O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Chile: deixando de ser Suica para ser Venezuela? - Carlos Alberto Montaner

Grato a meu amigo Orlando Tambosi por exibir um artigo incontornável.
Estaremos assistindo ao fim do modelo chileno de crescimento?
Não era bem um modelo, por sinal, e sim simples bom senso: estimular os negócios privados, a concorrência, os investimentos estrangeiros, abertura comercial, boa governança, infraestrutura decente, baixa corrupção e burocracia funcional, enfim, trabalho duro, nada que seja estranho ao capitalismo de mercados livres.
Tudo isso vai acabar agora?
Parece que sim...
Paulo Roberto de Almeida 

Por que imitar a Venezuela, senhora Bachelet?

Melhor seria, escreve Carlos Alberto Montaner, imitar a Suiça. Mas, ao que parece, a presidente chilena Michelle Bachelet anda reavivando a "luta de classes". Segue o texto na íntegra:


La presidente chilena, Michelle Bachelet, quiere reducir la desigualdad. Me sospecho que se refiere a la desigualdad de resultados, que es la que mide el coeficiente Gini. Pero es posible que en su afán nivelador acabe desplumando a la gallina de los huevos de oro.

Corrado Gini fue un brillante estadístico italiano de principios del siglo XX, fascista en su juventud, quien, fiel a sus orígenes ideológicos, propenso a estabular a las personas en estamentos, dividió a la sociedad en quintiles y midió los niveles de ingresos que percibía cada 20%.

En su fórmula matemática, 0 correspondía a una sociedad en la que todos recibían la misma renta, y 100 a aquella en la que una persona acaparaba la totalidad de los ingresos. De su índice se colegía que las sociedades más justas eran las que se acercaban a 0, y las más injustas las que se aproximaban a 100.

Como suelen decir los brasileros, Gini tenía razón, pero poca, y la poca que tenía no servía de nada. Chile, de acuerdo con el Banco Mundial, tiene 52,1 de desigualdad (mejor que Brasil, Colombia y Panamá, por cierto), mientras Etiopía, la India y Mali andan por el 33. Es difícil creer que estos tres países son más justos que Chile.

Es verdad que los países escandinavos, los mejor organizados y ricos del planeta, se mueven en una franja entre 20 y 30, pero Kenia exhibe un honroso 29 que sólo demuestra que la poca riqueza que produce está menos mal repartida que la que muestra Sudáfrica con 63,1, uno de los peores guarismos del mundo.

Es una lástima que, pese a su experiencia como jefe de Gobierno, la señora Bachelet no haya advertido que su país logró ponerse a la cabeza de América Latina, y consiguió reducir la pobreza de un 45 a un 13%, no repartiendo sino creando riqueza.

Cuando la señora Bachelet examina a las sociedades escandinavas observa que hay en ellas un alto nivel de riqueza e igualdad junto a una tasa impositiva cercana al 50% del PIB y supone, equivocadamente, que los tres datos se encadenan. Incurre en unnon sequitur.

Sencillamente, no es cierto. La riqueza escandinava, como la de cualquier sociedad, se debe a la laboriosidad y la creatividad de todos los trabajadores dentro de las empresas, desde el presidente hasta el señor de la limpieza, pasando por los ejecutivos.

Supongo que ella entiende que sólo se crea riqueza en actividades que generan beneficio, ahorran, innovan e invierten. Es decir, en las empresas, de cualquier tamaño que sean.

¿Y por qué está mejor repartida la riqueza en Escandinavia que en Chile?

Los socialistas suelen pensar que es el resultado de la alta tasa impositiva, pero no es verdad. La falacia lógica parte de creer que la consecuencia se deriva de la premisa, cuando no es así. Sucede a la inversa: el alto gasto público es posible (aunque no sea conveniente) porque la sociedad segrega una gran cantidad de excedente.

Lo que genera la equidad en las sociedades prósperas y abiertas es la calidad de su aparato productivo. Si una sociedad fabrica maquinarias apreciadas, objetos con alto contenido tecnológico, medicinas valiosas y originales, o suministra servicios sofisticados por medio de su tejido empresarial, será recompensada por el mercado y podrá y tendrá que pagar a los trabajadores un salario sustancial, de acuerdo con sus calificaciones, para poder reclutarlos y competir.

Si Bachelet desea reducir la pobreza chilena y construir una sociedad más equitativa, no debe generar una atmósfera de lucha de clases y obstaculizar la labor de las empresas, sino todo lo contrario: debe facilitarla.

¿Cómo? Propiciando las inversiones nacionales y extranjeras con un clima económico y legal hospitalario; agilizando y simplificando los trámites burocráticos, incluida la solución de los inevitables conflictos; facilitando la entrada al mercado de los emprendedores; estimulando la investigación; creando infraestructuras (puertos marítimos y aéreos, carreteras, telefonía, electrificación, internet) que aceleren las transacciones; multiplicando el capital humano y cultivando la estabilidad institucional, la transparencia y lahonradez administrativa.

Es verdad que ese tipo de gobierno no gana titulares de periódicos ni el aplauso de la devastadora izquierda revolucionaria, pero logra multiplicar la riqueza, disminuye la pobreza y aumenta el porcentaje de la renta que recibe la clase trabajadora.

Lo dicho: ¿para qué imitar a Venezuela cuando se puede emular a Suiza? Casi nadie sabe quién es el presidente de Suiza, pero hacia ese país se abalanza el dinero cada vez que hay una crisis. Por algo será. (Libertad Digital).

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domingo, 11 de maio de 2014

Dinastias itamaratecas se revoltam! Quem seriam os jovens afoitos?

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Cláudio Humberto
Diário do Poder, 11/05/2014

O chanceler Luiz Alberto Figueiredo acalmou os ânimos de movimento, liderado por dois filhos de embaixadores, disposto a “resgatar” o “prestígio perdido” do Itamaraty, numa carta aberta criticando Dilma.

China: sem vontade de ser a maior economia do mundo (isso tem custos...)

China não quer posição de maior economia do mundo
Jamil Anderlini e David Pilling | 
Financial Times, de Pequim e Hong Kong, 2/05/2014

A China tentou durante um ano minar a informação de que deverá superar em 2014 os Estados Unidos como maior economia do mundo com base no poder de compra. A revelação foi feita por pessoas que ajudaram a compilar os dados de relatório divulgado nesta semana pelo Programa Internacional de Comparação, sob os auspícios do Banco Mundial. 
O documento afirma que "a Agência Nacional de Estatísticas da China manifestou dúvidas sobre alguns aspectos da metodologia". Pequim recusou-se a publicar o principal número relacionado à China e o relatório diz que Agência Nacional de Estatísticas "não endossa os resultados como estatísticas oficiais". Pessoas envolvidas na compilação dos dados, no entanto, afirmam que o desagrado a China com as constatações vai mais além. 
"Um ano atrás havia uma grande discussão. A China queria desistir de tudo. Eles não querem ser vistos como a maior economia. Eles temem as implicações políticas que isso terá com os EUA", diz uma fonte envolvida na preparação do relatório. "Eles imploraram e ameaçaram durante um ano inteiro... a China odeia esse relatório." 
O principal motivo da postura reservada da China é que os líderes não querem se expor à pressão internacional que ela passaria a sofrer se fosse considerada a maior economia do mundo, afirmam fontes familiarizadas com os pontos de vista das autoridades chinesas sobre o assunto. 
"Eles certamente não querem exagerar o tamanho da economia. Esta é uma questão sensível", diz Vinod Thomas, diretor-geral de avaliação independente do Banco de Desenvolvimento da Ásia, que participou a compilação das estatísticas chinesas para o relatório. "A resistência e a suscetibilidade não estão sendo demonstradas em público, mas nos bastidores elas existem". 

A imprensa estatal chinesa não mencionou as últimas estimativas. Pequim frequentemente rejeita as estimativas externas que mostram a China assumindo a posição de líder mundial em questões que vão das emissões de carbono ao uso de energia. Assumir o título de maior economia do mundo, mantido pelos EUA desde 1872, pode ser visto como a coroação de três décadas de crescimento econômico acelerado. Mas os líderes chineses estão cautelosos com a maior responsabilidade que isso acarretaria. "Em base per capita, a China ainda é um país pobre e por isso não quer ser solicitado a ter grande participação no cenário internacional - ao menos por enquanto", diz um assessor de planejadores econômicos chineses. 

Reformas política, fiscal e trabalhista voltam ao debate (Valor)

Reformas política, fiscal e trabalhista voltam ao debate
De São Paulo.Valor 02/05/2014
Especial.Rumos da Economia. 

