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sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Condenados, mas vivissimos - Milton Simon Pires

CONDENADOS E LEGISLADORES

Milton Simon Pires

Tenho seguido com interesse a reação da grande imprensa à condenação do deputado Natan Donadon. Livrado da cassação de mandato pelos seus colegas, ele chegou e saiu algemado da sessão de hoje da Câmara dos Deputados. Retornou, depois da sua atividade parlamentar, ao Presídio da Papuda. Ainda não estou entendo, de fato, por que essa sensação toda de estranhamento..o porquê de tanta perplexidade..Me ajudem a compreender.
Imaginem vocês um lugar onde simplesmente não existe qualquer espaço para a mais simples noção de bem comum. Onde algumas poucas pessoas são inocentes e a grande maioria é de bandidos.  Um lugar onde se combina a noite tudo que será feito durante o dia. Um espaço onde não tem valor nenhuma lei escrita, onde impera o mundo dos interesses escusos, dos conchavos, das ameças e das delações..Imaginem um lugar de onde se pode, uma vez combinados alguns interesses, parar todo país e quem sabe até mudar a sua história. Uma instituição onde o que manda é o dinheiro e o narcotráfico..onde se pode contratar a morte de pessoas e onde, garantidas algumas condições, se pode desfrutar de regalias inimagináveis...Imaginaram? Pois bem, agora eu pegunto a vocês – Vocês conseguiram definir com certeza se eu estou falando de uma penitenciária de segurança máxima ou do Congresso Nacional? Se conseguiram; me mostrem como o fizeram pois eu mesmo me atrapalhei com o que escrevi!
Meus amigos, o que torna um homem perigoso não é sua força...não é seu dinheiro, nem suas armas  
mas sim o seu caráter. Não vou perder tempo aqui tentando demonstrar isso. Faço o caminho inverso afirmando que isso é tão verdadeiro, tão simples e tão evidente, que – como todas as coisas que guardam essas três qualidades – foi esquecido. Sendo esquecido, uma vez demonstrado de forma cabal provoca o falso deslumbramento. É dessa sensação que se vale quem quer vender jornal e fazer notícia afirmando “escandalizado” que agora o Brasil tem deputados presidiários. Guardasse o nosso povo a certeza de que não há diferença entre os valores que imperam num presídio e aqueles que regem nosso Congresso e não teria a restrição da liberdade de ir e vir de um marginal de terno provocado tamanha polêmica.
Há muito, mas muito tempo mesmo a democracia no Brasil acabou. Governa o país uma ditadura dos medíocres onde a noção de justiça cedeu a de “participação popular” e onde a mera noção de verdade foi trocada pela de consenso. Já escrevi antes sobre o tema.
Deputados bandidos sendo algemados e mesmo assim mantendo seu cargo não são causa disso. São a consequência. Afirmo ser pré-requisito essencial para vida politica no nosso país um caráter em absolutamente tudo idêntico ao dos sociopatas assassinos, estupradores e traficantes que lotam as prisões mais vigiadas. Sustento que a semelhança entre esses dois mundos é tamanha que não há  dinheiro nem luxo capaz de dissimular as coincidências. Essa afinidade funciona como um tapa na cara para quem acredita nas instituições acima dos homens, para quem coloca o mundo da economia acima da cultura e para quem crê que o “hábito faz o monge”. Ela desafia a máxima das faculdades de Direito ao proclamarem que não existem criminosos; mas sim crimes e atira perante toda sociedade brasileira a vulgaridade do seu cidadão mediano – aqueles entre os quais nos incluímos todos nós, que não somos presidiários nem deputados, mas que nosso silêncio covarde permitimos o surgimento de condições em que não se pode mais fazer a distinção moral deles. Quando um deputado brasileiro, bandido ou não, permanece indo e vindo algemado às sessões do Congresso, somos todos nós que estamos ali junto com eles. Somos 190 milhões de “depenados” - termo que define a mistura de deputados e apenados, que reflete o brasileiro médio e escandaliza o cidadão mínimo em qualquer republiqueta africana. Triste maneira de fazer um país gigantesco perceber que o que tem de mais importante não são as suas instituições, mas sim o seu povo, que esse povo, crente numa religião civil de adoração ao poderes colocou neles os piores dentre seus homens e que já não há mais diferença alguma entre condenados e legisladores.


PORTO ALEGRE, 30 DE AGOSTO DE 2013.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Pausa para... uma crianca feliz... e um avo desabituado...

Sem palavras...


Brasil-FMI: companheiros ainda mantem relacao esquizofrenica - materias de jornais

Ué? A gente não era autônomo do FMI? Não éramos credores do organismo? Por que reter um relatório sobre nossa excelente situação econômica e nossa mais excelente ainda política econômica?
O que temos a esconder?
Paulo Roberto de Almeida

FMI sugere ao Brasil reduzir empréstimos a bancos públicos
Sergio Lamucci
Valor Econômico, 29/08/2013

