segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

A voracidade tributaria da Uniao (e inconstitucional tambem) - DCI

Diaário do Comércio e Indústria, 30/01/12 - 00:00 > POLÍTICA

Governo retém verba de município, diz Lima


Brasília - A União não só se apodera da maior e melhor fatia do bolo tributário do País - cerca de 60% - como ainda retém recursos que deveriam ser repassados para estados e municípios. Nos últimos três anos, o valor travado ficou em R$ 6,7 bilhões e ainda falta liberar outros R$ 4 bilhões.

Quem reclama é o deputado federal Júlio César Lima (PSD-PI), especialista em tributos, ex-prefeito de Guadalupe (PI) e presidente da Frente Parlamentar Municipalista.

Fala com conhecimento na condição de procurador fiscal aposentado e autor de livro que trata sobre a questão dos repasses da União - Brasil em Dados Comparados das Unidades Federadas.

"Somando-se tudo isso, nós teremos dinheiro suficiente, pago aos estados e municípios através dos órgãos responsáveis, para que os investimentos já feitos não sejam perdidos, e as ações executadas pelos prefeitos tenham uma continuidade", protestou, em entrevista exclusiva ao DCI. Ele promete cobrar uma solução depois da reabertura do Congresso, no próximo dia 1º de fevereiro.

Em defesa de mais recursos para os municípios, Lima não acredita que isso aumente os casos de corrupção que têm levado à cassação de vários prefeitos. "Todas as obras feitas pelos prefeitos são as mais baratas do Brasil quando se analisa o custo da obra, dividido por habitante", opina.

DCI: Neste momento, qual é o projeto que mais toma espaço e tempo na Frente Parlamentar Municipalista?
Júlio César Lima: Um deles acontece dentro da Comissão de Finanças e Tributação, da qual sou membro titular, para que o governo, por meio da Receita, possa ser mais transparente. Por diversas vezes eu tenho identificado a retenção de recursos não compartilhados com estados e municípios, através do FPM [Fundo de Participação dos Municípios], principalmente. Esses recursos são oriundos do Refis 1, 2, 3, 4 e do Refis da Crise. Além do Refis, tem também o refinanciamento de dívidas administrativas e depósitos judiciais que nos dois últimos anos, 2010 e 2011, nós fizemos a União pagar, através da classificação da Receita e do Tesouro Nacional, R$ 6,7 bilhões para o FPM [Fundo de Participação dos Municípios], o FPE [Fundo de Participação dos Estados] e o Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação]. Ainda mais: como não tínhamos como classificar esses recursos, o fizeram provisoriamente, por meio da Portaria 232/09, que autoriza a classificação provisória. Mas essa portaria também diz que, logo em seguida, deve ser feita a definitiva, e o governo nunca, nunca, fez a classificação definitiva. Então, os municípios têm uma diferença significativa a receber. E o governo nos prometeu que pagaria tão logo fosse definida a consolidação dos restos a pagar. Isso era para ter sido feito em dezembro, e depois foi transferido para janeiro, mas, até hoje, ninguém se manifestou. Nós estamos atentos à reabertura dos trabalhos legislativos, no próximo dia 2, para que possamos reivindicar esse direito dos municípios. 

DCI: Por que o governo demora tanto a repassar esses recursos?
JC: O governo diz que tem dificuldade de classificar esses recursos. Eu já entendo diferente. Se eles tivessem boa vontade e menos negligência, todo o processo poderia ser feito com mais agilidade. Eles pagaram de 2009 a 2011 os R$ 6,7 bilhões e calculo que eles ainda devem pagar mais ou menos a mesma quantia. O importante é que nós continuemos lutando, pois, se ninguém se manifestar, aí, sim, eles não vão pagar nunca. Estamos também sempre exigindo mais transparência de todo esse processo. Eu já propus que quando o contribuinte pagar seu imposto seja colocado o percentual no próprio site, pois, assim, tudo poderá ser verificado em tempo real. Agora, a nossa luta é em relação ao Refis, nós queremos que aconteça a mesma coisa.

