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terça-feira, 30 de setembro de 2014

Poliica externa companheira: o mundo como palanque - Mac Margolis

O mundo é um palanque 
Mac Margolis 
O Estado de S. Paulo, 28/09/2014
Mac Margolis é colaborador da Bloomberg View e colunista do 'Estado'

Este mundo é um palanque. Que o diga a presidente do Brasil, Dilma Rousseff. Com a corrida presidencial nas últimas semanas e a promessa de um final suado, a líder brasileira fez o que faz todo mandatário que se preze em momentos difíceis: viajou.
Claro, já constava na agenda presidencial a sua participação da 69.ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Afinal, o Brasil é o país que dá início à solenidade anual da ONU, que reúne chefes de Estado e de governo de 193 nações. Restou para a brasileira - ou seus marqueteiros - o lampejo de amarrar a pompa à circunstância e converter a cúpula global em comício.
Seu discurso não encantou. Como oradora, a presidente é uma excelente tecnocrata. Ela, corretamente, chamou atenção para o desequilíbrio nas instituições de governança multilateral, como o Conselho de Segurança das Nações Unidas, para o qual o Brasil reivindica um assento permanente. Exatamente como fez no ano passado, quando Brasília já era voto vencido.
Criticou as grandes potências pela sua queda por soluções militares para os conflitos no Oriente Médio, deixando para a imaginação como seria uma negociação de paz com os encapuzados do Estado Islâmico (EI).
Convocou os pares internacionais para engrossar a luta contra o aquecimento global. Perdeu a oportunidade de explicar porque o Brasil, campeão em derrubada de florestas, não se juntou aos 150 países, 35 empresas, 16 grupos indígenas e 45 grupos da sociedade civil que assinaram o compromisso de reduzir o desmatamento pela metade até 2020, na última Cúpula do Clima.
Na toada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criticou os países ricos ("os louros de olhos azuis", como preferiu seu mentor), pelo colapso mundial após a quebra do banco Lehman Bros., crise pela qual o Brasil teria navegado com louvor.
Pulou a parte da pane na economia nacional, que recentemente embicou em recessão técnica, com inflação em alta e confiança do investidor, cadente.
Tocou apenas de raspão no tema da espionagem das agências americanas, que fez dela uma vítima e dominou seu discurso na mesma sala, no ano passado, e quase deflagrou uma crise diplomática entre Brasília e Washington. Mas esse foi o ultraje de ontem.
Hoje, com o segundo mandato em jogo, Dilma tem outro público a convencer. Por isso, enxergou no colegiado das nações um estúdio itinerante de propaganda eleitoral e seu discurso, um 'Café com a Presidenta' pelo teleprompter alheio.
Combate à desigualdade, aula magna de administração econômica, cerco implacável contra a corrupção e apoio total aos direitos dos homoafetivos: o Brasil do governo Dilma representa tudo isso e mais, afirmou.
Como a presidente brasileira, seus pares latino-americanos também escolheram o pódio internacional como atalho para as urnas.
O presidente boliviano, Evo Morales, que concorre à reeleição em outubro, jogou para a sua base andina ao propor um "tribunal do povo" para julgar os "crimes" do presidente americano, Barack Obama.
A presidente argentina, Cristina Kirchner, que sonha em fazer seu sucessor no ano que vem, aproveitou sua vez ao microfone para bater nos credores "abutres", aqueles que ao recusar os termos do acordo geral da dívida teriam levado seu país à oitava moratória externa desde 1820. "Terroristas não são apenas aqueles que jogam bombas", disse a presidente.
Cristina pegou a casa ainda cheia e atenta. Já Nicolas Maduro, da Venezuela, teve de se contentar com alguns gatos pingados. Maduro, enfim, não é Chávez, o orador dublê de bufão que encantava suas plateias com impropérios e blagues.
Dilma teve recepção melhor, em parte pelo peso do Brasil, em parte pelo horário, pois discursou logo antes de Barack Obama.
Do Brasil, emergente titular das Américas, sétima economia do mundo, sócio-fundador do grupo Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul), o mundo talvez imaginasse um discurso à altura. Pena que tenha ouvido mais um programa do horário eleitoral, com tradução simultânea.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Cuba-Coreia do Norte: dois regimes companheiros (e amigos doscompanheiros) - Mac Margolis

Sem comentários, pois do contrário seria cáustico para certa diplomacia..
Paulo Roberto de Almeida 

