Notas preventivas a uma entrevista para
a GloboNews
Paulo Roberto de
Almeida
[Objetivo:
sintetizar questões pertinentes; finalidade:
entrevista na GloboNews]
Em
decorrência de minha exoneração, por decisão exclusiva (e vingativa) do
chanceler, em 4 de março, segunda-feira de Carnaval, acabei sendo solicitado,
por grande número de jornalistas, a conceder entrevistas, escrever artigos,
formular opiniões, sobre a política externa, sobre a diplomacia brasileira, sobre
a minha própria demissão intempestiva como diretor do Instituto de Pesquisa de
Relações Internacionais (IPRI), entidade subordinada à Fundação Alexandre de
Gusmão, que é por sua vez vinculada ao Itamaraty. O “assédio” foi tão intenso
que na terça-feira de Carnaval não consegui sequer tirar o pijama, pois as
demandas foram intensas, da manhã à noite, simultaneamente, em dois telefones,
no computador, pelas redes de comunicação social.
Várias
entrevistas foram publicadas desde a própria segunda-feira 4 de março, e listo
aqui, rapidamente, o que me foi possível registrar como divulgação em relação
ao episódio (e descartando totalmente as dezenas de mensagens trocadas com os próprios
jornalistas por essas ferramentas mais usuais de comunicação eletrônica. O
início de toda o processo se deu em função da primeira postagem que eu fiz, abaixo
transcrita em primeiro lugar, reunindo três textos e convidando a um debate
sobre a política externa brasileira; o chanceler, provavelmente, não gostou de
ter o seu artigo, disseminado unicamente em seu blog pessoal (Metapolítica 17), confrontado a dois outros
textos de feitura bem mais elevada e com argumentação bem mais consistente que
a sua própria.
3426. “Onde está política externa do Brasil?”, Brasília, 6 março 2019, 3
p. Artigo para a revista Veja. Versão
revista, editada pela redação da revista. Publicada sob o título de
“Cadê a política externa?”, na
edição 2625 (ano 52, n. 11, 13/03/2019) de Veja,
divulgada em 8/03/2019, p. 60-61, reproduzido no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/cade-politica-externa-paulo-roberto-de.html).
Relação de Publicados n. 1301.
3433. “A política externa brasileira: respostas a
questionário de El País”, Brasília,
13 março 2019, 3 p. Respondendo a questões do repórter do El País sobre minha exoneração do cargo de diretor do IPRI.
Ocorre
que nessa sequência eu fui contatado pela assessoria da jornalista Miriam
Leitão para uma entrevista em companhia do embaixador Roberto Abdenur, a ser
realizada na manhã do dia 14 de março, o que me obrigou a viajar ao Rio de
Janeiro já na véspera, para não correr o risco de algum imprevisto no transporte
aéreo muito em cima do horário fixado para estar nos estúdios da Rede Globo (9:45hs).
No voo para o Rio, justamente, tentando prever quais perguntas me seriam
feitas, eu fui tomando notas em meu Moleskine sobre quatro pontos prováveis da entrevista,
e que transcrevo agora, na viagem de volta, sem que o que vai transcrito abaixo
represente, efetivamente, o teor da entrevista realizada, a ser transmitida
nesta noite de 14/03, às 21:30hs. Transcrevo, sem qualquer alteração, o que eu
escrevi em meu caderninho.
Demissão: O nome correto é exoneração.
Segunda-feira de Carnaval, logo de manhã cedo, fui despertado por telefonema do
chefe de Gabinete do ministro Ernesto Araújo, comunicando-me o descontentamento
do chanceler com o teor de minhas postagens sobre a diplomacia em curso e
anunciando minha exoneração. Segundo disse num primeiro momento o Itamaraty,
aos órgãos de imprensa que o procuraram na sequência, a substituição já estava
prevista há mais tempo, o que me fez pensar porque o fariam numa manhã de
Carnaval, sem sequer aguardar (aí estava uma ironia) a Quarta-Feira de Cinzas. Alertei
sobre a conveniência de se postergar a exoneração em função da vinda do sogro
do chanceler, embaixador Luiz Felipe de Seixas Corrêa, para palestra no âmbito
da série “Percursos Diplomáticos”, que eu havia criado quando de minha assunção
a diretor do IPRI, junto com o Instituto Rio Branco, em agosto de 2016. Como a
explicação sobre a “exoneração já prevista há mais tempo”, mas realizada numa manhã
de Carnaval, deve ter sido considerada ridícula, inventaram, em tweet do
assessor presidencial em assuntos internacionais, mais conhecido como
Robespirralho, a tese das “ofensas ao chanceler”. Tentei esclarecer que a
expressão “fundamentalistas trumpistas” não se aplicava ao chanceler, mas a um
dos Bolsokids e ao dito assessor, mas parece que não colou. Falei daquele
cidadão de boné da campanha “Trump 2020”, e que havia usurpado uma indevida
representação do povo brasileiro, ao afirmar, na Florida, que todos aqui
apoiavam a construção do muro nas fronteiras do México.
