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segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Pequeno dicionário de conceitos invertidos - Denis Lerrer Rosenfield, O Estado de S. Paulo

 Hamas

Denis Lerrer Rosenfield, 
O Estado de S. Paulo (23/10/2023) 
Desinformação propagada por Lula, PT e seus satélites exige uma espécie de pequeno dicionário para analisar a junção entre a ideologia e a estupidez humana 

 A desinformação propagada pelo governo Lula, pelo PT e por seus satélites, como PSOL, PCdoB e MST, exige que se faça o esclarecimento do significado de certas palavras, sob pena de afundarmos no abismo moral. Exigiria, mesmo, uma espécie de pequeno dicionário, voltado para a análise da junção entre a ideologia e a estupidez humana. As palavras perdem o seu significado e são substituídas pela irrupção disfarçada da maldade. 

Terror. O ataque do Hamas a Israel foi um ato inequívoco de terror. Visados foram bebês, trucidados e queimados, crianças assassinadas na frente de seus pais e vice-versa, sequestros de crianças levadas para Gaza, idosos e mulheres feitos reféns, jovens assassinados numa festa rave no sul do país e assim por diante. Tais atos se inscrevem na história humana da maldade, cujos antecedentes recentes são o Isis (Estado Islâmico) e as ações nazistas conduzidas pela SS. Himmler ficaria orgulhoso de seus herdeiros e simpatizantes de esquerda. 

Dois Estados. Os que não condenam o Hamas supostamente com o intuito de garantir a neutralidade do País, a exemplo das notas vergonhosas do Itamaraty e de membros do governo, esquecem um fator central: o Hamas não defende a solução de dois Estados, Israel e Palestina. Defende, sim, um único Estado: o do Hamas, do Mediterrâneo ao Rio Jordão, sob a sua dominação e a imposição da Lei Islâmica. O Hamas não representa os interesses dos palestinos. Tal função é exercida pela Autoridade Palestina, que desfruta de reconhecimento internacional. A Justiça encontra-se na criação de dois Estados, sem que o terror seja utilizado para destruir o outro, como é pregado pelo Hamas, desde a sua fundação. 

Campos de concentração. Outra pérola da estupidez encontra-se no dizer de pseudojornalistas que consideram, seguindo a propaganda do terror, que Gaza seria um “campo de concentração”. Os judeus seriam os novos nazistas. Talvez essa esquerda debiloide tenha razão apesar dela. Sim, Gaza é um campo de concentração criado, administrado e supervisionado pelo Hamas, que exerce a sua autodeterminação, uma vez que Israel desocupou o seu território. É essa organização terrorista que desvia recursos de saúde, emprego, educação e saneamento para a construção de túneis subterrâneos, compra e manufatura de foguetes, mísseis e armamentos. Oprime mulheres e reprime e assassina homossexuais. Nos túneis fica o exército terrorista, acima fica a população civil servindo de escudo humano. Eis por que o Hamas procura impedir o deslocamento da população civil. 

Cessação de hostilidades. Os diferentes chamamentos para a interrupção das hostilidades, em que pese a sua fachada humanista, visam simplesmente a interromper a contraofensiva israelense, voltada para a aniquilação dos terroristas. Procuram, isto sim, assegurar a vitória do Hamas, mantendo a sua estrutura militar intacta. A cobertura humanista do PT é apenas a manifestação de sua conivência com o terror. Segundo sua perversa lógica, quem se defende de atentados terroristas comete “genocídio”! Contribuição inestimável à história universal da ignomínia. Lula, embora tenha condenado o “atentado terrorista” em Israel, travou a língua e não conseguiu pronunciar a palavra Hamas. Talvez tenha ainda presentes as congratulações que recebeu deste exército do terror ao ganhar a eleição presidencial. À esquerda, assinalese a posição digna do presidente do PSB, Carlos Siqueira, que condenou sem ambiguidades o terror islâmico. Artistas. O silêncio dos artistas apoiadores do PT (exceção feita a Gilberto e Preta Gil) é ensurdecedor. Fizeram algazarra para eleger Lula, mas agora estão mudos. Ao se calarem, mostram-se coniventes com o terror e com o assassinato de 260 jovens num evento musical. Imaginem o barulho que fariam aqui, no Brasil, se uma só pessoa fosse assassinada num festival. Agora, acolá, os critérios desaparecem ao cruzarem o Atlântico. Jovens judeus e não judeus são exterminados, como se isso fosse justificado. É uma vergonha. 

Antissionismo e antissemitismo. O ataque terrorista do Hamas mostra claramente o seu caráter antissemita, voltado para a destruição do Estado de Israel e a aniquilação dos judeus. Nada diferente do que tentaram fazer os árabes e o mufti de Jerusalém ao não reconhecerem a existência do Estado judeu e ao recusarem a criação de um Estado palestino igualmente inexistente. Prometeram jogar os judeus ao Mediterrâneo. Eram contra a criação de dois Estados, tal como o Hamas. Um importante líder social-democrata do final do século 19 e início do século 20, August Bebel, já dizia que o antissemitismo é o socialismo dos idiotas. Princípios morais. A esquerda petista, com os seus assemelhados, mostra de uma forma contundente a sua ausência de princípios morais. A sua defesa dos direitos humanos é mero disfarce para incautos. O governo deveria alterar o nome de seu Ministério dos Direitos Humanos para Ministério dos Direitos Inumanos. Questão de coerência. 

Epílogo. E o destino dos reféns, aterrorizados?

segunda-feira, 25 de setembro de 2023

A diplomacia do PT: Muito mais do que hipocrisia - Augusto de Franco

 PT, Lula, lulopetistas: a hipérbole da falta de caráter, o pleonasmo da calhordice moral, a redundância do grotesco ético.

