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segunda-feira, 24 de abril de 2023

China Embarrasses Macron on Europe - Russia's war of aggression against Ukraine (Editorial WSJ)

 Macron já tinha sido humilhado por Putin, ao tentar desesperadamente reter a invasão russa, anunciada diversas vezes por Biden. Agora está tentando convencer a China a parar com a guerra de agressão. Não conseguirá!

Mas, o embaixador chinês em Paris é um trapalhão: ignora os acordos feitos ao abrigo da Conferencia sobre Segurança e Cooperação na Europa (CSCE), com sede em Viena, e que cobriram inclusive as ex-repúblicas federadas da Ásia central. Ignora que os Estados bálticos foram perfeitamente independentes entre 1919 e 1940. Ignora a História e o Direito Internacional. Deveria ser chamado de volta a Beijing!

Paulo Roberto de Almeida 


China Embarrasses Macron on Europe

Beijing’s ambassador reveals China’s real views on sovereignty.

WSJ Opinio

By The Editorial Board

April 23, 2023 4:42 pm ET

Emmanuel Macron has been trying to triangulate between the U.S. and China, and it isn’t going well. China’s ambassador to Paris has now embarrassed the French President by declaring that the former nations of the Soviet Union aren’t really sovereign under international law.

China’s Ambassador Lu Shaye was asked on Friday on French TV whether he considered Crimea to be part of Ukraine under international law. In 2014 Russia occupied and annexed Crimea, which had been part of Ukraine since the dissolution of the Soviet empire.

Mr. Lu didn’t stop at Crimea. “Even these ex-Soviet Union countries do not have effective status, as we say, under international law because there’s no international accord to concretize their status as a sovereign country,” Mr. Lu said. The “as we say” is a nice diplomatic touch since the only international law that Beijing recognizes is what serves its increasingly imperial interests.

The diplomat is saying that the many countries that declared their independence when the Soviet Union dissolved aren’t independent at all. That would include Ukraine, but also the three Baltic states, Moldova, and the countries of central Asia like Georgia and Kazakhstan. The clear implication is that Russia is justified in its attempt to conquer Ukraine, and perhaps the other countries too.

The Baltic states are furious and said they’d summon the Chinese ambassadors to their countries on Monday. The French Foreign Ministry responded with what it called “consternation” at Mr. Lu’s remarks and said Beijing should “say if these comments reflect its position, which we hope not to be the case.”

What did the French expect? Mr. Macron kowtowed to China’s Xi Jinping on his recent trip to Beijing, saying that Europe shouldn’t take a side over Taiwan. He also beseeched Mr. Xi to use his influence to mediate a settlement to the Russia-Ukraine war. China spotted weakness, as it always does, and has now spat on the French President’s entreaties. Any diplomatic clarification will be a ruse.

China wants the right to snatch any territory it wants to take, including Taiwan, disputed islands off Japan and in the Western Pacific, and border lands with India and others. Maybe Mr. Macron will figure out he’s being played.

https://www.wsj.com/articles/china-embarrasses-macron-on-europe-sovereignty-soviet-union-baltics-ambassador-lu-de45b8ed


quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Reformas previdenciárias são absolutamente e permanentemente necessárias, mas sindicadilistas se opõem, contra toda a sociedade

 No Brasil é a mesma coisa...

GREVE GERAL NA FRANÇA DESAFIA REFORMA DA PREVIDÊNCIA DE MACRON E PROMETE CAOS!

Folha de S. Paulo, 18/01/2023

O fantasma de grandes manifestações contra o governo, que os coletes amarelos fizeram ser uma das marcas do primeiro mandato de Emmanuel Macron na França, agora rondam seu segundo governo. O país enfrenta nesta quinta-feira (19) uma greve geral, convocada em reação à reforma da Previdência anunciada no último dia 10 pela primeira-ministra, Elisabeth Borne.

Trata-se da primeira paralisação a unificar as principais centrais sindicais francesas em 12 anos. O presidente, que desde a vitória na eleição de 2022 enfrentou o revés da perda da maioria no Legislativo e os impactos amargos da Guerra da Ucrânia na Europa, agora vê uma articulação que promete gerar uma quinta-feira caótica no país.

Escolas devem fechar, parte dos serviços de transporte e saúde será suspensa e o trabalho dos correios ficará interrompido, bem como o dos setores de energia e petróleo. "Será uma mobilização muito, muito grande", afirmou à rádio France Info o sindicalista Philippe Martinez, secretário-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT). "Diante de uma reforma tão séria, é um sinal importante que todos os sindicatos estejam unidos."

Os indícios de adesão maciça de trabalhadores aos protestos devem marcar o início de uma campanha que pretende continuar até fevereiro —e que tem tudo para ressuscitar as revoltas que geraram convulsão em 2018 depois do anúncio do aumento de uma taxa sobre combustíveis.

Revelados os planos de reforma no dia 10, os coletes amarelos já deram as caras em Paris e cidades como Toulouse, a quarta maior da França, onde uma marcha no último fim de semana fechou ruas do centro sob gritos contra Macron e sua proposta para a Previdência.