Washington - O Fundo Monetário Internacional (FMI) recomenda ao Brasil uma redução gradual da política de empréstimos aos bancos públicos, ressaltando a importância da adesão a uma meta de superávit primário que coloque a dívida pública numa trajetória de queda, segundo documento divulgado ontem, que elogia o ciclo de alta de juros promovido pelo Banco Central (BC) para conter a inflação.
Para o FMI, a economia brasileira está se recuperando da desaceleração que começou em meados de 2011, observando que os "ventos contrários" provocados pelas condições externas, "restrições domésticas de oferta e incertezas sobre políticas" parecem segurar o crescimento no curto prazo.
As informações fazem parte de nota de três páginas, que trata da conclusão das consultas ao artigo IV, o capítulo do estatuto do FMI que prevê raio-X anual da situação da economia dos países-membros. Não é contudo, o relatório completo, cuja publicação depende de autorização do Ministério da Fazenda, ainda pendente. (ver ao lado)
O FMI faz algumas críticas à política fiscal, na linha das realizadas por parte dos especialistas em contas públicas no Brasil, mas em tom mais brando. O aumento expressivo dos empréstimos do Tesouro para bancos públicos, especialmente ao BNDES, é malvisto pelos analistas por elevar a dívida bruta.
Segundo a nota do FMI, alguns diretores-executivos consideraram que "uma avaliação mais detalhada do que compreendem os conceitos da dívida pública bruta e líquida permitiria uma interpretação melhor da evolução e das perspectivas fiscais do país". A dívida líquida desconta ativos do governo, como reservas internacionais e créditos do Tesouro junto aos bancos públicos.
Em julho, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, mandou carta para a diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, pedindo uma mudança nos critérios de cálculo da instituição da dívida bruta brasileira. Nas conta do FMI, o endividamento bruto do país fica mais alto por incluir todos os títulos que estão na carteira do BC.
Os diretores-executivos da instituição, diz o documento, estimulam esforços do país para "manter a disciplina fiscal de Estados e municípios, o relaxamento da rigidez orçamentária para aumentar a poupança pública", além de encorajar o "reconhecimento mais completo de riscos fiscais associados a ativos de bancos públicos e acordos de concessão de infraestrutura." Eles ressaltaram a necessidade de ajuste fiscal firme e comedido, "ancorado à meta de longo prazo de superávit primário".
"Alguns diretores" acreditam, segundo a nota, que o estímulo fiscal pode ter papel de instrumento contracíclico. O FMI se mostrou satisfeito com o começo do ciclo de aperto monetário, destacando que a política monetária deve se voltar para conter pressões inflacionárias e ancorar expectativas de inflação. Para o FMI, a política monetária deve ter o papel principal na administração da demanda.
Ao falar da atividade econômica, o FMI aponta uma retomada gradual. "O consumo continuou resistente no ano passado, apoiado pelo baixo desemprego e amplos ganhos nos salários reais, embora tenha havido uma desaceleração mais recentemente", afirma. "Depois de período prolongado de fraqueza, o investimento começou a se recuperar nos últimos trimestres, enquanto a confiança dos empresários se firmou. Com a economia operando perto do potencial, restrições de oferta afetaram o crescimento de curto prazo e exacerbaram pressões inflacionárias."
Para o FMI, o baixo desemprego contribuiu para pressionar a inflação, impulsionando a demanda e elevando custos. O documento nota que o índice de preços ao consumidor tem rodado no limite superior da banda de tolerância da meta, de 6,5%, enquanto as expectativas de médio prazo acima do ponto central, de 4,5%. Nota que o déficit em conta corrente aumentou, refletindo demanda externa mais fraca, consumo forte e também aumento do investimento e interrupções temporárias na produção de petróleo. "A taxa de câmbio se depreciou ao longo do último ano, mais recentemente como parte de um amplo realinhamento nos vários mercados emergentes."
A nota destaca que fluxos de capitais, especialmente de carteira (para ações e renda fixa), diminuíram em 2012, devido à perspectiva de crescimento mais fraco, juros mais baixos no Brasil e ao uso de medidas de controle de capitais. "Mais recentemente, a volatilidade financeira global e o aumento da aversão global ao risco reduziram ainda mais os fluxos de carteira para ao Brasil." Os fluxos de investimento estrangeiro direto, porém, continuaram robustos, nota o FMI.
O fundo diz apoiar a decisão das autoridades brasileiras de limitar as intervenções no câmbio para moderar a excessiva volatilidade, destacando que o câmbio flutuante deve permanecer como o principal amortecedor de choques num cenário de turbulência. O documento, contudo, foi concluído antes de o real sofrer pressão mais forte, que levou o BC a decidir por uma atuação mais firme no mercado de moeda estrangeira.

Fazenda 'proíbe' FMI de divulgar relatório
 Adriana Fernandes, Laís Alegretti, Renata Veríssimo
O Estado de S. Paulo, 29/08/2013

Brasília - Fundo publicou apenas sumário de documento com dados da análise anual sobre a economia brasileira; governo cobra ajustes técnicos

Em mais um episódio envolvendo o Fundo Monetário Internacional (FMI), o governo brasileiro não autorizou o organismo a publicar o relatório completo com os dados da análise anual feita sobre a economia brasileira.A entidade limitou-se a divulgar ontem apenas o sumário da publicação.
O Brasil cobra do FMI modificações e ajustes técnicos no documento antes de autorizar a publicação da íntegra do relatório. O Ministério da Fazenda não informou quais são as mudanças pleiteadas pelo Brasil. A assessoria do ministro Guido Mantega disse que se trata de discussões técnicas. O Brasil alega que precisa de mais tempo para autorizar a divulgação.
"A decisão sobre a publicação do artigo 4.º será tomada depois que esse diálogo (com o FMI) for concluído", comunicou a assessoria de Mantega.
Conhecido como "artigo 4.º", o relatório é feito depois de uma avaliação e troca de informações com a área econômica do governo sobre a estratégia de política econômica. Economistas do FMI visitam o País e, após o retorno, a equipe apresenta o documento para a discussão na diretoria do Fundo.
O relatório foi concluído pela diretoria executiva do FMI no dia 26 de julho, mas apenas o sumário foi divulgado ontem, nos Estados Unidos, com recomendações ao País como: a redução gradual na concessão de crédito por bancos públicos, disciplina fiscal e adoção de uma meta de superávit primário que coloque o déficit público em trajetória de queda. No sumário, o FMI também avalia que uma política monetária mais apertada vai ajudar o País a lidar com pressão de preços. Ou seja, sugere juros mais altos para combater a inflação.
Pressão. Nos últimos meses, o Brasil vem pressionado o FMI para revisar a metodologia de cálculo da dívida bruta do governo federal. Mantega chegou até mesmo a enviar uma carta à diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde. A mudança passou a ser questão de honra para o Brasil porque, pelos critérios do FMI, a dívida pública brasileira fica quase 10 pontos porcentuais mais elevada em comparação aos cálculos feitos pelo Banco Central brasileiro. A preocupação do governo é que o cálculo mais elevado prejudique a imagem do Brasil, justamente no momento de maior crítica à política fiscal.
Na carta, o governo critica a metodologia, considera que os dados do FMI estão "substancialmente superestimados" e que isso prejudica a percepção sobre a situação fiscal brasileira. Pelos dados do FMI, a dívida bruta do País fechou 2012 em 68% do Produto Interno Bruto (PIB). Já pelos dados divulgados pelo BC, o endividamento ficou em 58,7% ao final de dezembro do ano passado.
Grécia. Em outro episódio mais recente, o representante do Brasil no FMI, Paulo Nogueira Batista, se absteve na votação de liberação de mais uma tranche de ajuda à Grécia. O procedimento foi desautorizado pelo ministro Mantega, que telefonou para a diretora do FMI para explicar que essa não era a posição do governo. Em seguida, Batista foi chamado a Brasília, mas não perdeu o cargo.