MUITO MAIS DO QUE HIPOCRISIA

Augusto de Franco, 24/09/2023

Talvez tenham falado muito baixo ou, quem sabe, eu esteja com problemas de audição, mas não consegui ouvir os protestos das feministas do PT contra o endurecimento da repressão às mulheres no Irã (que agora podem pegar até 10 anos de cadeia se mostrarem os antebraços nus ou usarem roupas apertadas). Aliás, não ouvi dessas feministas nem mesmo uma crítica contundente ao patriarcalismo do Talibã e de outros países islâmicos do Sul Global que perseguem e reprimem suas mulheres.

Também ainda não consegui ouvir os ativistas petistas dos direitos humanos protestando contra o tratamento dado a dissidentes políticos e população LGBTQIA+ em Cuba, na Venezuela, na Nicarágua e na maioria dos países do BRICS: na China, no Irã, nos Emirados Árabes Unidos, na Arábia Saudita, no Egito, na Etiópia.

Aliás, acho que nunca ouvi os defensores petistas da democracia criticarem organizações autocráticas (e terroristas) como o Hamas e o Hezbollah. Nem os defensores da liberdade de crença e da autonomia das etnias protestando contra a perseguição aos islâmicos na Índia e aos uigures na China.

O que será que está acontecendo? Alguém poderia chamar isso de hipocrisia. 

Mas é muito mais do que hipocrisia. É alinhamento. O PT se alinha a qualquer país que não seja uma democracia liberal ou um regime eleitoral não parasitado por populismos (ou seja, que tenha chances de entrar em transição para uma democracia liberal). Esse é o critério básico.

Para ser aliado preferencial do PT, o importante é ser contra o imperalismo norte-americano e o neocolonialismo europeu. Não importa se jogam gays do alto de edifícios, se apedrejam mulheres acusadas de adúlteras, se extirpam o clitóris de jovens, se criminalizam as oposições, se prendem e torturam quem diverge do governo, se proibem a organização de partidos que não sejam capachos do partido oficial, se envenenam ou defenestram opositores, se obrigam as mulheres a esconder a face e o corpo tratando-as como seres inferiores, se fecham e expropriam igrejas e até organizações humanitárias. 

Tá valendo tudo desde que seja contra o grande Satã e seus aliados demoníacos (que vêm a ser nada menos do que as mais bem colocadas democracias do planeta em todos os rankings internacionais). Vale até acusar de nazista - suprema indignidade - a resistência ucraniana à invasão militar do ditador expansionista Vladimir Putin.

Agora pergunto. Dá para admitir que um partido cujos dirigentes e militantes se comportam desse jeito seja democrático? Estou entendendo tudo errado quando ouço os discursos de Lula e as falas do camarada Teixeira e do camarada Marinho e do camarada Pimenta e do camarada Dirceu? Ou, além de surdo, estou quase cego quando não consigo ler direito os posts diários dos militantes petistas nas mídias sociais?


terça-feira, 8 de agosto de 2023

O estranho caso de afinidade eletiva do Brasil de Lula para com um dos parceiros diplomáticos do Brasil - Paulo Roberto de Almeida

O estranho caso de afinidade eletiva do Brasil de Lula para com um dos parceiros diplomáticos do Brasil 

 

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre a obsessão de Lula em defender os interesses de Putin no caso da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. 

 

Lula deve ser um dos poucos, senão o único dos chefes de Estado de países relevantes do mundo que expressa cuidados e que defende as “legítimas preocupações da Rússia com sua segurança”! 

Defesa e segurança da Rússia?

DA RÚSSIA?!?!?

O BRASIL?!?!?

A Rússia, tão grande, com tantos recursos e um poderio bélico impressionante, não é capaz de se defender sozinha?

Alguém no mundo está atacando a Rússia?

Ela já pediu ajuda à ONU?

Já denunciou o sórdido ataque à sua soberania e a violação da Carta da ONU por esse vil atacante?

O Brasil precisa vir em seu socorro?

E Lula já determinou que sua diplomacia viesse ou fosse em socorro à “legítima preocupação de segurança da Rússia”?

 

Desculpem, mas tenho legítimas dúvidas sobre o sentido da preocupação de Lula e sobre os fundamentos da atuação, neste caso, da diplomacia brasileira.

Algum diplomata da ativa, desse setor ou de outro, poderia me explicar esse estranho caso de afeição particular do Brasil para com o maior país do mundo?

Tem alguma nota do Itamaraty sobre esse estranho caso de afinidade eletiva com um membro específico da comunidade internacional?

Alguma outra nota por acaso tratando do que vêm ocorrendo no território e com a população de um vizinho específico desse outro país específico objeto dessa estranha e bizarra afinidade?

Só queria entender essa preocupação especial do Brasil para com uma “operação militar especial” da Rússia.

Agradeceria explicações de quem de direito.

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4454, 8 agosto 2023, 2 p.


segunda-feira, 31 de julho de 2023

A política externa companheira e a diplomacia partidária (2014) - Paulo Roberto de Almeida

 A política externa companheira e a diplomacia partidária

Paulo Roberto de Almeida

Mundorama (4/10/2014; ISSN: 2175-2052)

 

O início ou o término de um mandato presidencial sempre é uma boa ocasião para se efetuar um balanço das realizações ou das frustrações que nele possam ter ocorrido. Por deformação de ofício, mas também por inclinação pessoal, tenho feito esse tipo de avaliação ao final e até no início de novos mandatos, num terreno que por acaso é o meu pelas últimas décadas: os das relações internacionais do Brasil e da política externa dos governos que se sucederam desde o final dos anos 1970 (em plena ditadura, portanto), até a atualidade. Uma lista nominal de todos os ensaios de avaliação que escrevi a esse respeito ao longo dessas décadas seria provavelmente enfadonha, mas talvez possa ser útil aos que manifestem o desejo, e o interesse, de conhecer, ainda que seletivamente, o que produzi de mais relevante nessa área. Por isso, permito-me enumerar os mais representativos desse tipo de produção ao final deste breve ensaio.

