No discurso que Lula leu na ONU está escrito: “O neoliberalismo agravou a desigualdade econômica e política que hoje assola as democracias. Seu legado é uma massa de deserdados e excluídos. Em meio aos seus escombros surgem aventureiros de extrema direita que negam a política e vendem soluções tão fáceis quanto equivocadas. Muitos sucumbiram à tentação de substituir um neoliberalismo falido por um nacionalismo primitivo, conservador e autoritário”.

Há vários problemas nessa narrativa. Começa pelo fato de que nem Lula, nem os assessores que escreveram o discurso, nem todos que aplaudiram a ficção e mesmo alguns que a criticaram são capazes de definir o que significa “neoliberalismo”. O termo virou apenas um espantalho e um palavrão. Entre os que criticaram o trecho há quem veja o neoliberalismo como uma leitura economicista do liberalismo, o que está errado também.

Insisto nesse ponto porque sendo a premissa falsa, as conclusões condicionadas a ela são igualmente falsas.

Prestemos atenção às Socialdemocracias nórdicas, por exemplo. São as principais, as mais bem sucedidas e mais invejadas democracias liberais do mundo. E o são porque passaram por amplas reformas neoliberais nas décadas de 1980 e 1990 e, com isso, conseguiram oferecer à população um modelo sustentável de Estado de Bem-Estar social. Antes das reformas, estavam implodindo.

Sim, é isso mesmo. Todo o processo pode ser visto em detalhes no longo e bem fundamentado estudo de Lars Mjøset, Pesquisador e diretor de pesquisa do The Institute for Social Research de Oslo (1987-1995), diretor da Escola de Estudos de Ciências Sociais da Universidade de Oslo, desde 1995 e professor do Departamento de Sociologia e Geografia Humana da Universidade de Oslo (onde podemos observar também as muitas semelhanças com o que experimentamos no Brasil do Plano Real até o final do primeiro governo Lula).

Por que então pouca gente fala sobre isso? Em parte, por ignorância e, em parte, por oportunismo. O primeiro motivo é autoexplicativo. O segundo se deve ao fato da esquerda ser mais hábil no controle da narrativa e de ser mais fácil prometer o paraíso na terra e culpar adversários ideológicos por jamais conseguir entregar o resultado prometido.

Um exemplo lapidar dessa questão pode ser observado no livro “Neoliberalismo – História e Implicações”, a incensada e equivocada bíblia da esquerda, escrita por David Harvey. Ele até reconhece que diversas Socialdemocracias passaram por reformas neoliberais, mas comete um erro metodológico semelhante ao que comete todo seu grupo ideológico, não sei se pelo primeiro ou pelo segundo motivo acima: sua obra jamais analisa as verdadeiras culpadas pela crise, ou seja, as escolhas econômicas e políticas anteriores, que geraram um perigoso desequilíbrio fiscal e levou aqueles governos ao quase colapso. Foram estas escolhas que terminaram por demandar reformas neoliberais.

O livro também destaca ou reconhece os sólidos resultados positivos resultantes de tais reformas. Seu foco é exclusivamente o momento dos ajustes, dos cortes. Se ampliar o foco para o antes e o depois, suas teses se desmancham no ar imediatamente.

É importante lembrar (ou informar) que o neoliberalismo não defende de forma alguma a ausência do estado, mas sim seu foco em atividades fins que beneficiem diretamente o conjunto da população, como segurança pública, saúde, educação, infraestrutura, politicas de transferência de renda etc. E defende que isso tem que ser feito através do equilíbrio fiscal para que seja sustentável.

Esclarecido esse ponto, fica claro que Lula está errado quando diz que “O neoliberalismo agravou a desigualdade econômica e política que hoje assola as democracias.” Não existe esta relação causal. Ela é falsa. Aliás, como bem lembra Marcos Lisboa, a análise de casos concretos em todo o mundo mostra que a redução da desigualdade depende mais da qualidade do que da quantidade do gasto público. É a forma como o governo gasta o dinheiro dos impostos que tem o poder (ou não) de reduzir a desigualdade. Além disso,  é importante ter em mente que a redução das desigualdades, com preservação das liberdades individuais, só ocorre em democracias liberais. Ou seja, a redução da desigualdade precisa preservar as liberdades individuais e a própria democracia. Qualquer outro caminho é arbitrário, autocrático.

Pois bem, em seu discurso, Lula cita uma única vez a palavra Liberdade, ao dizer que “É fundamental preservar a liberdade de imprensa”, (o que certamenteprovoca um riso irônico em vários de seus amigos tiranos) mas repete 14 vezes ao todo a palavra Desigualdade, numa espécie de mantra, de oração por um mundo melhor. Mas qual caminho propõe para isso?

Conhecendo a relação preferencial de Lula com tiranias em todo o mundo, acredito importante lembrar um postulado do grande economista e intelectual Milton Friedman, prêmio Nobel em 1976:

“Uma sociedade que coloque a igualdade – no sentido de igualdade de renda – acima da liberdade terminará sem qualquer uma das duas: igualdade ou liberdade. O uso da força para alcançar a igualdade irá destruir a liberdade, e a força, introduzida inicialmente para bons propósitos, acabará nas mãos de pessoas que a usarão para promover seus próprios interesses.”

Analisando a movimentação de Lula e do PT ao longo de sua história, as tentativas de corrosão da democracia saltam aos olhos. E estão inda mais salientes nesse ano de 2023. Não vou repetir aqui cada uma delas. Estão reunidas em artigos que indico abaixo.

Lula e o PT perderam qualquer freio moral. Os juízes amigos no STF os convenceram que são inimputáveis, que estão acima das leis. Estão visivelmente deslumbrados – e isso é sempre perigoso.

Fique atento.

SUGESTÕES DE ARTIGOS COMPLEMENTARES

Basta clicar no título desejado para ler.

Sobre economia e neoliberalismo:

AS SEMELHANÇAS DO PLANO REAL COM OS AJUSTES DAS SOCIALDEMOCRACIAS NÓRDICAS.

***