Tudo é óbvio e esperado, mas sempre é interessante ter a confirmação por escrito de que a vida é assim mesmo: grandes impérios não gostam de ver os pequenos se qualificando militarmente e fazem de tuo para manter a preeminância estratégica.
Enfim, nenhuma novidade nisso, apenas a confirmação do que já se sabia.
Paulo Roberto de Almeida
EUA tentaram impedir programa brasileiro de foguetes
José Meirelles Passos
O Globo, 25/01/2011
Ainda que o Senado brasileiro venha a ratificar o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas EUA-Brasil (TSA, na sigla em inglês), o governo dos Estados Unidos não quer que o Brasil tenha um programa próprio de produção de foguetes espaciais. Por isso, além de não apoiar o desenvolvimento desses veículos, as autoridades americanas pressionam parceiros do país nessa área - como a Ucrânia - a não transferir tecnologia do setor aos cientistas brasileiros.
A restrição dos EUA está registrada claramente em telegrama que o Departamento de Estado enviou à embaixada americana em Brasília, em janeiro de 2009 - revelado agora pelo WikiLeaks ao GLOBO. O documento contém uma resposta a um apelo feito pela embaixada da Ucrânia, no Brasil, para que os EUA reconsiderassem a sua negativa de apoiar a parceria Ucrânia-Brasil, para atividades na Base de Alcântara no Maranhão, e permitissem que firmas americanas de satélite pudessem usar aquela plataforma de lançamentos.
Além de ressaltar que o custo seria 30% mais barato, devido à localização geográfica de Alcântara, os ucranianos apresentaram uma justificativa política: "O seu principal argumento era o de que se os EUA não derem tal passo, os russos preencheriam o vácuo e se tornariam os parceiros principais do Brasil em cooperação espacial" ? ressalta o telegrama que a embaixada enviara a Washington.
A resposta americana foi clara. A missão em Brasília deveria comunicar ao embaixador ucraniano, Volodymyr Lakomov, que "embora os EUA estejam preparados para apoiar o projeto conjunto ucraniano-brasileiro, uma vez que o TSA (acordo de salvaguardas Brasil-EUA) entre em vigor, não apoiamos o programa nativo dos veículos de lançamento espacial do Brasil". Mais adiante, um alerta: "Queremos lembrar às autoridades ucranianas que os EUA não se opõem ao estabelecimento de uma plataforma de lançamentos em Alcântara, contanto que tal atividade não resulte na transferência de tecnologias de foguetes ao Brasil".
O Senado brasileiro se nega a ratificar o TSA, assinado entre EUA e Brasil em abril de 2000, porque as salvaguardas incluem concessão de áreas, em Alcântara, que ficariam sob controle direto e exclusivo dos EUA. Além disso, permitiriam inspeções americanas à base de lançamentos sem prévio aviso ao Brasil. Os ucranianos se ofereceram, em 2008, para convencer os senadores brasileiros a aprovarem o acordo, mas os EUA dispensaram tal ajuda.
Os EUA não permitem o lançamento de satélites americanos desde Alcântara, ou fabricados por outros países mas que contenham componentes americanos, "devido à nossa política, de longa data, de não encorajar o programa de foguetes espaciais do Brasil", diz outro documento confidencial.
Viagem de astronauta brasileiro é ironizada
Sob o título "Pegando Carona no Espaço", um outro telegrama descreve com menosprezo o voo do primeiro astronauta brasileiro, Marcos Cesar Pontes, à Estação Espacial Internacional levado por uma nave russa ao preço de US$10,5 milhões - enquanto um cientista americano, Gregory Olsen, pagara à Rússia US$20 milhões por uma viagem idêntica.
A embaixada definiu o voo de Pontes como um gesto da Rússia, no sentido de obter em troca a possibilidade de lançar satélites desde Alcântara. E, também, como uma jogada política visando a reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Num ano eleitoral, em que o presidente Lula sob e desce nas pesquisas, não é difícil imaginar a quem esse golpe publicitário deve beneficiar. Essa pode ser a palavra final numa missão que, no final das contas, pode ser, meramente "um pequeno passo" para o Brasil" - diz o comentário da embaixada dos EUA, numa alusão jocosa à célebre frase de Neil Armstrong, o primeiro astronauta a pisar na Lua, dizendo que seu feito se tratava de um pequeno passo para um homem, mas um salto gigantesco para a Humanidade.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
terça-feira, 25 de janeiro de 2011
A bomba-relogio fiscal em construcao -- Rogério Furquim Werneck
O Brasil está construindo -- talvez já tenha construído -- um sistema econômico inviável: um baseado na extração de recursos contínua de contribuintes e empresários (que também são contribuintes, claro, mas a extração também se dá, irracionalmente, não apenas nos ganhos, mas no próprio processo produtivo, o que é, propriamente, um tiro no pé).
Em algum momento essa bomba fiscal vai explodir, talvez não com o estrépito e o furor de uma grande bomba, mas silenciosamente, esgotando as possibilidades de crescimento e de prosperidade.
Creio que precisamos de um "Jared Diamond", um que escreva uma versão econômica de seu justamente reconhecido livro "Colapso", ou seja, por que e como as sociedades constroem sua própria destruição, sendo irracionais ao mais alto grau.
Acredito que os políticos brasileiros já chegaram a essa grau de irracionalidade, ou de inconsciência, vocês escolhem.
Economistas como Rogério Furquim Werneck se encarregam de nos lembrar...
Aliás, a conta que ele faz de um iPad acho que está generosa. Eu fiz a conta para o último modelo do MacAir e cheguei à conclusão que com o preço de um no Brasil daria para comprar dois nos EUA: 102% mais caro aqui do que lá.
Pode?
Paulo Roberto de Almeida
Visão de futuro
Rogério Furquim Werneck
O Globo, 21.01.2011
A preservação do atual regime fiscal, que há mais de 15 anos vem exigindo aumento sem fim da carga tributária, põe em risco a sustentação do dinamismo da economia brasileira. Se não for possível conter a expansão do gasto público dos três níveis de governo, o aprofundamento requerido da extração fiscal acabará por sufocar aos poucos o crescimento econômico do País. São conclusões que advêm da análise agregada dos dados. Mas essa perspectiva do problema pode e deve ser complementada por visões mais específicas, ao nível microeconômico, de como a sobrecarga fiscal que hoje recai sobre a economia brasileira conspira contra o futuro do País.
Estima-se que a carga tributária bruta esteja hoje em torno de 35% do PIB. Mas isso é apenas uma média. Há segmentos da economia que arcam com taxação muito mais pesada. A carga fiscal que recai, por exemplo, sobre serviços de telecomunicação e certos produtos importados é muito maior. E deixa patente a deplorável visão de futuro que permanece entranhada no sistema tributário brasileiro.
