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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 4 de agosto de 2019

"Bolsonaro transgride separação de poderes" - Celso de Mello (FSP)

Bolsonaro transgride separação de poderes, diz Celso de Mello
O Estado de S. Paulo, 3/08/2019
"Presidente minimiza a Constituição’, diz decano”
Depois de dar o voto mais contundente no julgamento em que o Supremo Tribunal Federal contrariou o Palácio do Planalto e manteve a demarcação de terras indígenas com a Funai, o decano da Corte, ministro Celso de Mello, disse ao Estado que o presidente Jair Bolsonaro “minimiza perigosamente” a importância da Constituição e “degrada a autoridade do Parlamento brasileiro”, ao reeditar o trecho de uma medida provisória que foi rejeitada pelo Congresso no mesmo ano. “Ninguém, absolutamente ninguém, está acima da autoridade suprema da Constituição da República”, afirmou. Ao longo dos últimos meses, o decano se tornou o principal porta-voz do Supremo em defesa das liberdades individuais e de contraponto às posições do governo. Alvo de um pedido de impeachment após votar para enquadrar a homofobia como crime de racismo, Celso de Mello disse que a Corte não se intimida com manifestações nas ruas ou ameaças de parlamentares. “Pedidos de impeachment sem causa legítima não podem ter e jamais terão qualquer efeito inibitório sobre o exercício independente pelo Supremo Tribunal Federal de suas funções”, disse. É do decano o voto considerado decisivo no julgamento da Segunda Turma do Supremo em que a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acusa o ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, de agir com parcialidade ao condenar o petista no caso do triplex do Guarujá (SP). O ministro defendeu celeridade na análise do habeas corpus do ex-presidente, mas disse que sua convicção sobre o tema não está formada. 
Celso de Mello falou ao Estado após a sessão plenária de anteontem.
- Por unanimidade, o Supremo impôs nova derrota ao Palácio do Planalto e manteve a demarcação de terras indígenas com a Funai. Foi um recado ao presidente Jair Bolsonaro?
- É fundamental o respeito por aquilo que se contém na Constituição da República. Esse respeito é a evidência, é a demonstração do grau de civilidade de um povo. No momento em que as autoridades maiores do País, como o presidente da República, descumprem a Constituição, não obstante haja nela uma clara e expressa vedação quanto à reedição de medida provisória rejeitada expressamente pelo Congresso Nacional, isso é realmente inaceitável. Porque ofende profundamente um postulado nuclear do nosso sistema constitucional, que é o princípio da separação de Poderes. Ninguém, absolutamente ninguém, está acima da autoridade suprema da Constituição da República.
-Faltou um melhor assessoramento jurídico para o presidente Jair Bolsonaro nesse caso?
- Isso eu não sei, eu realmente não posso dizer.
-O senhor deu um voto contundente, apontando “perigosa transgressão” ao princípio da separação dos Poderes. O Supremo também contrariou o Planalto ao proibir o governo de extinguir conselhos criados por lei e foi criticado pelo presidente Jair Bolsonaro por enquadrar a homofobia e a transfobia como racismo.
- Aqui (na demarcação de terras indígenas) a clareza do texto constitucional não permite qualquer dúvida, é só ler o que diz o artigo 62, parágrafo 10 da Constituição da República (o texto diz que é vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo). No momento em que o presidente da República, qualquer que ele seja, descumpre essa regra, transgride o princípio da separação de Poderes, ele minimiza perigosamente a importância que é fundamental da Constituição da República e degrada a autoridade do Parlamento brasileiro. A finalidade maior da Constituição é estabelecer um modelo de institucionalidade que deva ser observado e que deva ser respeitado por todos, pois, no momento em que se transgride a autoridade da Constituição da República, vulnera-se a própria legitimidade do estado democrático de direito. Ninguém, absolutamente ninguém, está acima da autoridade suprema da Constituição da República. No momento em que se transgride a autoridade da Constituição da República, vulnera-se a própria legitimidade do estado democrático de direito.”
- O voto na criminalização da homofobia, considerado histórico por integrantes do STF, lhe rendeu um pedido de impeachment, assinado por deputados da ala conservadora. O senhor vê como uma forma de intimidar a Corte? 
- A história do Supremo Tribunal Federal, desde a primeira década republicana, nos tem revelado que tentativas de intimidação não têm efeito algum. Isso ocorreu no governo do marechal Floriano Peixoto, do marechal Hermes da Fonseca e, no entanto, o Supremo manteve-se fiel ao cumprimento de sua alta missão institucional, que consiste na tarefa de ser o guardião da ordem constitucional. Pedidos de impeachment sem causa legítima não podem ter e jamais terão qualquer efeito inibitório sobre o exercício independente pelo Supremo Tribunal Federal de suas funções constitucionais. O direito de o público protestar é legítimo, ninguém neste país pode ser calado. Qualquer cidadão tem, sim, o direito de protestar. É o direito legítimo. Agora, intimidações não são.
- É aguardada com expectativa a posição do senhor no caso em que a defesa do ex-presidente Lula alega parcialidade do então juiz Sérgio Moro na sentença do triplex. O voto do senhor, que deve ser decisivo, já foi concluído? 
- Eu tenho estudado muito, porque é uma questão que diz respeito não só a esse caso específico, mas aos direitos das pessoas em geral. Ainda continuo pensando, refletindo. Eu, normalmente, costumo pesquisar muito, ler muito, refletir bastante para então, a partir daí, formar definitivamente a minha convicção e compor o meu voto.
- A convicção do senhor já está formada nesse caso?
- Não, não, eu estou ainda em processo de reflexão.
- O senhor acha que seria ideal julgar o caso da suspeição de Sérgio Moro o quanto antes?
- A Constituição manda que o exercício da jurisdição se faça de maneira célere. O direito a um julgamento justo e rápido é um direito que hoje a Constituição assegura a todos, por isso eu acho que, sem distinção de casos, é possível e é necessário que o Supremo Tribunal Federal, como qualquer outro tribunal da República, decida com presteza, porém com segurança.
- Como o senhor avalia a situação da democracia brasileira?
- O regime democrático, muitas vezes, se expõe a situações de risco, mas eu confio que o regime democrático vai ser preservado em plenitude, ao menos enquanto o Supremo Tribunal Federal julgar com independência, como tem efetivamente julgado.
- O senhor ainda trabalha madrugada adentro, ao som de música clássica e bebendo Coca-Cola? 
- Eu gosto de trabalhar ouvindo música clássica, mas Coca-Cola não mais. Coca-Cola me deixa acordado.

