quarta-feira, 7 de julho de 2010

Como (Nao) Crescer a 7%; mais recente trabalho publicado

Apenas avisando os navegantes e curiosos:

978. “Como (Não) crescer a 7%
Espaço Acadêmico (ano 10, n. 110, julho 2010, p. 73-83).
Relação de Originais n. 2155.

O poderoso chefao da diplomacia brasileira...

Ops, como se dizia antigamente: qualquer semelhança é mera coincidência...

Nem o Barão nem o Chefão
Rolf Kuntz *
O Estado de S.Paulo, 7 de julho de 2010

Dom Vito Corleone jamais cursou uma faculdade e nunca foi diplomata, mas sabia falar com economia e precisão. Dava um recado sério quando usava as palavras "só negócio, nada pessoal". Falta essa clareza à diplomacia brasileira, talvez porque a sua percepção dos interesses e valores seja menos clara que a do chefão criado por Mario Puzo. O chanceler Celso Amorim teve uma educação e uma experiência internacional inacessíveis ao velho mafioso, mas seu discurso é muito menos convincente. "Negócios são negócios", disse o ministro à imprensa brasileira, na Guiné Equatorial, para explicar - e justificar - a boa vontade do governo brasileiro em relação ao ditador Teodoro Obiang Nguema Mbasogo.

A Guiné Equatorial foi a segunda escala do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na viagem à África iniciada no último fim de semana. Foi uma visita de Estado e o presidente africano foi convidado, como era previsível, a retribuí-la. Este convite foi um dos poucos detalhes normais nessa operação diplomática. A maior parte dos outros atos só se explica pela combinação das duas marcas principais da diplomacia petista, a vocação para as trapalhadas e a atração pelo autoritarismo.

O mau uso da palavra "negócio" nas explicações do chanceler brasileiro reflete essa dupla característica da atual política exterior. Para começar, o governo brasileiro pagou certamente mais que o necessário para promover os interesses do País na relação com a Guiné Equatorial. Quase nulo até o ano 2000, o comércio bilateral chegou a US$ 414,22 milhões em 2008 e no ano seguinte, em consequência da crise, recuou para US$ 302,84 milhões. A Guiné tem sido superavitária, exportando hidrocarbonetos e importando alimentos e produtos industriais do Brasil. Só para equilibrar o intercâmbio, os brasileiros deveriam exportar uns US$ 200 milhões a mais.

Há, portanto, boa margem para expansão das trocas. Um bom trabalho de promoção de comércio e investimentos poderia facilitar o aumento dos negócios. Mas o governo brasileiro aceitou pagar um sobrepreço por esse resultado. Comprometeu-se a apoiar o ingresso da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, embora esse idioma não seja o seu idioma corrente. Além disso, o presidente Lula e seu colega Obiang "renovaram", na declaração conjunta, "sua continuada adesão aos princípios da democracia, ao respeito dos direitos humanos e ao Estado de Direito". Poderia ser uma boa piada, se o presidente Lula não envolvesse nessa jogada o nome do Brasil.

Não houve nesse lance nem a fidelidade a princípios, nem o cálculo estritamente realista. As melhores tradições da diplomacia brasileira foram abandonadas em 2003, quando o presidente Lula recauchutou a velha bandeira do terceiro-mundismo. O distanciamento aumentou quando o governo passou a usar essa bandeira para promover uma ambição irrealista de liderança em relação aos países em desenvolvimento.

Os preços pagos por uma liderança nunca reconhecida de fato fora das fronteiras do Brasil foram sempre muito altos. O governo brasileiro se dispôs a engolir e a justificar desaforos dos parceiros sul-americanos, como se isso bastasse para consolidar sua preeminência regional. Nunca deu certo.

No comércio, a retribuição veio na forma de barreiras contra produtos brasileiros e de aumento de importações da China. No campo dos investimentos, houve ações contra interesses da Petrobrás e tentativas de rompimento de contratos. Na articulação diplomática, o Brasil colecionou derrotas incomuns. Não obteve apoio para eleger candidatos à direção-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC) nem à presidência do Banco Interamericano do Desenvolvimento (BID). No caso da OMC, os africanos apresentaram candidato próprio e acabaram, na rodada final, apoiando o nome apresentado pelos europeus.