No Rio de Janeiro, o ICMS onera os serviços comunicação em quase 43% (alíquota “por fora”). Em São Paulo, em 33,3%. E ainda há que se ter em conta todos os outros tributos que incidem sobre o setor de telecomunicações e acabam repassados, em boa parte, às tarifas. Em 2005, a carga tributária do setor, estimada com base nas contas nacionais, correspondia a mais de 57% do valor dos serviços. É curioso que, nesse quadro de absurda sobrecarga fiscal, o governo ainda esteja em busca da razão primordial pela qual a disseminação do acesso à internet em banda larga avançou tão pouco até agora. É lamentável que o País esteja entrando na segunda década do século 21 com tributação tão escorchante de serviços de telecomunicação, tendo em vista sua crescente importância econômica e social.
Desde a Constituição de 1988, quando passaram a cobrar ICMS sobre tais serviços, os Estados vêm mantendo uma extração fiscal extremada no setor, tirando o melhor proveito possível das exíguas possibilidades de sonegação que lhe são inerentes. No tempo em que telefone era considerado “coisa de rico”, ainda havia quem se dispusesse a arguir que essa taxação tão pesada estaria contribuindo para tornar a carga tributária menos regressiva. Mas já não há mais qualquer espaço para esse tipo de argumento.
O quadro mudou da água para o vinho desde a segunda metade dos anos 90. Na esteira da privatização, o acesso ao telefone vem sendo universalisado. Há hoje mais de 190 milhões de aparelhos celulares no País, 82% dos quais pré-pagos. É sobre o povão, portanto, que boa parte da sobrecarga fiscal vem recaindo. Por outro lado, as comunicações passaram a abranger uma gama de serviços muito mais complexos, que vão muito além da velha telefonia. O que se vê agora é o País taxando pesadamente seu futuro.
A mesma visão de futuro equivocada e arcaica que permanece entranhada na tributação das telecomunicações fica também evidenciada na taxação de certos produtos importados. Basta ver o que vem ocorrendo com dois produtos emblemáticos das novas tendências tecnológicas na área de informática. Os chamados tablets, como o iPad, da Apple, e os leitores de livros digitais, como o Kindle, da Amazon.
Um levantamento recente constatou que, entre 20 países pesquisados, é no Brasil que o iPad é mais caro (O GLOBO, 9/1/2011). Após a incidência de seis tributos, o produto chega ao consumidor brasileiro 84% mais caro do que nos EUA. Já o Kindle, que nos EUA custa US$189, pode ser entregue no Brasil se o cliente estiver disposto a arcar com um frete de US$20,98 e encargos fiscais que a própria Amazon estima em nada menos que US$199,73. O que perfaz um total de US$409,71. São níveis de tributação completamente injustificáveis, fora de qualquer padrão de razoabilidade, advindos de um juggernaut arrecadador que avança como autômato, alheio ao processo de modernização do País.
ROGÉRIO FURQUIM WERNECK é professor da PUC-Rio.
Em algum momento essa bomba fiscal vai explodir, talvez não com o estrépito e o furor de uma grande bomba, mas silenciosamente, esgotando as possibilidades de crescimento e de prosperidade.
Creio que precisamos de um "Jared Diamond", um que escreva uma versão econômica de seu justamente reconhecido livro "Colapso", ou seja, por que e como as sociedades constroem sua própria destruição, sendo irracionais ao mais alto grau.
Acredito que os políticos brasileiros já chegaram a essa grau de irracionalidade, ou de inconsciência, vocês escolhem.
Economistas como Rogério Furquim Werneck se encarregam de nos lembrar...
Aliás, a conta que ele faz de um iPad acho que está generosa. Eu fiz a conta para o último modelo do MacAir e cheguei à conclusão que com o preço de um no Brasil daria para comprar dois nos EUA: 102% mais caro aqui do que lá.
Pode?
Paulo Roberto de Almeida
Visão de futuro
Rogério Furquim Werneck
O Globo, 21.01.2011
A preservação do atual regime fiscal, que há mais de 15 anos vem exigindo aumento sem fim da carga tributária, põe em risco a sustentação do dinamismo da economia brasileira. Se não for possível conter a expansão do gasto público dos três níveis de governo, o aprofundamento requerido da extração fiscal acabará por sufocar aos poucos o crescimento econômico do País. São conclusões que advêm da análise agregada dos dados. Mas essa perspectiva do problema pode e deve ser complementada por visões mais específicas, ao nível microeconômico, de como a sobrecarga fiscal que hoje recai sobre a economia brasileira conspira contra o futuro do País.
Estima-se que a carga tributária bruta esteja hoje em torno de 35% do PIB. Mas isso é apenas uma média. Há segmentos da economia que arcam com taxação muito mais pesada. A carga fiscal que recai, por exemplo, sobre serviços de telecomunicação e certos produtos importados é muito maior. E deixa patente a deplorável visão de futuro que permanece entranhada no sistema tributário brasileiro.
No Rio de Janeiro, o ICMS onera os serviços comunicação em quase 43% (alíquota “por fora”). Em São Paulo, em 33,3%. E ainda há que se ter em conta todos os outros tributos que incidem sobre o setor de telecomunicações e acabam repassados, em boa parte, às tarifas. Em 2005, a carga tributária do setor, estimada com base nas contas nacionais, correspondia a mais de 57% do valor dos serviços. É curioso que, nesse quadro de absurda sobrecarga fiscal, o governo ainda esteja em busca da razão primordial pela qual a disseminação do acesso à internet em banda larga avançou tão pouco até agora. É lamentável que o País esteja entrando na segunda década do século 21 com tributação tão escorchante de serviços de telecomunicação, tendo em vista sua crescente importância econômica e social.
Desde a Constituição de 1988, quando passaram a cobrar ICMS sobre tais serviços, os Estados vêm mantendo uma extração fiscal extremada no setor, tirando o melhor proveito possível das exíguas possibilidades de sonegação que lhe são inerentes. No tempo em que telefone era considerado “coisa de rico”, ainda havia quem se dispusesse a arguir que essa taxação tão pesada estaria contribuindo para tornar a carga tributária menos regressiva. Mas já não há mais qualquer espaço para esse tipo de argumento.