As reformas estruturais - política, tributária, trabalhista e da Previdência- também precisam ganhar espaço "real" na agenda de 2015 ou no pós-2015, segundo avaliação de alguns executivos com quem o Valor conversou. Para Joesley Batista, presidente da holding J&F, passou da hora de o país implementar de uma vez por todas as reformas estruturais necessárias para melhorar o ambiente de negócios e destravar seu crescimento. "São os velhos gargalos de sempre que precisam ser atacados, sobretudo as reformas política, tributária e trabalhista", diz o empresário. 
Para Batista, a reforma política, entre outros objetivos, precisa reduzir o número de partidos. Na tributária, ele defende um sistema mais simples e objetivo (um exemplo é a antiga CPMF), enquanto na questão trabalhista, prega amadurecimento. "Quando a JBS comprou a Seara herdou 7 mil causas trabalhistas, um número que não tem cabimento", argumenta. A necessidade de uma reformulação nessa área é reforçada pelo CEO da Vanguarda Agro, Arlindo Moura. "É preciso leis específicas para o trabalhador rural, tal como existe nos EUA e na Europa", afirma ele. 
"Apesar de necessária já há algum tempo, a reforma política tornou-se uma agenda obrigatória para 2015, qualquer que seja o nosso governante. As manifestações que tomaram conta do país recentemente deixaram evidente essa necessidade. Além disso, outra reforma prioritária é a fiscal. Uma reforma que otimize a administração de impostos e reduza a carga tributária", diz Marcelino Rafart de Seras, presidente da EcoRodovias. Como terceira prioridade, junto com as reformas, ele cita o incentivo aos investimentos em infraestrutura, por meio de novos programas de concessões e financiamentos como os do BNDES. 
Para o presidente da WEG, Harry Schemelzer Jr., o próprio governo deve capitanear as reformas da Previdência, tributária e trabalhista. "Não é só querer fazer, mas liderar um movimento para que elas saiam do papel", afirma. Essas reformas, diz, vão tornar o país mais competitivo, na medida que reduzem a carga de impostos e simplificam o sistema trabalhista, com revisão e flexibilização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). 
O presidente da WEG também aponta a importância de continuar com a desoneração da folha de pagamentos e a retomada do Reintegra, instrumento que torna as exportações do país mais competitivas. Resolvido isso, diz, o crescimento da economia favorece soluções para demais questões, como educação, saúde e transportes. 
Na visão de Paolo Dal Pino, presidente da Pirelli Pneus, um ponto muito importante na agenda do novo governante será a não adoção de medidas que reforcem um ambiente de incertezas no país. "Será fundamental controlar os riscos empresariais para recriar a confiança dos investidores, em especial do capital internacional." Para ele, isso pode ser alcançado com planos de governo claros, soluções de longo prazo, transparência absoluta e diálogo aberto com a sociedade. 

Uma outra prioridade, ao seu ver, será desenvolver programas de investimentos em projetos de infraestrutura. "Temos de melhorar as condições logísticas de rodovias, aeroportos, ampliar ferrovias e dos portos para trazer maior competitividade às indústrias." 
(Colaboraram Chiara Quintão, Claudia Facchini, Cynthia Malta, Denise Neumann, Eduardo Laguna, Fabiana Batista, Fernando Lopes, Luiz Henrique Mendes, Ivo Ribeiro, João Rosa, Mariana Caetano, Sergio Bueno, Vanessa Dezem) 
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Concessões devem ter mais ênfase
Raymundo Costa e Ribamar Oliveira | De Brasília
Valor 02.05.14.Especial.Rumos da Economia 

Dilma Rousseff: proposta tem como base retomada do crescimento global 
Há dois programas de governo para um eventual segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, em gestação no PT, em gabinetes do Palácio do Planalto e do Instituto Lula. O primeiro é genérico, como convém a uma campanha eleitoral. O segundo contém as ações concretas a serem adotadas já nos primeiros dias de 2015, sobretudo na economia, se Dilma vencer a eleição. 
Caso confirme seu favoritismo nas urnas, Dilma planeja utilizar, de forma mais ampla e decidida, as concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. O fortalecimento da parceria do governo com o setor privado para a recuperação e desenvolvimento da infraestrutura do país será uma das marcas do futuro governo petista, segundo apurou o Valor
Dilma também vai propor uma nova regra para o reajuste anual do salário mínimo, atualmente calculado com base numa fórmula que combina a variação da inflação com o crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB). A presidente pretende preservar um ganho real para o mínimo a partir de 2016, mas sem a vinculação ao PIB. 
Ao contrário dos presidenciáveis do PSDB, Aécio Neves, e do PSB, Eduardo Campos, seus principais adversários na eleição de 5 de outubro, Dilma não aceitará instituir a independência do Banco Central por meio de lei aprovada pelo Congresso. Na agenda também está a reforma tributária com a retomada da discussão, entre outras coisas, da reforma do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A ideia geral, nessa área, é onerar menos a produção e os salários. A discussão sobre o financiamento da saúde, que perdeu cerca de R$ 40 bilhões anuais com o fim da CPMF, deve ser restabelecida com o Congresso. Outra decisão já tomada é a recuperação gradual das tarifas de energia elétrica e dos combustíveis, que estão defasadas. 
No campo político, o governo, por meio do PT, pretende aprovar o financiamento público das campanhas e o recurso a instrumentos de consulta direta à população. Na prática, isso significa a convocação mais frequente de plebiscitos para avançar em assuntos sobre os quais o Congresso não consegue se definir. A Constituinte exclusiva para a reforma política, proposta que surgiu em meio aos protestos de junho, deve ser um item do programa. O projeto de regulação da mídia, cujo texto foi elaborado no governo Lula e deixado de lado por decisão de Dilma, deve voltar com força em eventual segundo mandato. 
O programa de governo de Dilma a ser registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) será redigido pelo assessor especial da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia. Seu título provisório é "Continuidade com Mudanças". O artesão do programa com as medidas econômicas que Dilma planeja executar no segundo mandato é o economista Nelson Barbosa, ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda. 
As duas peças recebem contribuições de nomes como Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central, e do ex-ministro Delfim Netto, dois frequentes interlocutores de Lula. A Fundação Perseu Abramo, vinculada ao PT, também participa dos estudos, sob a coordenação de seu presidente, Marcio Pochmann. As diretrizes para a elaboração do programa de campanha serão apresentadas em encontro nacional do PT marcado para os dias 2 e 3 de maio, com a presença da presidente Dilma e do ex-presidente Lula, em São Paulo. 
A própria presidente deu pistas do que pretende fazer no segundo mandato, ao encaminhar ao Congresso o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2015. Ao se comprometer com um piso de 2% do PIB para o superávit primário do setor público, Dilma sinaliza que sua política fiscal não será expansionista, como ocorreu em quase todos os anos do seu primeiro mandato, e que ela será compatível com a manutenção da trajetória de queda da dívida pública líquida em proporção do PIB. Com uma política fiscal tendente à neutralidade, o BC teria menor dificuldade de executar uma política monetária voltada ao combate à inflação, que deverá terminar este ano próxima ao teto do intervalo de tolerância, que é de 6,5%. 
Todo o programa de governo para o segundo mandato de Dilma Rousseff está sendo elaborado com base na análise de que a crise financeira internacional, que se abateu sobre o mundo a partir de 2007, chegou ao fim e as economias dos países mais desenvolvidos, capitaneados pelos Estados Unidos, crescerão em ritmo mais forte. 
Ao pegar "carona" nessa retomada do crescimento mundial, o Brasil pode melhorar a situação de suas contas externas, com o aumento de seu saldo comercial. O país teria, também, melhores condições de equilibrar as contas públicas e elevar os investimentos, pois as receitas tributárias tendem a aumentar com um crescimento mais robusto da economia. 
A confiança no melhor desempenho da economia é que leva os estrategistas de Dilma a prever mais investimentos em saúde, educação e transporte público urbano, o eixo das manifestações de junho de 2013, uma explosão popular que levou PT e governo a prestar mais atenção às ruas. O PT reconhece que dois terços da população querem, de fato, mudanças, como apontam as pesquisas de opinião. Mas está certo de que é o agentes dessa mudança. A prova dos nove será no dia 5 de outubro. 

Empresarios pragmaticos, nao querem enfrentar o governo; so ajustes, ou mudancas mais profundas

Não há nenhuma chance de uma "fronda empresarial" como venho pregando, e isso porque os empresários não pretendem enfrentar o governo.
Ou são acomodados, ou não conhecem a sua força.
Podem também ser oportunistas, e preferir uma acomodação, com facilidades setoriais, em lugar de se unirem para construir um país decente...
Paulo Roberto de Almeida

Empresários querem agenda com foco na produtividade
Valor Econômico, De São Paulo 02/05/2014
Especial Rumos da Economia. 

Uma velha ideia nova apareceu com força nas conversas do Valor com 20 empresários de diferentes áreas sobre a agenda prioritária de 2015 - a necessidade de um programa de governo que permita ao país alcançar ganhos de produtividade. Ausente do debate político - porque parece vaga para ganhar votos nas ruas -, a produtividade surge como ideia chave para o Brasil enfrentar desafios que cresceram no pós-crise. E na visão dos empresários, ela passa pelo aumento do investimento com ênfase na infraestrutura, por um Estado mais enxuto e eficiente e por foco na educação. 
Representando um consenso entre os executivos, Cledorvino Belini, presidente da Fiat Chrysler para a América Latina, pontua que a agenda dos próximos anos começa na herança dos últimos governos. "Quando colocamos em perspectiva o legado dos governos democraticamente eleitos que se sucederam no Brasil nas últimas décadas, têm lugar de destaque a estabilização da economia e o avanço da inclusão social", diz ele. "Além do compromisso de preservar conquistas, o próximo governo assume com o desafio de fechar o círculo virtuoso de modernização do país, adotando medidas que assegurem o urgente e necessário avanço da produtividade", acrescenta o presidente da Fiat. 