DCI: E o senhor tem ideia de quanto ainda falta pagar?
JC: Eu estimo em pelo menos R$ 4 bilhões a mais. Isso sem contar com o que foi arrecadado pelo Refis da Crise nos meses de outubro a dezembro. Somando-se tudo isso, eu acredito que nós teremos dinheiro suficiente, pago aos estados e municípios através dos órgãos responsáveis, para que os investimentos já feitos não sejam perdidos e para que as ações executadas pelos prefeitos tenham uma continuidade.

DCI: Sobre os royalties do pré-sal, há algo que a Frente pretende fazer para reivindicar esse direito?
JC: Nós vamos lutar com toda a nossa força política dentro da Frente Parlamentar para que o projeto sobre os royalties do petróleo seja votado. É inconcebível que o governo use de alguns instrumentos para adiar essa votação. Porque todos os royalties produzidos pelo petróleo e principalmente do pré-sal vem do mar. Logo, o mar pertence à União e a União é de todo o povo brasileiro. Nós queremos mudar e mudar com responsabilidade. Nós queremos que o País cresça e que todos os estados cresçam e usufruam desse privilégio, principalmente os estados das regiões mais pobres, do norte e nordeste do Brasil, precisam de mais recursos. Nós entendemos que o critério mais justo é do FPE, mais compensador e redistribuidor, o que diminui a diferença entre ricos e pobres é a divisão.

DCI: A qual outro projeto a Frente pretende se dedicar em 2012?
JC: Nós vamos lutar para a Reforma Tributária. Essa reforma precisa ser focada um pouco mais na redistribuição compensatória da carga tributária brasileira. O atual sistema fiscal é muito injusto e concentra muito o dinheiro na mão dos ricos em detrimento dos pobres. A grande diferença está na tributação do ICMS, que é maior do que o Imposto de Renda, do que o Cofins e do que as contribuições previdenciárias. Nós queremos que essa tributação do ICMS seja no destino e no consumo, como já é com os três maiores contribuintes da atividade, que são energia, comunicação e petróleo. Esperamos que fazendo isso possamos atribuir uma capacidade de arrecadar mais nos estados mais necessitados, como no nordeste, que precisa desta redistribuição do ICMS para comprar no destino, não na origem.

DCI: O que atrasa o crescimento dos municípios brasileiros?
JC: O povo brasileiro não mora nem na União nem nos estados, mas sim nos municípios. E é lá que nós temos os problemas que precisamos resolver para proporcionar melhor qualidade de vida aos brasileiros. Cada município tem um gestor que está diretamente relacionado com seu povo e sua gente. Todas as obras feitas pelos prefeitos são as mais baratas do Brasil quando se analisa o custo da obra, dividido por habitante. E entendo que, nestes 10 anos do pacto federativo, os municípios, que têm cerca de 16% de toda a arrecadação de tributos da União, possam aumentar essa arrecadação para 20% ou 22%; os estados, que têm torno de 24%, possam chegar aos 30%; e a União, que tem cerca de 60%, possa cair para 50% ou 40%. Dessa forma, estaremos transferindo a responsabilidade para os municípios. E eu acredito que mesmo com todas as anomalias - como corrupção, que infelizmente se propaga no meio político, principalmente entre os prefeitos, que são maior número -, com ação eficaz dos órgãos fiscalizadores, teremos um resultado muito melhor do que temos hoje. Precisamos descentralizar os recursos, atender melhor as condições de cada município, para consequentemente, darmos assistência ao que mais precisa.

DCI: Por que os prefeitos são os políticos que mais têm suas contas contestadas e mais têm sofrido pedidos de cassação?
JC: Na minha opinião, quanto mais fragilizado o ente federado, mais fragilizados seus ocupantes, os prefeitos. Como eu já disse, eles estão em maior número. No Brasil são mais de cinco mil. Também vemos que os municípios não são bem municípios e não possuem assessorias essencialmente qualificadas, como nos estados. Por isso os municípios acabam ficando mais frágeis e suscetíveis a erros, sendo assim, mais prejudicados.

domingo, 29 de janeiro de 2012

As causas da pobreza no Brasil (Simon Schwartzman) - resenha Paulo R Almeida

Mais uma resenha publicada na revisa do Ipea, provavelmente em formato reduzido. Reproduzo ambos.