A educacao no Brasil continua em situacao falimentar (FSP)

Aposta do MEC, verba arrecadada por universidades federais caiu à metade
Folha de S. Paulo, 3/08/2019
 - Principal aposta do Ministério da Educação para ajudar a financiar as universidades federais em tempos de orçamento acanhado, os recursos obtidos pelas próprias instituições com iniciativas como cursos pagos, aluguel de imóveis e contratos com o setor público e privado despencaram desde 2013. Chamadas de receitas próprias, essas verbas caíram de R$ 1,5 bilhão em 2013 para menos da metade em 2017 (R$ 753 milhões), segundo dados levantados pela consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados. Os valores foram corrigidos pela inflação. A maior queda se deu em 2015, quando a economia do país encolheu 3,8%, e governos e prefeituras, tradicionais contratantes de pesquisas e consultorias, enfrentaram forte desequilíbrio financeiro. Em 2016 e 2017, a receita de verbas próprias se estabilizou no patamar entre R$ 700 milhões e R$ 800 milhões.
Relatório da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, de autoria de Cláudio Tanno, aponta que os recursos diretamente arrecadados pelas universidades responderam por apenas 1,5% do orçamento delas em 2017, mas têm "elevado potencial de incremento". Além da queda na arrecadação, os dados mostram ainda que as instituições de ensino não conseguem utilizar parte da verba angariada por conta própria. Em 2017, por exemplo, elas gastaram 83% do total arrecadado. Para utilizar os recursos, as universidades precisam que o orçamento seja liberado pela área econômica do governo, o que nem sempre acontece. Estudo recém-lançado pelo Cedes (Centro de Estudos e Debates Estratégicos) da Câmara dos Deputados aponta o teto de gastos do governo federal, que limita o aumento de despesas da União à inflação, como um desestímulo para as universidades captarem receitas próprias.
Isso acontece porque, mesmo que as instituições consigam aumentar a arrecadação além do previsto, elas só podem utilizar parte dessa verba. O restante é bloqueado e destinado a reduzir o déficit fiscal do Tesouro ou, em alguns casos, até é liberado, mas como contrapartida do corte de verbas que viriam de qualquer forma do MEC. "O teto de gastos constitui empecilho para ampliação de fontes de recursos das universidades com uso de recursos diretamente arrecadados, situação que vem a desestimular as instituições federais de ensino na busca por receitas dessa natureza", conclui o estudo, que recomenda a aprovação de legislação para tirar as receitas próprias do cálculo do teto de gastos. No ano passado, o Ministério da Educação da gestão Michel Temer (MDB) tentou fazer isso por meio de emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2019, mas acabou derrotado pela área econômica do governo. Pró-reitor de Planejamento, Orçamento e Finanças da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Fernando Mezzadri chama de confisco o bloqueio das verbas arrecadadas pela própria universidade. "Desestimula por completo. Não adianta fomentar a arrecadação se o recurso não é liberado", afirma.
Para Gustavo Fernandes, professor do departamento de gestão pública da FGV (Fundação Getúlio Vargas), seria complicado abrir uma exceção para as universidades nesse caso, uma vez que isso daria margem para outros órgãos públicos pleitearem o mesmo. Anunciado pelo Ministério da Educação com o objetivo de aumentar a captação de recursos extras para as universidades federais, o programa Future-se tenta contornar o limite transferindo parte da gestão a organizações sociais. "As instituições [universidades] já contam com receitas próprias [...]. Mas os recursos não apresentam retorno direto para as atividades por conta de limitação legal. O dinheiro arrecadado vai para a Conta Única do Tesouro", diz texto sobre o Future-se divulgado pela pasta. Parte das universidades já tem passado recursos privados para organizações sociais, como a UnB (Universidade de Brasília). Em 2014, a instituição transferiu atividades do antigo Cespe, responsável pela realização de concursos públicos, para a organização social Cebraspe, fazendo com que o dinheiro de taxas não mais ingressasse diretamente na UnB.
Com esse mesmo objetivo, a Universidade Federal do Paraná também transferiu para uma fundação de apoio em 2017 a realização do seu vestibular, uma das principais fontes de verba própria. A Federal de Juiz de Fora também passou a direcionar para fundações de apoio recursos privados, nos casos em que isso é possível. A consequência dessa estratégia, diz o professor da FGV, é que, em tese, as universidades tendem a perder um pouco da autonomia sobre essa verba, tolhendo a possibilidade, por exemplo, de direcionar parte dela a áreas do conhecimento com menos potencial de interação com o mercado. Para ele, é preciso cuidado para evitar esse desequilíbrio a partir da implantação do Future-se, que está sob consulta pública. Entre as medidas elencadas pelo plano para aumentar o aporte de recurso privado às instituições de ensino está a constituição de fundos patrimoniais, que concentrariam doações, e a destinação a elas do rendimento de fundos negociados em Bolsa. Esse ponto gerou críticas por parte de pessoas da área, como Renato Janine Ribeiro, ex-ministro da Educação do governo Dilma Rousseff (PT), que afirmou não ser adequado financiar a educação com um recurso vulnerável a flutuações.