O que me motiva a realizar esse tipo de exercício é o continuísmo diplomático, ou seja, o fato de se afirmar que a política externa companheira, é a única suscetível de defender a soberania do Brasil, e que ela deve ser preservada com todo o ativismo e altivez que supostamente a caracterizam (segundo a figura de estilo, pro domo sua, de um ex-chanceler). Como eu acho que isso nada mais representa do que propaganda enganosa a serviço do partido no poder, vou apresentar outros elementos de discussão, ao alinhar alguns argumentos em favor de uma outra visão, que pelo menos tem a vantagem de oferecer uma perspectiva “interna” da diplomacia companheira, e sem que ninguém me tivesse encomendado tal tarefa. 

 (...)


Ler a íntegra deste trabalho neste link: https://www.academia.edu/105090867/A_pol%C3%ADtica_externa_companheira_e_a_diplomacia_partid%C3%A1ria_2014_

 


Lista seletiva de trabalhos do autor sobre política externa do Brasil:

Nunca Antes na Diplomacia...: A política externa brasileira em tempos não convencionais (Curitiba: Appris, 2014, p. 289; ISBN: 978-85-8192-429-8; link: http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/NuncaAntes2014.html). 

“O Brasil e a integração regional, da Alalc à Unasul: algum progresso?”, Mundorama (11/06/2014; ISSN: 2175-2052; link: http://mundorama.net/2014/06/11/o-brasil-e-a-integracao-regional-da-alalc-a-unasul-algum-progresso-por-paulo-roberto-de-almeida/).

“Mercosul, do otimismo à resignação”, Boletim de Economia e Política Internacional (Ipea: n. 16, jan.-abr. 2014, p. 43-56; ISSN: 2176-9915; link: http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/boletim_internacional/140512_boletim_internacional016.pdf).

“Rumos adequados à política externa brasileira na próxima década”, blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/07/rumos-adequados-politica-externa.html).

 “Pensamento diplomático brasileiro: introdução metodológica às ideias e ações de alguns dos seus representantes”, in: José Vicente Pimentel (org.), Pensamento Diplomático Brasileiro: Formuladores e Agentes da Política Externa (1750-1964). (Brasília: FUNAG, 2013, 3 vols.; ISBN: 978-85-7631-462-2; vol. 1, p. 15-38; link: http://funag.gov.br/loja/download/1057-1058-1059-pensamento-diplomatico-brasileiro-colecao.epub).

“A diplomacia da era Lula: balanço e avaliação”, Política Externa (vol. 20, n. 3, dez./jan./fev. 2011-2012, p. 95-114; ISSN: 1518-6660; link: www.pralmeida.org/05DocsPRA/2344DiplomEraLulaBalRevPolitcaExterna.pdf).

Relações internacionais e política externa do Brasil: a diplomacia brasileira no contexto da globalização (Rio de Janeiro: LTC, 2012, 330 p.; ISBN 978-85-216-2001-3; http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/RelaIntPExt2011.html)

“Continuidade e Mudança na Política Externa Brasileira”, Mundorama (1/04/2011; link: http://mundorama.net/2011/04/01/continuidade-e-mudanca-na-politica-externa-brasileira-por-paulo-roberto-de-almeida/).

“A diplomacia brasileira numa nova conjuntura política”, Mundorama (29.12.2010; link: http://mundorama.net/2010/12/29/a-diplomacia-brasileira-numa-nova-conjuntura-politica-por-paulo-roberto-de-almeida/). 

“Never Seen Before in Brazil: Lula’s grand diplomacy”, Revista Brasileira de Política Internacional (vol. 53, n. 2, 2010, p. 160-177; ISSN: 0034-7329; link: http://www.scielo.br/pdf/rbpi/v53n2/09.pdf).

“La diplomatie de Lula (2003-2010): une analyse des résultats”, In: Denis Rolland, Antonio Carlos Lessa (coords.), Relations Internationales du Brésil: Les Chemins de La Puissance; (Paris: L’Harmattan, 2010, vol. 2: Représentations Globales, p. 249-259; ISBN: 978-2-296-13543-7). Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/10/relations-internationales-du-bresil.html).

“Pensamento e ação da diplomacia de Lula: uma visão crítica”, Política Externa (vol. 19, n. 2, set.-out.-nov. 2010, p. 27-40; ISSN: 1518-6660; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/09/pensamento-e-acao-da-diplomacia-de-lula.html).

 “Lula’s Foreign Policy: Regional and Global Strategies”, In: Werner Baer and Joseph Love (eds.), Brazil under Lula (New York: Palgrave-Macmillan, 2009, 326 p.; ISBN: 970-0-230-60816-0; chap. 9; p. 167-183; link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1811BrForPolicyPalgrave2009.pdf).

“A diplomacia do governo Lula em seu primeiro mandato (2003-2006): um balanço e algumas perspectivas”, Carta Internacional (São Paulo: Nupri-USP, vol. 2, n. 1, jan-mar 2007, p. 3-10; ISSN: 1413-0904; link: http://www.pralmeida.org/05DocsPRA/1733DiplomLula1roMandCartaInter2007.pdf).