4. “As causas da pobreza no Brasil”, Brasília, 26 agosto 2004, 2 p. Resenha de Simon Schwartzman, As Causas da Pobreza (Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004, 208 p.). Publicada na revista Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA-PNUD, ano 1, nº 2, setembro 2004, p. 77; link: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=1750:catid=28&Itemid=23). Relação de Trabalhos nº 1320. Relação de Publicados nº 474.
As causas da pobreza no BrasilImprimirE-mail
por Paulo Roberto de Almeida
livro-pobreza
O Brasil é ao mesmo tempo uma grande economia industrializada e uma das sociedades mais desiguais do planeta, exibindo um número anormalmente elevado de pobres e um grau de concentração de riqueza superior ao de muitos países mais pobres. Simon Schwartzman foi presidente do IBGE entre 1994 e 1998, além de ter exercido cargos governamentais e acadêmicos, o que o habilita a discorrer como poucos sobre esse aspecto mais visível da "questão nacional". Autor de outras obras, como o clássico de 1988 sobre as bases do autoritarismo (que pode ser consultado em sua página www.schwartzman.org.br/simon/, onde também figura este livro), ele nos brinda agora com uma reflexão metodologicamente embasada e empiricamente sustentada. Conclui que não há solução de curto prazo para o problema da pobreza no Brasil. "Tudo é fácil de dizer e dificílimo de fazer. A construção de uma sociedade competente, responsável, comprometida com os valores da eqüidade e justiça social, e que não caia na tentação fácil do populismo e do messianismo político, é uma tarefa de longo prazo e que pode não chegar a bom termo". Oxalá possamos desmentir esse diagnóstico. As causas da nossa pobreza já conhecemos. Falta, talvez, coragem para enfrentar o problema.

As causas da pobreza no Brasil

Resenha de:
Simon Schwartzman
As Causas da Pobreza
Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004, 208 p.