Diante de um cenário explosivo, em meio a uma população já enfurecida pela alta nos preços de alimentos e combustíveis, analistas têm sido cautelosos ao avaliar que proporções a greve pode tomar. Na saída da reunião do conselho de ministros, nesta quarta (18), o porta-voz Olivier Véran deu o tom da relação do Eliseu com a frente grevista: "Não se pode confundir manifestação e direito de greve com bloqueio".

Menos ambiciosa do que a proposta defendida por Macron na campanha pela reeleição, a reforma anunciada pelo governo quer aumentar em dois anos a idade mínima para aposentadoria, de 62 para 64 anos, até 2030. Também pretende elevar o tempo exigido de contribuição para ter acesso à pensão completa, de 42 para 43 anos, antecipando essa mudança para 2027 —uma lei de 2014 prevê a medida apenas para 2035. Esta alteração atingiria mesmo trabalhadores que se enquadram em regimes especiais, que deverão ser extintos para os novos ingressantes no sistema previdenciário.

Segundo estimativas do Ministério do Trabalho, aumentar os anos de contribuição pode render um adicional de € 17,7 bilhões ao ano para os fundos previdenciários.

"Quando há mais idosos trabalhando, aumentamos nossa riqueza coletiva, porque há mais impostos", defendeu Borne. "Esses recursos podem ser usados para reduzir nosso déficit orçamentário e para áreas prioritárias da política financeira, como saúde, educação e transição ambiental."

Para Laurent Berger, secretário-geral da Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT), o maior sindicato do país, trata-se de "uma reforma para equilibrar o Orçamento [do país] apenas nas costas dos trabalhadores".

A idade de aposentadoria na França é menor do que na maioria dos países europeus. Britânicos, por exemplo, têm acesso ao regime de Previdência aos 66 anos e os italianos, aos 67.

Macron já havia apresentado uma primeira proposta de reforma do setor em 2019, no primeiro mandato. Na ocasião, enfrentou ruas tomadas por manifestações e a mais longa greve nos transportes da história da França. O início da pandemia de Covid-19, então, o fez colocar os planos de volta na gaveta.

Quase quatro anos depois, o presidente francês afirmou, em seu discurso de Ano-Novo, que a reforma é "essencial para salvar o sistema" previdenciário e equilibrar as contas do Estado. Talvez antevendo ruídos, pediu ainda que a população se mantivesse unida.

Dias depois, a primeira-ministra explicou que, pelo modelo atual, "os membros ativos financiam as pensões dos membros aposentados". E continuou, argumentando em defesa das mudanças que viriam na proposta: "Estamos vivendo cada vez mais tempo, portanto o número de trabalhadores em relação ao número de aposentados está diminuindo constantemente".

Aos ouvidos dos franceses, no entanto, a fala soou como desculpa para a retirada de direitos. Em um comunicado conjunto, as principais centrais sindicais do país classificaram a reforma como brutal e sem justificativa, alegando que ela vai atingir duramente todos os trabalhadores.

"Se vivemos mais do que nos anos 1950, por outro lado somos muito mais produtivos", rebateu a CGT em outra nota. "Produzimos mais riqueza através de nosso trabalho, e ninguém pode contestar isso. Em teoria, temos os meios para financiar a aposentadoria."

Segundo pesquisa encomendada pelo jornal econômico Les Echos, o mais importante na área, 61% dos franceses concordam que alguma reforma da Previdência é necessária ao país, mas 66% discordam da mudança na idade mínima e 60% rejeitam o aumento no tempo mínimo de contribuição.

Para além da pressão das ruas, a proposta da dupla Macron-Borne também uniu os partidos de oposição, embaralhando campos políticos antagônicos. "É uma grave regressão social", disse Jean-Luc Mélenchon, líder da legenda de ultraesquerda França Insubmissa. Do lado oposto, Jordan Bardella, presidente da Reunião Nacional de Marine Le Pen, usou os termos "injusto e brutal" para definir o texto.

Completando o cenário, o presidente centrista aparece com a popularidade em baixa nas pesquisas, o que impõe dificuldades extras aos planos reformistas em um cenário em que não há maioria no Parlamento —perdida apenas dois meses depois de sua reeleição, em 2022.

A proposta deve ser apresentada formalmente ao conselho de ministros no próximo dia 23, para então seguir à Assembleia Nacional, onde Macron espera obter o apoio da direita para aprovar o texto ainda no primeiro trimestre. Durante esse tempo, a união dos sindicatos da França não deve dar trégua.

PRINCIPAIS MEDIDAS DA REFORMA PROPOSTA POR MACRON

Mudar progressivamente a idade da aposentadoria: de 62 anos hoje, chegaria a 64 em 2030. A idade mínima aumentará em três meses por ano a partir de 1º.set.2023

Aumentar o tempo mínimo de contribuição para ter acesso a pensão na íntegra: de 42 anos hoje, passaria a 43 em 2027. O tempo de contribuição aumentará três meses a cada ano

Quem começou a trabalhar cedo, entre 14 e 16 anos, poderá se aposentar ao completar 58 e 60 anos, respectivamente

domingo, 24 de abril de 2022

Se Macron perder, a culpa caberá a Mélenchon, e será terrível para a França, para a UE, para a Ucrânia - Jean-Philip Struck (Deutsche Welle)