“¿Una nueva ‘arquitectura’ diplomática? Interpretaciones divergentes sobre la política exterior del Gobierno Lula (2003-2006)”, Entelequia: revista interdisciplinar (2, Otoño 2006, p, 21-36; ISSN: 1885-6985; link: http://www.eumed.net/entelequia/es.art.php?a=02a02);

“A política internacional do PT e a diplomacia do governo Lula”, In: Guilhon de Albuquerque, José Augusto; Seitenfus, Ricardo; Nabuco de Castro, Sergio Henrique (orgs.), Sessenta Anos de Política Externa Brasileira (1930-1990) (2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, ISBN: 85-7387-909-2;  v. I: Crescimento, Modernização e Política Externa; p. 537-559),

“La politique internationale du Parti des Travailleurs: de la fondation du parti à la diplomatie du gouvernement Lula”, In: Denis Rolland et Joëlle Chassin (orgs.), Pour Comprendre le Brésil de Lula (Paris: L’Harmattan, 2004, ISBN: 2-7475-6749-4; p. 221-238; link: http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/73BresilLula.html).

“A política internacional do Partido dos Trabalhadores: da fundação do partido à diplomacia do governo Lula”, Sociologia e Política (Curitiba: UFPR; n. 20 jun. 2003, p. 87-102; ISSN: 0104-4478; link: www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-44782003000100008).

 

[Muitos outros materiais, e comentários tópicos, podem ser encontrados, geralmente sob a rubrica “diplomacia companheira” ou “política externa companheira”, no blog Diplomatizzando, desde vários anos, onde também tenho registrado os artigos dos companheiros de viagem do novo pensamento único, os acadêmicos gramscianos.]


segunda-feira, 24 de julho de 2023

“NÃO SOMOS CANDIDATOS À MEDIAÇÃO”, DIZ CHANCELER MAURO VIEIRA SOBRE GUERRA NA UCRÂNIA - CARLOS LINS e EDSON SARDINHA (Congresso em Foco)

 


ENTREVISTA

“NÃO SOMOS CANDIDATOS À MEDIAÇÃO”, DIZ CHANCELER MAURO VIEIRA SOBRE GUERRA NA UCRÂNIA

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, diz que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não se propõe a assumir o papel de mediador na guerra entre Rússia e Ucrânia. Em entrevista ao Congresso em Foco, o chanceler diz que o presidente vem apenas postulando a “necessidade urgente de se falar na paz, e não só na guerra” – e que, segundo ele, esse objetivo vem sendo alcançado.

“NÃO SOMOS CANDIDATOS À MEDIAÇÃO. O QUE TEMOS DITO É QUE ESTAMOS DISPOSTOS A APOIAR QUALQUER ESFORÇO DE PAZ, E QUE A GUERRA NA UCRÂNIA REQUER UM ESFORÇO COLETIVO, DE VÁRIOS PAÍSES. NÃO É TAREFA PARA UM PAÍS SÓ”

O presidente vem recebendo críticas nos últimos meses por não se posicionar de forma mais contundente contra a Rússia e a invasão comandada por Vladimir Putin, que já dura um ano e meio. Em 25 de abril, quando estava em Portugal, Lula já disse que o conflito é uma “violação da integridade territorial” da Ucrânia. Mas também já chegou a falar que, para que a guerra acabe, “cada um vai ter que ceder um pouco”. Em 19 de julho, Lula disse ainda que o presidente do Chile, Gabriel Boric, estaria sendo “sequioso” e “apressado” por cobrar uma postura anti-Rússia dos países da América Latina.

De acordo com o chanceler Mauro Vieira, no entanto, há progresso: “Nosso objetivo, que é esse, de que se fale também de paz, está sendo atingido. Basta ver o recente engajamento dos países africanos, que enviaram delegação de alto nível a Kiev e Moscou para dialogar com as partes. E também outras lideranças globais têm atuado nesse mesmo sentido. […] Eventuais críticas na mídia fazem parte do processo, mas o importante é que já contribuímos para que o debate sobre a paz ocupe também o primeiro plano”.

Vieira ainda não descarta um encontro presencial entre Lula e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Os dois líderes estiveram na Cúpula do G-7 em Hiroshima, no Japão, mas não chegaram a se reunir. “Não há qualquer ansiedade a respeito”, diz Mauro Vieira. “Os canais estão abertos e estão funcionando, e o encontro pessoal entre os presidentes ocorrerá quando houver uma próxima oportunidade”.

Na entrevista ao Congresso em Foco, Mauro Vieira definiu o atual momento da política externa como uma “volta do Brasil ao mundo”. Segundo ele, a prioridade do Itamaraty no primeiro semestre do governo Lula 3 foi “reconstruir pontes com o mundo”, buscando compensar os danos produzidos pelo isolamento diplomático nos quatro anos de Jair Bolsonaro.

Nessa toada, o presidente Lula vem adotando agenda intensa de viagens. No Brasil, nenhum presidente pós-ditadura militar viajou tanto nos 6 primeiros meses de mandato quanto Lula em seu terceiro mandato. “A demanda desses primeiros meses foi muito grande, porque todos querem conversar com o Brasil e com o presidente Lula”, diz Mauro Vieira. Segundo ele, o presidente realizou reuniões bilaterais com chefes de Estado e de Governo de mais de 40 países nesse período.