O quadro mudou da água para o vinho desde a segunda metade dos anos 90. Na esteira da privatização, o acesso ao telefone vem sendo universalisado. Há hoje mais de 190 milhões de aparelhos celulares no País, 82% dos quais pré-pagos. É sobre o povão, portanto, que boa parte da sobrecarga fiscal vem recaindo. Por outro lado, as comunicações passaram a abranger uma gama de serviços muito mais complexos, que vão muito além da velha telefonia. O que se vê agora é o País taxando pesadamente seu futuro.
A mesma visão de futuro equivocada e arcaica que permanece entranhada na tributação das telecomunicações fica também evidenciada na taxação de certos produtos importados. Basta ver o que vem ocorrendo com dois produtos emblemáticos das novas tendências tecnológicas na área de informática. Os chamados tablets, como o iPad, da Apple, e os leitores de livros digitais, como o Kindle, da Amazon.
Um levantamento recente constatou que, entre 20 países pesquisados, é no Brasil que o iPad é mais caro (O GLOBO, 9/1/2011). Após a incidência de seis tributos, o produto chega ao consumidor brasileiro 84% mais caro do que nos EUA. Já o Kindle, que nos EUA custa US$189, pode ser entregue no Brasil se o cliente estiver disposto a arcar com um frete de US$20,98 e encargos fiscais que a própria Amazon estima em nada menos que US$199,73. O que perfaz um total de US$409,71. São níveis de tributação completamente injustificáveis, fora de qualquer padrão de razoabilidade, advindos de um juggernaut arrecadador que avança como autômato, alheio ao processo de modernização do País.
ROGÉRIO FURQUIM WERNECK é professor da PUC-Rio.
Diplomacia da "pressao" (ou nao-diplomacia): relacoes Brasil-China
Fazer diplomacia pela imprensa, mandando recadinhos sobre possíveis intenções não faz parte, normalmente, dos instrumentos diplomáticos. Salvo em situações "híbridas", em que todo mundo se julga no direito de "dar um pitaco" nas relações exteriores do país.
O que acontece em vácuos institucionais, ou de pouca definição decisória.
Paulo Roberto de Almeida
Brasil estuda como pressionar China
Eliane Oliveira
O Globo, 25.01.2011
No momento em que busca reerguer os setores prejudicados pelo avanço dos produtos chineses, o governo esbarra em dificuldades práticas, a começar pelo fato de o Brasil ter reconhecido a China como economia de mercado em 2004. As autoridades brasileiras ameaçam não formalizar o novo status, enquanto as chinesas pressionam e afirmam que o Brasil assinou mas não cumpriu o memorando de intenções.
Quando um país não é formalmente reconhecido como economia de mercado, é mais fácil comprovar a existência de dumping (preço abaixo do custo de produção) ou subsídios e exigir compensações. Basta comparar os valores das mercadorias que entram no país com os preços em terceiros mercados.
Mas, se a economia chinesa for vista pelo Brasil como economia de mercado, os investigadores terão de buscar dados sobre custos e mão de obra na própria China, o que não é fácil, explicou uma fonte. Ou seja, quando o governo brasileiro reconhecer o status reivindicado pelos chineses, será mais difícil instaurar um processo.
— Esse reconhecimento nunca nos afetou. O problema é se isso for formalizado. Aí não seria mais possível usar terceiros países para fazer comparações — confirma Marcos Imamura, sócio da Guedes, Bernardo e Imamura Consultoria, especializada em dumping.
Segundo uma fonte que participou das discussões, o reconhecimento quase ocorreu no fim de 2010, por pressão chinesa. O governo brasileiro, porém, fez um recuo estratégico: quer negociar compensações para o câmbio artificial que mantém o yuan desvalorizado frente ao dólar. Mesmo porque Dilma Rousseff vai a Pequim em abril e não quer voltar de mãos vazias.
Um dos trunfos brasileiros é a forte dependência da China por alimentos e recursos naturais. Ela importa do Brasil cerca de US$20 bilhões por ano de soja e minério de ferro. Mas qualquer passo exige cautela, para que o Brasil não seja alvo de ações na Organização Mundial do Comércio (OMC).
O que acontece em vácuos institucionais, ou de pouca definição decisória.
Paulo Roberto de Almeida
Brasil estuda como pressionar China
Eliane Oliveira
O Globo, 25.01.2011
No momento em que busca reerguer os setores prejudicados pelo avanço dos produtos chineses, o governo esbarra em dificuldades práticas, a começar pelo fato de o Brasil ter reconhecido a China como economia de mercado em 2004. As autoridades brasileiras ameaçam não formalizar o novo status, enquanto as chinesas pressionam e afirmam que o Brasil assinou mas não cumpriu o memorando de intenções.
Quando um país não é formalmente reconhecido como economia de mercado, é mais fácil comprovar a existência de dumping (preço abaixo do custo de produção) ou subsídios e exigir compensações. Basta comparar os valores das mercadorias que entram no país com os preços em terceiros mercados.
Mas, se a economia chinesa for vista pelo Brasil como economia de mercado, os investigadores terão de buscar dados sobre custos e mão de obra na própria China, o que não é fácil, explicou uma fonte. Ou seja, quando o governo brasileiro reconhecer o status reivindicado pelos chineses, será mais difícil instaurar um processo.
— Esse reconhecimento nunca nos afetou. O problema é se isso for formalizado. Aí não seria mais possível usar terceiros países para fazer comparações — confirma Marcos Imamura, sócio da Guedes, Bernardo e Imamura Consultoria, especializada em dumping.
Segundo uma fonte que participou das discussões, o reconhecimento quase ocorreu no fim de 2010, por pressão chinesa. O governo brasileiro, porém, fez um recuo estratégico: quer negociar compensações para o câmbio artificial que mantém o yuan desvalorizado frente ao dólar. Mesmo porque Dilma Rousseff vai a Pequim em abril e não quer voltar de mãos vazias.
Um dos trunfos brasileiros é a forte dependência da China por alimentos e recursos naturais. Ela importa do Brasil cerca de US$20 bilhões por ano de soja e minério de ferro. Mas qualquer passo exige cautela, para que o Brasil não seja alvo de ações na Organização Mundial do Comércio (OMC).
Sic transit gloria mundi (no caso, as politicas nacionais...)
CAI A APROVAÇÃO DE 5 PRESIDENTES NA AMÉRICA DO SUL!
