Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
[Objetivo:
sintetizar questões pertinentes; finalidade:
entrevista na GloboNews]
Em
decorrência de minha exoneração, por decisão exclusiva (e vingativa) do
chanceler, em 4 de março, segunda-feira de Carnaval, acabei sendo solicitado,
por grande número de jornalistas, a conceder entrevistas, escrever artigos,
formular opiniões, sobre a política externa, sobre a diplomacia brasileira, sobre
a minha própria demissão intempestiva como diretor do Instituto de Pesquisa de
Relações Internacionais (IPRI), entidade subordinada à Fundação Alexandre de
Gusmão, que é por sua vez vinculada ao Itamaraty. O “assédio” foi tão intenso
que na terça-feira de Carnaval não consegui sequer tirar o pijama, pois as
demandas foram intensas, da manhã à noite, simultaneamente, em dois telefones,
no computador, pelas redes de comunicação social.
Várias
entrevistas foram publicadas desde a própria segunda-feira 4 de março, e listo
aqui, rapidamente, o que me foi possível registrar como divulgação em relação
ao episódio (e descartando totalmente as dezenas de mensagens trocadas com os próprios
jornalistas por essas ferramentas mais usuais de comunicação eletrônica. O
início de toda o processo se deu em função da primeira postagem que eu fiz, abaixo
transcrita em primeiro lugar, reunindo três textos e convidando a um debate
sobre a política externa brasileira; o chanceler, provavelmente, não gostou de
ter o seu artigo, disseminado unicamente em seu blog pessoal (Metapolítica 17), confrontado a dois outros
textos de feitura bem mais elevada e com argumentação bem mais consistente que
a sua própria.
3426. “Onde está política externa do Brasil?”, Brasília, 6 março 2019, 3
p. Artigo para a revista Veja. Versão
revista, editada pela redação da revista. Publicada sob o título de
“Cadê a política externa?”, na
edição 2625 (ano 52, n. 11, 13/03/2019) de Veja,
divulgada em 8/03/2019, p. 60-61, reproduzido no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/cade-politica-externa-paulo-roberto-de.html).
Relação de Publicados n. 1301.
3430. “Uma
homenagem de João Amoedo e um pequeno segredo”, Brasília, 7 março 2019, 2 p.
Relato de meu encontro com equipe econômica em meados de 2018 e sobre minha recusa
em ser cogitado para o governo saído das urnas. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/uma-homenagem-de-joao-amoedo-e-um.html).
3431. “Esclarecimentos
vindos do ‘outro lado’ da história”, Brasília, 7 março 2019, 4 p. Retificação dos
equívocos derivados de anúncios do Itamaraty, repercutidos por jornalistas,
sobre as razões de minha exoneração, como sendo por causa de supostas ofensas
ao chanceler. Postado no blog Diplomatizzando
(link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/retificando-eliane-cantanhede-no.html).
3433. “A política externa brasileira: respostas a
questionário de El País”, Brasília,
13 março 2019, 3 p. Respondendo a questões do repórter do El País sobre minha exoneração do cargo de diretor do IPRI.
Ocorre
que nessa sequência eu fui contatado pela assessoria da jornalista Miriam
Leitão para uma entrevista em companhia do embaixador Roberto Abdenur, a ser
realizada na manhã do dia 14 de março, o que me obrigou a viajar ao Rio de
Janeiro já na véspera, para não correr o risco de algum imprevisto no transporte
aéreo muito em cima do horário fixado para estar nos estúdios da Rede Globo (9:45hs).
No voo para o Rio, justamente, tentando prever quais perguntas me seriam
feitas, eu fui tomando notas em meu Moleskine sobre quatro pontos prováveis da entrevista,
e que transcrevo agora, na viagem de volta, sem que o que vai transcrito abaixo
represente, efetivamente, o teor da entrevista realizada, a ser transmitida
nesta noite de 14/03, às 21:30hs. Transcrevo, sem qualquer alteração, o que eu
escrevi em meu caderninho.
Demissão: O nome correto é exoneração.