O FMI e a escuridão do Brasil
Editorial O Estado de S. Paulo, 29/08/2013

Mistério insondável ou segredo? Não há cenário prospectivo da economia brasileira, nem para este ano nem para o próximo, no informe divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), na quarta-feira passada, sobre a recém-concluída coleta de informações sobre a situação e a evolução provável do País. Quem quiser conhecer as mais amplas e recentes projeções econômicas para Estados Unidos, Alemanha, China, Japão, Geórgia e República Eslovaca - para citar só uns poucos exemplos - poderá consultar os últimos relatórios do Fundo Monetário Internacional sobre as consultas realizadas periodicamente, quase sempre de ano em ano, com fontes oficiais, empresariais e acadêmicas desses países.
Os documentos e mesmo os comunicados breves à imprensa contêm, no mínimo, os números estimados para este ano e para o próximo. As estimativas alcançam, em alguns casos, os próximos cinco anos. No caso do Brasil, a série dos números termina, estranhamente, no ano passado. A nota publicada em julho de 2012 continha, pelo menos, as projeções para o ano. Naquele momento ainda se esperavam, por exemplo, um crescimento econômico de 2,5% e uma inflação de 4,8% - números fornecidos pelo governo, incorporados no relatório e errados.
Neste ano, nem as projeções para 2013 aparecem na tabela divulgada. Não foram citadas sequer as últimas estimativas do FMI: 2,5% de expansão do PIB neste ano e 3,2% no próximo. O governo terá, por insegurança diante dos maus resultados obtidos até agora, interferido para limitar os detalhes numéricos?
Mesmo com poucos números e com uma tabela encerrada em 2012, a nota evidencia uma avaliação pouco favorável da economia brasileira. Documentos desse tipo são em geral redigidos em linguagem diplomática, mas sem grandes contorções. A produção do texto recém-divulgado foi obviamente mais complicada, com muita interferência brasileira. A análise relevante, em geral crítica, aparece quase sempre depois de alguma referência positiva.
Exemplo de contorção: a economia melhora gradualmente, o investimento começou a recuperar-se e a confiança dos empresários se firmou. Mas - e aqui entra a parte substantiva - a economia deve estar operando perto do potencial, restrições do lado da oferta limitaram o crescimento no curto prazo e exacerbaram as pressões inflacionárias, com o baixo desemprego também contribuindo para pressões inflacionárias de custo e de demanda.
Qual o potencial de crescimento? Deve estar na faixa de 3% a 3,5%, pelas estimativas do Fundo, porque a projeção para o próximo ano indica 3,2%. No Brasil, há quem calcule margem ainda menor para uma expansão segura, isto é, sem pressão importante sobre os preços e sem desajustes perigosos nas contas externas. Sem entrar nesses detalhes, pelo menos no informe inicial para a imprensa, o pessoal do FMI é, no entanto, bastante claro quanto a esse ponto: o Brasil precisa de muito mais investimentos para crescer mais rapidamente.
A piora das contas externas também é mencionada. O câmbio desvalorizou-se, mas o custo da mão de obra em dólares se manteve. O rápido aumento do salário real e a estagnação dos ganhos de produtividade limitaram o efeito benéfico da depreciação do real sobre a competitividade. A mensagem é nítida: a deterioração do balanço de pagamentos, especialmente da conta de comércio, é atribuível apenas em parte à fraqueza da demanda externa. Neste, como em outros pontos importantes, o diagnóstico dos técnicos do Fundo diverge das explicações, ou justificativas, do governo.

Na avaliação da junta de diretores executivos, o crescimento deve estar sendo contido, no curto prazo, pelas limitações internas da oferta (dificuldades de produção) e pelas incertezas quanto à política econômica. O aperto monetário, segundo essa análise, é bem-vindo e seria conveniente mantê-lo para conter a inflação e ancorar as expectativas. Cuidar das contas públicas também seria, segundo essa análise, uma boa ideia.