 POLÍTICAFRANÇA

França volta às urnas com Macron na liderança das pesquisas

há 5 horas

País repete disputa de 2017. De um lado, o pró-europeu Macron. Do outro, a nacionalista de extrema direita Marine Le Pen. Levantamentos indicam que presidente deve vencer, mas com vantagem menor do que cinco anos atrás. 

https://www.dw.com/pt-br/fran%C3%A7a-volta-%C3%A0s-urnas-com-macron-na-lideran%C3%A7a-das-pesquisas/a-61571313?maca=bra-GK_RSS_Chatbot_Mundo-31505-xml-media

A França volta às urnas neste domingo (24/04) para escolher quem vai ocupar a Presidência pelos próximos cinco anos: o atual ocupante do cargo, Emmanuel Macron, ou a veterana de disputas presidenciais Marine Le Pen. É uma repetição do duelo do segundo turno de 2017, que novamente coloca frente a frente dois projetos antagônicos: a visão cosmopolita pró-europeia do liberal Macron e o ultranacionalismo eurocético da extremista de direita Marine Le Pen.

Cinco anos atrás, tanto Macron quanto Le Pen sacudiram o mundo político ao chegarem ao segundo turno. Foi a primeira vez desde a fundação da 5ª República francesa, no final dos anos 1950, que a disputa ocorreu sem a presença de forças tradicionais da política do país: conservadores e socialistas.

O cenário se repete agora em 2022, mas agora Macron, 44 anos, já não pode se apresentar como uma novidade independente e renovadora. Como presidente, ele foi capaz de mostrar bons números na economia, mas também acumulou desgaste ao promover impopulares reformas pró-mercado.

Já Le Pen, 53 anos, está em sua terceira disputa presidencial. Nesta campanha, ela baixou o tom de parte da agenda xenófoba e extremista do seu grupo político, focando mais em aspectos socioeconômicos, algumas vezes se apropriando de bandeiras da esquerda. A estratégia ajudou a ampliar seu eleitorado, mas um segundo olhar revela que seu programa continua com os mesmos velhos elementos de extrema direita.

Os dois candidatos também transformaram a reta final da campanha num embate de duas diferentes visões de "anti". Le Pen agitou seu eleitorado para fazer do segundo turno um referendo "anti-Macron". Já o presidente fez apelos para barrar uma vitória da extrema direita de Le Pen.

O desgaste de Macron e a ampliação do eleitorado de Le Pen, somado à apatia de parte do eleitorado - especialmente o jovem - e a perspectiva de alta abstenção no segundo turno, levantaram o temor durante a campanha de que a França, a segunda maior economia da UE, acabe sendo palco de um novo terremoto político internacional, como ocorreu com a vitória de Donald Trump nos EUA, em 2016, e a aprovação do Brexit no Reino Unido, em 2015.

No entanto, as últimas pesquisas mostram que Macron deve ser reeleito - quebrando um ciclo de insucessos que vem afetando presidentes franceses desde 2002. Um levantamento divulgado na quinta-feira mostrou que ele deve vencer com 15 pontos de vantagem, com 57,5% dos votos, contra 42,5% de Le Pen. Outra pesquisa divulgada nesta semana apontou vantagem de 11 pontos para o atual presidente. O instituto brasileiro Atlas, por sua vez, indicou na sexta-feira uma vitória mais magra para Macron, com 6,6 pontos de vantagem.

No primeiro turno, Macron foi o mais votado dos 12 candidatos na disputa, obtendo 27,85% dos votos, seguido de Marine, com 23,15% dos votos e que só ficou pouco à frente do terceiro colocado, o independente de esquerda Jean-Luc Mélenchon (21,95%).

A ofensiva de Macron

Nas duas semanas de campanha do segundo turno, Marine Le Pen, do partido Reagrupamento Nacional (RN), foi ficando cada vez mais distante da liderança de Macron, do partido A República em Marcha. Os primeiros levantamentos logo após o primeiro turno apontavam uma disputa mais acirrada, com os dois rivais chegando a aparecer empatados tecnicamente.

Mas Macron conseguiu ampliar sua liderança, cedendo em alguns projetos de reforma impopulares. Ele, por exemplo, fez um pequeno recuo nos planos de aumentar a idade de aposentadoria. Ainda tratou de focar em temas que sua campanha vinha ignorando, como a perda do poder de compra e o meio ambiente, como forma de cultivar o eleitorado ecologista e a classe trabalhadora, tentando ainda se afastar da pecha de "presidente dos ricos".

Emmanuel Macron faz discurso em palanque
Emmanuel Macron multiplicou eventos de campanha no segundo turnoFoto: Ludovic Marin/AFP

O chefe de Estado também aumentou sua presença em eventos de campanha, depois de permanecer ausente em boa parte do primeiro turno por causa da guerra na Ucrânia. Ele fez várias visitas a redutos de Le Pen e a áreas periféricas nas quais Mélenchon se saiu bem no primeiro turno. Além disso, Macron se pintou como o único contraponto possível ao radicalismo de Le Pen, multiplicando críticas contra a rival e seu programa, tentando conscientizar os eleitores sobre os riscos de o país passar a ser governado pela extrema direita.