Como o país não pode mais crescer pela incorporação de mão de obra, precisa fazê-lo pelo aumento da eficiência das empresas e do governo, pondera Belini, lembrando que isso não será possível sem ações de modernização e ampliação da infraestrutura. 
"A infraestrutura no Brasil, seja ela pública ou privada, anda emperrada", concorda o diretor-presidente da Alpargatas, Márcio Utsch, listando o custo da energia e políticas mal desenhadas, como a desoneração da folha de salários, como situações que travaram o desenvolvimento do país. Por isso, para ele, "a principal agenda para 2015 é o investimento", que passa pelos projetos públicos e pelo fomento do governo ao investimento privado. Sua agenda se completa com foco na educação (em que "não basta ter um monte de faculdades") e valorização das pessoas. "Temos que nos indignar com os crimes na porta de nossas casas e não aceitar a impunidade", diz ele. 
Um plano efetivo de investimentos em projetos de infraestrutura deve ser uma das prioridades na gestão do novo governo do Brasil, diz Harry Schmelzer Jr., presidente da fabricante de equipamentos elétricos WEG. Para o executivo, se o governo não dispõe de recursos, precisa criar as condições para atrair investidores. Ao mesmo tempo, o governo deve contemplar nesse plano instrumentos que favoreçam a indústria brasileira, de forma a atender a demanda que será gerada por um programa amplo voltado ao setor de infraestrutura. 
A agenda de dois executivos da área farmacêutica - os presidentes da Eli Lilly no Brasil, Julio Gay-Ger, e da Novartis, Adib Jacob, combina inovação e infraestrutura, entre outros temas. "Quando um país apresenta uma infraestrutura pouco desenvolvida, os produtos podem encarecer no mercado interno, prejudicando os consumidores, e no mercado externo, dificultando as exportações", observa Gay-Ger. "É preciso fomentar a geração de maior valor agregado no PIB, estimulando a inovação tecnológica nas esferas acadêmica e corporativa", sugere Jacob. Ele propõe que isso ocorra por meio de maiores investimentos e estímulos tributários para a produção científica de inovação no Brasil. 
Atuando em um setor em que os investimentos nos últimos anos foram afetados por mudanças de regras, o presidente da AES Brasil, Britaldo Soares, diz que é preciso dar agilidade e segurança aos processos de licenciamento e maior clareza e estabilidade aos marcos regulatórios setoriais, além de "fomentar a competitividade, inovação e aumento das produtividade no longo prazo". 
Na opinião de Arlindo Moura, CEO da Vanguarda Agro, uma das principais produtoras de grãos e fibras do país, a infraestrutura de transporte deve estar na agenda prioritária de 2015. "Houve avanços no planejamento, mas agora as coisas precisam sair do papel", diz. O diretor presidente da Merial no Brasil, Jorge Espanha, também acredita que o investimento em infraestrutura deve estar no topo da lista. Segundo ele, o ciclo de crescimento focado no consumo foi importante, mas evidenciou o gargalo da infraestrutura, que afeta o agronegócio. "O Brasil já é um celeiro, mas precisa conseguir escoar sua produção de grãos e proteína animal", afirma o executivo. 
"Esse país tem seus fundamentos muito sólidos. Não temos nenhuma razão para ficar temerosos", disse, em evento recente do Valor, o presidente do conselho da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, Abilio Diniz. De acordo com ele, os empresários precisam ir além das queixas. "Além de ficarmos nos queixando do governo - e temos razão para exigir mais -, temos que pensar o que podemos fazer, e nesse momento é preciso aumentar a produtividade". 
Uma mudança na condução da política econômica também é necessária na visão de Fabio Hering, diretor-presidente da Cia Hering. Embora defenda investimentos em infraestrutura, ele acredita que não há esgotamento do modelo da última década. "Acreditamos muito no potencial de consumo do mercado nacional. O necessário para um crescimento maior, agora, são alguns ajustes. O que tivemos foi um começo e não o fim de algo", pondera, concordando com a tese de mudanças que preservem conquistas dos últimos governos. E uma delas, deve ser o controle da inflação. "Sou afetado por aumento dos juros, mas não controlar a inflação é muito pior do que uma taxa elevada", afirma, deixando clara sua prioridade. 
Meyer Nigri, diretor-presidente da Tecnisa, também avalia que quem ganhar as eleições precisará fazer ajustes na economia. E para ele, o trade-off entre crescimento, emprego e inflação é dos mais complicados. "Acho que é preferível um pouco de inflação com crescimento, do que inflação mais baixa sem crescimento", diz ele, acrescentando, contudo, que nesse momento, contudo, o Brasil não tem pouca, mas muita inflação.
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Para executivos, Estado deve ser eficiente e enxuto
Valor De São Paulo 02.05.14
Especial.Rumos da Economia. 

Os empresários querem um Estado mais enxuto e mais eficiente. Eles estão menos preocupados em defender um número mágico para o superávit primário e mais interessados em medidas que permitam, via eficiência do setor público, reduzir a carga tributária. O presidente do conselho de administração do grupo Gerdau, Jorge Gerdau Johannpeter, defendeu recentemente um corte drástico no número de ministérios para melhorar os níveis de eficiência do futuro governo. Na opinião dele, seis seriam suficientes, incluindo as pastas que cuidam das áreas econômica e social, da segurança, de relações internacionais e articulação política. "Gosto de trabalhar com utopias porque construí minha vida sonhando com utopias e de repente elas acontecem", afirmou, em Porto Alegre, durante o 27º Fórum da Liberdade. 
Ele não é o único que sonha com uma Esplanada menor. Fábio Barbosa, do grupo Abril, defende que a melhora fiscal passa por uma reforma administrativa, com redução no número de ministérios. "O governo precisa parar de gastar tanto com a estrutura administrativa, pois arrecada bastante e não sobra dinheiro para fazer investimentos. É é preciso mais investimentos em infraestrutura, educação e saúde", faz coro Meyer Nigri, diretor-presidente da Tecnisa. 

Para o presidente-executivo do Conselho da MRV, Rubens Menin, o maior problema do Brasil hoje é a eficiência do Estado. "Temos de medir e gerenciar a eficiência do Estado, independentemente de quem seja o vencedor das eleições. Fala-se da redução da carga tributária, mas isso só será possível se o governo gastar menos e melhor", argumenta ele, acrescentando que isso passa pela desburocratização. "No setor de construção civil, a burocracia corresponde a 12% do custo total e a obtenção de licenças para uma obra leva de 24 a 30 meses. O Brasil ficou prisioneiro da burocracia", resume. 
Para melhorar a gestão fiscal, o presidente da Positivo Informática, Hélio Rotenberg, defende um controle total dos gastos públicos, com redução dos gastos de custeio e aumento dos investimentos. Além desse controle, ele diz que é preciso planejar o futuro do país, definindo as áreas em que o Brasil quer ser forte e os investimentos necessários para isso. "E a área prioritária é a educação", afirma. 
Para Marcio Utsch, da Alpargatas, o país precisa "perseguir o superávit fiscal para poder pensar no resto". Ele avalia que a Lei de Responsabilidade Fiscal deve ser obedecida, sem subterfúgios. "Temos que limitar o gasto com pessoal para os governantes nas três esferas governamentais (municipal, estatual e federal)", defende. 
O presidente da Anfavea, Luiz Moan, reconhece que "não há espaço para muitas mudanças no campo fiscal". Mesmo assim, defende que é preciso reduzir a carga tributária, o que não significa perda de arrecadação, segundo ele. "Experiências recentes mostram que o governo pode reduzir impostos e, ainda assim, arrecadar mais porque a desoneração leva ao aumento do consumo", pondera. 
Na avaliação de Cristiano Melles, presidente da Associação Brasileira de Restaurantes, entre as prioridades do novo governo devem estar um superávit fiscal primário de 3%, o restabelecimento da confiança nas informações econômicas oficiais com o fim de qualquer "criatividade contábil" e uma reforma previdenciária. 
Um problema fiscal a ser enfrentado é a desoneração da folha de pagamentos. Criticada pelo presidente da Alpargatas, ela é defendida, entre outros, por Harry Schmerzer Jr, da WEG, e Paolo Dal Pino, da Pirelli Pneus. 

2015, o ano do ajuste (qualquer que seja o governo) - Claudia Safatle

A urgência do ajuste
Claudia Safatle | De Brasília.
Valor Econômico, 02/05/2014
Especial.Rumos da Economia. 

Com o ano de 2014 congelado pelas eleições presidenciais de outubro, todos os olhares se voltam para 2015. 
O estoque de decisões adiadas para o próximo ano, para não comprometer a campanha pela reeleição de Dilma Rousseff, se avoluma. Forma-se o entendimento de que o próximo presidente da República terá que enfrentar um duro ajuste. Não há indícios de que haverá maior crescimento econômico, expansão da taxa de investimento, queda da inflação em direção à meta e redução da taxa de juros em um futuro próximo. Ao contrário. 2015 deve ser o ano de preparação do país para a retomada, no período seguinte, de uma maior taxa de crescimento, objetivo final de qualquer governo. 

