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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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terça-feira, 9 de abril de 2024

O Brasil tem problemas demais para ter pensamento estratégico- Rubens Barbosa (OESP)

AMBIÇÃO EXTERNA SEM PENSAMENTO ESTRATÉGICO

Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo, 9/04/2024


No Brasil, os problemas sociais, pobreza, concentração de renda, falta de recursos para o Estado, gastos desnecessários e duplicados, déficit público, déficit educacional e cientifico e tecnológico, sem falar nos privilégios, nos problemas da segurança pública, na violência e na corrupção, segurança jurídica para garantir investimentos, para citar os mais dramáticos, deixam pouco espaço para um pensamento de meio e longo prazo, verdadeiro esforço estratégico para um país do porte do Brasil, potência média, a nona economia do mundo, com interesses importantes a preservar na área do agronegócio e com grandes deficiências e vulnerabilidades na área industrial e, sobretudo, de Defesa, pelo baixo aproveitamento dos avanços da tecnologia.

 

O mundo mudou e hoje as preocupações com a Defesa são prioritárias. No meio de duas guerras, na Europa e no Oriente Médio, 58 conflitos localizados em 35 países e, na nossa vizinhança, a ameaça bélica da Venezuela contra a Guiana, o Brasil não pode se dar ao luxo de ignorar esse pensamento estratégico.

 

A falta de uma visão estratégica tornou-se trágica para o ambiente da Defesa Nacional e para um projeto nacional, exemplificado agora com o anúncio da venda da AVIBRAS, empresa líder de tecnologia de ponta no lançamento de foguetes. Com problemas de gestão que se arrastam a mais de ano, com dívidas acumuladas, o governo Lula ao assumir, tentou encontrar uma fórmula para preservar a empresa nacional, sem sucesso.

 

Caso se concretize a venda da AVIBRAS, será a terceira empresa de grande porte e significado na Defesa que o Brasil perde, depois da Engesa (carro de combate) e da Mectron SIATT (míssil naval). Em comunicado, a Avibras e a empresa australiana Defend Tex informaram que vem mantendo tratativas para viabilizar a recuperação econômica-financeira da empresa para manter suas unidades fabris no Brasil, retomar as operações e manter o fornecimento previsto nos contratos. Apesar do grave dano à soberania, com a desnacionalização da empresa, a operação conta com a boa vontade do governo e das autoridades do Ministério da Defesa (MD), inclusive dos comandantes das três Forças.

 

O Centro de Defesa e Segurança Nacional (CEDESEN), junto com a ABIMDE, apresentaram proposta ao MD que poderia ser uma saída para a Avibras. Sugeriu-se a criação da Empresa Crítica de Defesa (ECD), visto que uma análise de risco observando impacto com a descontinuidade de operações ou com a perda do controle nacional mostra que certas empresas são Críticas para o presente e futuro da país. A proposta é simples e direta: Criação, por lei, da classificação adicional de ECD, que se somaria às Empresas Estratégicas de Defesa (EEDs) e Empresas de Defesa (EDs). Para se tornar ECD a empresa deveria ser uma EED. Uma análise de risco deveria apontar que a sua descontinuidade possuiria impacto significativo imediato e de longo prazo em áreas estratégicas e de interesse da Segurança Nacional (e não somente Defesa Nacional). O Estado deveria se organizar para realizar aquisições mínimas periódicas das ECD de forma manter a capacidade de P&D e produtiva ao menos com carga mínima, evitando-se assim a sua desmobilização. Como contrapartida, as ECD deveriam estar sujeitas a intervenção técnico-econômica direta da União em caso de iminência de perda de controle nacional ou de severo desarranjo econômico. Os mecanismos precisariam ser discutidos, mas poderiam incluir a criação de Golden Share, inclusive sendo este uma forma de aporte financeiro.

 

Segundo a legislação vigente, a lei 12.598, determina que, em EED, o controle fique restrito a 40% dos votos, além de desenvolver tecnologia nacional. Aparentemente, não foi isso o que ocorreu. A legislação deveria ser aplicada, mas pode deixar de ser por não existir um responsável por desenvolver e sustentar uma Base Industrial de Defesa estratégica para o país

 

Algumas sugestões apareceram para tentar contornar a questão das dívidas crescentes da companhia que parou de fornecer equipamento ao exterior e enfrenta ameaça de paralização total. A última instância seria estatizar a empresa em troca da dívida tributária sem colocação de recursos públicos ou controle administrativo para empresas, mas não teve apoio de Lula.