Ex-Blog de Cesar Maia, 25.01.2011
(La Nacion, 24) José Mujica, Uruguai. Desde junho, sua popularidade caiu 23 pontos, afetado por um alto nível de conflito com a oposição e com os sindicatos . \ Evo Morales, Bolívia. As idas e vindas pela aprovação do "gasolinazo" levaram sua aprovação para o nível mais baixo desde que tomou posse em 2006: 30% \ Hugo Chávez, Venezuela. Vencido pela crise econômica, a percepção negativa, rejeição da sua gestão está no nível mais alto em cinco anos. \ Sebastian Piñera, Chile. O apoio ao empresário alcançou seu nível mais baixo para um líder chileno desde o retorno da democracia em 1990. \ Alan García, Peru. Os escândalos de corrupção que afetam o governo fizeram com que a desaprovação, rejeição da sua gestão disparasse para 65%.
Ex-Blog de Cesar Maia, 25.01.2011
(La Nacion, 24) José Mujica, Uruguai. Desde junho, sua popularidade caiu 23 pontos, afetado por um alto nível de conflito com a oposição e com os sindicatos . \ Evo Morales, Bolívia. As idas e vindas pela aprovação do "gasolinazo" levaram sua aprovação para o nível mais baixo desde que tomou posse em 2006: 30% \ Hugo Chávez, Venezuela. Vencido pela crise econômica, a percepção negativa, rejeição da sua gestão está no nível mais alto em cinco anos. \ Sebastian Piñera, Chile. O apoio ao empresário alcançou seu nível mais baixo para um líder chileno desde o retorno da democracia em 1990. \ Alan García, Peru. Os escândalos de corrupção que afetam o governo fizeram com que a desaprovação, rejeição da sua gestão disparasse para 65%.
Wikileaks-Brasil: o grande pacificador do Oriente Medio...
WikiLeaks: EUA suspeitam de motivação brasileira no Oriente Médio
José Meirelles Passos
O Globo on line, 22/01/2011
RIO - O governo dos Estados Unidos ainda não conseguiu decifrar, precisamente, os motivos que levam o Brasil a demonstrar tanto interesse em participar de espinhosas negociações sobre conflitos no Oriente Médio - e, sobretudo, as maneiras utilizadas para se inserir nesse contexto. Intrigados com o comportamento - que consideram pouco ortodoxo - das autoridades brasileiras sobre o assunto, diplomatas americanos têm ido além dos canais oficiais em busca de respostas, procurando contatos com as comunidades árabes no país atrás de alguma pista. Nos encontros, eles também mostram grande preocupação com a presença crescente no Brasil - segundo os seus cálculos - de militantes e simpatizantes do grupo radical xiita libanês Hezbollah, à qual o governo estaria fazendo vista grossa.
É isso o que sugere uma série de telegramas confidenciais enviados a Washington pela Embaixada dos EUA em Brasília, entre julho de 2005 e janeiro de 2009, que o WikiLeaks entregou ao GLOBO. Num deles, os diplomatas dizem que as autoridades brasileiras "tentam justificar suas posições e políticas mais controvertidas sobre o Oriente Médio" como uma resposta às demandas políticas da comunidade muçulmana brasileira.
No entanto, segundo a avaliação americana, tanto a comunidade árabe cristã como a muçulmana no Brasil não parecem ter o menor interesse no cenário político do Oriente Médio. Esse é um dos fatos intrigantes: "Isso levanta uma questão maior: o que está motivando, então, as políticas às vezes controversas e contraditórias do governo brasileiro em relação ao Oriente Médio?", conclui um dos telegramas.
===========
Desejo de grandeza?
Megalomania?
José Meirelles Passos
O Globo on line, 22/01/2011
RIO - O governo dos Estados Unidos ainda não conseguiu decifrar, precisamente, os motivos que levam o Brasil a demonstrar tanto interesse em participar de espinhosas negociações sobre conflitos no Oriente Médio - e, sobretudo, as maneiras utilizadas para se inserir nesse contexto. Intrigados com o comportamento - que consideram pouco ortodoxo - das autoridades brasileiras sobre o assunto, diplomatas americanos têm ido além dos canais oficiais em busca de respostas, procurando contatos com as comunidades árabes no país atrás de alguma pista. Nos encontros, eles também mostram grande preocupação com a presença crescente no Brasil - segundo os seus cálculos - de militantes e simpatizantes do grupo radical xiita libanês Hezbollah, à qual o governo estaria fazendo vista grossa.
É isso o que sugere uma série de telegramas confidenciais enviados a Washington pela Embaixada dos EUA em Brasília, entre julho de 2005 e janeiro de 2009, que o WikiLeaks entregou ao GLOBO. Num deles, os diplomatas dizem que as autoridades brasileiras "tentam justificar suas posições e políticas mais controvertidas sobre o Oriente Médio" como uma resposta às demandas políticas da comunidade muçulmana brasileira.
No entanto, segundo a avaliação americana, tanto a comunidade árabe cristã como a muçulmana no Brasil não parecem ter o menor interesse no cenário político do Oriente Médio. Esse é um dos fatos intrigantes: "Isso levanta uma questão maior: o que está motivando, então, as políticas às vezes controversas e contraditórias do governo brasileiro em relação ao Oriente Médio?", conclui um dos telegramas.
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Desejo de grandeza?
Megalomania?
Tentando aperfeicoar a democracia nas Americas
Parece que a Carta Democratica da OEA, aprovada em 11 de setembro de 2001 (sim, no mesmo dia...), pode ser aperfeiçoada, para garantir a democracia não só contra golpes, mas também contra candidatos a ditadores que implantam uma ditadura legalmente...
Eu proporia um mecanismo de revisão das políticas internas dos países membros, algo como um TPRM da OMC, o famoso Trade Policy Review Mechanism, periódico...
E também apoio a ideia de que partidos políticos possam peticionar, de modo fundamentado, contra seus próprios governos...
Paulo Roberto de Almeida
REUNIÃO DA "UPLA", EM SANTA CRUZ DE LA SIERRA, BOLÍVIA!
Ex-Blog de Cesar Mais, 24 de janeiro de 2011
1. A União de Partidos Latino-americanos (UPLA) reuniu-se neste fim de semana, em Santa Cruz, Bolívia, para avaliar o quadro político continental e abrir o ano em que a Carta Democrática da OEA (Organização dos Estados Americanos) cumpre 10 anos e requer ajustes.
2. A UPLA, após essa reunião, caminha para incorporar as demais organizações latino-americanas que representam os partidos de centro e centro-direita do continente. Com isso, as duas internacionais, a IDC (democrata de centro) e a UDI (união democrata), que congregam os partidos de centro e centro-direita europeus e norte-americanos, passarão a ter uma só representação política na América Latina. No Brasil, o Democratas é o membro integrante, ocupando, inclusive, a vice-presidência da UPLA.