Alho: um produto altamente estrategico, essencial, excepcional (protecionismo ridiculo)

Seria risível se não fosse patético.
Desde que o Mercosul começou, mais de 20 anos atrás, o alho sempre figurou em todas as listas de exceções. Deve ter alguma coisa com o alho que eu não percebo, e não deve ser só para espantar vampiros...
Paulo Roberto de Almeida

Produtores querem barrar alho chinês; importador fala em aumento de preço
MAURO ZAFALON (Vaivém das commodities / Coluna)
Folha de S. Paulo, 29/08/2013

Produtores e importadores de alho estão em pé de guerra por causa do produto vindo da China. Os agricultores brasileiros querem aumentar as barreiras impostas ao alho chinês, enquanto os importadores pretendem derruba-las.
O Brasil produz só 35% do alho que consome, e mais da metade do produto importado vem da China --quase todo o resto sai da Argentina.
Para entrar no país, o alho chinês é submetido, desde 1996, ao pagamento de tarifa antidumping. A medida é reavaliada de tempos em tempos e a revisão mais recente ocorreu em 2007, com previsão para expirar no final deste ano.
Os produtores brasileiros se anteciparam e pediram ao Departamento de Defesa Comercial (Decom), do Ministério do Desenvolvimento, a renovação do antidumping e o aumento da tarifa, de US$ 0,52 por quilo para US$ 1,01.
"Nossos estudos mostram que esse é o valor do dumping praticado pelos chineses", diz Rafael Corsino, presidente da Anapa (Associação Nacional dos Produtores de Alho).
Dumping é quando um produto é vendido com preço mais baixo que no país de origem. Segundo Corsino, o quilo do alho chinês é vendido no Brasil cerca de US$ 1 mais barato que na China.
Os importadores negam o dumping. O presidente da Ania (Associação Nacional dos Importadores de Alho), Herculano Gonçalves Filho, diz que algumas empresas chinesas abriram os seus números ao Decom para comprovar que não há essa prática.

Segundo ele, se a tarifa subir, o consumidor vai pagar mais pelo alho, já que a produção nacional não é suficiente para abastecer o país. A alta, diz, pode chegar a R$ 1,20 por quilo, que é vendido entre R$ 12 e R$ 15 ao varejo.

Argentina: quando um governo persegue cambistas, a crise esta' proxima

Argentina pressiona cambistas de dólar
Ariel Palacios
O Estado de S. Paulo, 29/08/2013

Governo ordenou uma série de blitze no centro portenho, fechando algumas agências de câmbio, além de perseguir nas ruas cambistas que vendiam dólares aos turistas

BUENOS AIRES - A derrota da presidente Cristina Kirchner nas eleições primárias do dia 12 de agosto e a perspectiva de um novo fracasso do governo nas urnas nas eleições parlamentares do dia 27 de outubro está provocando uma nova disparada do dólar na Argentina. A cotação oficial da moeda americana - o refúgio financeiro preferido dos argentinos há quatro décadas - encerrou ontem em 5,65 pesos. A cotação paralela "light" ficou em 8,75 pesos, enquanto que a versão do dólar paralelo aplicada pela maioria dos cambistas chegou a 9,69 pesos. Desta forma, a brecha entre a cotação oficial e a extraoficial ultrapassa os 70%.
No entanto, no fim do dia o secretário de comércio interior, Guillermo Moreno, ordenou uma série de blitze no centro portenho, fechando algumas agências de câmbio, além de perseguir nas ruas cambistas que vendiam dólares aos turistas. Moreno é o homem forte da presidente Cristina na cruzada antidólar deflagrada pelo governo em outubro de 2011.
Nos últimos dois anos, a Casa Rosada aplicou uma série de restrições que tornam quase impossível a compra de dólares por parte dos cidadãos argentinos. Sem a possibilidade de comprar pela via oficial, os argentinos recorrem ao paralelo, mercado que havia praticamente desaparecido nos 20 anos anteriores.
O governo tenta manter as aparências cambiais com o dólar oficial. No entanto, desde junho, em diversas reuniões com os donos de agências de câmbio - e também com cambistas ilegais -, o secretário Guillermo Moreno exerceu fortes pressões para que o dólar paralelo seja "moderado". Por este motivo, os cambistas fazem as operações ilegais anunciando um paralelo mais "light" - o denominado "blue" - para agradar o governo, embora, na realidade, protagonizem um câmbio mais elevado, chamado de "dólar-cueva" (dólar-caverna).
Repatriação. Em julho o governo anunciou o "Plano de Exteriorização Voluntária de Divisas", nome do mecanismo que implementa a anistia para os dólares não declarados que poderão entrar no sistema financeiro do país durante três meses. Além de tentar trazer fundos frescos para o país, a lei pretendia provocar uma queda do dólar. No entanto, o plano fracassou e o dólar voltou a crescer, embora de forma gradual. Mas a derrota do governo nas urnas provocou uma nova disparada na última quinzena.
O resultado eleitoral coloca a pique os planos do governo de reformar a Constituição com o objetivo de permitir reeleições presidenciais indefinidas para Cristina Kirchner.

Nesta semana, o dólar paralelo voltou a subir a partir do anúncio da presidente Cristina sobre uma nova - e polêmica - reestruturação da dívida pública com os "holdouts" (denominação dos credores que não entraram nas trocas de títulos realizados em 2005 e 2010).

O deputado-presidiario importa menos: o objetivo sempre foi salvar outros bandidos, maiores - Reynaldo Rocha

Reinaldo Rocha
Blog de Augusto Nunes, 29/08/2013

No país de pernas para o ar, da inversão absoluta de valores, não são os mensaleiros que serão beneficiados com a absolvição de Natan Donadon. Foi Donadon que se beneficiou do processo do mensalão.