O professor da FGV pondera, por outro lado, que é possível utilizar mecanismos para evitar especulação. Afirma ainda que a diversificação de fontes de recurso pode ser benéfica por deixar as universidades menos vulneráveis a oscilações em uma fonte apenas. De toda forma, dificilmente as instituições de ensino e pesquisa conseguem se blindar em cenários econômicos desfavoráveis. Em 2008, a Universidade Harvard, por exemplo, viu o seu fundo patrimonial, responsável por mais de um terço do financiamento de suas atividades, perder 22% do valor em apenas quatro meses. Outras universidades americanas sofreram baques semelhantes. Por questões como essa, o plano do MEC tem sido questionado pelo risco de o Future-se se traduzir em uma redução dos repasses de recurso público às universidades, que já enfrentam um bloqueio de verbas de 30% de suas despesas discricionárias (não obrigatórias). A pasta nega. "Não podemos depender de financiamento privado para verbas do dia a dia", diz o pró-reitor da UFPR. "O recurso privado é muito bem-vindo, mas tem que servir para complementar as ações", completa.
Professor com maior patente da USP diz duvidar de plano do MEC
 Titular de uma patente que, sozinha, responde por mais da metade dos royalties recebidos pela USP, o professor Humberto Gomes Ferraz poderia ser o garoto-propaganda dos sonhos do plano da gestão Jair Bolsonaro de atrair mais recursos privados para as universidades. Não é. Crítico da burocracia que atrasa pesquisas, Ferraz é o autor de uma pesquisa aplicada a um medicamento para náusea que se tornou sucesso de vendas. Sua reserva ao plano Future-se, anunciado no mês passado pelo MEC, não se deve às medidas do plano em si, como a possibilidade de organizações sociais atuarem em parte da gestão, algo que ele apoia. "O MEC não começou bem neste governo", afirma ao explicar sua posição, em referência ao discurso de enfrentamento com as universidades adotado pela gestão Bolsonaro. "Fico preocupado com quais seriam as reais intenções desse programa."
O temor de Ferraz é que o plano seja um pretexto para o governo tirar ainda mais recursos públicos da educação. Uma das medidas propostas pelo MEC é a regulamentação do pagamento de royalties a pesquisadores e universidades que desenvolverem produtos licenciados no mercado, algo que já ocorre em algumas instituições, como a USP.
Nesse ponto, o caso de Ferraz, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, é exemplar. Os pagamentos decorrentes de sua participação no desenvolvimento do remédio Vonau Flash renderam à USP 58% da receita da universidade obtida com royalties em 2017 (dados mais recentes), ou R$ 1,44 milhão. A inovação de Ferraz consistiu em desenvolver um comprimido que se dissolve na boca, o que, além de comodidade, permite uma ação mais rápida do princípio ativo. A pesquisa foi feita após uma demanda da farmacêutica Biolab, que financiou o projeto. O professor conta que levou um ano e meio para chegar ao resultado, trabalho que dividiu com aulas, congressos e outras pesquisas. A praticidade levou o Vonau Flash à liderança nas vendas de medicamentos para enjoo, e o dinheiro começou a vir. Segundo a resolução vigente hoje na USP, 30% do valor dos royalties vão para os criadores do produto; 45% aos departamentos dos criadores; 10% às faculdades deles; 5% à Reitoria e 10% à Agência USP de Inovação. O professor contesta essa divisão, que antes era mais favorável aos pesquisadores. De qualquer forma, ele comemora que a verba obtida com essa pesquisa já tenha financiado diversos outros equipamentos em seu laboratório, além de bolsas e outros itens. Para Ferraz, casos como o dele não são mais numerosos na USP por mais de um motivo.
Um deles é a falta de abertura dos pesquisadores e de disposição de parte das empresas para parcerias. "Quando fiz o orçamento para a Biolab, eles não questionaram. Mas às vezes tem empresa que vem, diz que não tem dinheiro e, quando você vê, o executivo está saindo de BMW e você está com um carrinho." Outro obstáculo, diz, é a burocracia da administração pública. "É um inferno gastar a verba da patente", desabafa. Comprar um equipamento, segundo ele, tem levado de seis meses a dois anos. Além disso, afirma, o fato de a universidade dar peso muito maior a publicações nas avaliações dos docentes, em detrimento de outros indicadores como o desenvolvimento de produtos, o tira do foco. Ainda assim, segundo ele, a liberdade proporcionada pela universidade é o que o motiva a trabalhar —mas ela "hoje está um pouco ameaçada no país", afirma. "Talvez o ministro não saiba, mas tem muita gente pensando em desistir", diz.

