terça-feira, 24 de junho de 2025

O Brasil no ‘eixo dos hipócritas’ - Editorial do Estadão

O Brasil no ‘eixo dos hipócritas’

Posicionamento do governo no conflito entre Israel e Irã repete o padrão de críticas seletivas e condescendência com autocracias que conspurca a credibilidade diplomática do Brasil

Notas & Informações,
Editorial do Estadão, 24/06/2025
https://www.estadao.com.br/opiniao/o-brasil-no-eixo-dos-hipocritas/

        A nota do Itamaraty sobre a ofensiva dos EUA ao Irã, longe de defender princípios democráticos ou a estabilidade internacional, é mais uma demonstração de alinhamento do governo Lula da Silva ao bloco autocrático global. Essa posição, marcada por um duplo padrão diplomático, põe o Brasil em rota de colisão com a tradição histórica de equilíbrio e prudência que sempre orientou sua política externa.
        No conflito entre Israel e Irã, o governo brasileiro formou com a Rússia o que se pode chamar de “eixo da hipocrisia”. A Rússia, que viola a soberania da Ucrânia numa guerra de agressão, condenou “com veemência” os ataques a alvos militares e instalações nucleares iranianas, reprovando-os como violações da soberania e do Direito Internacional. O Brasil, que jamais condenou “com veemência” a agressão russa na Ucrânia nem repudiou o bombardeio russo a uma das usinas nucleares ucranianas, também condenou o ataque americano ao Irã “com veemência”, salientando que “qualquer ataque armado a instalações nucleares representa flagrante transgressão da Carta das Nações Unidas”.
        Da Rússia, é claro, não se pode esperar nada, mas o Brasil deveria ao menos levar em conta o contexto real do ataque americano: o Irã é a maior fonte de instabilidade no Oriente Médio, um país cuja liderança teocrática prega abertamente a aniquilação de Israel e mantém uma guerra por procuração por meio de milícias como Hamas, Hezbollah e Houthis. Nessa guerra antiga e complexa, Israel não apenas tem o direito, mas o dever de se defender, assim como os EUA têm razões de sobra para apoiar a campanha israelense.
        O governo Lula opta por um silêncio cúmplice sobre a agressividade iraniana, enquanto faz questão de condenar as ações preventivas de Israel e dos EUA. Essa inversão de valores não é uma falha pontual, mas parte de um duplo padrão que marca a diplomacia lulopetista: criticar aliados democráticos e alinhados ao Ocidente, enquanto contemporiza com regimes autoritários, repressivos e fundamentalistas.
        O alinhamento com o Irã é só uma faceta desse quadro mais amplo. Do ponto de vista do Direito Internacional, o ataque americano é, de fato, controverso. Mas ao menos pode ser defendido com argumentos razoáveis, como o direito à autodefesa coletiva em face da ameaça nuclear iraniana. Já a invasão russa à Ucrânia não tem qualquer sombra de justificativa legítima. O governo brasileiro, contudo, opta pela ambiguidade e a condescendência com os crimes de Moscou.
        A hipocrisia é mais evidente à luz do histórico diplomático dos governos petistas. Em 2010, sob o comando de Lula, a diplomacia brasileira protagonizou uma desastrada mediação com o Irã de um acordo nuclear, ignorando alertas e fragilizando a posição brasileira no cenário internacional. A tentativa de protagonismo desmedido e voluntarismo diplomático expôs o País ao ridículo e aos riscos de alinhamento com um regime que ameaça a paz mundial.
Hoje, ao repetir o mesmo alinhamento, o governo reforça sua afinidade ideológica com regimes autoritários – Irã, Rússia, China e outros –, rompendo com a tradição de equilíbrio e prudência que sempre pautou a política externa brasileira.
Após a ofensiva dos EUA contra o Irã, as democracias sérias fizeram um apelo à moderação e ao resgate das vias diplomáticas, mas evitaram condenar o ataque e nem de longe legitimaram um regime beligerante e delinquente como o iraniano. Ao contrário: reconhecem o perigo concreto representado pela teocracia xiita, responsável por fomentar o terrorismo, desestabilizar o Oriente Médio e perseguir sistematicamente a fabricação de armas nucleares – uma ameaça que transcende fronteiras e atinge a segurança global.
        O que o Brasil ganha com essa adesão à aliança de autocracias? Quais benefícios estratégicos ou diplomáticos justificam associar o País a regimes que promovem a instabilidade internacional, violam direitos humanos e desafiam o multilateralismo baseado em regras? As respostas são óbvias: tudo isso só serve para satisfazer a rançosa ideologia antiamericana e antiocidental do lulopetismo.


Ex-embaixador Ricupero aponta incoerência da diplomacia brasileira sobre Irã e Ucrânia (VEJA+)

Ex-embaixador Ricupero aponta incoerência da diplomacia brasileira sobre Irã e Ucrânia

VEJA+, 24 de jun. de 2025
https://www.youtube.com/watch?v=BaTowtrvAUI

Na nova edição do Ponto de Vista, o ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Rubens Ricupero, comenta a reação do governo brasileiro ao ataque israelense contra instalações nucleares do Irã. Em conversa com Robson Bonin e Marcela Rahal, o diplomata avalia a nota divulgada pelo Itamaraty, que condenou “com veemência” a ação de Israel.