Diante da incerteza sobre quem será vitorioso nas eleições de outubro, abrem-se pelo menos duas vertentes de possibilidades na economia: com Dilma Rousseff reeleita ou com a vitória de um dos candidatos da oposição - Aécio Neves, do PSDB, ou Eduardo Campos, do PSB. 

No primeiro caso, prevalece o receio de que a presidente "dobre a aposta" na forma e no conteúdo do seu primeiro mandato, mas não é prudente desconsiderar a hipótese de que Dilma mudou e continuará mudando em direção a uma gestão mais amigável ao setor privado. Seu governo tende a ser "gradualista" na solução dos problemas. O grande desafio da presidente será recuperar a confiança dos agentes econômicos. 
Já os candidatos da oposição têm emitido sinais de que optariam por um "tratamento de choque" que se traduziria, por exemplo, em uma solução definitiva e mais rápida para a correção dos preços represados (combustíveis, energia e transportes urbanos). No gradualismo, os preços seriam corrigidos um pouco a cada ano, até eliminar a defasagem. 
Se há algum consenso entre os economistas de todos os matizes, é na política fiscal. Tanto os que são próximos ao governo quanto os de oposição focam na deterioração das condições fiscais nos últimos três anos como um dos pontos prioritários a serem atacados em 2015. 
O gasto público crescente acompanhado de aumento modesto das receitas minou a capacidade de produção de superávit primário. O saldo das contas públicas, que no primeiro ano do governo Dilma foi de 3,11% do PIB, no ano passado caiu para 1,9% do PIB, percentual que se repete como meta para este ano. 
O aspecto mais delicado do processo de corrosão fiscal, porém, está na taxa implícita de juros da dívida, hoje de cerca de 19% ao ano, embora a Selic seja de 11% e tenha caído para 7,25% sem, no entanto, reduzir o custo da dívida pública. 
Os juros implícitos resultam da diferença entre as taxas pagas sobre os passivos do setor público (Selic) e as que remuneram os ativos, bem mais baixas e que incidem sobre as reservas cambiais e os créditos do BNDES. 
O BNDES foi pródigo na concessão de crédito em nome de uma suposta política de criação de "campeões nacionais" e para sustentar a atividade econômica. Os empréstimos do banco subiram de 1,2% do PIB em 2008 para 8,6% do PIB em 2013. Para aliviar a dívida dos altos juros será crucial um cronograma de desmobilização de recursos da União para o BNDES. 
Foi pela piora da situação das contas públicas que o país sofreu o rebaixamento do "rating" de grau de investimento pela agência Standard & Poor's. 
Economistas que apoiam candidatos da oposição já começaram a alinhavar medidas que podem ser tomadas em janeiro de 2015, caso sejam eleitos, para recolocar a gestão fiscal nos trilhos. Cogita-se da suspensão das desonerações da folha de salários à elevação de impostos como, por exemplo, a Cide-Combustíveis. O próprio governo admite que as desonerações da folha não deram os resultados imaginados e deve reduzir o seu alcance, se reeleito. 
Com uma política fiscal mais eficaz, tira-se o peso do combate à inflação hoje nas costas do Banco Central. Mesmo assim, não é seguro que o país escape de uma nova rodada de elevação da taxa Selic a partir de janeiro do ano que vem. O BC acredita que entregará, ao fim deste ano, a inflação abaixo do teto de 6,5%. Para 2015 as expectativas do mercado são de uma variação de 6,3% do IPCA, taxa ainda distante da meta de 4,5%. Após quase 20 anos do Plano Real, a inflação continua a atormentar a vida do país. Nos doze anos de gestão do PT não foi dado um só passo para reduzir a meta rumo a uma taxa neutra. 
Uma inversão de objetivos marcou o governo Dilma Rousseff. Imaginava-se que a redução dos juros levaria à expansão automática dos investimentos, aumentando a oferta de bens e serviços. Com isso a inflação, fruto do descasamento entre a oferta e o consumo, estaria domada. As coisas não funcionaram como o Palácio do Planalto previa, porque juros por si só não determinam o investimento. 
Tudo conspirou para o governo abandonar a discussão ideológica estéril e retomar as privatizações, mediante contratos de concessão. Parte relevante das obras de infraestrutura do país foi ou será licitada. Rodovias e aeroportos avançaram. Portos e ferrovias ainda não. 
Assessores de Dilma começam, agora, a rascunhar uma "agenda de transição" deste para o eventual segundo mandato. Dentre as medidas elencadas consta a limitação do gasto público por lei, iniciativa que também faz parte da agenda de outros candidatos. Outras três medidas da lista já poderiam ter sido tomadas há anos, que são regras mais restritivas de acesso ao seguro-desemprego, ao abono salarial e às pensões por morte - cujos gastos crescem em progressões geométricas. 
São medidas necessárias, mas insuficientes para dar um novo arranjo à política fiscal e melhorar as condições de competitividade da economia brasileira. Conforme o resultado das urnas, serão retomadas a reforma da Previdência, com o estabelecimento de idade mínima para aposentadoria, e a flexibilização das regras que atam o mercado de trabalho, sobretudo no tocante à primazia do que é negociado entre patrões e empregados sobre a legislação. 
Do lado externo, a situação do balanço de pagamentos toma rumo inquietante. Apesar da desvalorização do real, dificilmente a balança comercial terá saldo positivo este ano. O déficit nas transações correntes com outros países é de US$ 25,186 bilhões desde o início do ano e deve encerrar 2014 na casa de US$ 80 bilhões. Em 12 meses até março a diferença entre o que país gastou e o que recebeu em decorrência de transações internacionais (comércio, serviços e outros) alcançou US$ 81,556 bilhões, o equivalente a 3,64% do Produto Interno Bruto (PIB). 
A desvalorização de 2013 conteve a escalada de aumento do déficit. A perspectiva de a recente valorização se mostrar duradoura, no entanto, pode interromper ou mesmo reverter o sinal. 
Os investimentos estrangeiros diretos financiam, hoje, cerca de 80% do déficit. Os outros 20%, que representam cerca de R$ 20 bilhões, são cobertos por investimentos financeiros que entram no país atraídos pela taxa de juros. Ficar dependente de capitais voláteis pode não ser uma boa estratégia quando se sabe que em algum momento haverá uma elevação da taxa de juros americana. 
Por estilo e personalidade, a presidente também deixou marcas e rachaduras no microgereciamento de seu governo, ao interferir em preços importantes da economia. 
O exemplo mais dramático da microgestão está na política energética, dos combustíveis à energia elétrica. A defasagem dos preços da gasolina, porém, é apenas uma fração dos danos produzidos na Petrobras, empresa envolvida em suspeitas de corrupção e negócios deletérios durante o governo Lula. 
Na área de energia elétrica, as contas não param de chegar. O represamento dos preços da energia, após a redução de tarifas em 2013, já custou quase R$ 10 bilhões no ano passado em recursos do Tesouro Nacional para a CDE. Recursos que terão que ser devolvidos à União pelo aumento da conta de luz dos consumidores nos próximos quatro anos. 
As despesas referentes a este ano começaram com o empréstimo bancário de R$ 11,2 bilhões para a Câmara Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), mas devem superar esse valor e também serão pagas pelos consumidores. 
Os aumentos de até 29% concedidos nas últimas semanas para as tarifas de energia não têm relação com o acionamento das usinas térmicas. São aumentos de preços gerados pela desvalorização da taxa de câmbio dos últimos doze meses, que afeta a energia de Itaipu; e pelos contratos antigos das distribuidoras que foram substituídos por energia negociada em leilão de 2008, basicamente de térmicas. Substituiu-se, assim, contratos baratos do passado por outros mais caros. 
Adiciona-se a esse quadro geral do setor, o fato de os reservatórios chegarem ao fim de novembro deste ano - quando volta a chover - no nível mais baixo da história, deixando para 2015 o risco de racionamento. 
O modelo de exploração do petróleo do pré-sal, herança do governo Lula, ao substituir o regime de concessões pelo sistema de partilha - pelo qual a participação da Petrobras é de 30% em cada poço - criou um compromisso para a estatal incompatível com a política de preços determinada pelo governo federal. O Palácio do Planalto fez alguns ensaios de mudança na partilha que não vingaram. O futuro da Petrobras, hoje, é uma incógnita. A companhia, que chegou a ser cotada no mercado a R$ 472 bilhões em maio de 2008, hoje vale cerca de R$ 180 bilhões. 
Para os estudiosos da economia brasileira, porém, não basta só fazer de 2015 um ano de "ajustes" e de "transição" para melhores políticas fiscal, monetária e de preços, dentre outras. É preciso cuidar da política. Esgota-se o modelo do "presidencialismo de coalizão", calçado na aliança entre o governo e uma base aliada forjada em numerosos partidos fracos, pouco representativos, e sem um projeto coerente de política econômica. 