 Conexão Havana-Pyongyang

Coluna / Mac Margolis


São 12,5 mil quilômetros de Cuba à Coreia do Norte, mas as afinidades encurtam as distâncias. Regidos por dinastias em vias de extinção, os dois países também têm em comum um pacto natural de Estados párias. Foi assim em julho de 2013, quando o regime de Raúl Castro resolveu ajudar os irmãos norte-coreanos com um navio carregado de surpresas. No manifesto do cargueiro Chong Chon Gang constava apenas açúcar. Quando os fiscais no Canal do Panamá foram checar, acharam bem mais.
Debaixo de mais de 200 mil sacos de açúcar refinado cubano havia não drogas, como imaginavam, mas um arsenal para alegrar qualquer ditador: dois caças MiG desmontados, 15 motores de avião, nove mísseis e duas plataformas antiaéreas completas.
Os panamenhos apreenderam o navio, prenderam a tripulação e reportaram o contrabando à ONU, que desde 2006 veta o envio de armamentos pesados ao regime norte-coreano, que nutre sonhos nucleares. Foi o início de uma tortuosa dança diplomática, ao estilo de Pyongyang e à moda bolivariana.
Na semana passada, Cingapura apresentou queixa-crime contra uma companhia de navegação local que teria bancado a operação com um operador panamenho. Todos aguardam a decisão do Conselho de Segurança da ONU, que recebeu um relatório detalhado sobre o caso, mas ainda não determinou sanções aos dois países.
Se depender da complexa tradição da corporação, onde China e Rússia, aliadas de conveniência de Pyongyang, têm poder de veto, o resultado da maior apreensão de armas ilegais enviadas para uma das piores tiranias do planeta pode acabar em pizza habanera.
Desde cedo, vários países latino-americanos trabalharam para garantir exatamente isso. São os aliados do falecido líder venezuelano Hugo Chávez, que ergueram uma cerca companheira. Acusaram o Panamá, nação “lambe botas” dos gringos, de ingerência em assuntos entre duas nações soberanas, Cuba e Coreia do Norte.
Se não fosse criminosa, a versão seria risível. Em primeiro lugar, os cubanos jamais admitiram enviar armas, apenas açúcar. Flagrados, disseram que o material era obsoleto e se destinava à manutenção na Coreia do Norte, para depois ser devolvido. Portanto, ele estaria isento do boicote da ONU.
Balela. Segundo o comandante Belsio González, diretor do Serviço Aeronaval do Panamá, os caças russos, assim como os motores, estavam em "excelente" estado. O Panamá libertou parte da tripulação do Chong Chon Gang sob fiança de US$ 700 mil, mas ainda mantém detidos três oficiais do navio. No seu relatório anual, um painel de especialistas da ONU concluiu que é a diplomacia norte-coreana que articula envios clandestinos de armas para Pyongyang por meio de complexos artifícios financeiros. A conexão com Havana faz parte do embuste.
A ditadura asiática encobriu o rastro da operação desastrosa. Trocou seu embaixador em Havana e abafou a história. Na bizantina política norte-coreana, o diplomata era ligado ao poderoso Jang Song-thaek, inimigo mortal do novo líder supremo, Kim Jong-un. Especula-se se que ambos, Jang e o ex-embaixador, tenham sido executados.
Chama a atenção que a desventura do Chong Chon Gang começou no Porto de Mariel, cuja reforma o governo brasileiro banca para consolidar laços companheiros e dinamizar o comércio do país amigo. Ao que parece, de olhos bem fechados.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Panama: o unico pais a salvar a honra perdida da AL no caso daVenezuela-OEA - Mac Margolis

O Panamá é bom de briga

 Mac Margolis


Na diplomacia, o Panamá não é exatamente um peso-pesado. Uma pequena tripa do istmo centro-americano, o país tem a população de Espírito Santo e um PIB menor do que o faturamento do Walmart. Teve seu momento de glória há um século, quando o Theodore Roosevelt traçou o canal do Atlântico ao Pacífico. Hoje, o Canal do Panamá depende de reformas urgentes, mas o diminuto país continua a surpreender.

Agressivo e altivo, o governo panamenho fala quando o resto da região silencia e não foge de brigas com vizinhos graúdos. O estilo choca-se com a comedida diplomacia da América Latina, onde a condescendência é a regra até com vizinhos que atropelam direitos humanos e o único inimigo consensual é Washington.

Pela atitude pouco companheira e a recusa ao nacionalismo barato, o governo panamenho já foi acusado de fantoche dos gringos. Assim foi na semana passada, quando o Panamá pressionou para que a deputada venezuelana María Corina Machado falasse ao Conselho Permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Líder importante da oposição ao governo de Nicolás Maduro, a deputada pretendia expor ao colegiado regional o que se passa nas ruas conflagradas da república bolivariana, onde pelo menos 31 pessoas morreram em confrontos ocorridos em meio à recente onda de protestos antichavistas.

A OEA vetou María Corina. Talvez pela afinidade latina com o socialismo do século 21 de Hugo Chávez. Ou, quem sabe, para não arriscar a mesada companheira – os 110 mil barris diários de petróleo barato que Caracas envia a 17 países amigos no programa Petrocaribe. Foi a senha para o presidente panamenho, Ricardo Martinelli, que convidou a oposicionista venezuelana para integrar sua delegação nacional na OEA, cedendo-lhe o assento do próprio embaixador. Assim, reprisou um gesto dos anos 80, quando a oposição do Panamá pediu o apoio da Venezuela para expor na OEA a repressão do então ditador Manuel Antonio Noriega. No entanto, não assim foi desta vez. Possessos, os bolivarianos manobraram para sufocar a insurreição. Na sexta-feira, a poucos minutos do início da eunião, o conselho decidiu, por 22 votos a 11, fechar as portas da OEA ao público. Para “não criar um circo”, o Brasil votou com os bolivarianos, trocando a lona pela mordaça.