3. O foco principal da reunião foram as emendas à Carta Democrática (CD) da OEA com vistas a seu aperfeiçoamento. A CD, já em seu artigo primeiro, restringe aos governos dos países membros qualquer acesso a OEA. Entende a UPLA que o direito a voto deve ter essa restrição. Porém, assim como em outras organizações, incluindo a ONU, deve se abrir canais para que os demais poderes dentro desses países, partidos e organizações da sociedade civil possam encaminhar à secretaria geral questões, problemas e denúncias para análise da OEA e, se for o caso, serem submetidas aos demais membros.
4. Na medida em que a CD define como membros integrantes aqueles que respeitam o jogo democrático, sugere-se uma comissão de alto nível para avaliar os países e encaminhar relatórios anuais.
5. Deve-se entender democracia não apenas a observância das regras para acesso ao poder, mas também o respeito às regras democráticas no exercício do poder. Finalmente, transformar a Carta Democrática -um documento que efetivamente produziu avanços- em um Tratado de forma a gerar efeitos vinculantes.
Eu proporia um mecanismo de revisão das políticas internas dos países membros, algo como um TPRM da OMC, o famoso Trade Policy Review Mechanism, periódico...
E também apoio a ideia de que partidos políticos possam peticionar, de modo fundamentado, contra seus próprios governos...
Paulo Roberto de Almeida
REUNIÃO DA "UPLA", EM SANTA CRUZ DE LA SIERRA, BOLÍVIA!
Ex-Blog de Cesar Mais, 24 de janeiro de 2011
1. A União de Partidos Latino-americanos (UPLA) reuniu-se neste fim de semana, em Santa Cruz, Bolívia, para avaliar o quadro político continental e abrir o ano em que a Carta Democrática da OEA (Organização dos Estados Americanos) cumpre 10 anos e requer ajustes.
2. A UPLA, após essa reunião, caminha para incorporar as demais organizações latino-americanas que representam os partidos de centro e centro-direita do continente. Com isso, as duas internacionais, a IDC (democrata de centro) e a UDI (união democrata), que congregam os partidos de centro e centro-direita europeus e norte-americanos, passarão a ter uma só representação política na América Latina. No Brasil, o Democratas é o membro integrante, ocupando, inclusive, a vice-presidência da UPLA.
3. O foco principal da reunião foram as emendas à Carta Democrática (CD) da OEA com vistas a seu aperfeiçoamento. A CD, já em seu artigo primeiro, restringe aos governos dos países membros qualquer acesso a OEA. Entende a UPLA que o direito a voto deve ter essa restrição. Porém, assim como em outras organizações, incluindo a ONU, deve se abrir canais para que os demais poderes dentro desses países, partidos e organizações da sociedade civil possam encaminhar à secretaria geral questões, problemas e denúncias para análise da OEA e, se for o caso, serem submetidas aos demais membros.
4. Na medida em que a CD define como membros integrantes aqueles que respeitam o jogo democrático, sugere-se uma comissão de alto nível para avaliar os países e encaminhar relatórios anuais.
5. Deve-se entender democracia não apenas a observância das regras para acesso ao poder, mas também o respeito às regras democráticas no exercício do poder. Finalmente, transformar a Carta Democrática -um documento que efetivamente produziu avanços- em um Tratado de forma a gerar efeitos vinculantes.
1822 de Laurentino Gomes: a historia para o cidadao comum
Ja li o 1808, do mesmo jornalista, e também vou ler o 1822. Não que eu espere aprender muita coisa nova, desse tipo de vulgarização de boa qualidade, embora o autor, apesar de não ser um historiador de formação, tem um excelente faro jornalístico e oferece boas coisas, algumas até inéditas, para quem queira refrescar o seu conhecimento sobre nossa história (alguns até aprendem do zero).
Mas, ele escreve muito bem e suas fontes são fiáveis. Sempre se pode aprender a escrever melhor com quem é um profissional da escrita...
Paulo Roberto de Almeida
Um barril de pólvora chamado Brasil
Fernando Vives
Carta Capital, 18 de janeiro de 2011
O autor de 1822, Laurentino Gomes, fala sobre o país improvável que surgiu na Proclamação da Independência
Entre as obras lançadas na Feira do Livro do Rio de Janeiro em 2008, um quase despretensioso livro sobre a vinda da corte portuguesa ao Brasil 200 anos antes reacenderia o debate sobre a pesquisa histórica no Brasil. Apesar – ou justamente por isso – da fama de não conhecer a própria história, o brasileiro colocou a obra entre as mais vendidas em pouco tempo. O livro era o 1808, e o autor, o jornalista Laurentino Gomes. Os 600 mil exemplares vendidos levaram Gomes a se dedicar exclusivamente à divulgação da obra e pesquisa para o próximo livro, 1822, desta vez sobre a Independência brasileira. Lançado no fim do ano passado, repetiu o sucesso e reacendeu um debate entre acadêmicos. Além de ser escrita por alguém de fora da academia, Laurentino mistura a macroestrutura da época com histórias curiosas dos personagens principais. A história do País estava sendo banalizada? “Eu vulgarizo a História, mas não a banalizo. Tiro da linguagem acadêmica e a conto de um jeito agradável”, diz.
Nesta entrevista ao jornalista Fernando Vives, regada a capuccino em uma padaria do bairro de Perdizes, em São Paulo, Laurentino Gomes fala sobre 1822, o desafio de tornar a história palatável ao público não acadêmico, as dificuldades de se fazer pesquisa no País e rebate os críticos de sua obra.
Carta na Escola: O senhor era um jornalista que tinha apenas curiosidade pela História. Como surgiu a ideia de falar sobre 1808, e depois de 1822?
Laurentino Gomes: Bem, fui jornalista durante quase 30 anos e o jornalismo e a história são vizinhos. O jornalista testemunha e narra história todos os dias, enquanto o historiador tem um olhar mais distanciado, com mais metodologia e profundidade. Em 1997, surgiu uma oportunidade: eu era editor da revista Veja e havia um projeto especial sobre a história do Brasil – um deles sobre a vinda da corte portuguesa ao Rio de Janeiro. O projeto foi cancelado, mas continuei. Lancei o livro em 2007 pensando na efeméride do ano seguinte, e aí aconteceu o que não imaginava: um livro sobre história do Brasil virou best seller. Então tomei uma decisão arriscada: deixar a Editora Abril, onde trabalhei por 22 anos, para seguir carreira por conta própria, dedicando-me à divulgação do 1808. Fiz bate-papos com leitores, palestras, aulas em escolas, feiras literárias e vi uma demanda: completar essa história. Eu tinha contado o cenário que preparou a Independência do Brasil, faltava contar essa parte. E já estou pensando em fechar uma trilogia, que é 1889, a Proclamação da República. São as três datas ícones da construção do Estado brasileiro do século XIX, a época em que foram lançadas as bases do Brasil que temos hoje.