Politica economica companheira: deterioracao das contas fiscais - Ribamar Oliveira (Valor)

Não há mais "gordura" para queimar na área fiscal

Ribamar Oliveira | Brasília
Valor Econômico, 02/05/2014
Brasil

Como os treinadores de futebol, que lutam para acumular pontos no início de um campeonato, os governos também costumam fazer superávit primário mais elevado no início do ano, pois as despesas são maiores no segundo semestre. Em ambos os casos, a ideia é fazer uma "gordura" no início para poder queimar quando as dificuldades aparecerem. O governo não está adotando essa estratégica neste ano. 
Alguns podem lembrar que isso também não ocorreu em 2013. É verdade. Mas, no ano passado houve um componente atípico, pois 57,6% do superávit primário do governo central (Tesouro, Previdência e BC) foram feitos nos meses de novembro e dezembro. Nos últimos dois meses de 2013, o governo obteve receita extraordinária superior a R$ 35 bilhões e, com isso, garantiu a meta de superávit primário. Sem essa receita extra, a meta não teria sido cumprida. 
Não há notícia de que uma receita extraordinária na dimensão da ocorrida no ano passado vá ingressar nos cofres do Tesouro Nacional em novembro e dezembro deste ano. Por essa razão, seria prudente que o governo federal fizesse um superávit primário mensal médio maior do que fez em 2013. Mas o que está acontecendo é o oposto. 
No primeiro trimestre de 2014, o superávit do governo central foi de apenas R$ 12,3 bilhões ou 1,02% do Produto Interno Bruto (PIB) do período - é o menor da série histórica desde 1999, em proporção do PIB. No ano passado, o superávit acumulado de janeiro a março ficou em R$ 20 bilhões, ou 1,79% do PIB e, em 2012, em R$ 33 bilhões ou 3,22% do PIB. 
São os Estados e municípios que estão sustentando, até agora, um nível mínimo para a meta fiscal. De janeiro a março, eles acumularam um superávit de R$ 13,2 bilhões, ou 1,09% do PIB do período. Mesmo com esse excelente resultado, o superávit primário de todo o setor público acumulado no primeiro trimestre ficou em 2,12% do PIB - o menor para o primeiro trimestre do ano em todo o governo da presidente Dilma Rousseff. 
Em março, no entanto, o resultado de Estados e municípios começou a fraquejar, quando eles registraram um superávit de apenas R$ 482 milhões (sem considerar suas estatais), o menor para o mês desde 2000. 
Em janeiro e fevereiro, o superávit dos governos estaduais e das prefeituras bateu recorde por causa das grandes transferências de recursos feitas pela União nesses dois meses. Parte dessa receita transferida era devida em 2013 e foi postergada para 2014, como é o caso do auxílio financeiro decorrente da chamada Lei Kandir e a quantia devida a eles pela arrecadação extraordinária do parcelamento de débitos tributários, que ingressou nos cofres do Tesouro em novembro e dezembro. 

A meta fiscal do governo central no primeiro quadrimestre deste ano é de R$ 28 bilhões. Para obtê-la, o governo central terá que fazer um superávit primário de R$ 15,7 bilhões em abril, ou seja, um resultado maior do que o registrado no acumulado dos primeiros três meses do ano. É possível que isso ocorra, pois abril é um mês em que se registra uma receita muito forte do Imposto de Renda. 
Há também, no entanto, despesas extraordinárias, que não ocorreram no ano passado, como a transferência de recursos do Tesouro para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e um repasse de R$ 1,5 bilhão para os municípios, que foi acertado no ano passado pela presidente Dilma. Neste último caso, o repasse é uma despesa para a União, mas ajudará a melhorar o superávit de Estados e municípios. 
Os números fiscais mostram que o governo está operando no limite, na linha d'água. Não há "gordura" para queimar e qualquer dificuldade adicional do lado das despesas, ou uma frustração maior da receita, poderá comprometer a meta fiscal deste ano. 
O problema maior é que a receita tributária está crescendo em ritmo mais lento do que o projetado pelo governo. De janeiro a março, a arrecadação de impostos aumentou apenas 7%, em termos nominais, em comparação com igual período de 2013. A receita de contribuições cresceu menos, apenas 6,3%. A previsão oficial é de crescimento de 8,3% da receita com impostos e contribuições neste ano. 

Para piorar o quadro, os gastos públicos estão aumentando em ritmo superior ao do crescimento da economia. No primeiro trimestre deste ano, as despesas do Tesouro aumentaram 10,8% acima da variação nominal do PIB, na comparação com o mesmo período de 2013, segundo a Secretaria do Tesouro Nacional. 

Politica Economica: metas de inflacao dividem economistas (Valor)

Debate sobre centro da meta de inflação divide economistas
Vanessa Jurgenfeld | De São Paulo
Valor Econômico, 02/05/2014

O aumento da inflação e a discussão em torno da importância ou não do cumprimento do centro da meta do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ocorrem a poucos dias de o regime de metas de inflação completar 15 anos no Brasil. Em meio ao debate sobre o avanço dos preços e da leniência ou não do governo no combate à sua aceleração, economistas passaram a levantar a necessidade de alterações no regime implantado em junho de 1999. 

Alguns acreditam que o regime de metas deveria se tornar mais "rígido" no país, de forma que a política econômica passasse a mirar e a atingir o centro da meta (4,5%), sem flexibilizações em torno do teto, de 6,5%. Isso mostraria a não negligência do governo em relação ao avanço da inflação. Outros economistas têm defendido que seria melhor ter uma meta mais alta e de médio prazo que se cumpra do que uma de curto prazo (1 ano), como a atual, e que poderá não ser cumprida, como indicam expectativas para este ano, segundo a mais recente pesquisa Focus. E há ainda neste debate os economistas mais críticos que acreditam que é preciso buscar alternativas ao regime, que não trouxe respostas de crescimento como o esperado. 
"É melhor ter meta maior e que você sabe que vai cumprir do que ter uma meta só para inglês ver. Do jeito que está hoje, é só para inglês ver", diz o economista José Luis Oreiro, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),. Ele tem sugerido a adoção de uma meta de três anos, de 5% ao ano, com uma banda que caia ao longo do tempo, de dois pontos percentuais (como é hoje) para um ponto. Isso mudaria o sistema atual, cuja meta é definida para ser cumprida no ano-calendário (em 12 meses). "Ao adotar uma meta de médio prazo, o governo voltaria a ter credibilidade sem perder flexibilidade", diz. "Ficaria numa situação melhor com o mercado financeiro, porque está dizendo que vai reduzir a inflação e em qual prazo vai fazer isso. Do jeito que o sistema está, todo mundo sabe que convergir a inflação para o centro da meta em um ano é impossível". 