            O Brasil é um país único no mundo por ser, ao mesmo tempo, uma grande economia industrializada, dotada de razoável capacitação técnica e ampla base competitiva, e uma das sociedades mais desiguais do planeta, exibindo um número anormalmente elevado de pobres e um grau de concentração de riqueza (o famoso índice de Gini) que é, provavelmente, o dobro da média mundial e bem superior ao de muitos outros países mais pobres. Essa contradição é verdadeiramente excepcional e ela deveria envergonhar todas e cada uma das lideranças políticas brasileiras toda vez que um indicador social é publicado pelos institutos oficiais de estatísticas como o IBGE.
            Simon Schwartzman foi, justamente, presidente do IBGE entre 1994 e 1998, além de ter exercido vários outros cargos governamentais e acadêmicos, o que o habilitou a discorrer como poucos sobre esse aspecto mais visível da “questão nacional” brasileira. Autor de muitas outras obras, como o clássico de 1982 sobre as bases do autoritarismo brasileiro (que pode ser consultado em sua página http://www.schwartzman.org.br/simon/, onde também figura este livro), ele nos brinda agora com uma reflexão metodologicamente embasada e empiricamente sustentada sobre as razões deste nosso “excesso” de pobres (comparativamente a outros países em situações comparáveis). Vários dos estudos aqui incluídos já tinham sido anteriormente publicados, mas sua consolidação num único volume permite seguir o pensamento de Simon Schwartzman (e de alguns de seus colaboradores, como Elisa Reis) numa gama de tópicos que, se não “esgota” o tema das causas da pobreza no Brasil, pelo menos contribui para uma análise objetiva, cientificamente embasada, desprovida das paixões que habitualmente obscurecem o diagnóstico e as “terapias” corretoras sobre o grande problema que nos envergonha aos olhos do resto do mundo.
            O primeiro capítulo é basicamente histórico, remontando as origens de nossa alta concentração de pobres por metro quadrado, o que redunda em falar da escravidão, descartando as visões classistas tradicionais para aprofundar a discussão em torno do nosso “capitalismo defeituoso”, bem como das limitações do nosso “Estado de bem-estar social” e suas patentes iniqüidades sociais. No segundo capítulo, Schwartzman e Elisa Reis examinam diferentes aspectos sociais e políticos da pobreza e da exclusão social no Brasil, mapeando os temas relevantes para esse estudo (que são os canais “clássicos” para o exercício da cidadania, como educação, saúde, justiça, seguridade social, regulação trabalhista, além de outros novos, como a representação político-partidária, os sindicatos e igrejas e as associações voluntárias). Como eles escrevem, “existem amplas evidências empíricas de que a educação é o principal correlato da desigualdade de renda no Brasil, muito mais importante do que outros condicionantes, como a raça, o gênero ou a região de residência das pessoas” (p. 42).
            O terceiro capítulo aproveita, justamente, a experiência do autor como presidente do IBGE, focando em especial a produção de estatísticas em geral (inflação, população, cor e raça, emprego e desemprego) e em especial sobre a pobreza. Como medir a pobreza é um problema sério no Brasil, uma vez que, dependendo do método usado, os números podem variar de 8 a 64 milhões de pessoas (para uma população, à época, de 170 milhões). Pobreza absoluta e pobreza relativa são aparentemente simples de se definir, mas a situação se complica quando se trata de medir a renda ou de definir o que é “necessidade básica”. O Banco Mundial utiliza o critério de um dólar por dia, como linha de pobreza, mas isso não é consensual, como parece óbvio. A conclusão do autor é que estudos globais sobre situações de pobreza, a partir de estatísticas sólidas e representativas, “precisam estar acompanhados de estudos em profundidade sobre grupos e situações específicas, sem os quais se torna muito difícil implementar e avaliar políticas adequadas de redução de pobreza” (p. 97-98).
            O quarto capítulo trata de raça e etnia, temas notoriamente controversos em função da fluidez das fronteiras ou da inexistência de barreiras efetivas entre as diferentes etnias e subculturas que coexistem no Brasil. É evidente que os negros ganham menos dos que os brancos no Brasil, mas o autor reafirma a evidência empírica de que é “a educação, e não a cor, a raça ou a origem, o grande fator de desigualdade na sociedade brasileira” (p. 113). O quinto capítulo aborda o trabalho infantil, utilizando dados da PNAD entre 1992 e 2001. Não se trata, em muitos casos, de necessidade de complementação da renda familiar, mas de uma cultura vinculada ao trabalho agrícola doméstico, além, obviamente, de ser uma decorrência da má qualidade do sistema educacional, que não consegue “segurar” os jovens depois da adolescência.
            O sexto capítulo aborda o tema da educação básica, cuja característica básica, mencionada acima, é o principal fator de desigualdade e da pobreza, não apenas no Brasil, mas em toda a região latino-americana. O autor não confia muito na capacidade do Estado em resolver esse grave problema, depositando suas esperanças na própria sociedade, que conquistaria por si só aquilo que o Estado não consegue proporcionar. É um dos capítulos mais extensos, e que mais mereceria abordagem em detalhe, bastando entretanto com assinalar que esse problema mereceria muito mais atenção do que o normalmente concedido por governos comprometidos com as elites universitárias.
            O autor conclui, de forma talvez pessimista, dizendo que não há solução de curto prazo para o problema da pobreza no Brasil, sendo necessários vontade política, compromisso com os valores da igualdade social e dos direitos humanos, uma política econômica adequada, que gere recursos, um setor público eficiente e políticas específicas nas áreas da educação, saúde, trabalho, proteção à infância e do combate à discriminação social, entre outras. Como ele mesmo confessa: “Tudo é fácil de dizer, e dificílimo de fazer. A construção de uma sociedade competente, responsável, comprometida com os valores da eqüidade e justiça social, e que não caia na tentação fácil do populismo e do messianismo político, é uma tarefa de longo prazo e que pode não chegar a bom termo” (p. 189). Oxalá possamos desmentir esta última parte desse diagnóstico tão preciso quanto realista da nossa realidade presente. As causas da nossa pobreza já conhecemos, graças inclusive ao trabalho competente do autor. Falta, talvez, coragem para enfrentar o problema de frente.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 26 agosto 2004