Segunda-feira de Carnaval, logo de manhã cedo, fui despertado por telefonema do
chefe de Gabinete do ministro Ernesto Araújo, comunicando-me o descontentamento
do chanceler com o teor de minhas postagens sobre a diplomacia em curso e
anunciando minha exoneração. Segundo disse num primeiro momento o Itamaraty,
aos órgãos de imprensa que o procuraram na sequência, a substituição já estava
prevista há mais tempo, o que me fez pensar porque o fariam numa manhã de
Carnaval, sem sequer aguardar (aí estava uma ironia) a Quarta-Feira de Cinzas. Alertei
sobre a conveniência de se postergar a exoneração em função da vinda do sogro
do chanceler, embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa, para palestra no âmbito
da série “Percursos Diplomáticos”, que eu havia criado quando de minha assunção
a diretor do IPRI, junto com o Instituto Rio Branco, em agosto de 2016. Como a
explicação sobre a “exoneração já prevista há mais tempo”, mas realizada numa manhã
de Carnaval, deve ter sido considerada ridícula, inventaram, em tweet do
assessor presidencial em assuntos internacionais, mais conhecido como
Robespirralho, a tese das “ofensas ao chanceler”. Tentei esclarecer que a
expressão “fundamentalistas trumpistas” não se aplicava ao chanceler, mas a um
dos Bolsokids e ao dito assessor, mas parece que não colou. Falei daquele
cidadão de boné da campanha “Trump 2020”, e que havia usurpado uma indevida
representação do povo brasileiro, ao afirmar, na Florida, que todos aqui
apoiavam a construção do muro nas fronteiras do México.
O chanceler
queria resolver a questão de imediato, disse-me o chefe de Gabinete, e assim
foi feito. O fato é que, além da depreciativa referência aos “fundamentalistas trumpistas”,
eu também havia “ofendido” o guru espiritual desse governo, a quem eu chamei de
“sofista da Virgínia” e de “Rasputin de subúrbio”, o que provavelmente provocou
a cólera do chanceler, uma vez que ele deve sua designação a quem ele
respeitosamente chama de “Professor”.
Minha avaliação sobre a política externa do chanceler
olavista: Todos os
jornalistas formulavam essa questão, ao que sempre respondi que era impossível
avaliar algo que simplesmente não existe, que foi exatamente o que eu disse em
meu artigo da Veja. Não há, nunca
houve, e não sabemos se haverá uma exposição clara, completa, sobre qual seria,
em que consistiria, a política externa do governo Bolsonaro. O que havia eram
apenas invectivas, slogans, intenções, várias vezes manifestadas, sobre a
necessidade de se afastar das diplomacias anteriores, todas elas, de todos os
governos, o que aliás os governos do PT já tinham feito, quase que da mesma
forma, ainda que não com o mesmo conteúdo e substância (se existem).
De fato, no dia 1º.
de janeiro tivemos alguns slogans altissonantes, em primeiro lugar do próprio
presidente – sobre a política externa “sem ideologia”, e comércio exterior idem
–, em segundo lugar do chanceler – sobre o fato de a política externa “estar
fora do Brasil”, sem que saibamos o que é isso exatamente, e se isso é possível
–, além de várias frases em latim, em grego e até em tupi-guarani. Mas nunca tivemos,
até aqui, uma apresentação abrangente sobre quais seriam as grandes linhas da
política externa do governo Bolsonaro. Para confirmar isso, eu convido todos a
acessar a “aula magna” – eu preferiria dizer “palestra mínima, e confusão máxima”
– do chanceler aos alunos do Instituto Rio Branco, na segunda-feira dia 11/03,
fechada a todos os que não fossem estudantes, mas felizmente (ou infelizmente,
não sei) gravada e disponível no YouTube, na qual ele discorre, da forma mais
caótica possível, sobre o nada.
A palestra
encontra-se disponível (não sei se permanecerá) no seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=0Qt1kCY7D0M. Imagino que deve ter sido um sofrimento terrível
para os alunos do Rio Branco, aguentar duas horas de balbuciamentos erráticos
sobre conceitos abstratos, uma salada inacreditável de acusações equivocadas
sobre tudo o que se fez anteriormente no Itamaraty e vários eflúvios olavistas,
sem qualquer sentido compreensível ou racional. Se acham que eu estou exagerando
na crítica, podem conferir o vídeo, e também sofrer por duas horas.
Tutela militar sobre o Itamaraty: Não é bem sobre o Itamaraty, e sim sobre o chanceler
especificamente. Aqui não é preciso inventar nada. Se havia alguma dúvida a
respeito, basta ler ou ouvir o que disse o general Hamilton Mourão, vice-presidente,
na reunião de Bogotá do Grupo de Lima sobre a Venezuela, na qual ele foi o
chefe da delegação brasileira, sendo que só ele falou, num espanhol bastante
correto, descartando por completo qualquer solução militar para o drama do país
chavista, eliminando as sinalizações anteriores emitidas pelo chanceler no
sentido de apoiar uma aventura americana de forçar ajuda humanitária pelas
fronteiras colombiana e brasileira da Venezuela. Nesse caso, os militares estão
atuando como diplomatas, defendendo princípios constitucionais brasileiros e o
próprio Direito Internacional, e o chanceler parece estar empenhado em violar
essas ferramentas básicas da diplomacia que ele deveria dirigir atendendo o que
se julga essencial na condução da política externa.