O chanceler
queria resolver a questão de imediato, disse-me o chefe de Gabinete, e assim
foi feito. O fato é que, além da depreciativa referência aos “fundamentalistas trumpistas”,
eu também havia “ofendido” o guru espiritual desse governo, a quem eu chamei de
“sofista da Virgínia” e de “Rasputin de subúrbio”, o que provavelmente provocou
a cólera do chanceler, uma vez que ele deve sua designação a quem ele
respeitosamente chama de “Professor”.
Minha avaliação sobre a política externa do chanceler
olavista: Todos os
jornalistas formulavam essa questão, ao que sempre respondi que era impossível
avaliar algo que simplesmente não existe, que foi exatamente o que eu disse em
meu artigo da Veja. Não há, nunca
houve, e não sabemos se haverá uma exposição clara, completa, sobre qual seria,
em que consistiria, a política externa do governo Bolsonaro. O que havia eram
apenas invectivas, slogans, intenções, várias vezes manifestadas, sobre a
necessidade de se afastar das diplomacias anteriores, todas elas, de todos os
governos, o que aliás os governos do PT já tinham feito, quase que da mesma
forma, ainda que não com o mesmo conteúdo e substância (se existem).
De fato, no dia 1º.
de janeiro tivemos alguns slogans altissonantes, em primeiro lugar do próprio
presidente – sobre a política externa “sem ideologia”, e comércio exterior idem
–, em segundo lugar do chanceler – sobre o fato de a política externa “estar
fora do Brasil”, sem que saibamos o que é isso exatamente, e se isso é possível
–, além de várias frases em latim, em grego e até em tupi-guarani. Mas nunca tivemos,
até aqui, uma apresentação abrangente sobre quais seriam as grandes linhas da
política externa do governo Bolsonaro. Para confirmar isso, eu convido todos a
acessar a “aula magna” – eu preferiria dizer “palestra mínima, e confusão máxima”
– do chanceler aos alunos do Instituto Rio Branco, na segunda-feira dia 11/03,
fechada a todos os que não fossem estudantes, mas felizmente (ou infelizmente,
não sei) gravada e disponível no YouTube, na qual ele discorre, da forma mais
caótica possível, sobre o nada.
A palestra
encontra-se disponível (não sei se permanecerá) no seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=0Qt1kCY7D0M. Imagino que deve ter sido um sofrimento terrível
para os alunos do Rio Branco, aguentar duas horas de balbuciamentos erráticos
sobre conceitos abstratos, uma salada inacreditável de acusações equivocadas
sobre tudo o que se fez anteriormente no Itamaraty e vários eflúvios olavistas,
sem qualquer sentido compreensível ou racional. Se acham que eu estou exagerando
na crítica, podem conferir o vídeo, e também sofrer por duas horas.
Tutela militar sobre o Itamaraty: Não é bem sobre o Itamaraty, e sim sobre o chanceler
especificamente. Aqui não é preciso inventar nada. Se havia alguma dúvida a
respeito, basta ler ou ouvir o que disse o general Hamilton Mourão, vice-presidente,
na reunião de Bogotá do Grupo de Lima sobre a Venezuela, na qual ele foi o
chefe da delegação brasileira, sendo que só ele falou, num espanhol bastante
correto, descartando por completo qualquer solução militar para o drama do país
chavista, eliminando as sinalizações anteriores emitidas pelo chanceler no
sentido de apoiar uma aventura americana de forçar ajuda humanitária pelas
fronteiras colombiana e brasileira da Venezuela. Nesse caso, os militares estão
atuando como diplomatas, defendendo princípios constitucionais brasileiros e o
próprio Direito Internacional, e o chanceler parece estar empenhado em violar
essas ferramentas básicas da diplomacia que ele deveria dirigir atendendo o que
se julga essencial na condução da política externa.
O que estou fazendo agora? Nada de muito diferente do que já fiz durante boa
parte dos governos lulopetistas entre 2003 e 2016: passar o meu tempo livre
(embora involuntariamente) na Biblioteca, que é o meu habitat natural, lendo e
escrevendo. Existe porém um problema: não acredito que a população brasileira,
que paga o meu salário, assim como os órgãos de controle, estão de acordo em
que eu receba um salário (ainda que diminuído de um quarto) sem que eu preste a
contrapartida que é o trabalho na profissão para a qual eu fiz concurso, e que
constitui a minha carreira primária. Acho também que o Itamaraty não merece
isso.
Em voo, de
Brasília ao Rio de Janeiro, 13/03/2019;
complementado em
14/03, para a lista dos trabalhos.
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