Leia abaixo o que o chanceler falou ao Congresso em Foco a respeito de outros assuntos:

  • política externa na gestão Bolsonaro – “Estamos trabalhando para repará-los [os danos], já a partir do processo eleitoral, quando as instituições democráticas brasileiras foram ameaçadas por discursos e orquestrações autoritárias e souberam dar a resposta adequada. O Brasil mostrou que é uma democracia madura e sólida, em um momento turbulento no mundo”;
  • agenda para o segundo semestre de 2023 – “É natural que a confirmação de algumas viagens ocorra mais perto das datas de cada compromisso”. Citou a cúpula dos BRICS em Joanesburgo, na África do Sul (agosto), a cúpula do G20 em Nova Délhi, na Índia (setembro), e a Assembleia-Geral da ONU, em Nova York (setembro), ambas em setembro, além da COP 28 do clima, nos Emirados Árabes Unidos (novembro);
  • Congresso – “Boa parte da sociedade brasileira, e também do Congresso, já está convencida dos prejuízos do isolamento diplomático dos últimos anos […] Desde o início da legislatura, temos contado com o apoio e com a compreensão de ambas as Casas do Congresso Nacional em relação ao nosso esforço de reconstruir pontes”;
  • Venezuela – “Para mim o mais importante foi a retomada das relações diplomáticas entre dois países vizinhos, após um afastamento que durou três anos, determinado pela decisão equivocada do governo anterior de fechar a embaixada e os consulados brasileiros naquele país. […] Isso é a antidiplomacia, com prejuízos evidentes para o Brasil”;
  • governo Maduro e violações à democracia – “Faremos chegar ao governo venezuelano nossas preocupações e críticas por meio de um diálogo diplomático franco, mas que será mantido pelos canais diplomáticos adequados, e não pela mídia ou pelas redes sociais”.

ÍNTEGRA

Leia abaixo a íntegra da entrevista concedida por Mauro Vieira ao Congresso em Foco. As perguntas e as respostas foram enviadas por e-mail.

Congresso em Foco: O presidente Lula tem priorizado a agenda internacional desde a sua posse, depois de quatro longos anos de isolamento internacional do Brasil. Nenhum outro presidente viajou tanto quanto ele nos seis primeiros meses do mandato. O que o governo espera conseguir ainda neste ano com esta agenda de viagens? O que já conseguimos até agora?
Mauro Vieira: Para um país da importância que o Brasil tem na sua região e no mundo, a agenda internacional se impõe entre as prioridades, até porque a política externa e a diplomacia presidencial são ferramentas indispensáveis para a promoção do País e dos seus produtos, para a atração de investimentos e para a defesa de regras internacionais que levem em conta os interesses da sociedade brasileira. Nestes seis primeiros meses, o que o Presidente Lula tem feito é reconhecer essa necessidade, atender a inúmeros convites e atuar para que o Brasil supere o isolamento que marcou o período anterior. Posso sintetizar esse momento novo, de volta do Brasil ao mundo, com uma frase do chanceler de um de nossos principais parceiros na Europa: “Como é bom poder voltar a conversar com o Brasil”, me disse ele, e outros parceiros disseram frases parecidas, na mesma linha, de que o mundo esperava pela volta do Brasil com saudades, para usarmos uma expressão bem nossa.

Com isso, a demanda desses primeiros meses foi muito grande, porque todos querem conversar com o Brasil e com o Presidente Lula. Ao final desse período inicial, o Presidente Lula tem um balanço de reuniões bilaterais com Chefes de Estado e de Governo de mais de 40 países, e em todas elas são discutidos assuntos de interesse do Brasil, seja na atração de investimentos, seja no fortalecimento de laços econômico-comerciais com nossos vizinhos, ou, para ser mais específico, na venda de aviões brasileiros para a China ou na atração de novos parceiros para o Fundo Amazônia, como ocorreu com os Estados Unidos e o Reino Unido, entre outros países. É uma política externa pragmática e que prioriza as necessidades de geração de oportunidades no nosso país, por meio dos laços econômicos e políticos com o mundo.

Já conseguimos sair do isolamento, logramos recuperar o lugar do Brasil como um país que é respeitado e lidera discussões relevantes no mundo, e que defende suas posições a partir do diálogo com a sociedade brasileira e de uma clara noção do interesse nacional em cada questão. O desenvolvimento sustentável e o combate à desigualdade, por meio da geração de oportunidades para todos, estão sempre entre essas questões. 

Há algum dano irreparável que o Brasil tenha sofrido com esse isolamento internacional ao longo dos últimos quatro anos?

Os danos, tanto de imagem quanto na defesa de interesses concretos, foram muito grandes. Estamos trabalhando para repará-los, já a partir do processo eleitoral, quando as instituições democráticas brasileiras foram ameaçadas por discursos e orquestrações autoritárias e souberam dar a resposta adequada. O Brasil mostrou que é uma democracia madura e sólida, em um momento turbulento no mundo, e mais uma vez se credenciou como um ator responsável para a comunidade internacional. A partir da posse do Presidente Lula, a tarefa que ele me delegou foi a de reconstruir pontes com o mundo. A expressão “reconstruir pontes” dá a exata noção dos muitos danos a reparar, e temos trabalhado nesse sentido desde o primeiro dia de gestão.

Quais países o presidente pretende visitar ainda em 2023?

O Presidente tem uma série de convites para visitas bilaterais e para eventos multilaterais no segundo semestre, e temos definido a agenda de viagens em diálogo com o Planalto, e em sintonia com as demandas da agenda doméstica, que são prioritárias para o governo. Com isso, é natural que a confirmação de algumas viagens ocorra mais perto das datas de cada compromisso. Mas, no segundo semestre, entre outros compromissos, o Presidente já participou da cúpula do Mercosul, em Puerto Iguazú, na Argentina, no começo de julho, está participando da cúpula CELAC-União Europeia em Bruxelas, e ainda terá a cúpula dos BRICS em Joanesburgo, na África do Sul, em agosto, a cúpula do G20 em Nova Délhi, na Índia, e a Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, ambas em setembro, além da COP 28 do clima, nos Emirados Árabes Unidos, entre o final de novembro e o início de dezembro.