Onde estão os antiglobalizadores? Perderam para os antiglobalistas?

Até a chegada de alguns malucos ao poder, um dos meus textos mais acessados, livremente disponíveis na Internet – plataforma Academia.edu – era este aqui, já bem antigo, mas de "sucesso" mais recente: 

1297) Contra a antiglobalização: Contradições, insuficiências e impasses do movimento antiglobalizador (2004)
https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida/Analytics/activity/documents/5873102 

Em Academia.edu, ele totalizou 5.890 visualizações, o primeiro de todos, campeão absoluto, pois o segundo, meu livro de 2014, Prata da Casa, só tem 4.896 visualizações, e alcançou 1.198 downloads, também campeão absoluto nesse quesito (o segundo vem numa distante posição, com 540 downloads, o livro Prata da Casa, justamente.

O texto é antigo, do tempo em que existiam antiglobalizadores, quando a tribo ainda organizava ruidosos convescotes anuais sob o signo do "Foro Social Mundial" – estou falando dos primeiros quinze anos do século atual, portanto –,  mas algum professor do Instituto Legislativo Brasileiro parece ter gostado dele e proposto a leitura para seus alunos de curso não presencial sobre relações internacionais. Foi portanto um dos mais acessados em toda a minha longa história de interações desse tipo. Mas de sucesso efêmero, pois quase já não existem mais representantes da tribo.

Hoje, fui verificar uma a uma as dezenas, centenas de mensagens que os garimpeiros desse curso deixavam para mim, ao descarregar o arquivo. A maioria simpaticamente, falando dos estudos ou apenas agradecendo. 
Mas também tive um aluno que foi absolutamente sincero ao dizer que não gostou do meu texto.
Reproduzo aqui o que ele escreveu: 

"Bom dia P. de Almeida. Gostaria de falar um pouco do artigo Contra a antiglobalização. Primeiro queria deixar claro que o artigo não é tão interessante como o título e mais decepcionante ainda quando o lê, e vê que você não é neutro na contradição dos anti, o artigo se tornou chato antes mesmo de começar, por que sua opinião a respeito ficou se repetindo continuamente a cada parágrafo. Não terminei de ler por que é chato de lê alguém que não argumenta apenas expõe a opinião repetidamente de forma que você engula e aceite. 
Ass: Rxxxxx Cxxxx
Dispenso os [sic] de certas expressões, e ainda corrigi alguns acentos, mas gostaria de agradecer a esse leitor a sinceridade da crítica, ainda que ele não tenha me corrigido em nada, apenas disse que não gostou da minha abordagem contra os antiglobalizadores.
É direito dele. Mas eu também acho que essa fauna curiosa já nem existe mais, eles devem ter se cansado de protestar contra a globalização usando os mais modernos materiais, ferramentas, técnicas e métodos de comunicação e publicação fornecidos quase a preço de custo, ou gratuitamente, pelo objeto mesmo do seu protesto: a globalização.
Acho que eles se aborreceram com os velhacos que queriam fazê-los acreditar que a globalização produzia pobreza e miséria no mundo, quando o contrário é o que acontece.