Sem limites. Pode haver um componente pessoal na rusga entre Caracas e Cidade do Panamá, na qual os dois mandatários só faltam xingar a mãe um do outro. “Lacaio rastejante”, o presidente Maduro chamou seu colega panamenho. “Imaturo”, revidou Martinelli, fazendo graça com o nome do venezuelano, a quem acusou de conduzir seu país “à falência”.

No entanto, não é apenas o fígado que fala. Conservador e capitalista desenvergonhado, o panamenho nunca escondeu seu desprezo pelo enclave chavista, que vai de La Paz a Havana.

Em julho, Martinelli provocou um paroxismo continental quando mandou apreender o cargueiro Chong Chon Gang, que saíra do Porto Mariel, em Cuba, rumo à Coreia do Norte. Oficialmente, o navio carregava açúcar. Os fiscais do canal desconfiavam de cocaína. Acharam uma verdadeiro arsenal.

Especialistas das Nações Unidas encontraram um sofisticado esquema de contrabando de armas. Nos contêineres, havia seis plataformas lançadoras de mísseis, dois caças MiG-21 desmontados, armas e munição. Mesmo assim, o governo de Cuba esperneou, escorado pelos companheiros bolivarianos, que alegaram ingerência por encomenda dos gringos.

A festa de desaforos entre os dois países continua. No início de março, o Panamá pediu à OEA que debatesse os confrontos nas ruas da Venezuela. Maduro deu o coice: expulsou o embaixador panamenho e rompeu o comércio bilateral. A OEA curvou-se à decisão. Os bolivarianos conseguiram calar a deputada María Corina dentro do colegiado já famoso pelo silêncio obsequioso. Fizeram-lhe um imenso favor, levando-a ao palco internacional, o mais novo para-raio da tempestiva revolta contra o chavismo.

É COLUNISTA DO 'ESTADO' E CHEFE DA SUCURSAL BRASILEIRA DO PORTAL DE NOTÍCIAS VOCATIV 

domingo, 2 de fevereiro de 2014

O efeito Kicillof, Argentina e Brasil - Mac Margolis

O efeito Kicillof
MAC MARGOLIS
O Estado de S.Paulo, 02 de fevereiro de 2014

Na década de 80, antes da abertura de mercado, época áurea do "similar nacional", uma bebida despontava na noite brasileira. Era a vodca Orloff, tida como uma versão melhorada do ameaçador destilado nativo.
"Cuidado com que você toma", advertia o narrador do comercial da bebida, insinuando ressacas terríveis: "Eu sou você amanhã".
Qual será o coquetel argentino de agora? Treze anos depois do colapso econômico que levou cinco presidentes à Casa Rosada em duas semanas, deletou20% da riqueza nacional e fez do país um pária internacional, a Argentina voltou a tremer.
As manchetes anunciam o pileque em flagrantes quase diários. A inflação ruma para 30%. O dólar paralelo disparou, forçando o governo a desvalorizar o peso em 15% nas últimas semanas. As reservas do Banco Central baixaram para níveis críticos. O desemprego saltou e a pobreza parou de cair. O novo ministro da Economia desmentiu a crise. A situação está "perfeitamente calma", insistiu Axel Kicillof. Faltou combinar com os argentinos.
Pode ser que a segunda economia sul-americana não esteja em estado falimentar. Soprada pela demanda global por matérias-primas, a Argentina recuperou-se dos efeitos do calote histórico e cresceu ao longo da década, mesmo quando fez tudo para se sabotar. Mas com o comércio global em passo lento e receitas minguantes das commodities, a crise crônica argentina voltou e ameaça aprofundar a linha divisória no continente.
É o fosso do desperdício. De um lado, estão os países que administram bem seus recursos naturais: Peru, Colômbia e, especialmente, Chile - que, quando o cobre dispara, deposita o lucro num fundo de estabilidade. Do outro lado, estão os países de abundância, gigantes pela própria natureza e apequenados pela cultura política nanica.
É o caso da Venezuela, com a maior reserva de petróleo do hemisfério, que converteu sua petroleira, PDVSA, em caixa eletrônico para custear aventuras bolivarianas. Dilapidou a estatal e viu cair a produção em meio ao boom histórico de petróleo.
A conta melhora nos países aliados, Equador e Bolívia, que administraram melhor a bonança, mas o alerta vale para toda a região, hipotecada em minérios, petróleo e gás. Hoje, a América Latina responde por 7% a 9% do crescimento global - igual a20 anos atrás.
A Argentina impressiona não pela crise - endêmica na região -, mas pela vocação para destruir a riqueza. Já se conhece o currículo do país. Orgulho dasAméricas, compete de igual na produção agropecuária com as potências mundiais. Já no século 19, aprimorou a refrigeração da carne, levando seu produto às melhores mesas da Europa. Chegou a ser a décima economia mundial em 1913 e a quarta renda per capita em 1929. Faturou cinco Prêmios Nobel entre 1936 e 1984, uma média de um a cada dez anos. E só um conto de Jorge Luis Borges poderia explicar por que a academia sueca não lhe entregou o sexto, de Literatura.
Mas aí parou. Desde então, o país nutriu uma das ditaduras mais sangrentas do hemisfério, instabilidade crônica e caudilhos de todos os manequins. Há, sim, o papa Francisco, cuja franqueza e simplicidade sacodem a conturbada Igreja Católica em boa hora. Mas, agora, o jesuíta portenho é do mundo, enquanto Argentina ainda é dos Kirchners.
Hiperinflação, hemorragia de credibilidade, crise cambial, manobras agressivas para corrigir o rumo desgovernado. Se o investidor titubeia, é só encampá-lo. Os dados oficiais estão ruins? Derrube o pesquisador e troque os índices. E se a má notícia continua, a culpa é do mensageiro. Na era K, a Argentina atualiza as convulsões e agressões que tanto desfiguraram as Américas no século passado.
Pode chamá-lo do efeito Kicillof, em homenagem ao mais novo protagonista do velho roteiro nacional. A Argentina é a América Latina de ontem.
É COLUNISTA DO 'ESTADO',
CORRESPONDENTE DO SITE THE DAILY BEAST E EDITA O SITE WWW.BRAZILINFOCUS.COM