A causa primeira do apodrecimento do Congresso está no PT e no projeto de poder sem limites, sem vergonhas e sem respeito ao país.
Os que roubaram se associaram à maior quadrilha de bandidos já vista no Brasil, que usa o poder como pé-de-cabra para arrombar cofres públicos e protege bandidos como membros da Cosa Nostra. São os responsáveis diretos pela absolvição parlamentar de um criminoso condenado a 13 anos de cadeia.
Isto não exime os covardes que zombaram da nossa cara nesta quarta-feira, em mais uma noite de infâmia. São venais e esperavam somente a oportunidade de reafirmar ao Brasil o que sempre fazem: viver no esgoto fétido onde convivem na alegre confraria das ratazanas.
Mas que não se acuse o salafrário condenado pela alegria incontida dos mensaleiros. Ou se debite ao Donadon o que é do PT. A César o que é de César. Ao PT a primazia da canalhice. O deputado que reclama do banho frio e da qualidade do repasto servido somente seguiu a trilha do PT e repetiu a cantilena dos inocentes ladrões de Ali Baba.
Que não se acuse o presidiário-deputado de ser a falta de decência explícita. Somente copiou quem nunca foi decente.
São estes os pioneiros que merecem – na visão de alguns ministros da defesa em ação no STF – uma pena minorada? É este exemplo – seguido por Donadon, que exige o mandato mesmo precisando de camburão para ir ao trabalho – que protege os mandatos de João Paulo Cunha e Genoíno?
Não seria a “elasticidade” das penas, tão citada por Ricardo Lewandowski, o argumento usado ontem por centenas de juízes? O ministro deve estar feliz. Ao menos uma de suas teses foi aplicada.
A interpretação a favor do réu (mesmo contra a sociedade) foi levada ao extremo. Preso? Sim. Condenado? Também. Mas deputado sempre!
Natan Donadon se valeu da desavergonhada exegese jurídica que ministros do STF propõem como uma nova prestação jurisdicional. A que se rebela contra a sentença (direito de qualquer réu) e consegue apoios entre os próprios julgadores.
Não foi isso que aconteceu onde no Circo dos Farsantes? Um ajuntamento de bandidos inocentando e protegendo um deles que – coitado – caiu em desgraça.
O exemplo está sendo dado há mais de oito meses em outro prédio da Praça dos Três Poderes. O Estado de Direito substituído pelo direito de alguns que lesam o Estado.
Donadon será eternamente grato ao PT, aos mensaleiros, aos blogueiros “progressistas” e chapas-branca, aos milicianos histéricos, aos movimentos sectários que defendem o indefensável, aos ministros que caíram de para-quedas no Plenário do Supremo, aos cordatos que mesmo discordando aceitam a podridão como normal, aos advogados medalhões regiamente pagos, ao poder.
Os mensaleiros nada devem a Donadon. Este sim deve e muito aos mensaleiros. Eles criaram o caldo de cultura onde mais é menos, onde roubo é malfeito, onde a mentira é dado oficial e onde o poder é passagem liberada para a corrupção.

Os mensaleiros devem ao Brasil. E esta conta – juro! – eu vou cobrar.

Martin-Luther King: Americano, nao Afro-Americano - Demetrio Magnoli

E ele não disse 'África' 
Demétrio Magnoli
O Estado de S. Paulo, 29/08/2013

Demétrio Magnoli é sociólogo e doutor em Geografia Humana pela USP.

Meio século atrás, à sombra do Memorial de Lincoln, em Washington, Martin Luther King pronunciou 1.667 palavras. Nenhuma delas era "África" - ou "africanos", ou mesmo "afro-americanos". Nessa ausência se encontra a prova da atualidade do discurso mais célebre do século 20. Deveríamos ouvi-lo novamente, prestando atenção no contraste entre aquela linguagem e a utilizada hoje pelos arautos das políticas de raça.
King aludiu à Proclamação de Emancipação, de Abraham Lincoln, "um grande farol de esperança para milhões de negros escravos", mencionou as "algemas da segregação" e as "correntes da discriminação" que, cem anos depois, ainda aleijavam "a vida dos negros", e falou sobre a "solitária ilha de pobreza, em meio a um vasto oceano de prosperidade material", na qual viviam os negros. No discurso de agosto de 1963, os negros eram definidos por referências situacionais (escravidão, segregação, pobreza), não por uma essência identitária (raça, etnia, cultura ou origem).
Americanos, não "afro-americanos" - isso são os negros, na linguagem de King. Os negros, que experimentam "o exílio em sua própria terra", marcharam à "capital de nossa nação" para cobrar uma promessa de igualdade escrita "pelos arquitetos de nossa República" na Declaração de Independência e na Constituição. A luta para resgatar aquela "nota promissória" ergueria "nossa nação das areias movediças da injustiça racial para a sólida rocha da fraternidade". Ela não deveria "conduzir-nos a desconfiar de todas as pessoas brancas", pois "muitos de nossos irmãos brancos (...) compreenderam que o destino deles está preso ao nosso" e que "a liberdade deles está inextricavelmente ligada à nossa".
A linguagem de King não desafiava apenas as leis de segregação, seu alvo imediato, mas uma narrativa sobre a origem dos Estados Unidos, seu alvo distante. Tal narrativa, uma versão da ideia do melting pot, se coagulara no final do século 19 como reação à libertação dos escravos e como chave lógica para a segregação racial oficial. Ela descrevia os Estados Unidos como uma nação de colonos brancos rodeada por minorias raciais (indígenas, asiáticos e negros africanos). No discurso que completa 50 anos, King contestava todo esse cortejo de noções identitárias emanadas do pensamento racial. Não, dizia, a nação é outra coisa - é aquilo que está escrito nos textos fundadores!
A contestação de King separava-o de uma longa tradição da política negra nos Estados Unidos. W. E. B. Du Bois entalhara o mito da raça na fachada da venerável NAACP, a principal organização negra americana. Ele não acreditava no valor explicativo de "grosseiras diferenças físicas de cor, cabelos e ossos", mas invocava "forças sutis" que "dividiram os seres humanos em raças claramente definidas aos olhos do historiador e do sociólogo".
"Nós", dizia Du Bois, "somos americanos por nascimento e cidadania" e "em virtude de nossos ideais políticos, nossa linguagem, nossa religião". Contudo, acrescentava, "nosso americanismo não vai além disso", pois, "a partir desse ponto, somos negros, membros de uma raça histórica que se encontra adormecida desde a aurora da criação, mas começa a acordar nas florestas escuras de sua pátria africana". Afro-americanos: o termo, cunhado muito depois na bigorna do multiculturalismo, foi concebido no início do século 20 como um fruto do pensamento racial. A atualidade do discurso de King encontra-se precisamente na sua ruptura com a visão de Du Bois, que era um reflexo da narrativa racista sobre a nação branca.
Du Bois, revisitado pelo multiculturalismo, não o universalismo de King, é a fonte das políticas oficiais de raça no Brasil. Um documento de "orientações curriculares" para a "educação étnico-racial" da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, datado de 2008, sintetiza as diretrizes que, a partir do MEC, disseminam entre os jovens estudantes a noção de divisão da humanidade em raças. O texto deplora a vasta diversidade de cores utilizada pelos indivíduos em declarações censitárias, que contribuiria "para diminuir o potencial político da população afro-brasileira".
"A pluralidade de cores no país diz quem é o povo brasileiro, mas não sua identidade étnico-racial", segundo os sábios da secretaria. A solução para a carência identitária residiria numa especial reinterpretação das palavras dos declarantes. Operando como "um agente social de reconhecimento eficaz do outro", transformando-se "em alguém mais ativo no processo de identificação", o recenseador produziria em tabelas e gráficos a "população afro-brasileira" que não emerge das autodeclarações. Em termos diretos, trata-se de manufaturar uma fraude censitária com a finalidade de gerar as tais "raças claramente definidas aos olhos do historiador e do sociólogo" de que falava Du Bois. Destinado a professores, o texto veiculava a mensagem inequívoca de que na sala de aula a linguagem da raça é um imperativo absoluto, em nome do qual se deve ignorar a informação censitária factual.
"Eu tenho o sonho de que meus quatro pequenos filhos viverão, um dia, numa nação onde não serão julgados pela cor da sua pele, mas pelo teor de seu caráter." A sentença nuclear do discurso de King não solicitava o reconhecimento de identidades étnicas ou de direitos raciais. Ela exigia que os Estados Unidos aplicassem o princípio, contido nos seus documentos fundadores, segundo o qual "todos os seres humanos são criados iguais". A igualdade entre indivíduos livres de todas as cores, não um acordo político entre coletividades raciais distintas, era a reivindicação do 28 de agosto de 1963. Eis por que aquele dia permanece tão atual, lá e aqui.