Na cúpula do Mercosul o Brasil assumiu a Presidência pro tempore do bloco, e o Brasil também assumirá a Presidência do G20 no ano que vem, o que torna indispensável a presença no encontro em Nova Délhi. Além disso, na COP 28 do Clima será oficializada a escolha de Belém (PA) para sediar a COP 30, em 2025. Belém também sediará outro importante evento de política externa do segundo semestre, a cúpula da Amazônia, que reunirá os presidentes dos oito países membros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) e mais alguns convidados, em agosto, com o objetivo de debater soluções e articular políticas para enfrentar os desafios do desenvolvimento sustentável na região.

Uma das questões colocadas como prioridade pelo presidente da República na política externa é o meio ambiente. O Brasil não envia sinais contraditórios ao mundo quando uma das Casas do Congresso aprova medidas como o marco temporal para as terras indígenas ou diminui as atribuições do Ministério do Meio Ambiente, como já foi feito?

Não vejo contradição aí, vejo apenas os Três Poderes da República desempenhando suas funções, e o Executivo também já reagiu a algumas dessas decisões, no âmbito das suas competências constitucionais. É assim que uma democracia funciona. O compromisso do governo do Presidente Lula com o desenvolvimento sustentável, já demonstrado plenamente nas duas gestões anteriores dele, voltou a ser demonstrado a partir do primeiro dia de gestão. Foram tomadas medidas duras de combate à criminalidade ambiental, como foi o caso do garimpo ilegal no território ianomâmi, por exemplo, entre tantas outras políticas em favor da sustentabilidade. Como consequência imediata, dados do INPE mostram que houve uma redução de 33,6% no desmatamento na Amazônia no primeiro semestre, na comparação com o mesmo período de 2022.

Nesse contexto, quais são as ambições do Brasil com a realização da COP 30, em 2025, em Belém?

Não se trata de ambição, e sim de reassumir um papel de liderança que o Brasil tradicionalmente ocupou no debate global sobre o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável, agora somado ao desafio da mudança climática, que ameaça a todos. E esse papel significa dar voz às preocupações dos países em desenvolvimento e às populações de regiões como a Amazônia. O Presidente Lula tem sido muito claro no sentido de cobrar dos países desenvolvidos o cumprimento de reiteradas promessas de apoio financeiro a projetos de desenvolvimento sustentável, promessas que não têm se materializado. E é preciso que elas se materializem, com urgência. O Brasil tem credenciais, tem credibilidade para fazer essas cobranças, e por isso é importante que reassuma seu papel no debate global sobre grandes desafios como o da mudança climática, e não só na COP. Já a partir da Presidência brasileira do G20, no ano que vem, esse assunto será uma das prioridades do período em que estaremos à frente do grupo. Muito tempo já foi perdido com promessas não cumpridas e, mais recentemente, com um negacionismo em relação à ameaça da mudança climática que é típico da era da desinformação em que vivemos.

Realisticamente, que tipo de suporte se pode esperar da atual composição do Congresso Nacional à política externa do governo Lula? O número alto de parlamentares mais à direita representa um obstáculo?

Pessoalmente, creio que boa parte da sociedade brasileira, e também do Congresso, já está convencida dos prejuízos do isolamento diplomático dos últimos anos, quando em muitos momentos se abdicou de fazer diplomacia por simples sectarismo ideológico. Diplomacia se faz por meio do diálogo com todos, e em especial com aqueles com os quais não concordamos, dessa forma se superam as dificuldades.

Essa tem sido a linha condutora da política externa brasileira ao longo de décadas, em governos de diferentes orientações ideológicas, e é essa a linha que estamos retomando, a da diplomacia, do diálogo, da busca do entendimento. E, desde o início da legislatura, temos contado com o apoio e com a compreensão de ambas as Casas do Congresso Nacional em relação ao nosso esforço de reconstruir pontes com o mundo e de retomar os princípios e linhas de ação tradicionais do País na política externa, com o pragmatismo e a responsabilidade que sempre nos caracterizaram no cenário mundial.

Eu mesmo já participei de audiências públicas tanto na Câmara como no Senado, e em ambas contei com uma ampla compreensão dos parlamentares a respeito da necessidade de retomada das linhas tradicionais de política externa brasileira.

Em relação aos Estados Unidos: é comum que se faça uma analogia entre o ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021, de inclinação pró-Trump, com os atos golpistas de caráter bolsonarista na Esplanada dos Ministérios em 8 de janeiro de 2023. O Itamaraty considera que a pré-candidatura de Donald Trump a presidente representa algum risco à democracia, seja nos Estados Unidos ou em uma escala maior?

Tanto as instituições democráticas norte-americanas quanto as brasileiras, que enfrentaram desafios muito semelhantes, demonstraram estar à altura desses desafios. Somos duas democracias sólidas, devemos estar atentos a eventuais ameaças, mas não vejo razão para temores quanto ao futuro.

Em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia, o presidente Lula tem postulado o papel de mediador no conflito. Ele sofreu algumas críticas por declarações a respeito da posição da Ucrânia no conflito. Que grau de protagonismo o presidente brasileiro pode ter nessa negociação? 

O que o Presidente Lula tem postulado é a necessidade urgente de se falar na paz, e não só na guerra. Não somos candidatos à mediação, o que temos dito é que estamos dispostos a apoiar qualquer esforço de paz, e que a guerra na Ucrânia requer um esforço coletivo, de vários países. Não é tarefa para um país só.