domingo, 26 de janeiro de 2014

Bolivia: em busca do poder nuclear - Mac Margolis

O sonho atômico da Bolívia
Mac Margolis
O Estado de S.Paulo, 26 de janeiro de 2014

Será o ar rarefeito dos Andes? Ou, quem sabe, o feitiço da Pachamama, a deusa da natureza cultuada por Evo Morales? Seja que for seu inebriante, o líder boliviano arfa sonhos grandiosos. Na semana passada, o presidente do Estado Plurinacional se superou. Em seu discurso anual para o Legislativo, que também marcou o 11.º ano de seu governo, Evo descortinou seu último projeto: um reator nuclear. A energia atômica é uma prioridade estratégica, "para fins pacíficos", salientou. "Bolívia não pode ficar à margem desse conhecimento, que é patrimônio da humanidade."
Não foi sua primeira ogiva política. Ano passado, em Moscou, o boliviano deixou no ar a ideia de conceder asilo ao delator americano Edward Snowden. Não concedeu, mas a suspeita de que fosse contrabandear o fugitivo gringo a bordo da aeronave presidencial provocou um pequeno escândalo diplomático. Em 2006, Evo mandou soldados para ocupar as refinarias da Petrobrás, um tapa de Lilliput na cara do gigante vizinho Gulliver.
A ousadia atômica, no entanto, surpreendeu até os "moralistas" mais acalorados. O sonho não é novo. Em 2010, seu governo firmou com o Irã um acordo de cooperação nuclear. Ano passado, renovou um tratado de assistência técnica com Argentina, selado nos anos 70. Seguiu para França, onde teria arrancado promessas de ajuda de François Hollande e, dias atrás, voltou animado de outra visita a Teerã. "Não estamos longe de ter energia nuclear. Temos a matéria-prima e o direito de usá-la", afirmou ao seu congresso.
Ainda é cedo para abrir o champanhe. Pequena, ilhada e pobre, a Bolívia não é candidata nata ao clube nuclear. Apenas três países latinos contam com reatores - Argentina, Brasil e México - e, apesar, de ostentarem economias bem mais avantajadas, todos enfrentaram dificuldades graúdas para erguer suas usinas. Faltou a Evo esclarecer o que a Bolívia espera ganhar da associação com os aiatolás, fora a redobrada patrulha atômica internacional.
Bom senso econômico, não é. Afinal, a Bolívia possui a segunda maior reserva de gás natural do continente e ainda se gaba de ser a "Arábia Saudita do lítio", matéria-prima de microbaterias. Mesmo assim, o país tropeça em seu próprio ufanismo. Nada a ver com a Pachamama. A culpa é da política. Nacionalista abrasado, Evo passou a última década colhendo poder e podando capital privado. Comemora o "novo modelo" econômico, que dilatou o naco estatal para 34% do mercado, contra 20% em 2005.
Peitar o capitalismo forasteiro rende aplausos mas espanta investimento. Resultado: em meio à demanda crescente por seu gás natural, as reservas devem despencar na próxima década. Que dizer da ambição nuclear se nem o botijão à boliviana está garantido? A explicação talvez esteja na usina política de Evo. Em outubro, os bolivianos irão as urnas. O presidente desponta como franco favorito, surfando no forte crescimento econômico movido a commodities, masenfrenta turbulências. Seu projeto de cortar com uma estrada uma vasta reserva indígena desagradou parte importante da sua base. Os investimentos sociais melhoraram a vida dos mais pobres mais não aumentaram a distância dos mais ricos. A Bolívia acaba de tirar do Brasil o título de sociedade mais desigual do continente.
Aí que se encaixa o plugue nuclear. Como o ouro e os canhões do passado imperial, a usina nuclear é hoje o emblema preferido do poder e da soberania. Quem domina o ciclo do urânio impõe respeito. A opção atrai os países bolivarianos - que, órfãos de Hugo Chávez, não se espelham mais na Venezuela, que mal consegue manter acesas as luzes e muito menos a revolução. Hoje, Evo e companhia buscam inspiração alternativa. Haja átomos.