Entre economistas de linha ortodoxa, além da defesa de que o governo mire o centro da meta, há argumentos para que esse valor, inclusive, caia. "Defendo em algum momento futuro a redução da meta central de 4,5% para 4% e o recuo do intervalo de variação da banda para 1 ponto percentual", propõe, entre outras mudanças, Eduardo Velho, economista da Invx Global Partners, e que estava na equipe do governo quando o regime foi implantado. 
O economista da FGV/Ibre, Renato Fragelli, também sustenta que o governo passe a cumprir o centro da meta, de 4,5%. Mas somente após isso ser conseguido de fato é que defende que a meta seja reduzida. "Vejo economistas sugerirem uma redução de 4,5% para 2,5% ou 3%. Tenho a opinião de que antes de pensarmos em reduzir a meta temos que passar três anos a cumprindo. Seria precipitado diminuir rapidamente. Isso iria desmoralizar mais ainda. Não podemos ser mais realistas do que o rei", destacou. "Também é irrealista tentar inflação muito baixa sem antes resolver problemas fiscais que países que têm inflação realmente baixa enfrentaram". 
O Brasil adotou esse regime após observar outras experiências consideradas bem-sucedidas por alguns economistas, como a da Nova Zelândia. Muitos economistas defendiam à época que, após contemplar a meta de 4,5%, o país deveria na verdade conseguir trazer a inflação para 3%, em nível parecido a de outros países, considerados por esses economistas em melhor patamar de desenvolvimento econômico. Por trás dessa ideia estaria a interpretação de que a meta de 4,5% seria alta demais para se tornar permanente porque, na corrente ortodoxa, quanto mais baixa inflação, melhor para o crescimento econômico do país. 
A meta de 4,5% está em vigor desde 2006. Em 15 anos de regime, em apenas cinco anos o país cumpriu ou o centro da meta ou conseguiu deixar a inflação abaixo disso (anos 2000, 2004, 2006, 2007 e 2009). Em duas ocasiões (2003 e 2004), houve uma "Carta Aberta", em que o governo decidia por uma revisão da meta para cima, por indicações de que a taxa prevista não seria alcançada. 
Além das diferenças sobre onde deveria ser colocada a meta, e se há problemas ou não em se atingir o centro ou apenas ficar dentro da banda, e se o país deveria ter meta mais de longo prazo, há economistas que levantam a preocupação sobre o momento em que ela deveria ser revista. 
Velho traz essa dúvida. Na sua avaliação, não é esse o momento. Ele diz que essas mudanças, caso feitas hoje, trariam um impacto negativo e iriam sancionar um novo "piso" informal da inflação, mais elevado, pois ao ampliar o horizonte de cumprimento da meta de 1 ano para 2 anos, por exemplo, sinalizaria ao mercado desconfiança com a meta de 4,5% e portanto, a nova meta ajustada de curto prazo pelo mercado seria mais próxima de 6%, com repercussões negativas no mercado acionário, com elevação da curva futura de juros. 
Também não há entre os economistas consenso sobre os ganhos até agora contabilizados pelo país em 15 anos do regime de metas. 
"Apesar de ser um crítico do regime de metas, nesses 15 anos ele apresentou mais ganhos do que problemas", afirma Fernando Ferrari Filho, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 
Ferrari cita entre os ganhos a inflação ter ficado, na sua opinião, "controlada", entre 1999 e 2013, a uma média de 6,7% ao ano. E isso também significa, diz ele, que "o atual descontrole da inflação, como [alguns] costumam dizer, não ocorre porque o patamar está próximo à média da inflação dos últimos 15 anos, de 6,7% ao ano". Em termos de problemas, ele destacou que as autoridades econômicas ainda não conseguiram desindexar totalmente a economia e o fato de o regime também não ter conseguido responder, eficientemente, a choques de custos. 
Na avaliação de Ferrari, um problema central do regime estaria no fato de entender que a inflação não tenha outra natureza a não ser de demanda. Isso difere da sua visão, de que a inflação seria predominantemente de conflitos distributivos, choques de oferta e custos de produção. Ao definir a inflação como de demanda, o regime pressupõe poder atacá-la com a alta de juros, remédio que na prática, segundo ele, não estaria tendo grandes efeitos pela aceleração de preços ter outras características. 
Em termos de eficácia, o regime teria um desempenho, no mínimo, questionável, na opinião do economista Luiz Fernando de Paula, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Isso porque se esperaria que com estabilidade na inflação o país tivesse um crescimento relativamente elevado, mas isso não ocorreu desde que o regime foi implantado. 
De Paula destaca que não há, inclusive, consenso na literatura internacional de que países que adotaram o regime de metas tiveram (ou têm) nos últimos anos um desempenho melhor em termos de inflação e crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do que os países que não o adotam. De Paula destaca que, além disso, é preciso atentar para outros fatos que interferiram na redução da inflação em alguns períodos vão além do choque de juros altos para controlá-la. Ele entende que a redução da inflação após 2003 no Brasil ocorreu por condições muitas vezes desconsideradas nas análises sobre eficácia do regime, como um contexto mundial deflacionista e uma taxa de câmbio valorizada, "em ambiente internacional benigno". 
Após 15 anos de sua adoção, De Paula diz que é preciso repensar o regime, buscando uma alternativa de substituição. 
"A experiência internacional mostra que há outros regimes de política macroeconômica que têm sido eficazes", disse, exemplificando com a experiência asiática, que mostrou que se pode controlar a taxa de câmbio, como faz a China, além de citar a experiência de países nórdicos europeus, com adoção de políticas de rendas. 
Ferrari, da UFRGS, se mostra menos incisivo num possível abandono e diz que poderiam ser mantidas as metas para inflação, mas ao mesmo tempo deveria haver metas também para o crescimento, como já fazem outros bancos centrais no mundo. 
Há ainda quem defenda a permanência do regime pelas impossibilidades políticas de com ele romper, como é o caso de Oreiro, da UFRJ. "Acho que a gente não pode brincar com inflação e que simplesmente jogar o sistema de metas pela janela seria partir para um confronto aberto com o sistema financeiro. Acho que a gente não tem nada a ganhar com isso. Não é que eu esteja defendendo interesse de banqueiro. Mas acho que estratégia dos governos Lula e Dilma foi de não confronto, o que nos diferencia da Argentina e da Venezuela. Se é uma estratégia de não confronto, vamos tentar solução de compromisso entre a flexibilidade da política monetária e a credibilidade necessária para ter uma política minimamente eficaz. Por isso, neste contexto, não defendo abandonar o regime", diz Oreiro. 
André Biancarelli, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), também entende que "não há clima para alterações mais profundas na forma como se pratica a política de combate à inflação no Brasil hoje". Mas diz que isso é justamente "produto da pressão do raciocínio político-eleitoral, ou de agentes do mercado financeiro, que não perdoarão tão cedo a tentativa de baixar as taxas gerais de rentabilidade da economia brasileira", destacou. 

Eleicoes 2014: percepcoes dos eleitores - Marcia C. Nunes; Alberto Carlos Almeida

Decifrando o eleitor

Márcia Cavallari Nunes
Valor Econômico, 02/05/2014-
Especial. Rumos da Economia. 

"A mudança desejada pela população não é necessariamente de governo, mas sim na maneira de governar"

Com o exercício da democracia e após várias eleições, o brasileiro foi aprendendo a votar. Com os seus erros e acertos, o eleitor hoje é bem mais pragmático, crítico e exigente. Ele passou a perceber que quando vota em um candidato que dá continuidade ao que o anterior estava fazendo, independentemente de ser do mesmo partido, quem ganha é ele mesmo e toda a população. 
Focando na esfera federal, ele vivenciou os avanços do país, desde a abertura da economia iniciada por Fernando Collor, passando pela implantação do Plano Real e pelo controle da inflação nos governos de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, até a grande mobilidade econômica ocorrida na era Lula. Na percepção do eleitor, com cada presidente o país avançou um pouco. 
Nas eleições de 2010, Dilma se apresentou como legítima sucessora de Lula e era vista como a que mais daria sequência às políticas públicas implementadas por ele. Essa expectativa do eleitor se confirmou até recentemente. Entretanto, hoje há sensação crescente de que os avanços desaceleraram. Por isso, ao contrário da última eleição presidencial, quando havia um desejo grande de continuidade, hoje se observa um desejo grande de mudança. 
Pesquisa do Ibope Inteligência divulgada na última semana mostra que mais de dois terços dos brasileiros (68%) querem que o próximo presidente do Brasil mude totalmente ou muita coisa no governo do país. Outros 28% gostariam de continuidade total ou que muita coisa do governo atual permanecesse igual na próxima gestão. Resultados totalmente inversos aos observados em 2010. 
Dentre os que querem mudanças, 24% citam a presidente Dilma Rousseff como quem mais tem condições de implementar as mudanças que o país ainda necessita. Aécio Neves é citado por 19%, Marina Silva por 15% e Eduardo Campos por 7%. Outros 23% declaram que nenhum dos nomes é capaz de realizar as mudanças necessárias e 1% acha que todos são capazes. 

Entre aqueles que querem mudanças, quando questionados se desejam que elas sejam feitas com Dilma no governo ou com outro presidente, 64% citam que querem com outro presidente no lugar de Dilma. Os que mencionam a atual presidente somam 25%, ou seja, Dilma Rousseff possui um contingente de eleitores (um em cada quatro) que acreditam que ela é a melhor candidata para promover as mudanças desejadas. 
Esses números deixam claro que a mudança desejada pela população brasileira não é necessariamente de governo, mas sim na maneira de governar. Essas mudanças consistem em acelerar o ritmo do desenvolvimento econômico do país, melhorar a prestação dos serviços públicos, combater a corrupção, dar mais transparência para a gestão, entre outras ações. Enfim, almejam uma mudança no Estado brasileiro. 
O brasileiro não admite retrocesso. Para ele, é proibido perder o que já foi conquistado. É por isso que, apesar de querer mudança na maneira de se governar o país, ele valoriza a continuidade de programas, pois percebe que ganha quando isso acontece. A continuidade tornou-se um valor. Não me refiro à continuidade de governo, mas sim a de avanços no país. 
A percepção dos principais problemas do país foi mudando ao longo dos anos, a economia foi perdendo força frente aos demais. Em 20 anos, o principal problema do Brasil deixou de ser a geração de empregos e passou a ser a saúde. Pesquisas realizadas nesse período mostram que, em agosto de 1994, 53% dos brasileiros consideravam o emprego como a área em que o Brasil mais enfrentava problemas. No entanto, no estudo mais recente, de dezembro de 2013, 58% citam a saúde. Geração de empregos é citada apenas por 10% dos brasileiros como a área em que o Brasil enfrenta mais problemas. 
A mobilidade econômica pela qual o Brasil passou nos últimos anos não significa necessariamente uma mobilidade social. Para que isto ocorra, o eleitor precisa ter acesso a serviços públicos de educação, saúde e transporte coletivo de qualidade. Precisa ter acesso à cultura e ao lazer. Só assim o eleitor vivenciará uma verdadeira mobilidade social. 
Assim, hoje existe uma percepção de que há uma diminuição no ritmo de crescimento econômico do país, o que gera muitas inseguranças. Somam-se a isso o problema da segurança pública e a questão da corrupção que aparecem todos os dias no noticiário, além das demandas constantes por melhorias nos serviços públicos. Tudo isso junto, faz com que o eleitor não tenha uma expectativa positiva de futuro e reforça, cada vez mais, o desejo de mudança. 
O brasileiro entende também que há dinheiro público suficiente para se realizar tudo o que é necessário, desde que bem usado e sem corrupção pelo caminho. O nível de tolerância está no limite. Por isso, as manifestações de junho do ano passado exigiam serviços públicos no padrão Fifa. 
A população brasileira passou anos ouvindo que o Brasil é o país do futuro e ela quer que esse futuro chegue. Cansou de esperar. O futuro demora, mas precisa ser construído. O eleitor quer respostas para as perguntas "Como é que vamos avançar? Como vamos continuar crescendo? Como e quando vamos melhorar a educação, a saúde, a segurança e o transporte?". E, é claro, sem perder nenhuma das conquistas alcançadas. 
O eleitor exige respeito, transparência na gestão pública e serviços de qualidade tanto no setor público, quanto no setor privado. Ele quer sentir que o Brasil continua avançando e que isso se reflita de alguma forma na sua vida. E tem pressa: quer ganhos tangíveis no curto prazo. 