Nosso objetivo, que é esse, de que se fale também de paz, está sendo atingido, basta ver o recente engajamento dos países africanos, que enviaram delegação de alto nível a Kiev e Moscou para dialogar com as partes. E também outras lideranças globais têm atuado nesse mesmo sentido, recentemente no Vaticano o Papa Francisco e o Presidente Lula também falaram sobre os esforços de paz. Desde a posse, já mantive reuniões de trabalho com quase 60 chanceleres, e em todas as conversas nas quais a guerra na Ucrânia foi mencionada, o papel do Brasil e do Presidente Lula foi bem recebido, mesmo pelos países em conflito e pelos seus principais aliados. Eventuais críticas na mídia fazem parte do processo, mas o importante é que já contribuímos para que o debate sobre a paz ocupe também o primeiro plano.

A evolução desse processo depende fundamentalmente dos países envolvidos, e da sua disposição em negociar, mas o avanço recente fez com que o debate global não esteja mais exclusivamente focado no conflito. Ele já contempla posições como a do Brasil, e agora também dos países africanos, e isso é um avanço.

Encontrar-se com Volodymyr Zelensky é uma prioridade para o presidente Lula?

Como sabemos, não foi possível o encontro entre os dois líderes à margem da cúpula do G7, em Hiroshima, no Japão, mas não há qualquer ansiedade a respeito. O Presidente Lula já manteve contatos telefônicos tanto com o Presidente Zelensky como com o Presidente Putin, o Embaixador Celso Amorim esteve em Moscou e em Kiev, como enviado especial, e avistou-se também com ambos os líderes, e eu também já me encontrei com o chanceler ucraniano Kuleba e com o chanceler russo Lavrov. Os canais estão abertos e estão funcionando, e o encontro pessoal entre os Presidentes ocorrerá quando houver uma próxima oportunidade.

A indústria brasileira tem perdido terreno na América do Sul para a China. Que medidas comerciais concretas o governo Lula pretende adotar para recuperar esse espaço no subcontinente?

Um dos grandes avanços em matéria de política externa nesse início de gestão foi a reunião de Presidentes da América do Sul. Um encontro presidencial na América do Sul não ocorria havia nove anos, e ocorreu no final de maio, em Brasília, por iniciativa do Presidente Lula, com a presença de 11 Chefes de Estado e um Chefe de Governo, ou seja, todos os países sul-americanos estiveram representados no mais alto nível. Depois de nove anos de canais bloqueados para o diálogo. Esse é um dado significativo dos prejuízos do isolamento, que começamos a reverter. Os chanceleres da reunião reuniram-se em Bruxelas à margem da reunião CELAC-UE, desta semana, para dar seguimento à retomada do diálogo, e voltarão a reunir-se em setembro em Nova York, à margem da Assembleia Geral da ONU. A integração latino-americana é um mandamento constitucional, em democracia nossos países protagonizaram uma aproximação inédita, e construíram um patrimônio de laços econômicos que precisa ser aprofundado. A reunião presidencial é o primeiro passo nessa retomada, que tem impacto direto e positivo em matéria de integração e das oportunidades econômicas que ela é capaz de gerar. 

Presidentes de esquerda de países da América do Sul criticaram o presidente Lula pelas declarações dele, no encontro em Brasília, de que há uma narrativa contra o governo de Nicolás Maduro na Venezuela. O governo brasileiro reafirma que a miséria e as violações de direitos humanos, apesar de reconhecidas por organismos internacionais, são uma narrativa?

Meu papel é o de Ministro das Relações Exteriores do Brasil, e não de comentarista das notícias da atualidade, por isso procuro ser bastante claro em questões complexas do contexto regional. E insisto no fato de que o grande avanço do semestre na região foi a realização da reunião dos presidentes sul-americanos, após nove anos de silêncio e de falta de diálogo. Para mim, é natural que divergências surjam, e é saudável que seja assim, não se convocou o encontro para que houvesse uma troca de elogios. No que diz respeito à situação na Venezuela e à relação bilateral, para mim o mais importante foi a retomada das relações diplomáticas entre dois países vizinhos, após um afastamento que durou três anos, determinado pela decisão equivocada do governo anterior de fechar a embaixada e os consulados brasileiros naquele país. O primeiro resultado foi o de que cerca de 20 mil brasileiros que vivem na Venezuela não tiveram, durante três anos, qualquer assistência do governo brasileiro. Se algum deles precisasse de algum documento oficial, só o obteria viajando à Colômbia ou voltando ao Brasil. Um governo não pode deixar seus nacionais sem qualquer apoio do Estado durante três anos. Mas foi justamente isso o que ocorreu na Venezuela. Além disso, o fechamento dos canais de diálogo afetou duramente o comércio, com impacto negativo para a região Norte do Brasil, e privou a população de Roraima do acesso à energia mais barata da usina hidrelétrica venezuelana de Guri. 

Isso é a antidiplomacia, com prejuízos evidentes para o Brasil. O Itamaraty sempre soube fazer diplomacia, e voltou a praticá-la. É bom lembrar também que, mesmo com as relações virtualmente rompidas, durante a pandemia foi o oxigênio doado pela Venezuela que salvou centenas de vidas em Manaus, em um momento no qual a escassez de oxigênio gerou uma séria crise na capital amazonense.

O governo brasileiro, que já condenou publicamente o embargo econômico à Venezuela, pretende repudiar as violações à democracia atribuídas ao governo Maduro?