O que estou fazendo agora? Nada de muito diferente do que já fiz durante boa
parte dos governos lulopetistas entre 2003 e 2016: passar o meu tempo livre
(embora involuntariamente) na Biblioteca, que é o meu habitat natural, lendo e
escrevendo. Existe porém um problema: não acredito que a população brasileira,
que paga o meu salário, assim como os órgãos de controle, estão de acordo em
que eu receba um salário (ainda que diminuído de um quarto) sem que eu preste a
contrapartida que é o trabalho na profissão para a qual eu fiz concurso, e que
constitui a minha carreira primária. Acho também que o Itamaraty não merece
isso.
Em voo, de
Brasília ao Rio de Janeiro, 13/03/2019;
complementado em
14/03, para a lista dos trabalhos.
Não sei exatamente o que comentar. Preciso primeiro avaliar as intenções do redator, por meio de uma leitura atenta de seus argumentos, se os há, pois o que se tem é um relato de "causos". Paulo Roberto de Almeida
O que aprendi com Olavo
No fundo, toda a obra de Olavo tem por trás a intenção de atacar alguém ou alguma coisa
Vai se acabando meu terceiro mês como aluno do COF. E aí? O que aprendi?
Aprendi a entender a origem do carisma de Olavo, que antes para mim era um mistério. Minha consciência, buscando o conhecimento (Viu, professor? Aprendi!), concluiu que as pessoas gostam dele e o admiram porque enxergam a dedicação extrema à missão que ele escolheu na vida, ao mesmo tempo que percebem uma certa vulnerabilidade por trás da casca de filósofo durão. Isso fica claro quando ele revela suas fraquezas: por exemplo, quando choraminga que nenhum aluno o defende. É o que basta para centenas de pessoas se mobilizarem a favor dele.
Aprendi também que é mentira que os seguidores de Olavo sejam todos pessoas com deficiência intelectual ou ressentidas por não ter acesso às melhores universidades, como alguns críticos gostam de insinuar. Tive conversas profundas com gente inteligente e seriamente empenhada em aprender.
Não é a burrice que atrai gente ao COF (assim como obviamente não é a burrice que atrai para a esquerda), é outra coisa. Suspeito que, em parte, seja a busca de um senso de pertencimento, do acolhimento de um vovô que ao mesmo tempo tem a aura sábia de alguém que está entendendo tudo — quando está tão difícil entender as coisas — e a informalidade de quem não tem papas na língua.
Aprendi também que, no fundo, toda a obra de Olavo tem por trás a intenção de atacar alguém ou alguma coisa. Quando fala de filosofia, ele ataca as pessoas que escolheram a filosofia como profissão. Quando o assunto é ciência, o subtexto é a superioridade da filosofia sobre a ciência. Qualquer discussão sobre política tem como premissa a má-fé ou o analfabetismo de qualquer um que não concorde com ele. Mesmo seu livro mais filosófico, sobre Aristóteles, dedica quase metade de suas páginas a ofender alguém (no caso, o parecerista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, classificado como “analfabeto” depois de recusar a publicação da tese de Olavo na revistaCiência Hoje). Olavo pode até se importar com o conhecimento, mas se importa mais com a guerra.
Aprendi que quase toda a obra de Olavo é uma tentativa de negar a complexidade do mundo. Por trás de seus textos estruturalmente sofisticados, há ideias bem simples. Ele quer voltar no tempo, para um mundo que ele fosse capaz de entender: onde só há dois sexos (e não me venha com gênero), Newton basta (sem as incertezas e as heresias da relatividade e da física quântica), preocupar-se com o clima é assunto para São Pedro e todo mundo que não é bom é mau, e vice-versa. Um mundo cristão, de cultura clássica, sob o comando de quem parece estar no comando — melhor se for alguém bem autoritário. Um mundo que possa ser apreendido inteiro por uma única mente brilhante, como a de Aristóteles — sem todas as complicações contemporâneas, que exigem uma imensa diversidade de perspectivas para fazer sentido.
Aprendi também o poder de uma mensagem única que preencha todos os espaços do dia, com a ajuda das redes sociais. A repetição incansável cria um ambiente saturado de informação, que não deixa espaço para mais nada. Quando essa mensagem é de ódio, os efeitos sociais são profundos. É sério: essa experiência me impactou muito e mudou, espero que temporariamente, minha percepção da realidade. Estou me sentindo muito desinformado sobre tudo que não é olavismo, e também muito paranoico, coisa que nunca fui.