*Mac Margolis é colunista do 'Estado', correspondente do site The Daily Beast e edita o site www.brazilinfocus.com


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

O paradoxo peruano: crescimento e baixa popularidade - Mac Margolis

Paradoxo peruano

MAC MARGOLIS - O Estado de S.Paulo, 22/09/2013

Em um continente conturbado e com indicadores sofríveis, o caso peruano desponta. Sua economia deve cravar crescimento de 5,6% este ano, o dobro do desempenho brasileiro, e em 2014 promete ser o melhor Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina.
Os bons números nada têm de milagre. São fruto da moeda estável, regras econômicas claras e políticas fornidas longe da fogueira populista que tanto atrai os líderes latinos. Loas para Ollanta Humala, o ex-militar e outrora golpista que, para se eleger presidente, guardou as camisas vermelhas, abriu o punho cerrado e revisou a retórica nacionalista para os tempos mais sóbrios.
Quem olhe o país de longe vê um dínamo nos Andes. De perto, a vista é outra. Humala amarga um dos piores índices de popularidade da América Latina. Os 41% de peruanos que aprovaram seu governo em junho hoje são 27%. Há dois meses, milhares de manifestantes, a maioria da classe média, tomaram as ruas contra Humala.
Como um país pode ir tão bem e seu líder, tão mal?
O paradoxo não é privilégio peruano. O Chile segue líder disparado na região, com crescimento forte, investimento robusto e a melhor cultura de administração do continente. Já seu presidente, Sebastian Piñera, um empresário equilibrado, corre o risco de terminar seu mandato com uma rejeição recorde.
Na Colômbia, não é diferente. Lá, o presidente Juan Manuel Santos preservou a política de segurança e de sobriedade fiscal que elevou o país à condição de segunda economia sul-americana. No entanto, a aprovação de Santos despencou 27 pontos desde junho (está em 21%) e sua reeleição em 2014 já é dúvida.
Enquanto os líderes moderados ardem no inferno astral político, os bolivarianos no Equador, Venezuela e Bolívia e Nicarágua, gozam de índices invejáveis mesmo quando pisoteiam seus dissidentes e tumultuam suas economia.
Venezuela sofre blecautes, uma epidemia de crime e escassez de papel higiênico? Não importa, Hugo Chávez, que governou soberano durante 14 anos, é quase beato enquanto seu inexpressivo sucessor, Nicolás Maduro, tem o dobro de aprovação de seu par colombiano. Nicarágua é um dos países mais pobres da América Central, mas o comandante Daniel Ortega conta com 70% de aprovação dos nicaraguenses.
Pão e circo. A senha para essa aprovação é distribuir pouco para muitos, uma receita garantida por petrodólares e ingressos de minérios, e controlada pelo poder estatal. Encampar empresas privadas, calar a imprensa e intimidar sindicatos, tudo pode desde que haja migalhas. O pão sustenta o circo bolivariano.
No Peru, Humala cometeu erros e deslizes. A violência subiu na zona rural e em alguns bairros de Lima, piorando a sensação de insegurança. (Mesmo que o país ostente uma das menores taxas de homicídio nas Américas: 2,4 por 100 mil habitantes.) Um quarto dos peruanos ainda vive na pobreza.
Seu pior pecado, no entanto, foi quebrar tabus. Para desgosto de muitos ex-companheiros, o mandatário defendeu as reformas de Alberto Fujimori. Não foi afinidade ideológica. Humala sabe que o ex-tirano fechou o Congresso, atropelou direitos humanos, comprou apoio político e acabou na cadeia. Também reconhece que Fujimori abriu a economia, equilibrou as contas e esmagou a guerrilha maoista.
Melhor para os investidores, sim, que apostaram alto em obras vultosas de mineração e infraestrutura. Só que seus ganhos também impulsionaram a economia e criaram empregos. Com dois anos de antecedência, o Peru acaba de alcançar os Objetivos do Milênio das Nações Unidas, reduzindo pela metade o número de pobres em 15 anos.
No Peru, como em outras sociedades em ascensão, quem sobe de vida enxerga melhor e logo, exige mais. Foi assim com os presidentes Alejandro Toledo e Alan Garcia, dois que abraçaram reformas e também saíram às vaias. Agora, a bola da vez é Humala.
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terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Equador: mais excessos de democracia, bananais - Mac Magolis

BananaLeaks
Mac Margolis
O Estado de S. Paulo, 11/02/2013

No princípio, havia os Pentagon Papers, os documen­tos sigilosos que escanca­ram os segredos de Wa­shington na malograda Guerra do Vietnã. O catatau escandalizou o pú­blico americano e acelerou o desfe­cho da Pax Americana do pântano do conflito asiático. Mais recentemen­te, conhecemos o WikiLeaks, razão social do exército de cibermilitantes dedicado a minar os computadores de governos ricos para descortinar os infames e o arbítrio dos poderosos.

Em comum, tiveram a convicção de que, entre a segurança nacional e o interesse público, prevalece o cida­dão. Alguns cidadãos mais que ou­tros, é verdade, já que o Wikileaks, em seu afã de embaraçar o império, acabou colocando em risco a vida de alguns inocentes. Mas a ideia se consoli­dou: os governantes nada podem ocul­tar dos governados.

Agora entra em cena o BananaLeaks, a melhor novidade do gênero na Améri- ca Latina .A publicação, que é 100% digi­tal, nasce do mesmo princípio dos seus antecessores - o compromisso de jogar luz aos porões oficiais. Seu lema, estam­pado no alto da sua página de boas vin­das: "Se não queres que ninguém saiba, não o faça".