Na América Latina, os governos das maiores economias têm rejeitado a pretensão brasileira de ocupar uma cadeira permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Quando o presidente Lula resolveu intrometer-se nas discussões sobre o programa nuclear do Irã, ficou falando quase sozinho. Os dois Brics com assento permanente no Conselho de Segurança, Rússia e China, apoiaram as sanções propostas por americanos e europeus.

O Barão do Rio Branco certamente não reconheceria princípios nem interesses nacionais nesse arremedo de estratégia diplomática. Dom Vito Corleone acharia estranhíssimo o uso da palavra "negócio". Mas gente como Teodoro Obiang Nguema Mbasogo deve gostar muito.

* Jornalista.

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Bom negócio para o ditador
Editorial
O Estado de S.Paulo, 7 de julho de 2010

"Negócios são negócios", disse o chanceler Celso Amorim para justificar a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao ditador Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, presidente da Guiné Equatorial há 31 anos. Esse longo período, iniciado com um golpe contra seu tio, Francisco Macías Nguema, foi para ele uma fase de grande prosperidade pessoal ? de excelentes negócios, portanto. Tornou-se o oitavo governante mais rico do mundo, segundo a revista Forbes, graças a métodos não recomendados pelas escolas de administração: violência contra os opositores ? incluindo o assassínio ?, corrupção e estrito controle da vida política de seu país.

O presidente Lula incluiu nos negócios com seu novo amigo o apoio à inclusão da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). O comunicado conjunto emitido no final da visita menciona a satisfação do presidente Obiang por esse apoio. Os países da comunidade nada ganharão com o ingresso desse novo sócio. Mas uma ditadura conhecida por sua violência e pela corrupção ganhará mais um foro para se manifestar e mais espaço na cena internacional,

Não se fala português na Guiné Equatorial, mas a diplomacia brasileira não se deixou impressionar por esse detalhe. Apesar de tudo, a língua portuguesa é um dos idiomas oficiais do país, por ato assinado em 2007 pelo ditador. Os portugueses chegaram à região em 1470. Logo depois apareceram espanhóis e ingleses. O controle ficou para a Espanha entre 1778 e 1968, ano da independência.

A Guiné Equatorial já exporta petróleo para o Brasil e empresários brasileiros poderão participar de seus programas de obras. Essas transações correspondem ao sentido mais comum da palavra negócio. Será necessário muito mais que o interesse material para estimular o comércio e o investimento? Certamente não, mas o presidente brasileiro deve pensar o contrário.

Além de usar a CPLP para facilitar seus "negócios" com o ditador da Guiné Equatorial, o presidente Lula emprestou seu nome a uma declaração com a seguinte preciosidade: "Os dois chefes de Estado reconheceram a importância da democracia para o desenvolvimento e renovaram sua continuada adesão aos princípios da democracia, ao respeito aos direitos humanos, ao Estado de Direito e à boa governabilidade política e econômica no marco da formulação de suas políticas nacionais de desenvolvimento." Também isso é parte dos negócios?

Nenhum jornalista pôde formular essa ou qualquer outra pergunta quando foi apresentado o comunicado conjunto. Lula e seu novo amigo, sentados lado a lado, ouviram um funcionário africano ler a declaração. Repórteres apenas assistiram à cerimônia, mas puderam conversar com o chanceler brasileiro, "Não estamos ajudando nem promovendo ditadura", disse o ministro, classificando como "pregação moralista" as críticas à aproximação com o ditador.

Não é o que os fatos mostram nem o que está no comunicado, no qual o governo brasileiro se dispõe a promover os interesses políticos de uma ditadura e a dar respeitabilidade a um governante conhecido por seu desprezo à democracia. Além de assumir o compromisso em relação à CPLP, convertida em objeto de "negócios", o presidente Lula avalizou uma declaração do ditador Obiang a favor da democracia, do respeito aos direitos humanos e do Estado de Direito.

"Quem resolve o problema de cada país é o povo de cada país", acrescentou o ministro. Também essas palavras os fatos desmentem. Brasília interveio nos assuntos internos de Honduras, abrigando em sua embaixada um ex-presidente introduzido ilegalmente no país e permitindo-lhe atuar na política durante quase cinco meses. Pode-se discutir se a deposição de Zelaya foi ou não um golpe, embora determinada pelo Congresso e pela Corte Suprema. Há justificativas legais para os dois lados. Mas sobre a interferência brasileira não há dúvida. Quanto ao povo hondurenho, elegeu no fim do ano passado um novo governo, que o Itamaraty não reconhece enquanto o presidente deposto não for reintegrado à vida política nacional. Não se vê perspectiva semelhante para o povo da Guiné Equatorial nem para os povos comandados por outros ditadores amigos do presidente Lula.