Em Defesa da Globalização (Jagdish Bhagwati) - resenha Paulo R. de Almeida

Agora a segunda resenha desaparecida no site do Ipea. Cabe esclarecer que minhas resenhas, originais, são sempre maiores, ou seja, mais extensas, do que as versões publicadas, que passam pelos cortes dilacerantes dos editores, sempre roubando caracteres aos autores e adequando seus textos aos espaços disponíveis.

2. “Globalização para todos os gostos”, Brasília, 12 junho 2004, 2 p. Resenha do livro de Jagdish Bhagwati: Em Defesa da Globalização: como a globalização está ajudando ricos e pobres (Rio de Janeiro: Elsevier-Campus, 2004, 348 pp.; ISBN: 85-352-1440-2). Publicada na revista Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA-PNUD, ano 1, nº 1, agosto 2004, p. 76). Relação de Trabalhos nº 1281. Relação de Publicados nº 507.




Globalização para todos os gostos

Resenha do livro de:
Jagdish Bhagwati

Em Defesa da Globalização: como a globalização está ajudando ricos e pobres

(Rio de Janeiro: Elsevier-Campus, 2004, 348 pp.; ISBN: 85-352-1440-2)

            O economista indiano da Columbia University se pergunta, no frontispício dessa obra, se o mundo precisa de mais um livro sobre a globalização. A pergunta é pertinente pois que, desde a popularização desse conceito no início dos anos 90, rios, talvez oceanos de tinta já foram vertidos em escritos pró- ou anti-globalização. O movimento anti-globalizador – que se vê como altermundialista, sem jamais ter explicado de que seria feito esse “outro mundo” – deve seu sucesso ao fenômeno que vitupera em encontros movidos mais a transpiração do que inspiração.
            O propósito de Bhagwati é outro: nem atacar, nem elogiar, mas explicar como funciona esse processo (nos seus mecanismos comerciais, financeiros, tecnológicos e culturais) e ver o que fazer para aperfeiçoá-lo. Os maiores beneficiários são, obviamente, as multinacionais, mas os pobres dos países emergentes também vêem sua prosperidade aumentar, como o provam milhões de chineses e indianos retirados da miséria absoluta. Os anti-globalizadores agitam temores, mas não dão provas concretas de que ele produza, como proclamam, miséria, concentração de renda ou destruição das culturas nacionais.
A primeira parte do livro é justamente dedicada à compreensão do movimento contrário à globalização, constatando no entanto Bhagwati que ela é benéfica não só economicamente, mas também socialmente. Na segunda parte, ele considera suas implicações sociais, examinando a distribuição da riqueza via comércio, via trabalho (com redução da exploração de crianças), a promoção das mulheres, da cultura e da democracia. Os benefícios dos investimentos diretos são muito superiores aos problemas, o que o leva a concluir que são infundados os temores dos anti-globalizadores.
A terceira parte aborda os aspectos “incômodos” da globalização: movimentos de capitais de curto prazo e fluxos de pessoas. Bhagwati não apóia a liberalização financeira e critica o “complexo Wall Street-Tesouro” (que engloba outras instituições, como o FMI e o Banco Mundial); ele comprova, com satisfação, que a ultra-liberal The Economist acabou rendendo-se às suas teses. A quarta parte, finalmente, quer fazer a globalização funcionar melhor e aqui também Bhagwati se distancia dos anti-globalizadores, pois ele preconiza o seu gerenciamento adequado pelos mesmos organismos multilaterais que eles querem enterrar. Ele discorda, portanto, de que a globalização necessite de uma face humana: isso ela já tem, mas pode-se sempre melhorá-la. Em conclusão, ele recomenda um pouco menos de paixão e um pouco mais de razão aos críticos da globalização.