Seu nome parece piada de mau gosto. Enfim, o Equador, alvo predileto de suas reportagens, é a capital mundial da bananeira e foi a globalização dessa fru­ta curvilínea que batizou aquele clássico da história latino-americana - a repú­blica de bananas.

Mas alguém o está levando a sério. O BananaLeaks tem pouco mais de um mês de existência e já sofreu golpes de mestre. Fundado em janeiro, ele saiu do ar dia 28, alvo de sabotagem de hackers sofisticados e bem financiados. Os re­beldes restauraram o portal com outro endereço na web, mas ele tombou de novo, vítima de outra cibersaraivada tão agressiva quanto anônima. Sua con­ta no Twitter também foi inutilizada.

Em jogo de gato e rato, os jornalistas do portal, que mantêm suas identida­des em sigilo (enfim, nesse jogo de ver­dades, o véu é para todos!), exportaram seu site para um servidor no Hemisfé­rio Norte e recalibraram o endereço na web. Hoje é bananaleaks.co e já contabiliza uma tempestade de acessos. Mas o que provocou tamanho alvoroço? Uma breve navegada na página não deixa dú­vidas. O site, declaram os autores, "con­centrará seus esforços em indagar e in­formar sobre a corrupção estatal, a li­berdade de expressão e direitos huma­nos nos países da região, onde as liber­dades e direitos fundamentais estão so­frendo restrições de maneira acelerada e brutal".

A equipe não é exclusivamente equa­toriana, mas o governo de Rafael Cor- rea, hoje em campanha acelerada para reeleição, é a pauta predileta da folha eletrônica. Uma reportagem conta que os irmãos Fernando e Vinicio Alvarado, ambos ministros do governo Correa, ti­raram diploma de doutorado com a mesma dissertação. Pior, nenhum dos dois seria o autor, pois a tese foi escrita por Fernando Savater, acadêmico espa­nhol conhecido como estudioso de éti­ca (!). Outros dois doutores da família Alvarado também teriam se servido da mesma tese.

Essa denúncia foi fichinha. Ao final de janeiro, uma manchete no portal acusou o presidente equatoriano de manter duas contas não declaradas na Suíça. Em questão de horas, o site en­trou em pane, seguida pela sua conta do Twitter. Mas as indiscrições bana­neiras continuam. "Conheça os depósi­tos secretos nas Bahamas do primo e conselheiro financeiro do presidente do Equador", clama outra manchete. Em outra cutucada, o site postou na íntegra um documentário do colombia­no Santiago Villa Chiappe, que acu­sa Correa de ajudar e aceitar ajuda da guerrilha marxista, as Forças Ar­madas Revolucionárias da Colôm­bia (Farc).

A ofensiva contra o BananaLeaks não tem autor assumido, mas sua pe­gada é bem conhecida. É mais uma agressão aos meios independentes de informação ness epaís andino, ins­pirado pelo socialismo do século 21 do presidente Hugo Chávez. O mes­tre bolivariano está ausente há dois meses, acometido pelo câncer num hospital cubano, mas seu estilo de governo - que mistura o rolo com­pressor com a mordaça - vai muito bem, obrigado.

Rafael Correa, um presidente po­pular, deve conseguir sua reeleição no próximo domingo. Tem cacife e caixa suficientes para conquistar votos nas regiões rurais e na periferia, e falta união e força política entre a ala da oposição. Mas a política é sempre uma incógnita e, quem sabe por isso, o melhor é garantir a vantagem, es­tancando as verdades inconvenien­tes, de onde quer que vazem.

sábado, 25 de agosto de 2012

Ao meu amigo Amaury de Souza - Mac Margolis


Ao meu amigo Amaury de Souza
Mac Margolis
O Estado de S. Paulo, 24 de agosto de 2012