“Do ponto de vista formal, a nota está correta. O ataque é ilegal e não foi autorizado pela ONU. Mas é curioso: a nota do Brasil foi mais dura do que a da China”, afirma Ricupero.

O embaixador também destaca o contraste da posição brasileira em relação à guerra na Ucrânia. “Lá, o governo evita condenar a Rússia. Isso gera uma percepção de incoerência”, diz.

Ricupero analisa ainda o contexto regional e internacional envolvendo o Irã: “Nenhum país deseja que o Irã adquira armas nucleares. Por isso, há até certo alívio mundial com o prejuízo ao programa nuclear iraniano.”

Assista à análise completa sobre a guerra no Oriente Médio, os bastidores da diplomacia internacional e os impactos da política externa brasileira neste cenário delicado.

Book by Joseph A. Tainter: The Collapse of Complex Societies (Amazon)


The Collapse of Complex Societies 

(New Studies in Archaeology)


Political disintegration is a persistent feature of world history. The Collapse of Complex Societies, though written by an archaeologist, will therefore strike a chord throughout the social sciences. Any explanation of societal collapse carries lessons not just for the study of ancient societies, but for the members of all such societies in both the present and future. Dr. Tainter describes nearly two dozen cases of collapse and reviews more than 2000 years of explanations. He then develops a new and far reaching theory that accounts for collapse among diverse kinds of societies, evaluating his model and clarifying the processes of disintegration by detailed studies of the Roman, Mayan and Chacoan collapses.




Desalento? Não! Continuo na liça - Paulo Roberto de Almeida

 Desalento? Não! Continuo na liça

Não adianta lutar contra tendências fortes da humanidade, ou é muito difícil. A mentira, a besteira, a irracionalidade também podem prevalecer, e levar sociedades inteiras ao desastre. EUA, Rússia, Irã, Brasil, Israel, entre outros países e sociedades, são exemplos disso. Há que lutar para preservar a racionalidade e a dignidade.

Paulo Roberto de Almeida 

O Triunfo e a Derrota de Eugenio Gudin - Paulo Roberto de Almeida e André Burguer

 O Triunfo e a Derrota de Eugenio Gudin 

Paulo Roberto de Almeida e André Burguer

Já escrevi bastante sobre o famoso, talvez único debate econômico significativo na história econômica do Brasil, aquele ocorrido em 1944/45 entre Eugênio Gudin e Roberto Simonsen. Meu argumento foi simples: Gudin venceu na lógica, na consistência teórica e nas propostas racionais. Mas o vencedor, na prática, foi Simonsen, pois toda a conjuração de líderes políticos, econômicos, acadêmicos, militares e civis, queriam estatismo, intervencionismo, industrialismo forçado, tudo isso imposto do alto, estilo nacionalismo autárquico. Por isso ainda somos um país “em desenvolvimento”, sempre requerendo soluções pelo alto, inclusive o agro, com subsídios e proteção. Por isso somos o que somos. Gudin venceu e perdeu; continua perdendo, mesmo com o agro triunfante. Sorry guys…

Paulo Roberto de Almeida 

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André Burguer escreveu:

A VINGANÇA DE GUDIN.

Eugênio Gudin morreu há quase quatro décadas. Viveu um século defendendo algo que, à sua época, parecia heresia econômica: o desenvolvimento do Brasil deveria vir do campo, não da fábrica. Para Gudin, as vantagens comparativas brasileiras estavam na agricultura, onde solo, clima e abundância natural podiam transformar o país num fornecedor global. Seus adversários não pensavam assim.

Durante boa parte do século XX, travou duras batalhas contra o projeto desenvolvimentista-industrialista que marcou a política econômica brasileira. De um lado, Gudin e alguns poucos liberais que enxergavam no mercado externo a oportunidade para o Brasil crescer aproveitando seus recursos naturais. Do outro, os industriais liderados por Roberto Simonsen — então presidente da poderosa FIESP — que viam na indústria o único caminho aceitável para o progresso nacional.

Os métodos industrialistas foram amplos e variados. Montagem artificial de indústrias via empresas estatais, subsídios generosos por meio do recém-criado BNDE (o “S” de social viria depois), protecionismo tarifário, reserva de mercado e convites generosos a multinacionais, como Juscelino fez com a indústria automobilística. Tudo isso regado a discursos de "soberania nacional" e "substituição de importações".

Gudin enfrentou não apenas os industrialistas, mas os populistas de várias matizes — de Getúlio Vargas a João Goulart — e, depois, a tecnocracia desenvolvimentista dos militares pós-1964. Se estivesse vivo hoje, teria novos oponentes: aqueles que, em pleno século XXI, acusam o agronegócio de ser "fascista", "ambientalmente predatório" e "concentrador de renda".

Mas a história, como se vê, pode ser irônica.

O agro resistiu. O agro cresceu. O agro venceu.