CE: O que mudou na sua concepção de dom Pedro I após este livro?
LG: Bem, antes eu estava repleto de preconceitos. No 1808, eu tinha a imagem de um dom João abobalhado, incapaz de tomar decisões. Para um jornalista isso é fascinante, mas havia mais além da caricatura. No 1822, isso aconteceu também. Tinha duas imagens de dom Pedro I. Uma é a de Tarcísio Meira no filme Independência ou Morte (de Carlos Coimbra, de 1972), um herói do regime militar, épico. Segundo, o do Marcos Pasquim na série O Quinto dos Infernos (Rede Globo, 2002), mulherengo e inconsequente. Descobri que nem era uma coisa nem outra, apesar de haver os dois elementos. Quando se olha ao passado, tem-se a impressão de que quem fez a História tinha amplo leque de opções. Não é bem assim. Descobri um documento no qual dom Pedro I defendia de forma categórica o fim da escravatura no Brasil. José Bonifácio iria apresentar à Constituinte de 1822-1823 também um projeto para abolir o tráfico negreiro. Então, se o imperador e o seu principal ministro queriam o fim da escravidão, por que não acabou? Porque não tinha como acabar. Então, pesquisar para esse livro me tornou um pouco mais generoso na avaliação dos personagens, sem ser leniente. Não absolvo dom Pedro I, mas por trás do imperador havia um ser com fragilidades muito humanas.
CE: E isso não é uma imagem comum nos livros de História.
LG: No estudo da História do Brasil, vejo dois momentos muito distintos: no fim do século XIX, uma construção dos heróis nacionais, com pouca luz da vida pessoal deles. Depois, no século XX, temos uma escola influenciada pelo marxismo que se dedica à macroestrutura, à história como choque de interesses. As pessoas desaparecem em ambos. A Formação Econômica do Brasil, do Caio Prado Júnior, é uma contribuição inestimável, mas não tem gente de carne e osso ali. Acho que hoje superamos esse momento maniqueísta. Meu olhar é jornalístico, não acadêmico, então queria mostrar as circunstâncias do mundo no momento, mas também dos personagens.
CE: O senhor atribui muita importância aos personagens de José Bonifácio e da imperatriz Leopoldina no livro. Por que eles são tão fundamentais?
LG: Eles exercem papéis simbólicos pelo sobrenome que traziam e o cargo que ocupavam. Dom Pedro era um jovem príncipe de 22 anos que dom João deixa no Brasil para governar um território 93 vezes maior que Portugal. E ele tinha zero de experiência política. Bonifácio era um homem muito experiente, morou 36 anos na Europa, viu a Revolução Francesa nas ruas de Paris. Ao chegar ao Brasil, tem um papel quase paternal com dom Pedro. O Brasil que emerge das margens do Ipiranga tem a assinatura de José Bonifácio, que percebeu que um Brasil grande, isolado, de províncias rivais, só se manteria unido através de uma monarquia constitucional nas mãos do herdeiro português. E ele tem apoio da princesa Leopoldina, mulher de Pedro, educada na corte de Viena, a mais ilustrada da época, e tinha uma noção política muito boa do que acontecia no mundo. Leopoldina converte-se às causas da Independência brasileira. Após 7 de Setembro, dom Pedro fez viagens para pacificar o País e é ela quem formaliza a Independência do Brasil, e depois se empenha pelo reconhecimento do novo país junto às monarquias europeias, dominadas por parentes dela. O Primeiro Reinado desaba definitivamente numa crise política que acaba com a abdicação ao trono em 1831, quando esses dois personagens saem de cena.
CE: No livro, quando o senhor afirma que o Brasil tinha tudo para não dar certo, mas deu, de que exatamente estava falando?
LG: Eu me referia às circunstâncias do Brasil na véspera da Independência. O que é dar certo ou errado na vida de um país? Difícil responder. No caso, seria um Brasil grande, integrado. A maior possibilidade era de que se fragmentasse, como ocorreu na América espanhola. Numa hipótese mais grave, numa guerra étnica entre escravos e brancos. As províncias tinham pouca comunicação entre si, 80% da população era analfabeta, de cada três brasileiros, um era escravo. O País estava falido, pois a corte, ao voltar a Portugal, raspou os cofres públicos. Os perigos eram tão grandes que a elite brasileira preferiu se unir em torno do herdeiro da coroa portuguesa em regime monárquico porque, se não acontecesse isso, poderia haver uma guerra étnica. O Brasil se manteve unido mais por suas fragilidades que por suas virtudes. Então o Brasil que surge em 1822 é um país que vai adiando outras soluções, o que conhecemos bem até hoje.
CE: O 1822 foi pesquisado e lançado em Portugal e no Brasil. Que diferenças dos fatos e personagens históricos o senhor encontrou entre os dois países?
LG: Brasil e Portugal, a rigor, compartilham a mesma história até 7 de abril de 1831, quando dom Pedro abdica do trono e tem-se a nacionalização da Independência brasileira. Até então, era a mesma lei e a mesma constituição. Curiosamente, porém, as visões desse período são completamente diferentes dos dois lados do Atlântico. Brasileiros e portugueses desconhecem o que aconteceu no outro país. Fui lançar meu livro em Portugal, e lá eles não faziam a menor ideia do que ocorreu em 1822. Não sabem que o dom Pedro IV deles era o mesmo dom Pedro que proclamou a Independência do Brasil.
CE: Fazer pesquisa histórica no Brasil é difícil?
LG: Muito. Não faço pesquisa primária, só narrativa secundária, ou seja, leio o que outros historiadores falaram sobre o assunto e confronto as versões, e vou aos locais onde as coisas aconteceram. No Brasil, as bibliotecas estão sucateadas, arquivos não catalogados ou abandonados. A pesquisa histórica no Brasil ainda está por acontecer. Existe outra frente pouca realizada, que é a história regional. A história nacional avançou mais, mas existem pedaços que só podem ser observados na perspectiva da região. Faltam incentivo e determinação em se fazer pesquisa por aqui.
CE: Críticos do seu trabalho dizem que o senhor trata da História de maneira superficial. Como interpreta isso?