Kissinger, realista cinico, e assassinos deliberados: Stalin, Hitler, etc...

Meu amigo virtual Vinicius Portela observou, com razão, que, num trabalho dedicado ao realista cínico Henry Kissinger, eu tinha aproximado esse personagem de ditadores bem mais conhecidos.
Eis a passagem de meu trabalho:

"...Kissinger jogou o jogo de forma tão competente quanto todos os demais atores da grande política internacional, Stalin, Mao, Kruschev, Brejnev, Chu En-lai, Ho Chi-min e todos os outros, ou seja, não há verdadeiramente apenas heróis de um lado e patifes do outro. Todos estão inevitavelmente comprometidos como pequenos e grandes atentados aos direitos humanos e aos valores democráticos."

Faz parte deste pequeno ensaio, agora disponível no link abaixo, deste mesmo blog:

O legado de Henry Kissinger
Paulo Roberto de Almeida
Mundorama, 05/06/2008


O velho Kissinger: o realismo cínico de um grande intelectual e um estadista sem escrúpulos (segunda-feira, 5 de julho de 2010)
Aproveitando a (duvidosa) homenagem que se faz o intelectual e homem de Estado (ver post Os novos Kissingers), transcrevo um artigo que escrevi em 2008. (no link acima) (...)

Bem, gostaria agora de retificar o que afirmei acima, num pequeno ensaio escrito muito rapidamente, sem o tempo necessário de reflexão e revisão.
Não, não creio que Kissinger possa ser colocado na companhia desses ditadores absolutos, déspostas sem escrúpulos e assassinos quânticos.

Stalin e Hitler ficariam bem na companhia de Mao Tsé-tung, Pol Pot e outros grandes assassinos da história (com h minúsculo no caso deles, embora eles certamente pertenceram à grande História). Os outros citados -- Kruschev, Brejnev, Chu En-lai, Ho Chi-min -- pertencem a uma outra categoria de figuras históricas, alguns ditadores, outros simplesmente estadistas, outros personagens patéticos (como Kruschev, depois de ter sido um auxiliar devotado de Stalin), à qual tampouco pertence Kissinger.

Este poderia fazer companhia a Chou En-lai, Metternich, Thiers, Foster Dulles e outros estadistas e diplomatas, com a vantagem, talvez, que Kissinger tinha consistência intelectual e não era apenas um negociador frio e calculista como Thiers.
Antes de se tornar um homem de Estado, Kissinger foi um scholar, um estudioso, pesquisador da diplomacia, do equilíbrio de poderes e da dissuasão. Usou um pouco de sua bagagem intelectual quando esteve a serviço da diplomacia americana, mas basicamente deixou de lado alguns de seus valores acadêmicos para afirmar prioritariamente os interesses primários, muitas vezes brutais, dos Estados Unidos.
Não hesitava em ordenar operações da CIA, quando achava que algum ditadorzinho metido a besta -- ou seja, querendo jogar nos dois lados da balança, ou mesmo se alinhar com os interesses soviéticos -- poderia ameaçar posições fundamentais dos EUA.
Mas, não creio, sinceramente, que tenha ordenado massacres ou torturas de civis. O que ocorreu, e certamente ocorreram efeitos desse tipo nos golpes e operações em que ele esteve envolvido -- bombardeio do Vietnã do Norte, do Laos, golpe de Pinochet no Chile, complôs em Portugal, etc -- eram por ele considerados como "side effects" do grande jogo estratégico, no qual só havia um grande contendor, os outros sendo meros piões secundários, mesmo potências nucleares como França e Inglaterra.
A China, em sua época, não era ainda um contendor estratégico, mas um aliado involuntário no grande jogo com a União Soviética.
Kissinger acreditava no equilíbrio de poderes, um pouco como Castlereagh, e certamente não imaginava que seria possível desmantelar a União Soviética numa corrida armamentista e tecnológica como aquela conduzida por Ronald Reagan.
Ele provavelmente teria gostado de ter continuado a servir os EUA sob um presidente conservador como Reagan, mas provavelmente teria aceito servir qualquer presidente, já que não era um político, mas um estrategista.