Meu amigo Amaury,
Foi de manhã, no outono carioca, que conheci Amaury de Souza. Eu acabara de chegar no Rio, no início dos anos 80, um jovem repórter americano, ansioso para abraçar o Brasil. Naquela época, as matérias eram todas fáceis e as produzia com ligeireza e traçados fortes, sem meios tons ou segundos pensamentos. Conforme fui ficando e conhecendo melhor o país, as suas nuances e contorções, a pauta foi se complicando. Devo a Amaury a correção de rumo. Esse e muitos outros que se seguiram.
À época, Amaury era professor universitário, recém-chegado de uma temporada nos Estados Unidos e agora lotado no Iuperj, conhecida faculdade de ciências sociais em Botafogo. Encontrei-o no seu escritório, uma alcova modesta no segundo piso, abarrotada de livros e teses que ameaçavam tragar toda a superfície da mesa. Atrás dela, cumprimentou-me em inglês impecável um homem de gravata e terno alinhado, trajes que nada combinavam com a universidade espremida e romanticamente desleixada. Já dava para perceber que naquele espaço não cabiam suas ideias.
Por sua sugestão, saímos para almoçar e seguimos caminhando, uma corrida de obstáculos pelas calçadas maltratadas do bairro, ele abrindo caminho e eu, ofegante, no seu rastro. Amaury detestava perder tempo. O destino era um restaurante mineiro tradicional do Rio, que assim como a faculdade, já vivera dias melhores. Professor Amaury ia me decifrando os pratos, o feijão tropeiro, o aroma correto da cachaça e o lugar de cada um desses ingredientes na cultura nacional. Minha aula de Brasil começara pelo paladar.
Amaury falou do fim projetado do regime militar e do redespertar democrático, na época ainda tênue. O Brasil novo estava em obras, tomado pela primeira campanha de eleições livres para governador em duas décadas. Logo mais, viria o clamor pelas eleições diretas presidenciais. Lá, entre tragos e pratos, lancei algumas perguntas a esmo, uma rajada de ideias cruas e desinibidas sobre o país que pensava conhecer. Amaury, atento, abanou lentamente a cabeça, como quem acabasse de assistir a um atentado contra a lógica, e pôs-se a falar, delicado mas firme enquanto tratava de socorrer minha narrativa torta.
Caminhada, uma boa mesa, um trago e uma escova nas ideias. Assim começou minha aprendizagem sobre o Brasil. Para minha sorte, o estágio se estendeu ao longo dos seguintes 30 anos. Daquele dia em adiante, aprendi que conversar com Amaury era essencial. Escutar mais do que conversar, é verdade, mas Amaury também tinha o que dizer. Quando o Brasil me surpreendia e a engrenagem política se mexeu - da abertura democrática ao impeachment de Collor, do Plano Real ao mensalão - era ele, invariavelmente, que eu procurava. Perdi a conta de quantas vezes o abordei: Amaury, e agora?
Certa vez, um editor me chamou à atenção. Será que eu não conhecia nenhum outro analista político do Brasil? Pior que conhecia, sim. Vários deles e de bom quilate. Mas era a Amaury que eu acabei retornando, sempre. Pois ninguém me surpreendia como ele, e certamente nenhum outro dispunha de tanto tempo, muito menos de pachorra, para responder à minha saraivada de dúvidas.
Não que sempre concordássemos. Em quase tudo que fazia, Amaury era intenso e contundente, quando não fulminante. Em sua casa, na mesa do bar ou numa roda de amigos, trovejava impiedoso contra os absurdos do país. Ora era a máquina pública que demandava impostos escandinavos para devolver serviços ugandenses. Ora a militância trabalhista que clamava pela liberdade mas lutava com unhas e dentes para manter o monopólio do imposto sindical. Ele tinha pouca paciência para a esquerda brasileira, paladinos da ética política na oposição, uma quadrilha no poder.
Amaury era politicamente incorreto, às vezes ao ponto de provocar arrepios. Mas fundamentava cada irrupção com fatos e calçava suas filípicas com argumentos. Sociólogo premiado, não admitia o lero sociologuês, tão rico em elucubrações poéticas quanto despido de dados. Amaury acreditava em pesquisa. Em vez de adjetivos, lançava mão de números. Como escreveu Roberto DaMatta, Amaury era um liberal em uma nação entregue à social-democracia, um defensor assumido da liberdade capitalista em uma sociedade com vergonha do lucro. Com ele entendi não só do Brasil mas do desafio de se pensar e repensar. Arrotar opiniões é uma coisa. Defendê-las sob sabatina, é outra. Amaury sabatinava.
Um dia, lá pelo final dos anos 90, farto com os descaminhos do Brasil, Amaury falou seriamente em sair do país. Seu destino seria Miami, confessou, rota de fuga de muitos brasileiros. "Miami?" perguntei, tentando imaginá-lo - aquela presença marcante, sempre alinhada e movida a uma energia quase atômica - flanando pela South Beach, de óculos Ray Ban e camisa estampada de hibisco. Felizmente, Amaury desistiu da ideia. Sua esposa, Martha, vez por outra lembrava daquela conversa, com mistura de espanto e bom humor, e até me agradecia pela intervenção amigável que, quem sabe, os tivesse salvo de um fim tropical kitsch. Obrigado, Martha. Mas foi puro interesse. Como eu iria fazer para entender o Brasil com Amaury lá longe, tomando mojito?
Tive a grande sorte de conviver com Amaury em sua terra, que ele pensava e interpretava como ninguém. Não foi diferente na semana retrasada, quando encontramos na Urca, no bar a poucos passos da sua casa. Magro e fragilizado pela doença, Amaury fazia questão de estar ali, tomar chope, falar de livros (estava imerso em "Jerusalém", último tomo do historiador Simon Sebag Montefiore), comentar o julgamento do mensalão e decifrar os rumos da política brasileira. Amaury podia estar doente, mas nunca o vi adoentado. Gostava demais da vida. Em pouco tempo, passei de aprendiz a admirador, a amigo de Amaury, e custa acreditar que isso tenha terminado.

terça-feira, 10 de julho de 2012

A ressaca democratica do Mercosul - Mac Margolis (Foreign Policy)


Latin America's Paraguayan Hangover

Some Latin American leaders have peculiar ideas about what constitutes an assault on democratic principles.