Aprendi, mais que tudo, sobre a força demolidora do insulto para impedir qualquer possibilidade de diálogo. Olavo é um artista da ofensa. Julgando pela perspectiva subjetiva de minha consciência, avalio que pelo menos metade das dezenas de milhares de páginas que ele diz ter escrito são ofensas a alguém. De um lado, ele xinga como uma criança: com a repetição infindável de apelidos engraçadinhos ao longo de dias e dias. Mas ele faz isso com a erudição de alguém que lê muito.
Acho que aprendi um pouco a usar dessa arma também. Cheguei mesmo a bolar, para mim mesmo, um exercício para treinar essa habilidade. Imaginei, de maneira hipotética, que eu quisesse ofender Olavo. E aí ofendi, sem dó: com referências a sua idade, a sua saúde, a seu peso, a suas dificuldades cognitivas na infância que formaram uma personalidade obcecada pela ideia de entender tudo. Dei-lhe apelidos feitos de palavras horríveis, inclusive uma com rima quase perfeita com seu sobrenome. Ficou bom. Ficou demolidor. Senti o poder que isso pode ter, de incitar.
Mas por que mesmo eu iria querer incitar alguém, num momento como este? Que uma pessoa que tenha acesso ao poder do Estado, inclusive de mobilizar violência a seu serviço, esteja incitando, aí já é outra história.
26.02
Assim como sobre a evolução ou o formato esférico da Terra, Olavo mandou avisar que não tem opinião formada sobre a reforma da Previdência, num post que deve ter deixado muito apoiador de Bolsonaro nervoso.
Depois ganhou um novo alvo quando o ministro da Justiça Sergio Moro chamou a especialista em segurança pública Ilona Szabó, que se considera uma liberal, para ser suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Olavo ficou furioso porque considera Szabó esquerdista, por causa de sua proximidade com Fernando Henrique Cardoso. A treta durou 48 horas, até Moro voltar atrás na indicação, depois de ser pressionado pelo presidente.
Mais tarde, surgiu no Facebook uma petição on-line pedindo a Moro e a Bolsonaro que defendam Olavo dos crimes que vêm sendo cometidos contra ele. O abaixo-assinado fala de “perseguição, fake news e assassinato de reputação” contra meu professor e sua família, denuncia uma “rede que atua dentro e fora do país e que incita o ódio através de ataques constantes”, sem mencionar nada específico.
27.02
Hoje chegou o boleto com a mensalidade do COF. Deletei.
02.03
Mas aí hoje Olavo postou um apelo a seus seguidores no Facebook:
“Acossados por uma rede internacional de caluniadores e difamadores, recebemos ainda uma cobrança monstruosa de despesas médicas e impostos, e vamos precisar desesperadamente da ajuda de nossos amigos.”
Olavo pede dinheiro e fornece seus dados bancários no Brasil e nos Estados Unidos. Disse que só pode pagar pela ajuda com livros autografados e sua profunda gratidão.
A cobrança à qual ele se refere foi por causa de uma internação de emergência para tirar um tumor da traqueia, em março do ano passado, contrariando a tese olavista, muitas vezes repetida, de que fumar faz bem à saúde. Aparentemente, a conta do hospital chegou agora — acontece isso nos Estados Unidos, você é atendido sem que ninguém discuta custos e de repente chega em sua casa uma conta astronômica.
Eduardo Bolsonaro compartilhou o apelo olavista, ajudando bastante a divulgá-lo.
Na página pessoal de Olavo, uma aluna perguntou, em relação ao apelo:
“Professor, acho que peguei o bonde andando e não estou entendendo o que está acontecendo. O senhor está com dificuldades para custear as despesas médicas que o senhor teve no ano passado, quando precisou ficar internado em um hospital? Os débitos fiscais são perante o Fisco dos EUA ou daqui do Brasil? Estão alegando sonegação? O que isso tudo tem a ver com a perseguição que seus detratores vêm impondo ao senhor? Isso tem a ver com a renda que o senhor tem com o COF, com os alunos brasileiros? Estão alegando evasão de divisas?”
Ela foi gentil na pergunta, e conferi que é uma verdadeira admiradora de Olavo, que contribuiu para outras campanhas em benefício dele e de outros ícones da direita, e tem papel de liderança organizando jovens. Mas ficou sem resposta.
