandinavos
para devolver serviços ugandenses. Ora a militância trabalhista que clamava
pela liberdade mas lutava com unhas e dentes para manter o monopólio do imposto
sindical. Ele tinha pouca paciência para a esquerda brasileira, paladinos da
ética política na oposição, uma quadrilha no poder.
Amaury era politicamente incorreto, às
vezes ao ponto de provocar arrepios. Mas fundamentava cada irrupção com fatos e
calçava suas filípicas com argumentos. Sociólogo premiado, não admitia o lero
sociologuês, tão rico em elucubrações poéticas quanto despido de dados. Amaury
acreditava em pesquisa. Em vez de adjetivos, lançava mão de números. Como
escreveu Roberto DaMatta, Amaury era um liberal em uma nação entregue à social-democracia,
um defensor assumido da liberdade capitalista em uma sociedade com vergonha do
lucro. Com ele entendi não só do Brasil mas do desafio de se pensar e repensar.
Arrotar opiniões é uma coisa. Defendê-las sob sabatina, é outra. Amaury sabatinava.
Um dia, lá pelo final dos anos 90, farto
com os descaminhos do Brasil, Amaury falou seriamente em sair do país. Seu
destino seria Miami, confessou, rota de fuga de muitos brasileiros.
"Miami?" perguntei, tentando imaginá-lo - aquela presença marcante,
sempre alinhada e movida a uma energia quase atômica - flanando pela South
Beach, de óculos Ray Ban e camisa estampada de hibisco. Felizmente, Amaury
desistiu da ideia. Sua esposa, Martha, vez por outra lembrava daquela conversa,
com mistura de espanto e bom humor, e até me agradecia pela intervenção
amigável que, quem sabe, os tivesse salvo de um fim tropical kitsch. Obrigado,
Martha. Mas foi puro interesse. Como eu iria fazer para entender o Brasil com
Amaury lá longe, tomando mojito?
Tive a grande sorte de conviver com
Amaury em sua terra, que ele pensava e interpretava como ninguém. Não foi
diferente na semana retrasada, quando encontramos na Urca, no bar a poucos
passos da sua casa. Magro e fragilizado pela doença, Amaury fazia questão de
estar ali, tomar chope, falar de livros (estava imerso em
"Jerusalém", último tomo do historiador Simon Sebag Montefiore),
comentar o julgamento do mensalão e decifrar os rumos da política brasileira.
Amaury podia estar doente, mas nunca o vi adoentado. Gostava demais da vida. Em
pouco tempo, passei de aprendiz a admirador, a amigo de Amaury, e custa
acreditar que isso tenha terminado.
terça-feira, 10 de julho de 2012
A ressaca democratica do Mercosul - Mac Margolis (Foreign Policy)
Latin America's Paraguayan Hangover
Some Latin American leaders have peculiar ideas about what constitutes an assault on democratic principles.
BY MAC MARGOLIS | Foreign Policy, JULY 9, 2012
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