Márcia Cavallari Nunes é CEO do Ibope Inteligência. 

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Mudança veloz na cabeça
Alberto Carlos Almeida
Valor 02/05/2014
Especial. Rumos da Economia

Ser de esquerda é acreditar que a pobreza e a desigualdade são causadas por uma estrutura social injusta 

Houve uma mudança dramática da cabeça do eleitor nos últimos quatro anos: a política social perdeu importância e se tornaram bem mais relevantes medidas cujo objetivo é o aumento da eficiência da economia. Isto ocorreu porque a estrutura social do Brasil mudou muito, aumentou a escolaridade, aumentou a renda média e aumentou a capacidade de consumo. O resultado disto é simples, modificaram-se as demandas. 
Na última eleição presidencial, assim como ocorreu em 2006 quando Lula foi reeleito, o Bolsa Família foi um dos principais temas de campanha. Ele foi a vedete, o mascote da campanha. O PT se esforçou com sucesso em demonstrar que essa política de transferência de renda fazia justiça a um enorme eleitorado que havia sido abandonado há anos por uma elite insensível aos pobres, esse foi o discurso de Lula e Dilma. Os adversários insistiram em afirmar que o Bolsa Família resulta na acomodação de quem o recebe, que seus beneficiários deixam de buscar empregos e passam a nutrir uma grande dependência em relação aos benefícios governamentais. Falou-se muito na expressão "porta de saída": encontrar um meio para que quem recebe o Bolsa Família pudesse, no futuro, não mais precisar do benefício. 

São visões de mundo opostas, são apenas ideologias, não existe um lado certo ou errado. Há somente a ideologia com que você concorda e aquela de que você discorda, em geral dá-se o nome de "certo" àquilo com que se concorda e "errado" àquilo de que se discorda. O que existe no Brasil são dois eleitorados que têm valores diferentes, de um lado os que prezam o Bolsa Família e as políticas de transferência de renda, de outro os que acham que se trata de um gasto indevido do governo. A distância relativa entre esses dois eleitorados sempre existirá, é ela quem assegura os votos certos do PT e os votos certos do PSDB. O que mudou muito nos últimos quatro anos foi a importância das políticas sociais de transferência de renda para definir o voto. 
Ser de esquerda é acreditar que a pobreza e a desigualdade são causadas por uma estrutura social injusta. Quem pensa assim acha que é papel do governo e do Estado atuar para diminuir as desigualdades. Ser de direita é acreditar que a pobreza e a desigualdade são causadas pelos próprios indivíduos que são diferentes em seu apetite pelo bem-estar econômico e por sua capacidade individual de alcançá-lo. Quem pensa assim acha que o governo não deve atuar para diminuir as desigualdades, mas apenas dar as condições para que cada um busque o que for melhor para si em termos econômicos e financeiros. 
As pessoas mais pobres e com menor escolaridade tendem a ser de esquerda, ao passo que as pessoas menos pobres e mais escolarizadas tendem a ser de direita. Veja-se o mapa de votação do Brasil em 2006 e 2010 e ver-se-á que o PT é sistematicamente mais bem votado nas áreas mais pobres enquanto o PSDB é sistematicamente mais bem votado nas áreas menos pobres. Isto ocorre também nas eleições para governos estaduais e prefeituras. O mapa de votação, por exemplo, da cidade de São Paulo vem sendo assim e foi assim em 2012 quando no segundo turno se enfrentaram Haddad, do PT, e Serra, do PSDB. 
A classe média ainda não dará o tom principal da eleição presidencial, mas ela entrará no palco em grande estilo 
Na medida que uma sociedade aumenta seu nível escolar, e quanto mais rápido isto ocorre, foi o que aconteceu com o Brasil nos últimos anos, toda a população caminha para a direita. O pensamento de esquerda e seus eleitores não deixam de existir, muito menos deixa de existir a diferença relativa entre esquerda e direita, mas as políticas substantivas demandadas pelo eleitorado mudam, e muito. Nos Estados Unidos muito mais escolarizados do que o Brasil a esquerda é representada por Obama e pelos Democratas, a direita é liderada pelos Republicanos. Lá, porém, diferentemente de nós, o equivalente do Bolsa Família (existe nos EUA) não é um tema relevante de campanha. 
No Brasil de 2014 o Bolsa Família continuará sendo um divisor do voto petista e anti-petista, mas terá bem menos peso do que em 2010. Outros temas estão na cabeça do eleitor com mais força hoje do que há quatro anos, este é o caso da necessidade de mais estudo para se obter melhores empregos e da necessidade de se investir mais em infraestrutura. Ser de esquerda nos EUA é defender mais a geração de empregos do que o combate à inflação. No Brasil das últimas duas eleições presidenciais ser de esquerda era defender de maneira clara as políticas de transferência de renda. 
Em 2014 o eleitorado obrigará os candidatos a caminharem para a direita em um ritmo mais rápido do que no passado. O PT já vem há algum tempo atualizando o seu discurso. Desde a eleição passada o PT fala em "classe média", "oportunidades", "geração de empregos" e coisas congêneres. No fim de 2013 o governo Dilma ocupou fortemente a mídia com notícias de investimentos em infraestrutura, as chamadas concessões. Dilma respondia a este novo eleitorado, a esta nova cabeça do eleitor. Programas como o Pro-Uni, Fies, e Ciência sem Fronteiras respondem à demanda por condições para melhorar de vida, nestes programas não se dá o peixe, como se convencionou dizer do Bolsa Família, mas se ensina a pescar. 
Alguns podem considerar que este novo eleitorado é uma vantagem para a oposição. Pode até ser, desde que ela saiba entendê-lo. O fato é que nos últimos anos, talvez até mesmo na última década, o PT soube captar de maneira mais efetiva as demandas do eleitorado e suas mudanças. Não é bom para a democracia, não é bom para o PT e tampouco para o PSDB que o eleitorado não seja plenamente compreendido pela oposição. Todos ganham com uma competição eleitoral mais acirrada. Um eleitorado mais à direita não significa necessariamente que as demandas sociais não tenham que ser contempladas, longe disto. Na verdade, a classe média ainda não dará o tom principal da eleição presidencial, mas ela entrará no palco em grande estilo. Ironicamente, este novo ator é resultado do sucesso dos governos do PT e é ele quem pode ameaçar o predomínio de Dilma e de Lula na política nacional. 

Alberto Carlos Almeida, sociólogo, é diretor do Instituto Análise e autor de "A Cabeça do Brasileiro". 

Henry Ford: o homem que inventou a era moderna (e depois a perdeu) - Richard Snow

O homem que inventou a era moderna
Autor de nova biografia de Henry Ford mostra como o empresário transformou a produção industrial e o regime capitalista
11 de maio de 2014 |
Lucia Guimarães - O Estado de S.Paulo

NOVA YORK - Num ano próximo a 1940, um adolescente conversava com Henry Ford sobre livros didáticos que considerava antiquados. Ford defendia os livros. O jovem John Dahlinger, de fato, filho ilegítimo de Henry Ford com sua amante, protestou: "Mas, senhor, vivemos novos tempos. Esta é a idade moderna e...". Ford cortou o interlocutor: "Rapaz, eu inventei a idade moderna".
A frase confirma a arrogância do pai da produção industrial do século 20, mas é um epíteto merecido, diz o autor da nova biografia de Henry Ford, o historiador Richard Snow. Em Henry Ford, O Homem que Inventou o Consumo (Ed. Saraiva, 416 páginas, R$ 44,90), nas livrarias brasileiras no dia 15, Snow não desenterra esqueletos ou revela fatos inéditos. Mas, numa narrativa com verve literária, que vai cativar leitores desinteressados nos meandros da combustão interna do histórico automóvel Modelo T, o automóvel que "todos podiam comprar" e que inaugurou a produção em massa responsável pela prosperidade americana no último século, Snow nos lembra da importância do homem que, segundo ele, teve a vida partida ao meio. Foi cativante, generoso e brilhante na primeira metade de seus 84 anos. Tirano, antissemita e megalomaníaco na metade seguinte.
O homem que dobrou o salário de todos os seus empregados, em 1913, acreditava que os judeus tinham inventado o jazz para dominar os Estados Unidos. O capitalista mais bem-sucedido do mundo há cem anos, detestava finanças e achava que acionistas não deviam receber dividendos. O empresário que inventou a produção industrial em massa, antes conhecida como "Fordismo", passou mais de uma década resistindo à inovação de sua galinha dos ovos de ouro: o Ford Modelo T, o automóvel que mudou a paisagem urbana e a economia mundial, apelidado no Brasil de Ford Bigode.
O menino da fazenda que detestava os animais gastou milhões pra montar um museu dedicado à vida rural. As contradições de Ford continuam a desafiar a compreensão do homem que em 1915 alugou um navio, encheu de escritores e jornalistas, e partiu para a Europa sob a manchete do New York Times: "Grande Guerra Vai Terminar no Natal. Ford vai Deter a Guerra". Ford não impediu o conflito. Mas continua inquietando os que se debruçam sobre sua biografia extraordinária. Em 1929, o popular ator e humorista Will Rogers disse a Henry Ford, sem o menor tom de brincadeira: "Vai demorar cem anos para sabermos se você nos ajudou ou nos prejudicou. Mas o certo é que você não nos deixou onde nos encontrou".
Estado conversou com o biógrafo Richard Snow em seu apartamento em Manhattan.
Qual a maior contribuição de Henry Ford?