Procurei o e-mail do Seminário de Filosofia na minha lixeira e fui lá renovar minha mensalidade: mais R$ 60. O tema da aula foi o projeto da Escola de Frankfurt, um grupo de filósofos alemães de um século atrás, de destruir o mundo. Segundo Olavo, os frankfurtianos dominam o pensamento de esquerda hoje e, consequentemente, mandam na mídia, na universidade e no PT. É basicamente por isso que é impossível dialogar com toda essa gente: todos eles estão trabalhando pela destruição do mundo.
Era sábado de Carnaval, passava das 11 da noite e eu ouvia da janela gritos da festa lá embaixo. Enquanto isso, quase 800 pessoas discutiam animadas no chat, lotado de novo, sobre as formas mais eficazes de doar ao mestre.
03.03
Carnaval animado na Virgínia. O professor estreou hoje mais um canal de comunicação: o perfil do Twitter @oproprioolavo. Agora dá para passar quase 24 horas por dia consumindo e comentando conteúdo dele, sem fazer mais nada. Você checa o Twitter, tem algo ultrajante lá, comenta, depois faz o mesmo na página pessoal no Facebook, depois na fanpage e, quando terminar de comentar lá, já tem algo novo no Twitter. É assim dia e noite. Fora os grupos de apoio no Facebook. Estou quase agradecendo ao sujeito que me expulsou do grupo do WhatsApp.
O maior alvo dessa metralhadora é Mourão: hoje houve um post dizendo que é melhor Bolsonaro confiar nos filhos do que nele, outro dizendo que ele não vê Bolsonaro como comandante — o que em si já é um golpe militar —, um dizendo que ele próprio, Olavo, defende mais a honra das Forças Armadas do que o general vice, um comparando o capitão comprometido com as promessas de campanha com o general que as despreza, outro lembrando que Mourão deveria servir à vontade popular, entre tantos. Olavo também compartilhou um “Pedido de Desculpas” do Movimento Direita Brasil, por ter recomendado o voto em Alexandre Frota, depois dos ataques do ator a Olavo.
Sobrou tempo para uma advertência ao presidente, a quem Olavo permanece fiel:
“Bolsonaro está dando mais atenção gentil a seus inimigos do que ao povo que o elegeu. Isso é SUICÍDIO. Ou ele vira as costas aos fofoqueiros e fala ao povo uma vez por semana, ou pode-se considerar derrotado desde já”.
07.03
O presidente deu mais mostras de que escuta o mestre: anunciou que faria lives semanais pelo Facebook e publicou hoje a primeira, criticando campanhas de educação sexual e reclamando de lombadas eletrônicas. Dois dias antes, ele já tinha elogiado Olavo no Twitter, mesmo com o filósofo descendo a lenha todo dia em seu vice.
Mas, mesmo com o apoio de Bolsonaro, Olavo está furioso. Hoje parece ter rachado com o governo.
“Já não posso mais me calar. Todos os meus alunos que ocupam cargos no governo — umas poucas dezenas, creio eu — deveriam, no meu entender, abandoná-los o mais cedo possível e voltar a sua vida de estudos.” Sua explicação foi a seguinte: “O presente governo está repleto de inimigos do presidente e inimigos do povo, e andar em companhia desses pústulas só é bom para quem é como eles”.
Será que a influência do filósofo no poder está se acabando?
08.03
Quanto entrei na sala de aula para assistir à aula número 463, encontrei, pela primeira vez, mais de 1.000 alunos no chat. O clima era de comoção. Muita gente xingando Mourão, outros atacando o diplomata Paulo Roberto de Almeida, demitido nesta semana da diretoria do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, depois de compartilhar críticas a Olavo. Vários discutiam a confusão no Ministério da Educação, onde um assessor, o coronel Ricardo Roquetti, era acusado de tutelar o ministro, indicado por meu professor, a mando de Mourão, e de perseguir os alunos de Olavo, que ocupam posições-chaves na pasta.
A aula não falou de nenhuma dessas polêmicas: foi sobre ciência política. Olavo disse que “não temos nada a comemorar pela modernidade”, referindo-se ao fim da Idade Média. “O resultado foi o homem perdido. O individualismo é a consequência, porque o ‘eu’ foi tudo que restou a ele, quando acabou o império e a autoridade da Igreja.” Sobrou tapa para Haddad (“que quis transformar São Paulo numa cracolândia”) e Obama (“que nem nasceu nos Estados Unidos — tem documento falso”), acusados de, por influência da Escola de Frankfurt, propor uma política “baseada no prazer sexual”.
Elogios só para a Polônia e para a Hungria, cujos governos, que vêm sendo acusados de destruir a democracia, segundo Olavo estão “abertos para o transcendente”. António Salazar, ex-ditador de Portugal, também foi citado em tom positivo: “Um homem mais religioso do que todo o clero brasileiro junto”.