 

Essa transação ocorre quando o MD discute a atualização da Política Nacional de Defesa e a Estratégia Nacional de Defesa, embora a questão da Avibras certamente não tenha sido colocada no contexto mais amplo da capacidade de Defesa do país. Os interesses divergentes no contexto do establishment militar brasileiro não permitem ainda o entendimento de que a capacidade militar tem dois componentes essenciais. Capacidade operacional de combate, providas pelas FFAA e capacidade logística de defesa, provida pelas sinergias entre um órgão do Estado que gere a demanda por produtos e tecnologia de defesa e uma BID estratégica, sem a qual as FFAA não podem operar e mesmo existir. As FFAA exigem uma reforma estrutural para se modernizar e apoiar a indústria nacional de Defesa.

 

O assunto transcende as competências do Poder executivo e deveria merecer a atenção do Congresso já que envolve questões de Defesa e Segurança Nacional.

 

Rubens Barbosa, presidente do Centro Estudos de Defesa e Segurança Nacional (CEDESEN)


quinta-feira, 19 de outubro de 2023

Distinguindo os problemas do Oriente Médio - Paulo Roberto de Almeida

Distinguindo os problemas do Oriente Médio

  

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.

Nota sobre os problemas da região e o papel de Israel. 

 

O Oriente Médio tem muitos problemas, alguns enormes, e há muito tempo. 

Nenhum deles se chama Israel, que resultou de uma decisão votada na ONU, que prosperou, que introduziu muitas inovações tecnológicas e descobertas científicas, que domou o deserto e floresceu a agricultura em terras áridas, que se manteve democrático, a despeito dos seus integristas ortodoxos, que protesta contra o autoritarismo populista, e que não provocou deliberadamente nenhuma guerra, mas que foi atacado diversas vezes: 1948, no seu próprio nascimento, 1967, 1974, várias intifadas e ataques a partir do Líbano, da Síria, de milícias organizadas e armadas a partir de fora, como agora no caso do Hamas em Gaza. 

Os grandes problemas do Oriente Médio se chamam, desde sempre, antissemitismo, ditaduras familiares, corrupção, não educação, desigualdades persistentes, opressão das mulheres, e também, desde vários anos, ISIS, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Irã teocrático e anti-Israel, Arábia Saudita fundamentalista, terrorismo desenfreado, etc. 

Os problemas dos palestinos não surgiram a partir de Israel, que era muito pequeno e que praticamente não tinha nenhum Exército em 1947-48, mas dos Estados árabes circundantes, que nunca aceitaram o Estado de Israel e tampouco um Estado palestino, e que também mantiveram um povo (feito de muçulmanos, mas também de cristãos) à margem de suas respectivas sociedades.

É muito difícil reconhecer isso?

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4494, 19 outubro 2023, 1 p.


domingo, 14 de novembro de 2021

O que trava o Brasil? - Paulo Roberto de Almeida

 Sobre o que trava o Brasil

Esta é a pergunta: o que impede e sempre impediu o Brasil de avançar? A ignorância política e o autismo econômico das elites (as que contam, isto é, as do dinheiro, não as da inteligência). Em resumo, a absoluta mediocridade das elites dominantes e dirigentes, ou seja, as que sempre mandaram no Brasil (com algumas poucas exceções). 

Tem sido assim desde 1822, passando por 1889, 1930, 1964, 1988 (pois é), 2018.

Nada, portanto, de que possamos nos orgulhar em 2022. 

Pelo menos, vamos emergir de um pesadelo: o de ter uma cavalgadura na PR!

Não parece nada, e de fato não é nada, mas é quase tudo: é apenas o bode na sala, que será posto para fora, o que vai desanuviar e desempestar o ambiente.

Voltaremos, assim, ao que sempre foi nosso: à mediocridade e ao autismo das elites. Frustrados?