Acho que agora estamos sendo assediados por uma outra tribo, os antiglobalistas, ainda não muito ruidosa, talvez porque ele são basicamente ridículos, ao lutar contra um tal de globalismo que parece estar ameaçando a soberania dos povos. 
São os ludditas da globalização.
Olá, antiglobalistas, vocês são absolutamente entediantes, com essa conversa mole, paranóica, do globalismo.
Estou aguardando mais sérias evidências das ameaças globalistas para poder me pronunciar, mas já escrevi alguns textos a respeito. Um dos mais recentes é este aqui: 

O globalismo e seus descontentes: notas de um contrarianista
https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida/Analytics/activity/documents/39206570

Tem também um dossiê, feito de forma absolutamente involuntária, ao deparar-me com um maluco que fica pregando essa paranoia: 
Dossiê Globalismo: Brasil Paralelo e seu seguimento

Enfim, não se pode contentar todo mundo, e a internet é livre: abriga pesquisadores sérios, aprendizes, simples estudantes e um bando de malucos...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de agosto de 2019

Uma homenagem a Rubens Ricupero - Samuel Pessoa (FSP)

A importância de Rubens Ricupero

Além do aprendizado, em momentos críticos os indivíduos fazem a diferença

O movimento político Livres, coordenado por minha amiga Elena Landau, divulgou na semana passada documentário comemorativo dos 25 anos do Plano Real.
A grande surpresa do documentário foi o depoimento do ministro da Fazenda do governo Itamar, de março a setembro de 1994, Rubens Ricupero.
Sempre achei que o papel de Ricupero para a difícil construção da estabilidade monetária tivesse sido subsidiário. Estava enganado. Ricupero foi fundamental.
Quando FHC deixou o Ministério da Fazenda do governo Itamar para candidatar-se à Presidência, Itamar chamou Ricupero, à época ministro do Meio Ambiente, e convidou-o para o cargo. Ricupero ponderou que era mais oportuno que um membro sênior da equipe do ministério —Edmar Bacha ou Pedro Malan, por exemplo— assumisse a posição.
Na conversa, ficou claro para Ricupero que Itamar não queria ninguém da equipe de FHC à frente do ministério. Antes de aceitar, Ricupero tomou o cuidado de estabelecer precisamente a sua atribuição:
“Tocar o Plano Real com esta equipe”. Este foi o combinado. O discreto diplomata nascido e criado no Brás, figura de proa do Itamaraty, com livros publicados, tendo ocupado inúmeros cargos, entre eles a secretaria-geral da Unctad e a Embaixada do Brasil em Washington, negocia à mineira com o presidente mineiro: o que é combinado não sai caro.
Inúmeras vezes Itamar chamava Ricupero no Planalto. Este sugeria que um técnico o acompanhasse, o que era imediatamente recusado. A conversa tinha que ser entre eles.
Nesses difíceis encontros no Planalto, Itamar compartilhava com Ricupero sua preocupação com o sucesso do plano e tentava convencer o ministro de que ele tinha que adotar um formato mais próximo ao dos cinco planos anteriores, que tinham dado com os burros n’água: congelar os preços.
Inúmeras vezes pleiteou aumentos de salários para servidores e do salário mínimo.
Na véspera do lançamento da nova moeda, em 30 de junho de 1994, no início da noite, o ministro da Justiça de Itamar, Alexandre Dupeyrat Martins, do círculo íntimo do presidente, foi ao Ministério da Fazenda conversar com Ricupero. Persio Arida participou da conversa.
O presidente Itamar ainda não assinara a medida provisória, apesar de toda a logística para o lançamento físico da nova moeda estar pronta.
A pedido de Itamar, o ministro da Justiça inicia meticulosa inquirição sobre a consistência econômica do plano.
Após longo tempo de conversa em que Persio repassou com o ministro da Justiça os fundamentos do Plano Real, Ricupero perde a paciência, liga para a secretária particular de Itamar e diz: “Transmita o seguinte recado ao presidente. Mas faça-o desta forma: se o presidente não me receber em duas horas, algo muito ruim acontecerá”.
O ministro da Justiça, indignado com os termos do telefonema de Ricupero, pergunta se ele não é bem-vindo à Fazenda. Ricupero responde que sempre será. E, se Itamar assim o desejasse, Dupeyrat poderia assumir a Fazenda.
Itamar chamou Ricupero, assinou a medida provisória, e o resto é história.
A construção de uma sociedade é um processo coletivo em que o aprendizado é um elemento importantíssimo. Parece, por exemplo, que a sociedade brasileira aprendeu que não se trava conflito distributivo com inflação. A Argentina ainda não aprendeu essa lição.
Mas além do aprendizado, em momentos críticos os indivíduos fazem a diferença. Ricupero fez. Eu, minhas duas filhas e a sociedade inteira agradecem.