Mas, numa semana de muita polêmica, que terminou com Olavo solicitando a todos os seus alunos que deixassem o governo, o professor nem falou de Brasília. Será que ele realmente resolveu abrir mão do poder político e dedicar-se a ser um professor que fala de filosofia?
09.03
Parece que não. O coronel Roquetti foi demitido do Ministério da Educação, a mando do presidente, e os alunos de Olavo, pelo visto, ficaram. Ao longo dos últimos três meses, meu professor comprou briga com quase todo mundo que ele não indicou no governo. Até agora, os Bolsonaros apoiaram-no em todas e demitiram quem ele mandou — Ilona Szabó, o coronel Roquetti, Paulo Roberto de Almeida —, mesmo contra a vontade de figurões como Moro e Mourão.
11.03
Agora meu professor parece ter rachado também com o ministro que ele mesmo indicou, Ricardo Vélez Rodríguez. No Twitter, ele perguntava se “Vélez se vendeu ou se deu?”. Bem que o colega dele, o filósofo Joel Pinheiro da Fonseca, com quem almocei na semana passada, tinha me avisado que brigar com as pessoas é omodus operandide Olavo. É assim que ele passa pelo mundo: tretando. E com muita frequência o seguidor de hoje vira o arqui-inimigo de amanhã.
Aliás, li hoje um denso artigo filosófico de um desses ex-seguidores, Martim Vasques da Cunha, publicado na semana passada no jornal conservadorGazeta do Povo.Chama-se “O mínimo que você precisa saber sobre o pensamento de Olavo de Carvalho”. O texto é cuidadoso e respeitoso, e dedica bem mais elogios do que críticas ao ex-professor. Mas as críticas são fortes: Cunha acusa-o de ter um projeto de poder com toques místicos. “O que era para ser uma comunidade de estudos tornou-se depois uma ‘teia hierárquica’, cuja meta é influenciar espiritualmente os eventos políticos de uma nação, como uma casta.” Para Cunha, o que Olavo tem em mente é “um programa de reforma intelectual, moral e espiritual do ser humano”: ou seja, a coisa mais autoritária que existe. A resposta de Olavo a esse tipo de crítica vem na forma de apelido: no caso, Mastim Vaca. Fico aqui pensando qual apelido ele vai me dar. Pênis Burroman, será? Ou será que vai me reservar a suprema humilhação de me ignorar?
Mas o que não foi ignorado hoje foi um tuíte de Olavo dizendo que nenhum estudante consegue sobreviver na universidade sem usar drogas e participar de bolinação coletiva. A mensagem bombou nas redes sociais, servindo de escada para uma infinitude de piadas.
12.03
Uma coisa que Olavo disse me faz pensar muito: a ideia de que um professor universitário tem conflitos de interesse demais e não pode pensar livremente. Acho que ele tem razão, sabia? Realmente vivemos uma época em que é difícil pensar com liberdade.
Mas tenho notado que Olavo convive também com um número enorme de conflitos de interesse. Por exemplo: ele sabe que sua audiência aumenta — e a receita também — se ele se comportar menos como um filósofo e mais como um soldado.
Esse papel de animador de torcida que ele tem certamente o atrapalha na hora de olhar para as coisas querendo realmente ganhar conhecimento.
Hoje, por exemplo, a Polícia Federal tinha acabado de anunciar que o matador de Marielle Franco era vizinho de Bolsonaro, e que o motorista que conduziu o assassino no crime foi fotografado ao lado do presidente. Olavo postou: “Pô, presidente, a mídia já está insinuando que o senhor e sua família são culpados da morte da Marielle. Nem diante de uma coisa dessas o senhor vai tomar a iniciativa de processar os caluniadores?”. Não é estranho que um filósofo nunca, jamais, em tempo algum critique ou sequer admita dúvida sobre o presidente da República? Que livre-pensador é esse, casado com o poder?