O ponto alto dessa última estratégia ocorreu no único debate do segundo turno, no qual Macron destrinchou os planos de Le Pen e adotou uma postura combativa, deixando Le Pen na defensiva. No embate, ele ainda explorou os laços da rival com a Rússia, incluindo um empréstimo milionário que o RN obteve de um banco russo em 2014 e advertiu que a proposta de Le Pen de proibir o uso do véu islâmico em público provocaria uma "guerra civil". Todas as pesquisas apontaram que Macron se saiu melhor do que a rival no debate.

Le Pen não diminui desvantagem, mas deve conseguir votação recorde

Herdeira de um clã político que há décadas assombra a França, Marine Le Pen exibiu nesta campanha o produto de um longo e intenso trabalho de suavização da sua imagem radical.

Ao longo da corrida, ela tentou oferecer uma versão de populismo acessível, focando especialmente em temas sociais, como diminuição de impostos e aumento de salários e aposentadorias. Em 2017, ela já havia dado os primeiros passos dessa estratégia, mas sua campanha continuava mais explicita no combate à imigração e na defesa de um "Frexit".

Desta vez, a linguagem usada nas agendas anti-imigração, anti-União Europeia, anti-Otan e anti-islã passaram a ser abordadas em vocabulário menos direto. Em vez de "Frexit", ela fala em "renegociar tratados" com a UE. A saída completa da Otan se tornou "saída do comando unificado da Otan", entre outros subterfúgios. "É um programa de saída da Europa, embora ela não o diga claramente", afirmou Macron antes do primeiro turno.

A campanha do segundo turno, de fato, acabou expondo um pouco da velha Marine Le Pen. No debate desta semana, ela foi confrontada por Macron sobre seu plano de proibir a exibição do véu islâmico e planos populistas de convocação de referendos para contornar a Assembleia Nacional e implementar projetos nativistas.

Marine Le Pen
Marine Le Pen aprofundou em 2022 sua estratégia de "desdiabolizar" o Reagrupamento NacionalFoto: Michel Spingler/AP Photo/picture alliance

Le Pen ainda tentou salvar algo do seu mau desempenho no debate, acusando Macron de ter agido de forma "arrogante" no duelo e afirmando que os "franceses [também] sofreram com essa arrogância e desprezo nos últimos cinco anos".

Mas a estratégia dupla de vitimização e suavização do discurso mostrou seus limites quando o segundo turno se aproximou. Nas duas semanas de campanha, Le Pen viu sua distância em relação a Macron aumentar, falhando em conquistar uma fatia decisiva dos indecisos e dos eleitores de Mélenchon.

Ainda assim, os levantamentos apontam que a candidata deve conquistar mais de 40% dos votos válidos - um recorde para a extrema direita francesa e um contraste e tanto com o massacre eleitoral sofrido pelo pai de Marine, Jean-Marie Le Pen no segundo turno de 2002. Nunca a direita radical chegou tão perto de conquistar o cargo mais alto da França.

O enfraquecimento da "frente republicana"

Assim como ocorreu em 2017, Macron, no papel de antagonista de Le Pen, conseguiu apoio de vários adversários moderados. Quase todos os principais candidatos derrotados no primeiro turno pediram apoio para o atual presidente. Os principais jornais da França também manifestaram apoio a Macron em editorais.

E, de novo, assim como ocorreu em 2017, houve uma notável exceção: Jean-Luc Mélenchon, o independente de esquerda que mais uma vez, por uma pequena margem, viu frustrados seus planos de chegar ao segundo turno.

Mélenchon repetiu sua estratégia de se limitar a pedir para que seus apoiadores não votem na extrema direita, sem endossar a candidatura de Macron. Na prática, deixando aberta a porta para que seus eleitores votem em branco/nulo ou não compareçam às urnas.

A nova recusa de Mélenchon em apoiar Macron e um crescente desinteresse dos jovens em votar - uma pesquisa apontou que 41% das pessoas na faixa dos 18 aos 24 anos não compareceram ao primeiro turno - demonstraram fissuras profundas na estratégia de "cordão sanitário" ou "frente republicana", quando praticamente todo o espectro político deixa as diferenças de lado e se une em torno de um moderado para derrotar uma força extremista.

Se em eleições passadas a presença de um radical no segundo turno era garantia de vitória certa para um moderado, desta vez o pleito demonstrou um cenário mais cinzento. Em 2002, o conservador Jacques Chirac derrotou no segundo turno o extremista Jean-Marie Le Pen por uma vantagem colossal de 64 pontos percentuais. Em 2017, Macron nunca se viu realmente ameaçado por Marine Le Pen e terminou vencendo com uma vantagem de 32 pontos.

Desta vez, a vantagem mais magra de Macron em pesquisas, a organização de protestos "Nem Macron, nem Le Pen" - como o que ocorreu na Sorbonne logo após o primeiro turno - e a sinalização da possibilidade de uma alta abstenção, demonstram que uma parte dos eleitores se cansou do ritual de votar no "menos ruim" - como definiu uma jovem estudante desiludida em entrevista à RFI. É uma posição que levantou críticas de alguns observadores, por servir, na prática, como uma complacência não intencional com a extrema direita.

Protesto
Protesto "Nem Macron, nem Le Pen" na Universidade Sorbonne. Apatia dos jovens acendeu alertas na FrançaFoto: picture alliance / abaca

Diante do risco de desinteresse de parte do eleitorado e o temor sobre os efeitos que uma surpresa no pleito possa causar na UE, os primeiros-ministros de Portugal, António Costa, da Espanha, Pedro Sánchez, e o chanceler federal alemão, Olaf Scholz, expressaram apoio público à reeleição de Macron, apontando para os riscos de uma Le Pen no Palácio do Eliseu. O ex-presidente Lula também divulgou mensagens de apoio a Macron.