Não pensem que seria muito melhor se tivéssemos tido supostas inteligências no comando do país: não se esqueçam que supremos desastres na vida de certos países foram provocados por alguns intelectuais até reconhecidos e homenageados por gerações. 

Rousseau, Marx, Lênin, Stalin, Hitler, Mao. 

Esses caras, na teoria ou na prática, foram responsáveis por gigantescas perdas humanas e materiais, que infelicitaram povos e nações por duas ou três gerações. 

Mas mesmo “boas almas” — Cristo, Buda, Gandhi, Churchill — não estiveram isentos  de falhas ou ficaram imunes a desvios de doutrinas por parte de discípulos ingênuos, equivocados ou fundamentalistas, que também provocaram perdas involuntárias.

As misérias humanas têm muitas causas, e sua superação nunca foi retilínea e segura. 

Estamos sempre aprendendo. Como diz um velho ditado: errar é humano, persistir no erro é desumano! 

Espero, sinceramente, que não persistamos no erro em 2022.

Saudações a todos!

Paulo Roberto de Almeida 

Brasília, 14/11/2021

Agruras do Mercosul - Marcos Magalhães e Paulo Roberto de Almeida

 Excelente artigo de Marcos Magalhães sobre os desacordos atuais no Mercosul. Os problemas NÃO SÃO do Mercosul, e sim dos próprios países membros. Se ouso falar a verdade, elas são duas: a redução unilateral de tarifas do Brasil— que é ILEGAL pelas regras da TEC - não vai reduzir a inflação no Brasil, como alega o ministro Paulo Guedes, que desconhece completamente o Mercosul e até política comercial, ou o Gatt-OMC. Por outro lado, autorizar ou não o Uruguai a negociar acordos de liberalização comercial isoladamente é realmente contrário ao espírito e à letra de uma união aduaneira, mas vamos reconhecer que esta só existe para garantir uma reserva de mercado para os Industriais protecionistas da Argentina e do Brasil, da mesma forma como eles garantem há décadas reservas nacionais de mercado CONTRA os interesses de seus próprios consumidores. Em resumo: não existem problemas DO Mercosul, os problemas são dos dois sócios maiores.

Paulo Roberto de Almeida 

Inflação alta abre fraturas no Mercosul

Marcos Magalhães 

Capital Politico, 9/11/2021

Ao observar uma tempestade, natural ou política, é comum imaginar que só poderemos avaliar a extensão dos danos quando as águas baixarem. Como se a lenta volta a uma situação anterior desnudasse aos poucos os riscos que até então apenas imaginamos.

O Mercosul, neste momento, enfrenta uma situação inversa. A rápida subida dos índices de inflação ajuda a desmascarar uma crise de relacionamento que até então parecia mais ou menos encoberta por frases de efeito de conversas diplomáticas.

A ação que desnudou a falta de entendimento dentro do bloco foi tomada pelo governo brasileiro, ao reduzir de forma unilateral em 10% as alíquotas de importação em 87% dos produtos que compõem o chamado universo tarifário.

A redução foi anunciada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, como medida de combate à inflação no Brasil, que deve chegar a 9,3% em 2021, segundo as estimativas mais recentes. A meta da inflação para este ano, é bom lembrar, é de 3,75%, com tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.

O problema é que a redução das alíquotas, adotada de maneira unilateral até o fim de 2022, deveria ter sido adotada de forma consensual pelo conjunto do Mercosul, pois elas estão previstas nas regras da Tarifa Externa Comum (TEC).

O governo brasileiro anunciou há poucas semanas um acordo com o argentino para a abertura da economia, mas não ocorreu uma decisão formal do bloco. Ou seja, o Brasil, para combater a inflação, de certa forma ignorou a regra de consenso adotada pelo Mercosul.

“A modernização do Mercosul passa também pela dimensão tarifária”, disse Guedes ao comentar a decisão. “É importante ter acesso e atenção às necessidades internas de forma a reduzir o custo de comida, de itens essenciais para a população brasileira”.

Reação

Ao noticiar a redução das alíquotas, o jornal El País, de Montevidéu, acusou o governo brasileiro de promover uma “ruptura” nas normas internas do bloco. Sem o consenso dos quatro integrantes, uma decisão como esta “fere” o Mercosul, na visão uruguaia.