Eu também tenho um sonho. Sonho com o dia em que milhões de exemplares do discurso de Martin Luther King sejam distribuídos, clandestinamente, como material subversivo nas escolas brasileiras.

Mais Medicos: apenas um embuste para esconder uma ilegalidade anterior - Folha de SP

29/08/2013 - 03h30

Convênio para importar cubanos foi firmado antes do Mais Médicos

Folha de S.Paulo, 29/08/2013
SHEILA D'AMORIM
JOHANNA NUBLAT
DE BRASÍLIA

Mais de dois meses antes do lançamento oficial do programa Mais Médicos, o governo brasileiro já tinha assinado com a Opas (Organização Pan-Americana da Saúde, braço da OMS) o contrato que abriu caminho para importar 4.000 médicos cubanos.
Com data de 26 de abril deste ano, o "80º termo de cooperação técnica para desenvolvimento de ações vinculadas ao projeto de acesso da população brasileira à atenção básica em saúde" traça regras gerais para parcerias com a entidade.
Válido por cinco anos prorrogáveis por igual período, ele serviu de base para que fosse firmado em agosto o convênio com Cuba.
Apesar de o contrato já estar valendo no lançamento do Mais Médicos, em julho, o Ministério da Saúde insistiu, na época, que os profissionais brasileiros eram a prioridade do programa.
Finalizada a primeira rodada de seleção do Mais Médicos, no início de agosto, apenas 10% das vagas foram ocupadas. Depois disso, o governo indicou que a solução seria um acordo para trazer os profissionais de Cuba.
Essa sinalização confirmou o que o então ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores) já havia citado três meses antes como uma possibilidade em exame. Na época, a fala de Patriota criou um constrangimento ao governo diante da reação negativa.

Carlos Bueno a Eduardo Saboia: carta de solidariedade (O Globo)

From: "carlos antonio bueno" <cxxxxxxx@xxxxxx.com>
To: <
Cartas@oglobo.com.br>
Sent: Tuesday, August 27, 2013 9:58 PM
Subject: Itamaraty. 
Nem tudo está perdido.

Caro colega Eduardo Saboia, 


Poucas vezes durante os quarenta e três anos de carreira, senti orgulho em constatar a existência de homens de coragem, despreendimento e inusitada lucidez, ao seguirem a sua consciência e corretamente interpretarem o verdadeiro interesse nacional resgatando um asilado político vítima de manobras protelatorias e confinado a quatro paredes na chancelaria da nossa embaixada em La Paz. 
O seu gesto, Eduardo, é mais que um exemplo do que podemos, nós diplomatas, fazer por zelar pelos princípios que defendemos, pela integridade da instituição a que pertencemos e pela carreira que abraçamos com patriotismo e destemor de uma diplomacia hoje orientada para objetivos duvidosos. 
Aquí deixo o meu respeito e admiração pelo seu desempenho. 
Nem tudo está perdido. 