O próprio presidente francês, mesmo numa situação mais confortável nos últimos dias após ampliar sua vantagem, advertiu na quinta-feira: "Nada está garantido".

Ainda que a "frente republicana" tenha perdido força, Macron ainda deve se beneficiar de um sentimento de rejeição da extrema direita entre uma parte decisiva do eleitorado. Segundo pesquisa Ipsos, 39% dos eleitores que pretendem votar em Macron neste domingo têm como principal motivação impedir uma vitória de Le Pen, e não necessariamente endossar o programa do presidente. Apenas 25% afirmaram compartilhar das ideias de Macron. No caso de Le Pen, 42% dos seus eleitores afirmaram concordar com seu programa.

Mesmo os desiludidos eleitores de Mélenchon começaram a se mover para apoiar Macron, num apoio que deve ser decisivo. Uma pesquisa apontou que 54% dos seus eleitores pretendem votar no atual presidente para barrar Le Pen. Outros 23% devem se abster ou optar pelo branco/nulo. Paradoxalmente, pelo menos 23% dos eleitores do esquerdista disseram que estariam dispostos a votar na extremista de direita Le Pen. De certa forma, o segundo turno acabou se transformando mais uma vez em um referendo sobre a possibilidade de um membro da família Le Pen finalmente assumir o poder.

sábado, 23 de abril de 2022

Le Pen Closer Than Ever to the French Presidency (and to Putin) - Roger Cohen (NYT)

Nunca a extrema direita chegou tão perto do poder. A extrema-esquerda também.


Le Pen Closer Than Ever to the French Presidency (and to Putin)

As elections approach Sunday, the far-right candidate is linked to the Russian president by a web of financial ties and a history of support that has hardly dimmed despite the war in Ukraine.

By Roger Cohen

The New York Times, April 22, 2022



Marine Le Pen, left, the challenger for France’s presidency, and President Vladimir V. Putin of Russia at the Kremlin in March 2017. She has supported his annexation of Crimea.Credit...

Pool photo by Mikhail Klimentyev

 


PARIS — When Europe’s far-right leaders gathered in Madrid in January, they had no problem finding unity on the issues they hold dear, whether cracking down on immigrants or upholding “European Christian ideals.” But as Russian troops massed on the Ukrainian border, they were divided on one issue: the threat posed by President Vladimir V. Putin.

Marine Le Pen, the extreme-right challenger for the French presidency, objected to a paragraph in the final statement calling for European solidarity to confront “Russian military actions on the eastern border of Europe.” Even in a gathering of illiberal nationalists, she was an outlier in her fealty to Mr. Putin.

Now, on her campaign website, the leaders’ statement appears with that paragraph cut in an unacknowledged change to the text. This little subterfuge is consistent with an embrace of Mr. Putin so complete that even his ravaging of Ukraine has hardly diminished it.

Over the past decade, Ms. Le Pen’s party, the National Rally, formerly the National Front, has borrowed millions from a Russian bank, and Ms. Le Pen has supported Mr. Putin’s annexation of Crimea in 2014, as well as his incendiary meddling that year in the Donbas region of eastern Ukraine, where just this week Russia redoubled its offensive.

Her support for Mr. Putin is one thing in a time of peace and another in a time of war. Russia, a nuclear power, has invaded a European state, and Ms. Le Pen is closer than ever to her cherished goal of becoming president of France, having narrowed the gap with President Emmanuel Macron before the decisive round of the election on Sunday.

With polls showing Ms. Le Pen gaining about 44.5 percent of the vote to Mr. Macron’s 55.5 percent, she is within range of the shocks that produced Brexit and Donald J. Trump’s victory in 2016. As in Britain and the United States, alienation and economic hardship have fed a French readiness to gamble on nationalist dreams.

If Ms. Le Pen wins, which is not likely but possible, her victory will almost certainly fracture the allied unity engineered by President Biden in an attempt to defeat Mr. Putin. It would hand Mr. Putin by far his most important ally in Europe, one he could leverage in his aims to divide Europe from the United States and fracture Europe’s decades-old project of unity.

France, a core member of the European Union and NATO, is suddenly the possible soft underbelly of the West.

Julien Nocetti, a Russia expert at the French Institute of International Relations, said there was “a complete ideological alignment between Putin and Le Pen” — one that would be deeply worrying to France’s American and European allies.

The Ukraine war has caused Ms. Le Pen to pivot a little by saying Mr. Putin crossed “a red line” with the invasion, but she still says her foreign-policy priority is a rapprochement with Russia once the fighting stops.

Since Ms. Le Pen, 53, took over the leadership of her party in 2011, she has only deepened its Putin predilection, making four trips to Moscow and one to Crimea. She would support sanctions against Russia, she says, but not cutting off imports of Russian oil and gas, which she has equated with economic death for France.

“We have to think of our people,” she said in a recent TV interview, a position consistent with the strong focus on pocketbook issues that has propelled her campaign. The majority of French people are more focused on getting to the end of the month than getting Russia out of Ukraine.