Encerro este comentário me redimindo, portanto, do pequeno erro graciosamente levantado pelo Vinicius, a quem agradeço por ter me chamado a atenção para essa inconsistência em meu texto, e vou preparar um outro trabalho, talvez "necrológico", para fazer uma avaliação da obra de Kissinger, quando ele se despedir deste nosso mundo...
Paulo Roberto de Almeida
(Shanghai, 7.07.2010)

terça-feira, 6 de julho de 2010

Diplomacia de Lula, poco de contradicoes - Miriam Leitao

Bota poço nisso...
Na verdade, a razão de tudo isso é muito simples, tão simples que basta ter olhos para olhar e chegar a uma conclusão clara, cristalina. Não é preciso nem dizer do que se trata. Para bom entendedor...

Valores relativos
Miriam Leitão
O Globo, 6 de junho de 2010

O ministro Celso Amorim deu uma resposta padrão para as críticas em relação à visita a Guiné Equatorial dirigida pelo ditador Obiang Mbasogo: disse que ’negócios são negócios’. De fato, são.

Mas a diplomacia sabe também que gestos são gestos. Uma coisa é visitar, outra é acolher na Comunidade de Língua Portuguesa um país que sequer fala o português.

Na espantosamente equivocada diplomacia do governo Lula tudo vive misturado.

Só para lembrar: o Brasil não reconhece o governo de Honduras.

Em maio, condicionou a ida do presidente Lula à reunião da Cúpula União EuropeiaAmerica Latina, na Espanha, a que o governo de Madrid desconvidasse o presidente de Honduras, Porfírio Lobo, alegando o golpe contra Manuel Zelaya. Bom, houve sim um golpe, mas o governo de Lobo foi eleito.

O país tão radicalmente defensor de princípios em Tegucigalpa não faz o mesmo no circuito Havana, Caracas, Teerã; nem parece o mesmo que abona a ditadura corrupta e truculenta da Guiné Equatorial com o argumento de que “negócios são negócios”. O país que não comenta a situação interna do Irã, alegando respeitar o princípio de não interferência em assuntos internos, é o mesmo que compara os presos políticos cubanos a criminosos comuns e que afronta a oposição venezuelana afirmando que na Venezuela tem “democracia demais”.

A diplomacia do governo Lula é um poço de contradições insanáveis. Outro argumento usado pelo ministro das Relações Exteriores é que “o isolamento e a distância só farão com que o país fique mais perto de outros e fique mais longe do que desejamos”.

Esse é o mesmo argumento usado para justificar relações fraternas com Mahmoud Ahmadinejad, sem qualquer pergunta a respeito das abusivas condenações à morte de cidadãos que se manifestaram contra as fraudes nas eleições do ano passado.

Quando foi a Tripoli, o presidente Lula fez declarações sobre uma suposta redemocratização do país que estaria sendo conduzida por Muammar Kadhafi.

Quando convém, o governo Lula usa um dos três argumentos: da frieza comercial, da boa influência brasileira sobre maus governos, ou da não interferência em assuntos internos. Em alguns momentos, faz a defesa ideológica de regimes autoritários como os de Cuba e Venezuela.

Em outros momentos, apresentase como defensor inflexível da democracia, o que ocorreu no caso de Honduras.

Como o governo de Honduras realizou eleições, respeitando o que prometeu, não seria o caso de o ministro Celso Amorim dizer o mesmo que disse sobre Guiné Equatorial, que o país não deve ser isolado, porque a proximidade pode empurrá-lo na direção certa? Será que a diferença é apenas o fato de que Guiné tem promissores campos de petróleo, enquanto Honduras é apenas um pobre país centro-americano? Se for isso, que a diplomacia atual nos poupe dos sermões sobre o golpe contra Zelaya ou da condenação à tentativa de golpe que houve em Caracas em abril de 2002, ou quaisquer outros ataques de principismo seletivo.

O Brasil tem que ter relações comerciais com o maior número de países.

Mas deve evitar gestos que pareçam ser uma aprovação a governos que desrespeitem sistematicamente os direitos humanos e que se perpetuem no poder, como Mbasogo. Deve evitar por dois bons motivos: não são esses os valores brasileiros, e o Brasil tem que se esforçar para construir laços com os países e não com os governos.

Por mais interminável que pareça, um dia acabará o governo Hugo Chávez. As demonstrações recorrentes de apoio ao chavismo não são evidentemente bem vistas pela oposição do país. É preciso manter boas relações com a Venezuela sem abonar um governante histriônico que tem feito um ataque serial às instituições. Da mesma forma, é bom aprofundar relações com Cuba sem que isso signifique apoio do Brasil à ditadura de 51 anos da família Castro.