Acho que o presidente se engana. A imagem dele no exterior é formada aqui dentro, por ele mesmo e seus apoiadores mais chegados, que parecem empenhados em reforçar essa mesma imagem que ele julga negativa. Os embaixadores nas capitais dos principais países cuja imprensa tem se revelado especialmente negativa em relação ao presidente não podem fazer muito, pois as redações recebem insumos a partir de correspondentes estrangeiros no próprio Brasil, ou de agências de imprensa que simplesmente reportam o que está acontecendo por aqui. Relatos geralmente objetivos, ainda que se julgue que esses jornalistas sejam todos esquerdistas e "anti-fascistas", o que pode até ser verdade, mas eles estão fora do alcance dos embaixadores no exterior. Por outro lado, colunistas e autores de análises de opinião, nesse mesmo sentido – ou seja, atacando o presidente lá fora, e supostamente ao alcance dos embaixadores –, são geralmente "brasilianistas", ou acadêmicos que conhecem razoavelmente bem o Brasil, acompanham a imprensa brasileira e também recebem insumo a partir do Brasil. Minha recomendação, portanto, é a de que o presidente (e sobretudo seus filhos e outros fanáticos do bolsonarismo) modifique o seu comportamento, não exija muito dos embaixadores no exterior, que dispõem de poucas condições de mudar uma imagem que toma sua origem aqui mesmo. Cabe fazer uma análise realista das fontes efetivas dessa imagem, e assim facilitar a obra dos embaixadores no exterior. Se o presidente deixar de colocar videos pornográficos na internet, deixar de ofender jornalistas com base em FakeNews, como faz por exemplo aquele mau exemplo do hemisfério setentrional (ao qual o presidente e seus bolsominions parecem apreciar e enaltecer), se ele adotar uma postura presidencial, isso já é um bom começo para mudar essa imagem de racista, homofóbico e direitista. Paulo Roberto de Almeida Brasília, 14/03/2019
Bolsonaro trocará 15 embaixadores em postos-chave para melhorar sua imagem
Presidente disse a jornalistas que não está sendo retratado de maneira correta no exterior
BRASÍLIA - O presidente Jair Bolsonaro se prepara para trocar o comando de 15 importantes embaixadas brasileiras, entre as quais as de Estados Unidos, Portugal, Itália e França. A notícia foi dada por Bolsonaro durante café da manhã com jornalistas na manhã de ontem. Entre as razões para as trocas, pelo menos uma foi citada pelo próprio presidente na reunião: a insatisfação com a imagem dele que está sendo propagada no exterior.
Segundo a Globonews, no encontro, Bolsonaro foi perguntado por que iria trocar o embaixador nos EUA, e ele respondeu que sua imagem como presidente do Brasil não estava sendo veiculada de maneira correta. Bolsonaro se queixou de estar sendo chamado de ditador, racista e homofóbico, e afirmou que não é nada disso. Ele deu a entender que caberia aos embaixadores reverter tal imagem.
O presidente acrescentou que a escolha do novo embaixador em Washington só deverá ser anunciada após sua visita àquele país, que começa no próximo domingo. Atualmente o cargo é ocupado pelo diplomata Sergio Amaral. Embaixador aposentado e um especialista em comércio exterior, Amaral deixou a presidência da Câmara de Comércio Brasil-China para assumir a embaixada em Washington no governo de Michel Temer e foi o responsável por preparar a visita de Bolsonaro aos Estados Unidos, na próxima semana.
Até agora, os nomes mais cotados para o cargo na capital americana são o diplomata Nestor Forster Junior, muito ligado ao chanceler Ernesto Araújo, e o consultor Murillo de Aragão. No primeiro caso seria uma escolha mais ideológica, já que Forster apresentou Araújo a Olavo de Carvalho, o guru do bolsonarismo. Já o segundo seria um sinal de que o governo pretende privilegiar o aspecto econômico da relação bilateral.
Nos últimos dois dias, Olavo de Carvalho atacou Aragão nas redes sociais. “By the way, Murilo (sic)Aragão é homem de Lula”, disse na terça-feira. Ontem, Carvalho afirmou que Aragão foi “alegre membro do Conselhão do Lula”, referindo-se ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (CNDE), que reunia no Palácio do Planalto, periodicamente, representantes de diversos segmentos da sociedade para discutir temas conjunturais. “Colocar petistas em tudo quanto é cargo, sob o pretexto de qualificações técnicas apolíticas, é fazer o povo de trouxa”, afirmou o ideólogo.
Consultado sobre os ataques de Carvalho, Aragão respondeu apenas:
— Respeito o Olavo de Carvalho, mas provavelmente ele não está bem informado acerca da minha trajetória profissional — disse ao GLOBO.
Existem atualmente 224 postos no exterior, entre embaixadas, consulados, missões e escritórios. Segundo fontes da área diplomática, na troca do comando das 15 embaixadas, a ideia é que parte delas seja ocupada por embaixadores sêniores, ou seja, mais experientes.
O chanceler Ernesto Araújo já fez uma grande mexida no Itamaraty ao assumir o comando da diplomacia brasileira, criando uma Secretaria de Assuntos de Soberania Nacional e Cidadania e departamentos específicos para as relações com os Estados Unidos e a China.