LG: Dependendo de como é feita, às vezes considero até um elogio. Um crítico disse que eu vulgarizo a história do Brasil, que é de fato o que faço. Eu torno esse conhecimento acadêmico, quase criptografado, e decodifico usando a experiência que adquiri no jornalismo. Toda vez que um jornalista faz uma reportagem, ele se obriga, por treinamento, a ser didático. Mas veja: existe uma linha muito tênue que não me permite ficar só na superfície nem me aprofundar muito. Tento usar uma linguagem provocativa de capa, para chamar a atenção do leitor leigo, mas, se ficar só nisso, fica banal, mero entretenimento. E tenho de fazer direito, respeitando as fontes, os leitores e a pesquisa.
CE: O senhor crê que existe, em parte, certo “ciúme” de alguns historiadores pelo fato de alguém de fora se aventurar nessa área?
LG: Sim, existe uma reação corporativista, mas de uma parte mais medíocre da academia. Agora, tive resenhas muito boas de historiadores como Lilian Schwarcz, Mary del Priore, João Marcel Carvalho França e Elias Tomé Saliba, entre outros. Eles entenderam o que estou fazendo. Não estou competindo, e sim fazendo um trabalho de divulgação científica, que é bom para eles. Professores de História estão adorando esses livros, o ciúme vem mais da academia mesmo.
CE: O senhor fez uma espécie de making-off nas redes sociais enquanto fazia o livro. O que conseguiu tirar dessa experiência?
LG: Isso é uma lição que o novo jornalismo praticado hoje me deu, que é ter uma cabeça multimídia. Não vamos atingir toda a audiência possível usando só um único formato. Estou no Orkut, Twitter e Facebook, além de dar aulas e palestras. Interajo muito com o público também durante a pesquisa. É quase como um reality show. Exemplo: no 1822, coloquei que José Bonifácio morreu na Ilha de Paquetá. Um tuiteiro especializado em José Bonifácio me informou que ele morreu em Niterói. Vou corrigir na próxima edição. Há uma rede de especialistas nessas comunidades. Se você consegue chegar até eles adequadamente, eles acompanham o seu trabalho e te divulgam.
Mas, ele escreve muito bem e suas fontes são fiáveis. Sempre se pode aprender a escrever melhor com quem é um profissional da escrita...
Paulo Roberto de Almeida
Um barril de pólvora chamado Brasil
Fernando Vives
Carta Capital, 18 de janeiro de 2011
O autor de 1822, Laurentino Gomes, fala sobre o país improvável que surgiu na Proclamação da Independência
Entre as obras lançadas na Feira do Livro do Rio de Janeiro em 2008, um quase despretensioso livro sobre a vinda da corte portuguesa ao Brasil 200 anos antes reacenderia o debate sobre a pesquisa histórica no Brasil. Apesar – ou justamente por isso – da fama de não conhecer a própria história, o brasileiro colocou a obra entre as mais vendidas em pouco tempo. O livro era o 1808, e o autor, o jornalista Laurentino Gomes. Os 600 mil exemplares vendidos levaram Gomes a se dedicar exclusivamente à divulgação da obra e pesquisa para o próximo livro, 1822, desta vez sobre a Independência brasileira. Lançado no fim do ano passado, repetiu o sucesso e reacendeu um debate entre acadêmicos. Além de ser escrita por alguém de fora da academia, Laurentino mistura a macroestrutura da época com histórias curiosas dos personagens principais. A história do País estava sendo banalizada? “Eu vulgarizo a História, mas não a banalizo. Tiro da linguagem acadêmica e a conto de um jeito agradável”, diz.
Nesta entrevista ao jornalista Fernando Vives, regada a capuccino em uma padaria do bairro de Perdizes, em São Paulo, Laurentino Gomes fala sobre 1822, o desafio de tornar a história palatável ao público não acadêmico, as dificuldades de se fazer pesquisa no País e rebate os críticos de sua obra.
Carta na Escola: O senhor era um jornalista que tinha apenas curiosidade pela História. Como surgiu a ideia de falar sobre 1808, e depois de 1822?
Laurentino Gomes: Bem, fui jornalista durante quase 30 anos e o jornalismo e a história são vizinhos. O jornalista testemunha e narra história todos os dias, enquanto o historiador tem um olhar mais distanciado, com mais metodologia e profundidade. Em 1997, surgiu uma oportunidade: eu era editor da revista Veja e havia um projeto especial sobre a história do Brasil – um deles sobre a vinda da corte portuguesa ao Rio de Janeiro. O projeto foi cancelado, mas continuei. Lancei o livro em 2007 pensando na efeméride do ano seguinte, e aí aconteceu o que não imaginava: um livro sobre história do Brasil virou best seller. Então tomei uma decisão arriscada: deixar a Editora Abril, onde trabalhei por 22 anos, para seguir carreira por conta própria, dedicando-me à divulgação do 1808. Fiz bate-papos com leitores, palestras, aulas em escolas, feiras literárias e vi uma demanda: completar essa história. Eu tinha contado o cenário que preparou a Independência do Brasil, faltava contar essa parte. E já estou pensando em fechar uma trilogia, que é 1889, a Proclamação da República. São as três datas ícones da construção do Estado brasileiro do século XIX, a época em que foram lançadas as bases do Brasil que temos hoje.
CE: O que mudou na sua concepção de dom Pedro I após este livro?
LG: Bem, antes eu estava repleto de preconceitos. No 1808, eu tinha a imagem de um dom João abobalhado, incapaz de tomar decisões. Para um jornalista isso é fascinante, mas havia mais além da caricatura. No 1822, isso aconteceu também. Tinha duas imagens de dom Pedro I. Uma é a de Tarcísio Meira no filme Independência ou Morte (de Carlos Coimbra, de 1972), um herói do regime militar, épico. Segundo, o do Marcos Pasquim na série O Quinto dos Infernos (Rede Globo, 2002), mulherengo e inconsequente. Descobri que nem era uma coisa nem outra, apesar de haver os dois elementos. Quando se olha ao passado, tem-se a impressão de que quem fez a História tinha amplo leque de opções. Não é bem assim. Descobri um documento no qual dom Pedro I defendia de forma categórica o fim da escravatura no Brasil. José Bonifácio iria apresentar à Constituinte de 1822-1823 também um projeto para abolir o tráfico negreiro. Então, se o imperador e o seu principal ministro queriam o fim da escravidão, por que não acabou? Porque não tinha como acabar. Então, pesquisar para esse livro me tornou um pouco mais generoso na avaliação dos personagens, sem ser leniente. Não absolvo dom Pedro I, mas por trás do imperador havia um ser com fragilidades muito humanas.
CE: E isso não é uma imagem comum nos livros de História.