O Brasil tem como tradição, sempre que chamado, atuar na construção de consensos em momentos de dificuldades em países amigos. Também com a Venezuela tem sido assim, em especial desde 2013. O Brasil tem estado à disposição para apoiar e, quando convidado, mediar o diálogo entre os atores políticos venezuelanos. Naquele momento isso ocorreu com o engajamento também da UNASUL. Vários dos esforços diplomáticos desde então produziram resultados positivos, enquanto o rompimento do diálogo não trouxe qualquer benefício ao longo dos últimos anos. Em 2019, ao decidir reconhecer como presidente “autoproclamado” o deputado Juan Guaidó, eleito em 2015 com pouco menos de 100 mil votos, na prática o governo anterior inviabilizou qualquer possibilidade de atuação efetiva da diplomacia brasileira para a superação da crise política na Venezuela.

A história recente demonstra claramente que o Brasil cometeu um grande equívoco.

Não repetiremos esse equívoco, e faremos chegar ao governo venezuelano nossas preocupações e críticas por meio de um diálogo diplomático franco, mas que será mantido pelos canais diplomáticos adequados, e não pela mídia ou pelas redes sociais. Os interesses do Brasil e da integração regional exigem de nós profissionalismo em uma relação que é estratégica para nós e também para a colaboração fronteiriça na Amazônia.

As previsões para a economia mundial são de baixo crescimento para 2023, mas vêm melhorando em comparação ao início do ano. De um modo geral, que oportunidades isso representa para o Brasil?

Economia não é minha especialidade, mas nos contatos que venho mantendo desde janeiro, percebo que o cenário global oferece boas perspectivas para a economia brasileira, tanto para o nosso setor exportador quanto para aqueles que investem em novas fronteiras tecnológicas, como a da transição energética. Há uma profunda transformação em curso no mundo, e é preciso que estejamos prontos para aproveitar as oportunidades que ela já está oferecendo. Em matéria de transição energética, por exemplo, nossas possibilidades são muito promissoras, desde que consigamos gerar, na política e na sociedade, os consensos necessários quanto aos rumos a seguir. Tenho a confiança de que não deixaremos passar essa oportunidade.



O falso salvador do mundo - Lourival Sant’Anna O Estado de S. Paulo

 Grato a Augusto de Franco pela transcrição em seu blog, de onde copiei este artigo de Lourival Sant'Anna. Meus comentários iniciais: 

Não são só posições ideológicas ou princípios moralmente indefensáveis que movem a péssima diplomacia de Lula 3 (como aliás já era em Lula 1 e 2). Ele também exibe distorções notáveis em termos de cálculo estratégico, ao apostar num rápido e incontornável declínio americano e numa indefenida e propriamente indesejável “nova ordem global” numa aliança estreita com duas grandes autocracias que estão a anos-luz de distância de nossa própria régua moral, em democracia e DH. Pretende levar o Brasil a embarcar na canoa furada do Brics, claramente dominado pelo peso dos interesses nacionais chineses? E agora russos? O Itamaraty se submete passivamente a todas essas loucuras? (PRA)


O falso salvador do mundo

Lourival Sant’Anna, O Estado de S. Paulo (23/07/2023)

Lula embarcou em uma fantasia calcada em premissas moralmente indefensáveis

O forte viés ideológico da política externa do governo Lula cria fraturas na América Latina e inviabiliza o exercício da liderança que naturalmente caberia ao Brasil. A complacência de Lula com as ditaduras russa, venezuelana e nicaraguense, assim como sua repulsa ao livre-comércio e ao Ocidente, anulam o peso da credencial do presidente no que realmente interessa ao mundo quando olha para o Brasil: a proteção ambiental.

O desmatamento da Amazônia foi reduzido em 34% no primeiro semestre deste ano. A conquista confirma as incomparáveis credenciais de Lula e da ministra Marina Silva, que conseguiram reduzir o desmatamento em 84% entre 2004 e 2012, enquanto o PIB do agronegócio crescia espetaculares 75%.

Lula poderia surfar nesse inestimável capital, para extrair concessões de Europa e EUA. Mas prefere atacar a ambos, responsabilizando-os pelo flagelo da Ucrânia, pela corrida armamentista e pela inflação de alimentos, como se não fossem consequências da guerra expansionista de Vladimir Putin.

A palavra “Rússia” não pôde sequer constar da declaração final da cúpula União Europeia-América Latina, por causa da preocupação do governo brasileiro em não melindrar o ditador russo. Para indignação do presidente do Chile, Gabriel Boric: “Hoje é a Ucrânia, amanhã pode ser qualquer um de nós”.

Outro presidente de esquerda, Gustavo Petro, da Colômbia, também criticou o imperialismo russo. Depois descambou para denunciar a invasão de Iraque, Líbia e Síria. Cobri as três guerras para o Estadão. A invasão do Iraque foi um crime, mas os EUA não colonizaram o país, como a Rússia tenta fazer com a Ucrânia. Líbia e Síria foram palcos de revoluções populares que receberam apoio ocidental.

FRATURAS. Boric e os presidentes do Paraguai, Mario Abdo Benítez, e do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou, já haviam se insurgido contra o desagravo de Lula ao ditador Nicolás Maduro na véspera da cúpula sulamericana, em 30 de maio, em Brasília. Lula justificou com a pérola “democracia é um conceito relativo”. Os presidentes de Equador e Peru também rejeitam essas posições.

Por causa de seu apoio ao chavismo desde sempre, Lula não goza da confiança da oposição venezuelana para mediar uma negociação entre ela e o regime.

Por fim, com sua iniciativa de reabrir o acordo com a UE para proteger o mercado de compras governamentais, Lula também frustra Uruguai e Paraguai, e futuramente a Argentina, com a saída de cena de seu amigo Alberto Fernández, nas eleições de outubro.

Lula trocou oportunidades reais de liderança e benefícios para o Brasil por uma fantasia de salvador do mundo, calcada em premissas moralmente indefensáveis.