Esse é o ponto que o governo Lula nunca conseguiu.

Mbasogo é um ditador sanguinário que há 30 anos prende e mata inimigos do seu governo e instaurou um estado policial. Não é o Brasil que vai mudar isso, mas sim os cidadãos do país. Mas o cuidado tem que ser o de visitar o país sem abonar seu governo; prospectar negócios sem demonstrar carinho por um ditador. A boa diplomacia sabe bem como fazer esse equilíbrio. Para isso, existem os gestos. Eles precisam ser calibrados na medida certa para passar a mensagem que se quer passar.

Nos governos autoritários, recomenda-se lembrar de como vários governantes fizeram quando estivemos nós sob ditadura. Programas de visitas ao Brasil de governantes democráticos às vezes continham encontros com outras lideranças da sociedade, inclusive adversários do regime. Um dia, o governo militar acabou e alguns líderes daquela oposição passaram a governar o país.

Ahmadinejad nunca teve bons propósitos com o seu programa nuclear. Defender o direito de o Irã ter um programa pacífico, como o nosso, é totalmente diferente de não ver as contradições entre o que o Irã faz e o que o Irã fala; e de ignorar as razões da preocupação da comunidade internacional em relação ao país.

A diplomacia brasileira já soube defender valores e ser pragmática; abrir mercados e ter distanciamento crítico em relação aos governos.

Hoje, não sabe mais.

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Talvez a razão esteja aqui:

Trecho de entrevista de Luís Inácio Lula da Silva à revista “Playboy”, em julho de 1979:

"Há algumas figuras que eu admiro muito, sem contar o nosso Tiradentes e outros que fizeram muito pela independência do Brasil e pela melhoria das condições do povo (...). Por exemplo, o Hitler, mesmo errado, tinha aquilo que admiro num homem, o fogo de se propor a fazer alguma coisa e tentar fazer (...). Não, não [respondendo ao repórter se admirava Adolf Hitler]. O que eu admiro é a disposição, a força, a dedicação. É diferente de admirar as idéias dele, a ideologia dele (...). Khomeini, não conheço muito a coisa sobre o Irã, mas a força que o (xiita) Khomeini mostrou, a determinação de acabar com aquele regime do Xá foi um negócio sério".

EUA-Unasul: "ei, voce ai: empreste a bola, mas nao queremos voce no jogo"

Deixa ver se eu entendi direito: meninos birrentos do quarteirão mais pobre querem a bonita bola de futebol do garoto rico do outro quarteirão, mas não querem que ele participe do jogo, apenas empreste a bola, e não fique se metendo no jogo...
Acho que é um pouco isso, mas vai tentar entender...
Paulo Roberto de Almeida

Chanceleres da Unasul analisam diálogo com os EUA
Nejme Joma
AFP, 06/07/2010

QUITO - Os chanceleres da Unasul analisarão na quinta-feira, em Quito, uma forma de diálogo do bloco com os Estados Unidos, informou a chancelaria equatoriana nesta terça-feira, no momento em que o acordo militar americano com a Colômbia ainda sofre críticas por parte de vários países sul-americanos.

O conselho de chanceleres da União das Nações Unidos Sul-americanas (Unasul) se reunirá de maneira extraordinária para tratar de vários pontos da agenda regional como o diálogo político com os Estados Unidos, afirmou a chancelaria.

Venezuela, Equador e Bolívia rejeitam o acordo militar entre militar entre Estados Unidos e Colômbia assinado em 30 de outubro de 2009, através do qual as tropas americanas podem utilizar bases colombianas para lutar contra o narcotráfico e o terrorismo.

Além disso, os chanceleres receberão um relatório da secretaria técnica sobre o apoio do organismo ao Haiti pelo terremoto de janeiro e outro sobre a presidência pro témpore, que prepara a transferência do cargo à Guiana em agosto.

Governo brasileiro inaugura nova modalidade de entrevista a imprensa: sem perguntas nem respostas...

Não, não foi no Brasil, pelo menos não ainda..., pois se depender de certas pessoas, vão querer inaugurar no Brasil também...