Abraço solidário do colega 

Carlos Bueno (embaixador aposentado) 
tel.(021) xxxx-xxxx 
Rua Gastão Bahiana xxx, Lagoa, RJ

Brasil-Bolivia: quem deve sentar-se no banco dos reus? - Ricardo Noblat

Quem deveria sentar-se no banco dos réus

Ricardo Noblat


Finalmente apareceu alguém sem medo de confrontar a presidente da República - o diplomata Eduardo Saboia, cérebro da operação que resultou na retirada da Bolívia do senador Roger Pinto Molina, refugiado em nossa embaixada de La Paz há mais de 450 dias.
O Brasil acatara o pedido de asilo político do senador, que denunciara autoridades do seu país por envolvimento com narcotráfico. A Bolívia negara o salvo-conduto para que Roger deixasse o país em segurança sob a acusação de que é corrupto.
Saboia disse que Roger não podia receber visitas. Nem circular dentro do prédio da embaixada. Nem se comunicar com a família. Nem tomar banho de sol. Uma autoridade do governo boliviano comentou certa vez que ele ficaria ali até morrer.
- Você imagina ir todo dia para o seu trabalho e ter uma pessoa trancada num quartinho do lado, que não sai? Aí vem o advogado e diz que você será responsável se ele se matar. Eu me sentia como se fosse o carcereiro dele, como se eu estivesse no DOI-Codi.
Presidente não bate-boca com funcionário de escalão inferior. Dilma bateu, ao dizer ter provado da desumanidade dos DOI-Codis. O dia sequer terminara e Saboia já replicava Dilma. "Eu que estava lá, eu que posso dizer. O carcereiro era eu. Ninguém mais viu aquela situação", respondeu. Desautorizou a presidente. E sugeriu que ela nada poderia falar a respeito porque não estava lá.
Nenhum ministro, senador, deputado ou presidente de um dos poderes da República foi tão longe em relação a Dilma como Saboia, um mero encarregado de negócios que respondia por uma embaixada de segunda classe na ausência do embaixador.
De duas, uma. Dilma e o bando de assessores que a cercam não prestaram atenção no que afirmou Saboia. Ou prestaram, mas a presidente quis bancar a esperta e mudar o foco da discussão. Até agora, a discussão é favorável a Saboia.
Recapitulemos. Disse Saboia: "Eu me sentia como se fosse o carcereiro dele, como se eu estivesse no DOI-Codi". Era Saboia, bancando o carcereiro, quem se sentia como se estivesse no DOI-Codi. Não disse que o senador enfrentava condições semelhantes às dos DOI-Codis.
As palavras ditas por Dilma: "Eu estive no DOI-Codi, sei o que é o DOI-Codi. E asseguro a vocês que é tão distante o DOI-Codi da embaixada brasileira lá em La Paz como é distante o céu do inferno". Em resumo: Saboia disse uma coisa. Dilma, outra.
No sábado, ao ficar sabendo que Roger chegara a Corumbá, após rodar mais de 1.500 quilômetros em um carro da embaixada, acompanhado por Saboia e dois fuzileiros navais, Dilma só faltou escalar as paredes do Palácio da Alvorada. Cobrou a demissão imediata de Saboia ao ministro Antonio Patriota, das Relações Exteriores. Patriota estava em São Paulo, pronto para ir à Finlândia.Dilma foi grosseira com ele, como de hábito. Mandou que retornasse a Brasília. E o demitiu.
A indignação de Dilma tem a ver com duas coisas. A primeira: ela ficou mal diante do presidente Evo Morales, que acusou o Brasil de desrespeitar tratados internacionais ao providenciar a fuga de Roger, sem que ele tivesse obtido salvo-conduto.A segunda: Dilma tem medo de que reste provada a negligência do governo no caso do senador boliviano. Saboia tem como provar negligência. Para evitar que o governo tente pôr fim em sua carreira diplomática de mais de 20 anos, está disposto a provar.
- Eu perguntava da comissão bilateral para resolver a questão do senador, e me diziam: "Olha, aqui (no Brasil) é empurrar com a barriga." Tenho e-mails dizendo: "A gente sabe que é um faz de conta, eles fingem que estão negociando e a gente finge que acredita".
Tem um filme na praça chamado "Hannah Arendt". Conta a história do julgamento do carrasco nazista Adolf Eichmann. E da cobertura do julgamento feita para a revista americana "The New Yorker" pela filósofa judia de origem alemã Hannah Arendt. A teoria da "banalidade do mal" começou a nascer ali, quando Hannah se convenceu de que Eichmann não se sentia responsável pela morte de milhões de judeus. Ele repetia em sua defesa: cumprira ordens.
Ninguém ordenou que Saboia tentasse salvar a vida do senador que ameaçava se matar, segundo atestados médicos. Sentindo-se responsável por ele, Saboia decidiu obedecer ao que mandava a sua consciência. Despachou para o Itamaraty mensagem antecipando o que iria se passar. A resposta foi o silêncio. Quem por aqui se lixava para a sorte do senador boliviano? Quem em La Paz se lixava?
Por negligência, omissão e desumanidade, Saboia não poderá ser punido. Não deverá ser punido. Não merece ser punido. Por tais crimes, são outros que deveriam sentar-se no banco dos réus.

O Brasil e a nao-intervencao: ABC Color lembra a intervencao nos assuntos internos do Paraguai

Dilma dice que su gobierno “no interfiere en vida de otros países”
ABC Color (Paraguai), 29/08/2013

La presidenta brasileña, Dilma Rousseff, afirmó ayer que su gobierno no interviene en asuntos internos de otros países, a poco más de un año de que, junto a los otros miembros del Mercosur y Unasur buscara impedir que el Paraguay cambiase el gobierno que, en ese momento, le era adicto.

“No interferimos en la vida de otros países, no colocamos la vida de quien quiera que sea en riesgo, adoptamos rigurosamente el concepto de la no intervención y solo respaldamos acciones excepcionales si pasamos por el debido escrutinio de la ONU”, dijo Dilma Rousseff, olvidando obviamente lo que su gobierno llevó a cabo hace poco más de un año en el Paraguay.

En Sudamérica, dijo Rousseff, “somos 12 países hermanos, iguales en derechos, merecedores del mismo respeto, democráticos, en un continente como el nuestro, que estuvo marcado por dictaduras y que hoy vive un estadio de modernización política”.