Certainly, Ms. Le Pen vaunted her connection with Mr. Putin until he went to war on Feb. 24. She included a photo of herself shaking hands with him in her election brochure as evidence of her “international stature.” This handout disappeared abruptly from view after the Russian invasion.

The photo was taken at the Kremlin on March 24, 2017. That was less than five weeks before the first round of the last presidential election, in which Mr. Macron defeated Ms. Le Pen by 66.1 percent to 33.9 percent. The National Rally leader said then that she would immediately review lifting “unjust” sanctions against Russia if elected.

As for Mr. Putin, he said with a knowing smirk that Russia did “not want to influence events in any way.”

Jean-Maurice Ripert, the French ambassador in Moscow from 2013 to 2017, said in an interview that a fellow European ambassador, a close friend, had asked the Russian leader after the French election why he had backed Ms. Le Pen.

“Because I had been told she was going to win,” Mr. Putin said.

Certainly that is what he wanted. Ms. Le Pen, committed to “equidistance” between great powers and hostile to “America’s protectorate on European soil,” sees in Mr. Putin the defender of the nation-state, family and Christianity against border-eroding multilateralism and irreligious cultural decay.

“It’s all about sovereignty,” said Marlène Laruelle, the French director of the Institute for European, Russian and Eurasian studies at George Washington University. “The sovereign state against international organizations; the sovereign traditional family against L.G.B.T.Q. rights.”

Then there is the money. Unable to get a loan from French banks, Ms. Le Pen and several of her top aides scrambled for cash in Russia, accepting a 9.4 million euro loan, then $12.2 million, at a 6 percent interest rate, from the First Czech-Russian Bank in September 2014. It was supposed to be repaid by 2019.

Wallerand de Saint-Just, who was long the National Rally’s treasurer before leaving the position last year, negotiated the deal in Moscow. In a written answer to a question as to why French banks had refused any loan to the National Rally, he said “My experience with the six big French banking groups is that they obey orders from the political executive.”

But given the lack of transparency and accountability in Russia’s financial sector — and Mr. Putin’s sway over it in his pay-to-play system — the sum has long raised hard questions of just how beholden Ms. Le Pen actually is to the Russian president, and whether some of her outspoken backing for him has been a consequence.

I asked Ms. Le Pen this month at a news conference whether the outstanding loan did not create at least the impression of dependence on Russia, a liability for any future president?

“Absolutely not,” she said. “I am totally independent of any link to any power.”

In her current campaign, again unable to get a loan from a French bank, Ms. Le Pen turned to Hungary, where Viktor Orban, the anti-immigrant Hungarian prime minister, has been in power for 12 years. A Hungarian bank has now lent the National Rally another $11.4 million, so if she were to win she would be indebted to both Mr. Putin and Mr. Orban.

Already her backing of Mr. Putin has been borderline fawning. Ms. Le Pen visited Moscow and Crimea in June 2013; Moscow in April 2014; and Moscow again in May 2015. She was received by the president of the Duma, the lower chamber of Russia’s Parliament, during the first of these visits, and sprinkled her Russian sojourns with pro-Putin remarks.

In 2013, she blamed the European Union for a new “Cold War on Russia.” In 2015, also while in Moscow, she criticized France’s pro-American stance and suggested this would change “in 2017 with Marine Le Pen as president.” In 2021, she recommended Russia’s uncertain Sputnik vaccine for the coronavirus, saying “our anti-Russian ideology should not ruin our capacity to vaccinate our fellow citizens.”

The 2014 visit came at a particularly delicate moment, given the Crimea annexation. It was one of several demonstrations of support for Mr. Putin from prominent members of Ms. Le Pen’s party who visited Crimea that year, and the Donbas, the Ukrainian region where clashes kindled by Moscow had begun.

Among them was Aymeric Chauprade, her former top diplomatic adviser, who went to Crimea to observe the dubious March 2014 referendum that massively backed the Russian annexation. A United Nations General Assembly resolution declared the vote invalid.

“It was the West that began changing European borders with Kosovo’s independence in 2008,” Mr. Chauprade, who has since left the National Rally, said in an interview. “There was an openness to accepting invitations from Russia, a good atmosphere.”

Russian troops guarded a Ukrainian marine base in Crimea as Mr. Putin moved to annex the peninsula in March 2014. Le Pen has visited Moscow and Crimea and made remarks that were supportive of Russia. 

Mediapart, a French investigative news website, was the first to expose the Russian loan to the National Rally in September 2014. In an earlier interview with Mediapart, Mr. Chauprade said visits to the Donbas that year and in 2015 by Jean-Luc Schaffhauser, a former National Rally member of the European Parliament, had been a “quid pro quo” for the loan.


“Going to the Donbas amounted to strong support for Russia,” he said.

Mr. Schaffhauser did not respond to a request for comment.

I asked Mr. Chauprade whether the loan was indeed a “quid pro quo.” He said that while there was an “inclination to help,” there was “no conditionality.”

The Russian loan, whatever the strings, has had a convoluted history.

Shortly after the First Czech-Russian bank collapsed in 2016, the National Rally loan was acquired by Aviazapchast, a private Russian company that in Soviet times was part of the aviation ministry, supporting Soviet aircraft operating abroad.