Amorim defende visita de Lula à Guiné Equatorial
Leonencio Nossa, Enviado Especial
O Estado de S.Paulo, 05 de julho de 2010

Na coletiva, cerimonial do governo local não permitiu perguntas de jornalistas ao presidente
"Negócios são negócios". Ditador Nguema Mbasogo está no poder desde 1979

MALABO, Guiné Equatorial - O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, defendeu neste segunda-feira, 5, a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Guiné Equatorial, governada pelo ditador Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, no poder desde 1979. Em rápida entrevista, o chanceler disse que "negócios são negócios" e classificou de "pregação moralista" as referências da imprensa aos crimes contra os direitos humanos atribuídos ao ditador. "Não estamos ajudando nem promovendo ditadura", disse Amorim. "Quem resolve o problema de cada país é o povo de cada país."
Em conversa com jornalistas, o chanceler disse que democracia não se impõe e ressaltou a importância do comércio com a ditadura de Mbasoso, financiada com dinheiro de empresas de petróleo dos Estados Unidos. "O exemplo tem mais força que a pregação moralista", afirmou, sem entrar em detalhes. "Negócios são negócios. Acho que a gente tem de trabalhar normalmente. Estamos num continente onde os países ficaram independentes há pouco tempo", completou. "Isso é uma evolução que tem a ver com a sociedade e com a política."

Na Guiné Equatorial, a família Mbasogo comanda não apenas o Estado, mas a economia. O hotel da rede Sofitel em que Lula passou a última noite pertence a Mbasogo. No pequeno país, não há divisão entre as finanças do Estado e do clã. Os recursos das exploradoras de petróleo, que começaram a chegar ao país nos anos 1990, não resolveram o problema da miséria. Estima-se que 60% da população vivam na pobreza.

Lei do silêncio. Em sua visita à Guiné Equatorial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cumpre até o momento a lei de silêncio imposta por Mbasogo. Na entrevista coletiva marcada para esta manhã, o cerimonial do governo local não permitiu perguntas dos jornalistas. Todos as cadeiras da sala onde o evento ocorreu, num espaçoso palácio de mármore e lustres de cristal, foram ocupadas por diplomatas, assessores e seguranças.

Sentado numa poltrona ao lado de Lula, Mbasogo ostentava um relógio de ouro, cravejado de rubis e diamantes. Ali, os dois ouviram um burocrata do governo da Guiné ler uma declaração ressaltando a visita "histórica e transcendental" do presidente brasileiro. Depois da coletiva de imprensa, sem perguntas nem respostas, Mbasogo ofereceu um requintado banquete para a comitiva de Lula. Os jornalistas brasileiros não aceitaram o almoço.

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Ditador respeita democracia e direitos humanos, diz Lula
Ana Flor
Folha de S. Paulo, 6 de junho de 2010

Os chefes de Estado concordaram em não fazer ingerências um no país do outro; foram assinados cinco acordos

Ao lado do ditador Obiang Nguema Mbsogo, há 31 anos no poder na Guiné Equatorial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou acordos e divulgou um comunicado afirmando que os países são comprometidos com a democracia e o respeito aos direitos humanos. Mbsogo é acusado por organizações internacionais de perseguir opositores do regime, fraudar eleições e violar direitos humanos. É também um dos mandatários mais ricos do mundo.
Os dois assinaram cinco acordos nas áreas de defesa, supressão de vistos oficiais e de cooperação bilateral. No comunicado conjunto, ambos os presidentes concordaram em não fazer ingerências um no Estado do outro. Após o encontro, o Brasil divulgou nota afirmando que os países renovaram sua continuada adesão aos princípios da democracia, ao respeito aos direitos humanos.
Lula também chancelou o pedido de Mbsogo para ser admitido na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). A língua foi incluída entre os idiomas oficiais há pouco tempo, como parte do pleito do ditador.

NEGÓCIOS
Ao chegar ao palácio presidencial -um suntuoso edifício com chão de mármore e lustres de cristal- o ministro Celso Amorim (Relações Exteriores) justificou a visita de Lula afirmando que o exemplo tem muito mais força do que a pregação moralista. Segundo Amorim, negócios são negócios e o Brasil não pode desprezar as possibilidades de trocas comerciais com o país. Tem empresa com mais de US$ 1 bilhão investidos na Guiné Equatorial, não é pouca coisa. Não podemos jogar isso fora, nenhum país do mundo joga isso fora, nem Estados Unidos nem Alemanha nem França, afirmou.
Amorim demonstrou irritação quando questionado sobre os negócios do Brasil com um país acusado de não respeitar direitos humanos. Você tomou café da manhã? Olhou de onde vem a manteiga? Da França, disse, dando a entender que, se a Europa não ignora o país, o Brasil não deve fazê-lo. A posição brasileira se choca com a que foi tomada em episódios como o de Honduras, em que mesmo após as eleições o Brasil não reconhece o novo governo. Uma coletiva de imprensa marcada para depois da assinatura de atos foi cancelada sem explicações. Até os ministros brasileiros foram surpreendidos pela decisão.
O presidente seguiu no fim do dia para o Quênia, onde inicia sua primeira viagem ao leste da África. Tentará ativar o comércio com o país mais industrializado da região. Atualmente, o comércio entre os dois países é pequeno até se comparado com outros países do continente: US$ 91 milhões, sendo que US$ 89,4 milhões são exportações brasileiras -90% de produtos industrializados.