LG: No estudo da História do Brasil, vejo dois momentos muito distintos: no fim do século XIX, uma construção dos heróis nacionais, com pouca luz da vida pessoal deles. Depois, no século XX, temos uma escola influenciada pelo marxismo que se dedica à macroestrutura, à história como choque de interesses. As pessoas desaparecem em ambos. A Formação Econômica do Brasil, do Caio Prado Júnior, é uma contribuição inestimável, mas não tem gente de carne e osso ali. Acho que hoje superamos esse momento maniqueísta. Meu olhar é jornalístico, não acadêmico, então queria mostrar as circunstâncias do mundo no momento, mas também dos personagens.
CE: O senhor atribui muita importância aos personagens de José Bonifácio e da imperatriz Leopoldina no livro. Por que eles são tão fundamentais?
LG: Eles exercem papéis simbólicos pelo sobrenome que traziam e o cargo que ocupavam. Dom Pedro era um jovem príncipe de 22 anos que dom João deixa no Brasil para governar um território 93 vezes maior que Portugal. E ele tinha zero de experiência política. Bonifácio era um homem muito experiente, morou 36 anos na Europa, viu a Revolução Francesa nas ruas de Paris. Ao chegar ao Brasil, tem um papel quase paternal com dom Pedro. O Brasil que emerge das margens do Ipiranga tem a assinatura de José Bonifácio, que percebeu que um Brasil grande, isolado, de províncias rivais, só se manteria unido através de uma monarquia constitucional nas mãos do herdeiro português. E ele tem apoio da princesa Leopoldina, mulher de Pedro, educada na corte de Viena, a mais ilustrada da época, e tinha uma noção política muito boa do que acontecia no mundo. Leopoldina converte-se às causas da Independência brasileira. Após 7 de Setembro, dom Pedro fez viagens para pacificar o País e é ela quem formaliza a Independência do Brasil, e depois se empenha pelo reconhecimento do novo país junto às monarquias europeias, dominadas por parentes dela. O Primeiro Reinado desaba definitivamente numa crise política que acaba com a abdicação ao trono em 1831, quando esses dois personagens saem de cena.
CE: No livro, quando o senhor afirma que o Brasil tinha tudo para não dar certo, mas deu, de que exatamente estava falando?
LG: Eu me referia às circunstâncias do Brasil na véspera da Independência. O que é dar certo ou errado na vida de um país? Difícil responder. No caso, seria um Brasil grande, integrado. A maior possibilidade era de que se fragmentasse, como ocorreu na América espanhola. Numa hipótese mais grave, numa guerra étnica entre escravos e brancos. As províncias tinham pouca comunicação entre si, 80% da população era analfabeta, de cada três brasileiros, um era escravo. O País estava falido, pois a corte, ao voltar a Portugal, raspou os cofres públicos. Os perigos eram tão grandes que a elite brasileira preferiu se unir em torno do herdeiro da coroa portuguesa em regime monárquico porque, se não acontecesse isso, poderia haver uma guerra étnica. O Brasil se manteve unido mais por suas fragilidades que por suas virtudes. Então o Brasil que surge em 1822 é um país que vai adiando outras soluções, o que conhecemos bem até hoje.
CE: O 1822 foi pesquisado e lançado em Portugal e no Brasil. Que diferenças dos fatos e personagens históricos o senhor encontrou entre os dois países?
LG: Brasil e Portugal, a rigor, compartilham a mesma história até 7 de abril de 1831, quando dom Pedro abdica do trono e tem-se a nacionalização da Independência brasileira. Até então, era a mesma lei e a mesma constituição. Curiosamente, porém, as visões desse período são completamente diferentes dos dois lados do Atlântico. Brasileiros e portugueses desconhecem o que aconteceu no outro país. Fui lançar meu livro em Portugal, e lá eles não faziam a menor ideia do que ocorreu em 1822. Não sabem que o dom Pedro IV deles era o mesmo dom Pedro que proclamou a Independência do Brasil.
CE: Fazer pesquisa histórica no Brasil é difícil?
LG: Muito. Não faço pesquisa primária, só narrativa secundária, ou seja, leio o que outros historiadores falaram sobre o assunto e confronto as versões, e vou aos locais onde as coisas aconteceram. No Brasil, as bibliotecas estão sucateadas, arquivos não catalogados ou abandonados. A pesquisa histórica no Brasil ainda está por acontecer. Existe outra frente pouca realizada, que é a história regional. A história nacional avançou mais, mas existem pedaços que só podem ser observados na perspectiva da região. Faltam incentivo e determinação em se fazer pesquisa por aqui.
CE: Críticos do seu trabalho dizem que o senhor trata da História de maneira superficial. Como interpreta isso?
LG: Dependendo de como é feita, às vezes considero até um elogio. Um crítico disse que eu vulgarizo a história do Brasil, que é de fato o que faço. Eu torno esse conhecimento acadêmico, quase criptografado, e decodifico usando a experiência que adquiri no jornalismo. Toda vez que um jornalista faz uma reportagem, ele se obriga, por treinamento, a ser didático. Mas veja: existe uma linha muito tênue que não me permite ficar só na superfície nem me aprofundar muito. Tento usar uma linguagem provocativa de capa, para chamar a atenção do leitor leigo, mas, se ficar só nisso, fica banal, mero entretenimento. E tenho de fazer direito, respeitando as fontes, os leitores e a pesquisa.
CE: O senhor crê que existe, em parte, certo “ciúme” de alguns historiadores pelo fato de alguém de fora se aventurar nessa área?
LG: Sim, existe uma reação corporativista, mas de uma parte mais medíocre da academia. Agora, tive resenhas muito boas de historiadores como Lilian Schwarcz, Mary del Priore, João Marcel Carvalho França e Elias Tomé Saliba, entre outros. Eles entenderam o que estou fazendo. Não estou competindo, e sim fazendo um trabalho de divulgação científica, que é bom para eles. Professores de História estão adorando esses livros, o ciúme vem mais da academia mesmo.
CE: O senhor fez uma espécie de making-off nas redes sociais enquanto fazia o livro. O que conseguiu tirar dessa experiência?
LG: Isso é uma lição que o novo jornalismo praticado hoje me deu, que é ter uma cabeça multimídia. Não vamos atingir toda a audiência possível usando só um único formato. Estou no Orkut, Twitter e Facebook, além de dar aulas e palestras. Interajo muito com o público também durante a pesquisa. É quase como um reality show. Exemplo: no 1822, coloquei que José Bonifácio morreu na Ilha de Paquetá. Um tuiteiro especializado em José Bonifácio me informou que ele morreu em Niterói. Vou corrigir na próxima edição. Há uma rede de especialistas nessas comunidades. Se você consegue chegar até eles adequadamente, eles acompanham o seu trabalho e te divulgam.
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