On its website, Aviazapchast describes its main activities as “supply of aviation technical equipment and civil and dual-use material as well as repair of aircraft.”

Its general director is listed as Dzheruk V. Ivanovic, who served in the Russian armed forces from 1983 to 1996. A former deputy general director, Yevgeny N. Barmyantsev, worked as a Soviet spy in the United States, before he was expelled in 1983.

New York Times account at the time said he was “caught in the act of retrieving what he thought were stolen American military secrets from the base of a tree in rural Maryland.”

Odd company, on the face of it, for a French presidential candidate’s party to keep.

Mr. Saint-Just, in his written answer, said that Aviazapchast’s “holding of the loan has been entirely approved by the court of appeal in Moscow.”

“This is a very obvious and clear case of dependence on Russia,” Mr. Nocetti, the Russia expert, said. “The company holding the loan has an organic link with the Russian government through its military origins.”

Mr. Macron, in an electoral debate on Wednesday with Ms. Le Pen, said, “When you speak to Russia, you speak to your banker.” She insisted that she was “a totally free woman.”

Ms. Le Pen, in answer to my question, said she was ready for any French or American bank to take over the loan. “We continue to reimburse the loan. That is the only obligation of my movement,” she said.

It is possible that the exercise of power, if she is elected, would attenuate Ms. Le Pen’s long-held pro-Putin, anti-NATO positions, especially if Mr. Putin prosecutes the war in Ukraine with relentless brutality.

Last week, however, she said that she would withdraw France from the integrated military command of NATO, a technical step with powerful symbolism at a moment when NATO’s original mission to defend a free Europe against Moscow has been revived.

America’s alliance with France, one of its oldest, has been put to many tests over the centuries. But all the evidence suggests that a France governed by Ms. Le Pen would pose enormous problems for President Biden just when he needs his nuclear-armed ally most.

One core issue is how free Ms. Le Pen would really be when it comes to Russia. “If Ms. Le Pen is still reimbursing, she is not free, she’s dependent,” said Sylvie Bermann, who succeeded Mr. Ripert as French ambassador to Russia in 2017.

Mr. Saint-Just, the former National Rally treasurer, had another explanation of Ms. Le Pen’s Russia policy. “She believes in balance and equidistance. She has always had in her head a phrase of General de Gaulle: ‘In foreign affairs, France has no friends, only interests.’ 


Adèle Cordonnier contributed reporting.

 

What to Know About France’s Presidential Election 

Heading to a runoff. In the first round of the election, French citizens voted to advance President Emmanuel Macron and the far-right leader Marine Le Pen to the second round on April 24. This runoff, which polls predict could be close, will hinge to a large extent on perceptions of the economy. Here’s a look at the race:

The incumbent. Mr. Macron, an inveterate political gambler, who in 2017 became the nation’s youngest elected leader, announced his re-election bid just a day before the deadline, against the background of the war in Ukraine. After a lackluster campaign, Mr. Macron is trying to tap into the country’s large pool of voters worried about the environment with ambitious promises.

The far-right veteran. Ms. Le Pen, a nationalist with an anti-immigrant agenda, is making her third attempt to become president of France and is facing Mr. Macron for a second time after losing to him in the 2017 runoff. Though she has sought to sanitize her image, her proposal to ban Muslim women from wearing head scarves is controversial.


What comes next? At 8 p.m. in France on April 24, the French news media will work with pollsters to publish projected results based on preliminary vote counts, though projections might not become clear until later if the race is close. Read more about the runoff here.


sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Macron: hipócrita segundo brasilianista Olivier Dabene (FSP)

Macron é hipócrita e não respeita compromissos ambientais, diz cientista político

Para professor da Sciences Po, briga com Bolsonaro foi 'bálsamo fantástico' para líder francês