A convite do Palácio do Planalto, a repórter ANA FLOR viajou de Cabo Verde à Guiné Equatorial e ao Quênia numa aeronave da Força Aérea Brasileira.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Alergia a burrice, ojeriza a estupidez: imposto sobre as grandes fortunas

Este blog e este escrevinhador têm poucas coisas que os deixam com alergia (vocês sabem: aquela sensação de irritação à flor da pele, um prurido incômomo, que pode degenerar em coceira). Em princípio, sou animado pelo gosto inveterado do conhecimento, tenho curiosidade por um pouco de tudo, e procuro ler tudo o que apresenta algum interesse intelectual, mesmo no sentido lato.
Sou ademais tolerante com a ignorância sincera, isto é, daquelas pessoas que não puderam estudar na vida, e que apenas exibem o despreparo de quem não teve escola, mal lê e não consegue juntar dois raciocínios lógicos numa simples sequência de frases. Pobres de espírito existem em todas as partes, em sociedades ricas e pobres, embora só nestas eles costumam ser em maior número.
Não é o caso do Brasil, país singular, em que mesmo os mais pobres, pelas dificuldades da vida, justamente, aprendem a ser espertos, e esses eu respeito, menos quando são desonestos.
Mas, se tem uma coisa que eu não consigo aguentar é a burrice. Não a burrice comum, mas a burrice de gente instruída, a ignorância enciclopédica, exibida por gente até bem posta na vida, que fala o tempo todo e pretende dar lições de moral em todos e cada um.
Existe essa estupidez "instruída", se me permitem a expressão e dessa eu tenho completa ojeriza, comichão irresistível.
Ele me aparece quando leio ou ouço certas propostas políticas e econômicas, como essa que vai abaixo no artigo do ex-Secretário da Receita Federal. Eu me refiro, portanto, à burrice de alto coturno, à estupidez de estirpe, à ignorância convertida em receita de política pública.
Dessa eu tenho alergia terrível. E o chamado imposto sobre a grande fortuna é tudo isso, mesmo se ele foi concebido e apresentado por um tucano de estirpe, o próprio constituinte Fernando Henrique Cardoso, que depois viria a ser presidente da República (e que nunca quis converter sua idéia estúpida em realidade). Ele também comete estupidezes e nem sempre se desculpa. Pelo menos uma vez, ao se tornar ministro da Fazenda, recomendou que esquecessem o que ele havia escrito, supostamente referindo-se à chamada teoria da dependência, que não é nem teoria, nem é da independência. Apenas uma estupidez sociológica. Pois bem, ele foi o inventor desse tal imposto, imitando nisso (nem originalidade ele teve), os estúpidos dos socialistas franceses (que depois se arrependeram e viraram quase todos capitalistas).
A estupidez foi então recuperada pelo bando de energúmenos que redigiu o tal plano esquizofrênico dos direitos humanos, um enorme estupidez, do começo ao fim.
Bem, chega de alergia, deixo vocês com este artigo de Everardo Maciel.
Paulo Roberto de Almeida

Os direitos humanos e o imposto sobre grandes fortunas
Everardo Maciel
O Globo, 5.07.2010

Li fragmentos, divulgados pela imprensa, do denominado III Plano Nacional de Direitos Humanos. Pareceu-me um amontoado de idéias em que predominam platitudes e bizarrices, reproduzindo velhos discursos marcados pelo radicalismo hiperbólico. Surpreendi-me, entretanto, com uma esdrúxula referência ao imposto sobre grandes fortunas.