What a difference a year makes: lembrança de um outro verão...

No começo do verão passado, no final de junho de 2018, eu e Carmen Lícia Palazzo estávamos fora do Brasil, mais precisamente em Portugal, onde eu estava participando pela segunda vez do Estoril Political Forum, uma grande iniciativa do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, sob liderança do Professor João Carlos Espada.
Lá fui surpreendido com a notícia de minha promoção ao último grau da carreira, ministro de primeira classe, usualmente chamado de embaixador, mas esse título não corresponde verdadeiramente, pois o "embaixador" é apenas aquela pessoa, da carreira diplomática ou não, que exerce a função de chefe de posto, em missão diplomática permanente no exterior. 
Eventualmente, alguns chefes de missão temporária – assembleias da ONU, grandes conferências diplomáticas internacionais, missões especiais a serviço do país no exterior, etc. – também podem passar a ostentar o título, em se tratando de grandes personalidades do mundo político, jurídico ou cultural, a exemplo de alguns ministros de Estado das Relações Exteriores que se destacaram na área, mas isso é mais raro. 
Nunca foi o meu caso, e acredito que não o será, por circunstâncias conhecidas.

Naquela oportunidade, comecei a receber mensagens de cumprimentos de diversas pessoas, colegas de carreira, amigos, conhecidos diversos, às quais eu mal podia responder individualmente, tantas eram, por estar envolvido com as atividades do seminário, que se estende por três dias. Depois disso ainda passeamos um pouco por Portugal. O próprio SG-MRE, embaixador Marcos Galvão, me escreveu cumprimentando, lamentando apenas que a promoção tivesse ocorrido tão tardiamente.


O que fiz então? O que sempre faço: sento, penso e escrevo.

Acabei redigindo uma mensagem geral alusiva ao fato, que publiquei, como também sempre faço, neste meu espaço de liberdade: 


Duas pedras no meio do caminho... (a propósito de uma promoção tardia)”, Estoril, 26 junho 2018, 4 p. Esclarecimento a propósito de minha promoção tardia na carreira. Postado no blog Diplomatizzando(26/06/2018; link:  https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/duas-pedras-no-meio-do-caminho-paulo.html).

Era uma explicação e uma informação. Eu estava bem, então, como diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), vinculado à Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) do MRE, cargo ao qual tinha sido convidado ao cabo de 13,5 anos de ausência de qualquer função na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, ou seja, durante todo o regime lulopetista, "exílio" do qual fui retirado apenas a partir do impeachment do seu desastroso quarto e último governo (por enquanto).

Pouco antes eu havia estado com a equipe econômica que já estava trabalhando no programa de governo do então candidato que se revelou vencedor em outubro. Fui muito bem recebido, pois tinham tomado conhecimento de alguns textos meus, e me queriam como associado naquela equipe. Recusei de pronto, não a eventualmente enviar textos e reflexões sobre a política externa, mas a me associar a uma equipe de um candidato do qual eu não seria eleitor, nem jamais votaria por ele, digamos que por incompatibilidade total de "programas", ou antes, de "personalidades". Ficamos em bons termos, mas quando da divulgação do programa do dito candidato, escrevi um novo texto comentando rapidamente sua parte econômica – que considerei boa, ainda que vaga – e critiquei asperamente, duramente, a parte de "política externa", uma horrível assemblagem mal costurada de ideias estapafúrdias que já antecipavam o desastre que seria sua diplomacia, caso eleito.
Esse foi o último contato que tive com a equipe econômica, embora tenha conversado posteriormente com um dos membros da equipe, por telefone, e novamente confirmado minha indisponibilidade para colaborar diretamente, mas aberto a oferecer sugestões e subsídios.

Na ocasião, lembrei-me de um outro texto, que havia escrito antes no final de 2016, quando já estava exercendo o cargo de diretor do IPRI, quando desejei rememorar os anos de travessia do deserto no Itamaraty. Eu o coloquei novamente na mesma ocasião da promoção, aqui novamente disponível: 
“Como atravessar o deserto (e permanecer digno ao fim e ao cabo)”, Brasília, 18 dezembro 2016, 7 p. Divulgado no blog Diplomatizzando (24/06/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/uma-longa-travessia-do-deserto.html).
    