Ao adotar uma postura unilateral, escreveu no principal diário de Montevidéu o articulista Pablo Fernández, o Brasil estaria deixando “caminho livre” ao Uruguai para negociar acordos de livre comércio com a China e outros países.

Até aqui, todos os acordos com países e blocos têm sido negociados em conjunto pelos quatro integrantes do Mercosul. O principal deles, ainda pendente de conclusão por causa de divergências na área ambiental, é com a União Europeia.

Adepto de maior abertura econômica, o Uruguai há anos defende a possibilidade de firmar acordos diretamente com outros países. A Argentina e o Brasil sempre resistiram, alegando que seria necessário manter a unidade do bloco. Até que o atual governo brasileiro passou a ver a possibilidade com mais simpatia.

Em setembro, o presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, disse ter recebido uma oferta formal da China para dar início a estudo de viabilidade de um possível futuro acordo de livre comércio entre os dois países. O tema é tão importante para o governo uruguaio que Lacalle convidou representantes de todos os partidos políticos para anunciar a aproximação com Pequim.

A disposição do Uruguai de buscar um voo solo nas negociações comerciais não tem sido bem recebida pelos argentinos. Em reunião de cúpula em que se celebraram os 30 anos do Mercosul, o tema chegou a motivar um momento de tensão.

Após ouvir Lacalle dizer que o bloco não poderia ser uma “carga” para o Uruguai, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, insinuou que os uruguaios poderiam deixar o bloco se não estivessem satisfeitos. “É mais fácil descer do barco se essa carga pesa muito”, afirmou.

Crise

Os dois já estiveram juntos desde então, tentando reduzir a tensão no relacionamento bilateral. Mas não chegaram a um consenso. E o Brasil, que poderia adotar uma posição de liderança no bloco, demonstra simpatia pela reivindicação uruguaia, mas não apresenta uma proposta para o futuro do Mercosul.

A difícil situação econômica dos dois maiores países do bloco também não ajuda. Se a inflação brasileira se aproxima dos 10% e causa ansiedade ao recordar as dificuldades dos tempos anteriores ao Plano Real, no país vizinho a alta inflação se tornou uma realidade permanente.

Nos doze meses até setembro a inflação argentina foi de 52,5%, tornando ainda mais difícil a vida de uma população já bastante afetada pelo desemprego e pelo alto nível de pobreza. O índice pode ser ainda maior em 2022, prejudicando as perspectivas eleitorais dos peronistas de Fernández.

Embora tenha concordado com a redução das alíquotas de importação sugerida pelo Brasil, com exceção de setores considerados estratégicos, o governo argentino não parece confiante de que a medida ajude a reduzir a inflação em seu próprio país.

A falta de perspectivas econômicas tem levado inclusive grandes empresários a buscar abrigo do outro lado do rio da Prata. Montevidéu tem sido vista por eles como um porto seguro, quando comparada à sempre agitada Buenos Aires.

Em reportagem sobre as eleições legislativas do próximo mês, o jornal londrino Financial Timesinforma que os líderes do mundo de negócios na Argentina estão “votando com seus pés”.

O bilionário do setor petrolífero Alejandro Bulgheroni e o “rei da soja” Gustavo Grobocopatel, informa o jornal, já vivem no Uruguai, “onde a economia é mais estável e o regime de impostos é mais amigável”.

Se a alta da inflação revelou o grau de desentendimento entre os integrantes do Mercosul, o futuro do bloco só começará a ficar claro depois das eleições presidenciais no Brasil, em 2022, e na Argentina, em 2023. Caberá à política buscar a convergência capaz de proporcionar um novo modelo para a integração regional.

Marcos Magalhães
Jornalista especializado em temas globais, com mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Southampton (Inglaterra), apresentou na TV Senado o programa Cidadania Mundo. Iniciou a carreira em 1982, como repórter da revista Veja para a região amazônica. Em Brasília, a partir de 1985, trabalhou nas sucursais de Jornal do Brasil, IstoÉ, Gazeta Mercantil, Manchete e Estado de S. Paulo, antes de ingressar na Comunicação Social do Senado, onde permaneceu até o fim de 2018. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ magmarcos@outlook.com