O presidente da França, Emmanuel Macron, resvala na hipocrisia ao atacar a política ambiental do governo Jair Bolsonaro, já que o país europeu não cumpre vários compromissos listados no Acordo de Paris sobre a mudança climática.
O cientista político Olivier Dabène, professor da Sciences Po (Instituto de Estudos Políticos de Paris), diz que o embate dos últimos dias entre Paris e Brasília ofereceu um “bálsamo fantástico” ao líder francês.   
“Bolsonaro lhe foi muito útil. É um alvo fácil, tem um quê de palhaço imprevisível, é alguém que vai retrucar uma provocação com virulência, com uma provocação maior ainda”, afirma o pesquisador, que também presidente o Observatório Político da América Latina e do Caribe.
Outra prova dessa hipocrisia de Macron, diz o professor, é o fato que Paris segue distribuindo licenças para mineradoras atuarem na faixa da Amazônia situada na Guiana Francesa
Nesse sentido, prossegue Dabène, centrar fogo no presidente brasileiro permite a Macron desviar a atenção da opinião pública da França, “onde as coisas não vão exatamente bem no país”.
Para o professor, “um mínimo de respeito à soberania brasileira deveria impedir que se debatesse a internacionalização da floresta”, ainda mais considerando que Brasília não estava na lista de participantes da cúpula do G7 (clube de países ricos), em que a ideia foi aventada.
“Isso é ridículo, denota desprezo por um Estado que não seria capaz de proteger sua floresta.”  
Sim, pelo menos nas últimas décadas. Historicamente, as relações bilaterais são boas, posso até dizer ótimas. Então [a animosidade] choca um pouco. Não são dois países que tenham o hábito de se confrontar assim. Houve um estremecimento quando os franceses tentaram libertar [a então senadora e candidata à Presidência da Colômbia] Íngrid Betancourt [refém das Farc de 2002 a 2008]. Ocorreu uma violação do espaço aéreo brasileiro que suscitou uma crise curta.
Mas não devemos exagerar o alcance do embate atual. Não me parece tão grave assim. Vivemos uma época em que, inspirados por Donald Trump, os políticos deixaram de lado os discursos meramente retóricos e se divertem tentando ser “sinceros”, quando não insultando.
Trata-se então de um conflito desenhado para as câmeras e para as plateias internas de cada presidente?
Sim, ainda que haja diferenças entre as posturas dos dois. Bolsonaro é o arquétipo do dirigente que fez uma campanha populista, em cima de declarações improvisadas que viraram uma arma eleitoral bem-sucedida. Agora, leva essa franqueza populista à política externa de seu país.
Já Macron precisava de um G7 que tivesse repercussão, ainda que ninguém esperasse muita coisa dessa cúpula. A expectativa era apenas a de que os outros líderes tentassem não irritar muito Trump. Mas ele [o francês] tinha em mente uma diplomacia retumbante, feita de lances vistosos e jogadas audaciosas.
Desse ponto de vista, os incêndios na Amazônia representaram um bálsamo fantástico para Macron, e ele soube se aproveitar disso. Bolsonaro lhe foi muito útil. É um alvo fácil, tem um quê de palhaço imprevisível, é alguém que vai retrucar uma provocação com virulência, com uma provocação maior ainda...
Resta a ver o efeito disso sobre a opinião pública na França, em um momento no qual as coisas não vão exatamente bem no país.
Então Bolsonaro tem alguma razão ao dizer que Macron instrumentalizou um problema interno do Brasil, quis tirar proveito dele?
Sim, isso me parece claro. Os dois jogaram o mesmo jogo: fizeram política interna com diplomacia. É claro que o conflito não foi inventado do nada, que há um problema de fundo: o respeito a compromissos ambientais, ao Acordo de Paris sobre a mudança climática. Mas os brasileiros têm razão em dizer que os franceses não respeitam seus próprios engajamentos e que apontar o dedo para o Brasil ajuda a desviar o foco disso.
E como o sr. vê o comentário do presidente brasileiro sobre a “mentalidade colonialista” de Macron ao falar em “crise internacional” na Amazônia?
Quando Bolsonaro faz isso, rejeita novamente a linguagem moderada dos governantes. Mas não está totalmente errado. A atitude do G7 de dar lições a um país que não foi convidado à mesa de discussão é inapropriada.
A soberania e o anticolonialismo são ideias sempre associadas à floresta amazônica. Trata-se de um tema sensível, o que os franceses às vezes não percebem. Para o Brasil, falar em bem comum da humanidade [referindo-se à Amazônia] não faz sentido. Entendo o choque de algumas pessoas.
Um mínimo de respeito à soberania brasileira deveria impedir que se debatesse a internacionalização da floresta. O Brasil não é o Polo Sul; ninguém vai recortar a Amazônia em zonas pequenas controladas por países estrangeiros. Isso é ridículo, denota certo desprezo por um Estado que não seria capaz de proteger sua floresta.    
Para a França, é muito mais fácil criticar o Brasil –e ainda mais o Brasil de Bolsonaro— do que a China e os Estados Unidos. Ou mesmo a Alemanha, grande poluidora com carvão.
O fato de a Amazônia não ter sido mencionada no documento final da cúpula do G7 foi tido pelo Itamaraty como uma vitória brasileira. É possível fazer essa leitura?
Até se pode pensar assim, mas Macron também já teve uma vitória ao atrelar a Amazônia à ratificação ou não do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul.
Macron deveria palpitar sobre gestão florestal no Brasil quando a preservação da parte da Amazônia situada na Guiana Francesa é contestada, sobretudo devido à proliferação do garimpo ilegal?
Exato. Esse é um dos temas em que a atuação da França é muito criticável, e Macron sabe disso. Então é prático desviar a atenção para a Amazônia brasileira, enquanto ativistas protestam contra as licenças dadas a mineradoras e atividades extrativistas muito poluentes. É hipocrisia.
Passada a briga de agora, qual será o futuro das relações entre França e Brasil?
Não estamos longe de uma tempestade em copo d’água [nesse episódio da Amazônia]. Não acho que as relações serão afetadas por muito tempo. Deve haver um apaziguamento rápido.
No que diz respeito à ratificação do acordo, Macron não tem interesse em manter longamente seu veto, porque isso o isolaria na Europa, e ele tem a ambição de encarnar o futuro do continente, seu renascimento. Não acho que esteja disposto a pagar esse preço. E acho que alguns diplomatas brasileiros sabem disso.

OLIVIER DABÈNE, 60
Professor de ciência política na Sciences Po (Instituto de Estudos Políticos de Paris) preside, na mesma instituição, o Observatório Político da América Latina e do Caribe. Autor de Atlas du Brésil (2013), já foi pesquisador visitante na USP, na Universidade Oxford e na Universidade do Texas, entre outras