Nos três dias de viagem aos Estados Unidos, a partir do próximo domingo, Bolsonaro terá um encontro privado com o presidente americano, Donald Trump, na Casa Branca, e deve assinar três acordos, que ainda estão sendo discutidos pelos dois países. O governo brasileiro trata a visita como a sinalização do início de uma nova etapa na relação com os americanos.
— A visita é a primeira de caráter bilateral realizada pelo presidente Jair Bolsonaro ao exterior, demonstrando a prioridade que o governo atribuiu à construção de uma sólida parceria com os Estados Unidos da América — declarou ontem o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros.
Meus sinceros agradecimentos à nova administração autoritária do Itamaraty, que me demitiu de meu posto de Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais: eles conseguiram dar um tremendo boost em meus seguidores e comentaristas, segundo as estatísticas do Twitter:
@PauloAlmeida53, take a look at your stats for the week ending March 10, 2019, as well as insights on how to keep growing your Twitter presence.
Follower metrics for @PauloAlmeida53
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Last week, the frequency that you Tweeted grew by 22.8%.
Grato EA: mais um pouco vc me promove a leader de twitaços (involuntariamente, claro). Eu não sou como o Chapolim Colorado, cujos movimentos eram cientificamente calculados. Mas os seus movimentos parecem ser o contrário do Chapolim: estupidamente não calculados para dar errado.
Today's encore selection -- from Niccolo's Smile: A Biography of Machiavelli by Maurizio Viroli.
Niccolo Machiavelli (1469-1527) was a statesman, author and source of the term 'machiavellian,' which has come to mean 'unscrupulously cunning, deceptive or expedient' in seeking to achieve some end, and comes from the ideas he put forward in his book, The Prince. Niccolo was an able and eager political functionary renowned for his good humor and wit, but was banished from political life when the Republic of Florence he served fell, and was replaced by the returning Medici and the old form of autocracy. Though he wrote passionately in advocating republics above autocracies, The Prince was his attempt to show that he could nevertheless be a worthy counselor to the Medici—a notably unsuccessful bid to win a job, since the Medici disregarded him. With this book he was saying, 'If you want to be a powerful autocrat here's how to do it right':
"In his brief work [The Prince] are contained the results of his studies of ancient history and everything he learned during his years as secretary of the Florentine Republic. ... Above all, he wished that his short work might be read and understood by the Medici ... [and] if they read it, they would realize that he knew better than anyone else what a prince should do to consolidate power. ...
"When The Prince began to circulate ... it found a host of enemies who saw it as an evil work, inspired directly by the devil, in which a malevolent author teaches a prince how to win and keep power through avarice, cruelty, and falseness. ... What had Machiavelli written to stir up such indignation? He had explained that the ideas set forth by thinkers who had written advice books for princes before him were simply wrong. ... These writers maintained that a prince who wishes to keep power and win glory must always follow the path of virtue. ... Machiavelli [who had just seen Florence fall under such a 'virtuous' leader] stated that a prince who followed such advice in all circumstances not only would not conserve his power, but would surely lose it and be scorned and soon forgotten. ...
Portrait of Niccolò Machiavelli by Santi di Tito.
" 'It is necessary' [he wrote] for a prince, if he wants to maintain his realm, 'to learn to be able not to be good' and to use or not use this, 'according to necessity.' ... A good prince, it has been said for centuries ... should try not to instill fear in but to win the love of his subjects. ... Machiavelli argues instead that a prince ... should 'know well how to use the beast and the man.' ... With similar daring, he discarded the doctrine that a good prince must be generous, lavishing gifts and favors on his friends, [writing that he] will succeed only in flattering a few hangers-on and bankrupting his estate. ... Machiavelli [writes that] a prince should certainly hope to be considered merciful and kind but that cruelty [could be] 'well-used.' ... It is difficult to be loved and feared at the same time, but 'it is much safer to be feared than loved if one has to lack one of the two.' ... [Further] princes who have readily broken their word have, 'done great things', and have triumphed over princes who have kept their word. ... In short, he wants a prince who knows how to win.
"When Francesco Vettori who had become Lorenzo [de Medici, Duke of Urbino]'s most authoritative adviser presented Lorenzo with Niccolo's masterpiece, Lorenzo barely glanced at it, showing much more interest in two stud dogs that someone had sent him."
Niccolo's Smile: A Biography of Machiavelli Author: Maurizio Viroli Publisher: Hill and Wang a division of Farrar, Straus and Giroux Copyright 1998 by Gius, Laterza & Figli Pages: 153-160