Eu sempre preferi manter minha independência de pensamento e de ação, independentemente de cargos, promoções, situações na carreira. Senti que minhas funções se terminariam com a eleição desse novo governo, e assim foi. Logo nos primeiros dias deste governo, em janeiro, recebi a instrução de "não fazer nada" no IPRI, até que as "chefias" decidissem o que poderia ser feito. Já era uma antecipação do que viria pela frente. Fui exonerado no cargo no Carnaval deste ano de 2019, por postar em meu blog três textos convidando a um debate sobre a política externa do governo: uma palestra do embaixador Rubens Ricupero, um artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e um outro artigo-resposta do próprio chanceler, respondendo acerbamente aos dois. Isso deve ter sido em torno das 2hs da manhã do dia 4 de março. Fui acordado às 8hs pelo chefe de gabinete do chanceler, comunicando-me a dispensa do trabalho. Ainda argumentei que eu estava fazendo exatamente o que o chanceler fazia: alimentar um blog pessoal com comentários diversos e, no meu caso, artigos de imprensa, todos eles livremente disponíveis, inclusive no próprio clipping do Itamaraty. Enfim, minha sorte já estava selada desde antes, como eu já tinha total certeza.

Em tempo: o referido chanceler tampouco tem o direito de ser chamado de "embaixador", pois jamais exerceu qualquer chefia de missão permanente, assim como jamais teve cargos relevantes na Secretaria de Estado, sendo apenas um ministro de segunda classe chefe de departamento. Foi promovido a ministro de primeira classe junto comigo, em junho de 2018, provavelmente a pedido de seu sogro, duas vezes Secretário Geral do Itamaraty. Este é apenas um esclarecimento.

Acredito que o atual chanceler, que jamais exibiu as ideias que o "distinguiram" desde outubro ou novembro do ano passado, construiu uma personalidade olavo-bolsonarista que nunca teve, de maneira totalmente artificial, e portanto mentirosa, apenas para ser alçado ao cargo que tem atualmente. Aliás, a atenção sobre si foi chamada por um artigo que saiu publicado na revista que eu editava no IPRI: "Trump e o Ocidente", Cadernos de Política Exterior número 6, segundo semestre de 2017. 
Eu comento esse artigo em meu mais recente livro: Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty, em duas edições, uma de autor, outra pela UFRR, ambas livremente disponíveis a partir de meu blog: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/07/miseria-da-diplomacia-em-edicao-de.html .

Estas são as lembranças que me foram despertadas pouco mais de um ano depois dos eventos que relato aqui. O motivo foi justamente essa canção americana: What a difference a day makes...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de agosto de 2019

sábado, 3 de agosto de 2019

Stalinismo no Itamaraty: um outro caso de livro censurado por causa de um prefácio assinado por Celso Amorim

Alguns stalinistas de direita vão certamente reclamar de que postei aqui uma matéria feita por um portal perfeitamente stalinista, e que se acredita de esquerda. Acho ambos amigos de ditaduras e de totalitarismos.
Mas convido os stalinistas de direita a fazerem matérias sobre o mesmo fato - FATO – que eu postarei aqui com o maior prazer.
No caso do Portal Vermelho, transcrevo aqui pois foi a única matéria sobre essa denúncia que efetuei em meu mais recente livro: Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty.
Existem vários outros casos, muitos outros, que relatarei oportunamente.
Paulo Roberto de Almeida

Como censura a obras acadêmicas ameaça a imagem do Itamaraty  - Portal Vermelho

Uma reportagem publicada pela Folha revela que o Itamaraty se recusou a publicar um livro do embaixador Synesio Sampaio Goes Filho por conta do prefácio da obra, escrito por Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington e também historiador da diplomacia – e visto como desafeto pelo atual ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. 

Por Daniel Buarque

O caso não é isolado, entretanto, e o clima de revisão e censura também atinge outras obras que passam pelo MRE. Esta tendência cria uma ameaça à imagem de profissionalismo, olhar crítico e independência do Itamaraty no resto do mundo. Em seu livro mais recente, que não foi publicado pela Funag, o diplomata Paulo Roberto de Almeida cita pelo menos um outro caso em que a censura ocorreu neste ano.

"Uma tese de doutorado defendida no King's College, da Universidade de Londres, por Mathilde Chatin – Brazil: a new powerhouse without military strength? – A conceptual and empirical quest about an emerging economic power –, já aprovada para publicação pelo Conselho Editorial da Funag em 2018 foi congelada definitivamente por incluir um prefácio do ex-ministro Celso Amorim, no cargo durante o período coberto pelo trabalho acadêmico", diz Almeida em Miséria da Diplomacia: A Destruição da Inteligência no Itamaraty (Boa Vista: Editora da UFRR, 2019).

Os dois casos se juntam à exoneração do próprio Almeida, em março, do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), órgão vinculado ao MRE. A mesma Folha relatou à época que a demissão ocorreu após Almeida republicar, em seu blog pessoal três textos recentes sobre a crise na Venezuela, um assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, outro pelo embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero e o terceiro pelo atual ministro das Relações Exteriores.