Nos últimos 40 anos, o Brasil deixou de ser um importador de alimentos para se tornar um dos maiores fornecedores do planeta. O agronegócio brasileiro cresceu a uma taxa média de 4,07% ao ano nesse período — quase o dobro do crescimento médio do PIB nacional, que foi de 2,3% ao ano. A produção de grãos, por exemplo, saltou 334% nas últimas três décadas, enquanto a área plantada aumentou apenas 71%. Ou seja: mais produção, com menos terra — o que significa produtividade, algo que Gudin sempre pregou.

Em 2023, o setor agropecuário representou 24% do PIB brasileiro, segundo o Cepea/USP. Nas exportações, o agro respondeu por mais de 50% de tudo o que o país vendeu ao mundo. O PIB atual do agronegócio brasileiro — em torno de US$ 600 bilhões — supera o PIB total de países inteiros, como a vizinha Argentina.

Trata-se de um setor que não apenas gera superávit comercial robusto, mas também sustenta o real, alivia as contas públicas e reduz a vulnerabilidade externa do país. É o Brasil competitivo, não o Brasil dependente do BNDES.

E convém ser preciso: quando falamos em agro brasileiro, falamos de tecnologia, de ciência aplicada, de biotecnologia, de manejo racional do solo, de máquinas de última geração, de sementes geneticamente adaptadas, de integração lavoura-pecuária-floresta e de um setor que compete com o que há de melhor no mundo. Este é o agro que sustenta o Brasil.

Muito longe da agricultura familiar romântica de baixa produtividade. E mais distante ainda dos assentamentos do MST, cuja produção é majoritariamente de subsistência ou fortemente subsidiada. O exemplo mais celebrado — e midiático — dessa agricultura foi o arroz orgânico, cuja produtividade é a metade do arroz convencional e cuja produção mal preenche uma fração irrelevante da demanda nacional.

Se o Brasil dependesse da agricultura familiar dos manuais de ONGs e dos assentamentos ideológicos, estaríamos todos na fila da FAO buscando ajuda humanitária.

Mas felizmente havia Eugênio Gudin — e, sobretudo, o Brasil real.

Hoje, as previsões do velho liberal se materializam em cada navio que parte lotado de soja, milho, carnes, açúcar, algodão, café, etanol, celulose. Em cada safra recorde, em cada avanço tecnológico, em cada ganho de produtividade por hectare. O campo, tantas vezes desprezado pelos ecologistas e planejadores do asfalto, ergueu o país e alimenta o mundo.

Gudin venceu. Afinal, a história lhe fez justiça.

Este artigo foi originalmente publicado na Revista Oeste.


A teocracia iraniana sobreviverá aos golpes israelenses e americanos? Paulo Roberto de Almeida em resposta à The New Yorker

A teocracia iraniana sobreviverá aos golpes israelenses e americanos?

Paulo Roberto de Almeida

        A The New Yorker, a excelente revista intelectual americana, da qual fui assinante enquanto residia nos EUA, tem um artigo de capa, na edição de 23 de junho de 2025, cuja pergunta título eu vou responder antes mesmo de ler a matéria:

Can Ayatollah Khamenei, and Iran’s Theocracy, Survive This War?

The future of the Islamic Republic may be shaped more by the country’s culture and politics than by the military prowess of its opponents.


        Vou responder que sim, totalmente sim, absolutamente sim, qualquer que seja a destruição infligida a seu patrimônio material, a seus equipamentos bélicos, a seu programa nuclear, ainda que toda a sua atual liderança teocrática, reacionária, repressiva, ditatorial, antifeminista, antigays, antissionista e antiamericana, ainda que tudo isso seja eliminado, a golpes de mísseis, bombardeios, assassinatos dirigidos, operações abertas ou clandestinas de supressão de seus guardas revolucionários e até mesmo Forças Armadas, mesmo que sua capital e principais instalações militares sejam extirpadas da face da terra iraniana.
        Sim, tudo isso sobreviverá às bombas israelenses e americanas, pela simples razão que uma sociedade não pode ser "consertada", nenhuma sociedade pode ser "ajustada", por mais que ela esteja errada – economicamente, politicamente, socialmente, diplomaticamente –, por mais que ela seja disfuncional e negativa para o seu próprio povo, à custa de bombas e destruição impostas de fora.
        A sociedade iraniana, como qualquer outra, possui uma história, uma cultura, uma forma de ser, que não são moldados pelo alto e de fora. Tudo depende de sua dinâmica própria, e ela virá, no momento apropriado para o povo iraniano.
        Sim, infelizmente os teocratas reacionários do regime iraniano atual sobreviveram e continuarão impondo sua ditadura sobre o povo, as mulheres, a sociedade iraniana, enquanto sua dinâmica própria não for transformada a partir de dentro, pela vontade da maioria do seu povo. Não creio que as bombas trarão algum resultado positivo, apenas sofrimento e opressão para a maioria da sociedade.
        Pronto, vou ler o artigo agora.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 24/06/2025

segunda-feira, 23 de junho de 2025

A letter from a writer in Teheran - Persuasion



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