Ford não era um inventor. Ele teve uma visão sobre o modo de produção que mudou o mundo. Em vez de ter um operário cumprindo 37 tarefas, decidiu que 37 operários deveriam cumprir 37 tarefas e a linha de montagem deveria passar por eles. Podemos atribuir a produção em massa a Henry Ford. Sabe que até o termo foi cunhado por ele num artigo para a Enciclopédia Britânica? Antes, os americanos se referiam a esse modo de produção como 'Fordismo'. Quando outras indústrias começaram a imitar o Fordismo, teve início a prosperidade americana que se estendeu por boa parte do século 20 e nos ajudou a sair vitoriosos na 2.ª Guerra.
O primeiro veículo experimental criado por Henry Ford, em 1896, foi o Quadriciclo, parente da bicicleta e não da carruagem.

Muitos pensam que o carro substituiu o veículo de tração animal. Mas o importante passo intermediário foi fruto da explosão da bicicleta no fim da década de 1880. A demanda por bicicletas era tal, no final do século 19, que exigia uma fabricação mais refinada. As peças de metal tinham de ser cortadas com mais precisão e os fabricantes acabaram aprendendo técnicas que não eram necessárias para as carruagens. A bicicleta permitiu a transição decisiva da tração animal para o automóvel.
O sucesso do Modelo T é atribuído a uma decisão incomum numa era em que empresários viam o automóvel como um artigo de luxo.

Quando Ford abriu sua primeira fábrica, em 1903, seus sócios imediatamente queriam aumentar o preço do Modelo T. Ele foi categórico: 'Vamos cortar preços' e virou uma noção do capitalismo ao avesso. Naquela época, o preço médio de um carro de qualidade era US$ 7 mil. Uma casa no subúrbio custava US$ 2 mil. Ford dizia que, cada vez que cortava US$ 0,50 do preço do Modelo T, atraía mais 50 mil compradores. Ele acreditava que sua máquina tinha de ser simples e barata. No final da produção, em 1927, um Modelo T custava US$ 295 e a Ford tinha vendido 15 milhões de unidades.
Quando o Modelo T começou a fazer sucesso, Ford tomou outra decisão que enfureceu os industriais.

Ford tinha 50 mil empregados. Eles ganhavam US$ 2,50 por dia, um bom salário então, numa linha de montagem. De repente, ele dobrou os salários para US$ 5,00. O Wall Street Journal o acusou de tentar destruir o capitalismo com filantropia. Ford sabia o que estava fazendo. Transformou seus empregados em compradores de automóveis. Outras indústrias se sentiram compelidas a aumentar salários e Ford inaugurou um ciclo de produção e consumo que trouxe enorme prosperidade ao país.
Como o passado de Ford, crescendo numa fazenda, pesou sobre o futuro inovador da América urbana?
Ford não suportava a rotina rural. Desde menino, ele pensava que o músculo animal era ineficiente e que a energia humana devia ser substituída pela energia mecânica. Aos 13 anos, ele já consertava relógios na área de rural de Michigan, onde morava. Ele não gostava dos animais da fazenda, tomou horror a vacas e declarava, sério: 'A vaca tem de acabar!'. Sua intimidade com máquinas era única. Colocavam 12 carburadores idênticos na sua frente e ele acertava o que funcionava mal. A ironia é que, no fim da vida, ele celebrou num museu a vida rural americana que tinha conseguido destruir mais do que qualquer outro. O museu Greenfield Village, em Michigan, é um primor. Começou com a fazenda de sua infância, mas é também um documento sobre a transição dos Estados Unidos para a modernidade. Ford comprou e instalou lá o laboratório de Thomas Edison e a oficina dos irmãos Wright, pioneiros da aviação.
O sr. acha que Henry Ford compreendeu o impacto que causava na vida dos americanos com o Modelo T?

Não acredito que ele pudesse entender inicialmente as consequências de sua inovação. Em poucos anos, foi rompido o isolamento da vida rural. O carro de produção em massa causou uma transformação profunda na forma como as pessoas se comunicavam. De repente, era possível visitar alguém a 60 quilômetros de distância e não apenas para conduzir negócios. Ford revolucionou o lazer. O carro mudou a noção de privacidade: John Steinbeck gostava de dizer que metade dos bebês americanos nos anos 20 tinham sido concebidos num Modelo T. Não era preciso mais manter várias gerações de uma família sob o mesmo teto. Criaram-se as condições para o estilo de vida suburbano. Tudo o que assumimos como natural na vida moderna do século 21 cresceu da viabilidade da produção do motor de combustão interna há 100 anos.
O sr. acredita que o Ford visionário esbarrou no Ford que não era um pensador profundo?

Sim. Ele teve uma visão e mudou o mundo com seu sistema de produção. Mas o sucesso estrondoso lhe deu a ilusão de que podia fazer tudo. O que levou a várias ideias desastrosas. Um exemplo clássico foi a Fordlândia.
Por que Ford errou tanto na aventura amazônica?

Quanto mais rico e mais bem-sucedido, menos tolerante ele ficava a limitações. Queria controlar todas as etapas de produção, ser dono das minas, das fábricas de vidro. E queria se livrar da dependência da borracha que os britânicos produziam na Ásia. Quando fechou o acordo para a Fordlândia com o governo brasileiro no final da década de 20, Ford já estava cercado de uma claque de assessores obedientes que diziam o que ele queria ouvir. Despachou engenheiros para plantar seringueiras! Com sua mania de pregar e pontificar, queria decidir como os empregados deviam trabalhar e viver. A Fordlândia acabou vendida em 1946 com prejuízo pelo neto dele, Henry Ford II, por US$ 20 milhões, mais ou menos US$ 200 milhões hoje.
Entre as decisões desastrosas, o sr. cita também a maneira como ele descartou colaboradores fundamentais.

Era um padrão estranho e profundamente destrutivo. James Couzens, o homem que ajudou Ford a montar seu império financeiro, foi uma grande perda inicial. Outra perda, com consequências trágicas para a companhia, foi a do imigrante dinamarquês William Knudsen, arquiteto da expansão da Ford na Europa. Quando diziam, é hora de inovar o Modelo T, o consumidor quer um carro mais confortável, um objeto de desejo, Knudsen ofereceu soluções para mudar a produção. Foi logo despachado, em 1921. No ano seguinte, Alfred Sloan, vice-presidente da General Motors, o contratou. O resultado foi o Chevrolet. Knudsen ajudou a GM a usurpar a liderança da Ford. Acho que Ford se livrava das pessoas como se quisesse eliminar testemunhas. Ele não se conformava com a ideia de que teria de mudar e manteve o Modelo T em produção até 1927, por muito mais tempo do que era sensato. Mesmo a introdução, do Ford Modelo A, com seu design elegante e inovações mecânicas, não podia repetir a façanha. O Modelo T já tinha mudado o mundo e o Chevrolet agora disputava a preferência dos consumidores.
Por que o sr. encerra a biografia em 1927, quando termina a produção do Modelo T?

Henry Ford era uma figura bastante incomum. Não consigo pensar num outro grande homem - penso que ele pode ser descrito como tal - cuja vida foi tão claramente partida ao meio. Na primeira metade, ele foi genuinamente produtivo, generoso e afável. Tinha um talento mágico para atrair gente talentosa. Mas, na segunda metade de vida, ele foi horrível. Ele parece ter mudado no curso de dois anos e não conheço ninguém de sua estatura que tenha mudado dessa forma. Mais do que qualquer outra decepção da vida pessoal, acho que a ideia de abandonar o Modelo T o deixou louco. O Modelo T era feio, confiável, simples e, para Ford, era perfeito, um objeto de virtude. Quanto mais ele ouviu dos próximos que era hora de mudar mais ressentido foi ficando.
Ele conseguiu se reabilitar do antissemitismo militante?

Acho que o antissemitismo o manchou para sempre. Ele comprou um jornal local de Michigan, o Dearborn Independent, que publicou uma série de 96 artigos sob o título "O Judeu Internacional". Ford era obcecado pela ideia de que os judeus queriam começar guerras para promover comércio e controlavam as finanças. Foi uma desgraça. O jornal acabou fechando em 1927, sob uma barragem de processos de difamação. Ford se desculpou alegando que não lia o que estava sendo publicado.
A quem o sr. compara Henry Ford entre empresários do século 21?

Em sua pomposa biografia de 1922, Minha Vida e Obra, Ford faz um comentário de passagem que é esclarecedor. Conta que quando estava construindo o quadriciclo experimental, não havia demanda alguma pelo automóvel. 'Claro que nunca há a demanda para um produto que não existe', dizia. Mais uma vez, virava noções ao avesso. Neste caso, a de que a necessidade é a mãe da invenção. Ele introduziu a invenção que criou a necessidade. E acho que nós não tínhamos necessidade alguma de um iPhone ou iPad, não? Ele pode ser assim comparado a Steve Jobs.