Na época, o clima de perseguição dentro do ministério levou à preocupação com o uso mais frequente da censura. A imposição de censura no Itamaraty, especialmente quando direcionada a obras acadêmicas e de história, aumenta o risco pelo qual vem passando um dos principais ativos da diplomacia brasileira.

Por anos, o Itamaraty foi reconhecido internacionalmente como um dos serviços de política externa mais ativos e competentes do mundo. O profissionalismo e senso crítico dos diplomatas brasileiros são mencionados com frequência por estrangeiros que trabalham com política externa, que elogiam o preparo e conhecimento dos representantes do Brasil. Com a imposição de censura, é possível que o serviço de política externa do Brasil perca parte da sua capacidade crítica, que ajuda a promover esta imagem de competência da presença brasileira no exterior.
Blog Brasilianismo

Ainda a censura no Itamaraty a prefacio de Ricupero sobre biografia de Alexandre de Gusmão por Synesio Goes (O Globo)

Mais uma matéria sobre o stalinismo diplomático em curso no Itamaraty atual: se o prefácio fosse escrito por um bolsonarista, mas que defendesse posturas divergentes da atual diplomacia, seria provavelmente publicado junto com a biografia. Prefácio e obra tratam do século XVIII, ou seja, não apresentam nenhum vínculo com a modernidade, mas apenas por causa de um autor a junção foi vetada, com a mais canhestra das razões. Se os diplomatas e não diplomatas quiserem ler mais sobre Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madri (1750), mas com alguns "saltos" para a contemporaneidade, recomendo ler logo o primeiro capítulo do monumental livro de Rubens Ricupero, A diplomacia na construção do Brasil (1750-2016), que revela, aliás, como Alexandre de Gusmão trapaceou (escondendo o mapa francês, mais preciso, e forjando o mapa das cortes, para enganar os espanhóis) em benefício dos seus mestres portugueses e, em última instância, do engrandecimento do Brasil.
Paulo Roberto de Almeida

Itamaraty veta publicação de livro com prefácio de crítico à política externa

Apresentação do historiador e embaixador aposentado Rubens Ricupero foi incluída na última hora em biografia de Alexandre de Gusmão, diplomata brasileiro do século XVIII

Itamaraty vetou livro com prefácio do ex-embaixador do Brasil nos EUA, Rubens Ricupero Foto: Paulo Nicolella / Agência O Globo
Itamaraty vetou livro com prefácio do ex-embaixador do Brasil nos EUA, Rubens Ricupero Foto: Paulo Nicolella / Agência O Globo
BRASÍLIA - O veto à publicação de um livro sobre a vida de Alexandre de Gusmão pelo Itamaraty causou polêmica no meio diplomático. O autor da obra, Synesio Sampaio Goes Filho, conta que terá de procurar outra editora, como antecipou a Folha de S. Paulo. Isso porque a biografia de Gusmão, diplomata brasileiro do século XVIII, tem o prefácio escrito por Rubens Ricupero, ex-embaixador do Brasil em Washington, ex-ministro da Fazenda e um dos maiores críticos da atual política externa brasileira.
O livro, denominado "O estadista que desenhou o mapa do Brasil", chegou a ser aprovado pelo conselho editorial da Fundação Alexandre de Gusmão (Funag). Porém, só após o sinal verde da instituição, vinculada ao Ministério das Relações Exteriores, Goes Filho incluiu o prefácio de Ricupero.
— É verdade [que mandou o livro sem o prefácio], mas eu tinha esperança de que meu livro fosse visto de novo pela comissão. O problema é que o presidente da Funag [Roberto Goidanich) disse o seguinte: 'O Rubens ataca muito o ministro [Ernesto Araújo, o chanceler]  e eu não publico isso aqui' —- disse ao GLOBO o autor.
Goes Filho ressaltou que, para ele, ficou claro que seria impossível a publicação do livro com o prefácio de Rubens Ricupero.
— O Rubens é o maior autor sobre assuntos diplomáticos dos nossos tempos. Seus livros valorizam muito a diplomacia — afirmou.
Procurado, o Itamaraty reiterou que a não publicação do livro se justifica pelo fato de o material ter sido examinado sem o prefácio. Ou seja, não importa quem tenha escrito o texto de apresentação da obra, esse teria que ter passado pelo crivo do conselho. O órgão também informou que o presidente da Funag não vai se manifestar.
— Eu disse ao Synesio que o prefácio não me pertence mais e que poderia ficar à vontade para não incluí-lo no livro. Mas ele teve uma atitude digna e resolveu não publicar a obra — comentou Rubens Ricupero.
Segundo ele, o prefácio não trata do momento atual. Fala sobre o século XVIII e questões de fronteira. Por isso, em sua opinião, a única explicação possível é mesmo a autoria do texto.
— É uma infantilidade, um desgaste inútil, um tiro no pé — arrematou Ricupero.