Paulo Roberto de Almeida


Origens e itinerário do desenvolvimento brasileiro (Albert Fishlow) - resenha por PRA


Começo transcrevendo a primeira resenha que produzi para a revista do Ipea, que simplesmente desapareceu do site da revista. Ela tinha sido preparada para o número zero da revista, depois foi "esquartejada", reduzida a pedacinhos e publicada no número 1.

1. “Origens e itinerário do desenvolvimento brasileiro”, Brasília, 2 junho 2004, 2 p. Resenha do livro de Albert Fishlow, Desenvolvimento no Brasil e na América Latina: uma perspectiva histórica (São Paulo: Paz e Terra, 2004, 340 p). Publicada na revista Desafios do Desenvolvimento (Brasília: IPEA-PNUD, ano 1, nº 1, agosto 2004, p. 77). Relação de Trabalhos nº 1275. Relação de Publicados nº 503.

Origens e itinerário do desenvolviment[ism]o brasileiro

Paulo Roberto de Almeida

Resenha do livro de Albert Fishlow:
Desenvolvimento no Brasil e na América Latina: uma perspectiva histórica
(São Paulo: Paz e Terra, 2004, 340 p; ISBN: 85-219-0749-4; R$ 40,00).

Publicada,
sob o título de “Origens e itinerário do desenvolvimento brasileiro”,
na revista Desafios do Desenvolvimento
(Brasília: IPEA-PNUD, ano 1, nº 0, julho 2004, p. 79).
Trechos sumprimidos na publicação da revista: [ ]

A caracterização de brasilianista tem sido comumente aplicada, no Brasil, aos estudiosos americanos das áreas de ciências sociais, do contrário um economista como Albert Fishlow já teria há muito merecido o título de brasilianista emérito, junto com Werner Baer [(que aliás já o recebeu, em 2002, da Embaixada do Brasil em Washington)]. Poucos economistas teóricos e aplicados – [o que inclui não apenas a atividade de pesquisa, mas sobretudo a de formulador de políticas e, sobretudo, a nobre missão de professor –] detêm um currículo tão vasto e tão diversificado em coisas do Brasil e da América Latina quanto este antigo aluno do famoso historiador econômico Alexander Gerschenkron, com quem ele certamente aprendou algumas lições a respeito das “vantagens do atraso” [(expressão não por acaso útil para descrever a situação brasileira)].
Autor ou co-autor de mais de 14 livros [(embora nenhum deles exclusivamente sobre o Brasil)] e de centenas de artigos e ensaios – dezenas deles sobre o Brasil – Fishlow é extremamente conhecido nos circulos de estudiosos da economia brasileira, mas não tinha ainda sido contemplado com uma compilação de seus [muitos] trabalhos sobre nosso país e a região. A lacuna acaba de ser fechada graças à feliz iniciativa de Edmar Bacha, que selecionou seus melhores escritos das últimas três décadas, com o que podemos comprovar que Fishlow pode ser tranqüilamente equiparado aos grandes [da sua área,] como Raul Prebisch, Celso Furtado ou Albert Hirshmann.
Diretor de tese de muitas das melhores cabeças da economia aplicada brasileira [– entre eles alguns ministros –] e formador das primeiras equipes que se dedicaram ao planejamento econômico, Fishlow não pode ser considerado nem um “estruturalista” nem um “neoliberal”. Ele é um profissional completo e pragmático. Reconhece o papel do Estado no desenvolvimento brasileiro, mas aponta as insuficiências sociais do processo. Sustenta teoricamente seus argumentos, mas também os dota de provas empíricas e sabe colocar nosso itinerário em perspectiva histórica [(o endividamento externo no século XIX ou nos anos 1930, por exemplo)] e também em visão comparada com os países asiáticos. Impossível não experimentar um crescimento do PIB intelectual com a leitura deste livro [dotado de tantas vantagens comparativas (relativas e absolutas) e] de tão grandes externalidades positivas.

(capturar capa do livro no site da Livraria Cultura ou da Paz e Terra)

[Brasília, 1274: 1 junho 2004, 2 p.]



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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...