BY MAC MARGOLIS | Foreign Policy, JULY 9, 2012

It's been two and a half weeks since Paraguay's parliament removed President Fernando Lugo from office in an astounding high-speed impeachment procedure. But the shock waves from the event are still reverberating through the capitals of Latin America -- and the reactions offer some jarring insights into some of the region's double standards about democracy.
As many have noted, Lugo's removal wasn't pretty. Yet it was hardly the "parliamentary coup" that some in the region have been claiming. The road to impeachment is mapped out by the Paraguayan constitution, and lawmakers stuck to the letter of the law. No tanks or troops took to the streets. Within hours after his removal Citizen Lugo was sounding off to his boosters and the press. (The photo above shows Lugo supporters demonstrating in the streets of Asunción after his removal.) Nor did the Organization of American States (OAS) expel Paraguay from its ranks. "The democratic order has remained intact in Paraguay in spite of the swift impeachment trial," said Thor Halvorssen, president of the Human Rights Foundation, an outspoken U.S.-based civic group. "Although politics and emotion run high," he added in a written statement, "we urge the OAS and others to consider the facts and the law."
That is exactly what didn't happen. If the legitimacy of Lugo's ouster remains murky, there was no mistaking what happened next as Paraguay's neighbors swiftly punished the new government and remade a continental trade alliance, shredding international treaties and two decades of diplomatic best practices in the process. In Mendoza, Argentina, regional leaders convened an emergency summit of Mercosur, the South American customs union, ostensibly to defuse the crisis in Paraguay. Instead of olive branches, they brought kerosene.
Although Brazil, Argentina, and Uruguay stopped short of imposing sanctions on the new government in Asunción, they wasted no time in suspending Paraguay from the fold on the argument that the "coup" against Lugo violated Mercosur's democratic charter, as outlined in the so-called Ushuaia Protocol. That was the first misstep. By the union's rules (article 37 of the Ouro Preto Protocol and Article 20 of the Treaty of Asunción), all four founding members are entitled to their say in binding matters, including the alleged offending nation. However, when Paraguay's Ignacio Mendoza Unzain arrived in Mendoza to argue the new government's case, he was turned away. More than a humiliation, the snub was a clear breach of Mercosur's charter. "Paraguay's case was not even heard in Mendoza," says Brazilian diplomat and foreign policy scholar Paulo Roberto de Almeida. "This was clearly illegal."
The second blunder was even worse. Long eager to be inducted as a full member to Mercosur, Venezuela had secured the blessings of Brazil, Argentina, and Uruguay -- but not of Paraguay. Although Lugo had lobbied hard on behalf of his ally Hugo Chávez, the opposition-controlled Paraguayan legislature demurred. At issue was Chávez's habit of trampling on democracy at home and meddling abroad in the name of spreading a messianic vision of twenty-first-century socialism. And since all decisions in Mercosur must be unanimous, Venezuela remained out in the cold. But by ousting Paraguay -- until the next presidential elections in April 2013 -- the pro-Chávez faction of Mercosur opened a back door to the Bolivarian showman.
The irony was not lost on the region. In his 12 years in power, Chávez has become a master at gaming democracy. Again and again he has tested his popularity in national referendums and elections, and then parlayed his victory at the ballot box into a blank check to bully critics, stack the courts and gerrymander, counting on his mouthpieces in congress to grant him extraordinary powers.
And yet in 2010, when he redrew voting districts to throw legislative elections to chavista candidates, Latin America's heads of states looked the other way -- or worse. "If anything, Venezuela has an excess of democracy," then-President Luiz Inácio Lula da Silva once said, famously defending Chavez's rule." It's been no different in Bolivia, Ecuador, and Nicaragua, where Chávez's Bolivarian acolytes have had their way with the press, the legislature, and critics to thundering silence in the hemisphere. Likewise, not one sitting Latin president invoked the Ushuaia Protocol or the Democratic Charter of the OAS when Argentine president Cristina Fernández de Kirchner purged the National Statistics Institute and threatened to prosecute media that dared report the real numbers on inflation.
The implications for regional politics and prosperity are dire. True, trade has soared among the Mercosur nations, from $4.5 billion to over $47 billion, from 1991 to 2011. But prosperity has failed to bring union, and lately the bold customs union has succumbed to internal squabbling and beggar-thy-neighbor protectionism. The ham-handed reaction to the political crisis in Paraguay may only hasten the decline. By throwing Paraguay under the bus and extending a welcome mat to Venezuela, Mercosur has made a hash of its own rules on democracy and free trade. "Who in this tale deserves the name of coup-makers?" asked the Estado de Sao Paulo newspaper in a lead editorial.
A small comfort may be the measured reaction from the Latin street. Paraguayans, though perplexed, did not storm the barricades after Lugo's fall, a prospect that could have brought conflict and possibly a bloodbath. And even as the media and opinion makers condemned the hasty impeachment, they were equally indignant over the rush to banish Paraguay and to extend Mercosur's approval to Chávez's dubious democracy. "We do not have a Democratic Charter, just a syndicate of presidents,"wrote the Ecuadorian jurist and former diplomat Mauricio Gándara Gallegos in a recent column.
As unstable and fraught as it may be, constitutional democracy is still the gold standard for the America's and its breach a shouting offense. But unless the region's leaders apply the rules and safeguards to all nations, whether run by conservatives or compañeros, the new era of Latin democracy will look a lot like the old one of conspiracies and coups d'état.