Ao compulsar o Decreto nº 7.037, de 2009, que aprova o mencionado Plano, pude constatar que se trata de um modorrento calhamaço de 228 páginas, no qual há uma furtiva menção àquele imposto. A proposição seria “regulamentar a taxação do imposto sobre grandes fortunas previsto na Constituição”. A cerimoniosa referência ao texto constitucional não salva a pobreza da frase. Como regulamentar o que jamais foi instituído? Como “taxar” um imposto?

A inserção da proposta no Plano, por sua vez, é singularmente pitoresca. Ela integra o “Objetivo Estratégico II” (afirmação dos princípios da dignidade humana e da equidade como fundamentos do processo de desenvolvimento), que é parte da “Diretriz 5” (valorização da pessoa humana como sujeito central do processo de desenvolvimento), que, enfim, se inclui no “Eixo Orientador II” (desenvolvimento e direitos humanos). Essa gongórica articulação foi capaz de, impressionantemente, desembocar na malsinada proposição. É um assombroso salto lógico.

A extravagante idéia poderia ser vista apenas como concessão feita aos bolsões políticos “radicais, porém sinceros”, para usar um chavão frequentemente repetido no governo Geisel. Não é assim, entretanto. Tramita no Congresso Nacional projeto de lei complementar, já aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, que pretende instituir o imposto sobre grandes fortunas, menoscabando o tamanho da carga tributária brasileira.

O imposto sobre as Grandes Fortunas foi concebido na França, no início da década de 80, tendo sua denominação alterada, ainda naquela década, para Imposto de Solidariedade sobre a Fortuna. Poucos países copiaram tal inovação tributária, alguns deles por pouco tempo. Foi nesse contexto que a Constituição de 88 acolheu a novidade, conquanto condicionando instituição do imposto à edição de uma lei complementar.

A experiência mostrou que aquele imposto encerra inúmeros vícios de concepção. Tem baixa capacidade arrecadatória - na França, por exemplo, não representa mais que 0,7% das receitas tributárias. Sua base de cálculo é confusa, em virtude das dificuldades em estabelecer o piso de incidência e das inúmeras exclusões da base de cálculo – a exemplo de obras de arte e bens de uso profissional. Constitui um notável desestímulo à poupança e um peculiar caso de pluritributação, pois tributa mais uma vez um patrimônio já tributado pelos impostos patrimoniais, para não falar da tributação da renda que lhe deu origem. De resto, revelou-se um infeliz incentivo à expatriação de capitais e domicílios fiscais.

Não se alegue que a instituição do imposto sobre grandes fortunas seria uma forma de ampliar os recursos para despesas sociais, porque esses gastos não demandam financiamento por um tipo especial de tributo. Ao contrário, a regra geral é não haver vinculação entre imposto e despesa.

Tampouco se pode pretender, por aquela via, elevar os níveis de progressividade tributária – tese, a propósito, em gradual desuso no mundo, como evidenciam os contínuos avanços, na Europa Oriental, da onda simplificadora centrada no flat tax. A progressividade, malgrado seu caráter polêmico, é matéria já alcançável por alíquotas do imposto de renda e dos impostos patrimoniais.

No projeto de lei complementar, a incidência ocorreria a partir de patrimônios superiores a R$ 2 milhões. A recente e perigosa explosão nos preços dos imóveis urbanos converteria parte significativa da classe média das grandes cidades brasileiras em contribuintes do imposto, mesmo que não tenha havido correspondente aumento de sua renda líquida. De mais a mais, como ficariam aqueles que optaram por construir fundos financeiros para custear sua aposentadoria, sobretudo quando se considera a hipótese plausível de colapso da previdência?

As alíquotas variariam de 1 a 5%. Na hipótese da alíquota máxima, não considerada a incidência dos impostos patrimoniais, sua incidência, no prazo de 20 anos, corresponderia à completa estatização do patrimônio tributado. Nem a mais perversa mentalidade estatizante lograria conceber algo com maior requinte de perversidade.

Definitivamente, inexiste qualquer vínculo conceitual entre direitos humanos e o excêntrico imposto sobre grandes fortunas – uma curiosidade francesa. A extensa fronteira entre os direitos humanos e a tributação se desdobra nas limitações constitucionais ao poder de tributar, na prevenção de discriminações e privilégios fiscais infundados, na observância do princípio da capacidade contributiva e, de modo afirmativo, na efetivação dos direitos do contribuinte e equalização de suas relações com o fisco. Isto, contudo, é outra história.

Everardo Maciel é ex-secretário da Receita Federal

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