El año pasado, en junio de 2012, una “patota” de cancilleres llegó hasta el “hermano” Paraguay para intentar impedir que sus representantes políticos (el Congreso) aplique una norma de la Constitución paraguaya (el juicio político) para cambiar legalmente a un presidente que le era adicto, el entonces mandatario Fernando Lugo.

Estas declaraciones las pronunció la Presidenta en el Palacio del Planalto durante la ceremonia de toma de posesión del nuevo canciller brasileño, Luiz Alberto Figueiredo, en reemplazo de su predecesor Antonio Patriota, quien fue el enviado de Rousseff al Paraguay en 2012.

El relevo en Itamaraty se produjo luego de la huida de la Embajada del Brasil, en La Paz, del senador opositor boliviano Roger Pinto, asilado en esa legación desde hacía más de un año.

Esa acción, según el Gobierno brasileño, no contaba con el conocimiento ni consentimiento del Ministerio de Relaciones Exteriores ni de la Presidencia del Brasil.

La gobernante brasileña reiteró la postura oída frecuentemente en las alocuciones oficiales referentes a las relaciones internacionales en la región.

“El fundamento de nuestra política externa es la relación armoniosa y respetuosa con nuestros hermanos latinoamericanos, a ellos siempre debemos dar lo mejor de nosotros, la mayor de nuestras prioridades es la integración regional”.

La Presidenta brasileña realizó estas declaraciones en relación al caso ocurrido con el senador boliviano, días atrás.


Sus palabras, no obstante, hacen referencia a los “12 países hermanos” de Sudamérica, donde queda incluido el Paraguay, una nación que aún recuerda la intervención brasileña (y de otros países) en sus asuntos constitucionales, tras lo cual fue suspendido de diversos órganos internacionales, en un intento de aislarlo diplomáticamente, al haber cambiado de Gobierno, en contra de lo que aquellos países pretendían.

Uma aventura boliviana: o relato da odisseia por estradas perigosas

'A ideia era fazer a viagem sem parar'

Senador, diplomata e fuzileiros usaram fraldas geriátricas para reduzir riscos

29 de agosto de 2013 | 2h 05
Andreza Matais - O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - Sexta-feira, 23 de agosto, 15 horas, Embaixada do Brasil em La Paz.
 
Pinto passou 454 dias preso em embaixada de La Paz - André Dusek/Estadão
André Dusek/Estadão
Pinto passou 454 dias preso em embaixada de La Paz


"Ha llegado el momento", disse o encarregado de negócios da embaixada, Eduardo Saboia, ao senador Roger Pinto. Estavam apenas os dois no escritório da representação brasileira na Bolívia quando Pinto ouviu instruções do plano de fuga. Na sequência, entrou um fuzileiro naval, que faz a segurança na embaixada, e o ajudou a colocar um colete à prova de balas por cima da camisa social.
O sentimento era dúbio. Depois de 454 dias preso num prédio da representação brasileira no país vizinho, num isolamento que só não foi completo porque Saboia decidiu não atender à recomendação do então chanceler Antonio Patriota para cortar celular e internet, o político havia se apegado aos objetos do quarto como a única coisa que lhe restava. "Você vê sua cama, sua mesa, sua cadeira. É seu mundo que foi construído ali, dá uma tristeza. Sei que olhei para trás e senti tristeza." O calvário de Roger Pinto começou após ele denunciar o envolvimento de membros do governo Evo Morales com o narcotráfico.
Seguiram-se ameaças de morte, perseguição política, acusações contra ele de corrupção, processos e a decisão de pedir asilo diplomático ao Brasil. A permissão para vir ao País, entretanto, não chegou quase 15 meses depois de o senador refugiar-se na embaixada.
A saúde física e mental fragilizada levaram o senador ao desespero e resultaram no plano de fuga cinematográfico concluído no sábado, quando o grupo de seis pessoas chegou a Corumbá (MS). Em 22 horas de viagem, pararam apenas uma vez na estrada. "Todo mundo pôs fralda geriátrica para não ter de parar. A operação tinha de dar certo e uma parada poderia significar correr riscos." Nos quase 15 meses em que ficou na embaixada, o senador escreveu um diário. A última parte conta a fuga para o Brasil, que o político antecipou, com exclusividade, em conversa com o Estado, a quem repassou fotografias do trajeto percorrido durante a viagem. No Brasil, Pinto ainda está confinado, agora na casa de seu advogado. O plano de retirada do senador causou uma crise diplomática que resultou na demissão de Patriota do Ministério de Relações Exteriores e em ameaça (em curso) de demissão de Saboia.

"Por que eu não termino com isso logo de uma vez?"
Havia três hipóteses para o senador: morrer sem assistência médica (não havia permissão para que recebesse um médico), ser levado a um hospital e sair de lá preso ou fugir para o Brasil. A demora na solução para o dilema impôs uma quarta opção: "Por que eu não termino logo com isso de uma vez? Amanhã termina e já não se acontece mais nada", perguntou-se o senador pouco antes da decisão que colocaria um ponto final na sua agonia. Religioso, Saboia, o responsável pela embaixada brasileira na Bolívia, já tinha feito sua opção. "Saboia me comunicou que era preferível isso (a fuga) e rapidamente se tomaria essa decisão."
"Sua vida corre perigo, mas eu também vou correr porque vou lhe acompanhar."
Na sexta-feira, perto das 15 horas, os servidores da embaixada e do prédio onde está localizada, em La Paz, já haviam encerrado o expediente. As ruas estavam desertas. O diplomata foi até o quarto do senador e apresentou seu plano. A estratégia era seguir para o Brasil usando dois carros oficiais da embaixada, Nissan 4x4, num trajeto perigoso, que incluía a região de Cochabamba, onde se concentra a produção de cocaína no país.
Os dois seguiriam no mesmo carro, o diplomata à frente, ao lado de um fuzileiro naval e, no banco de trás, outro fuzileiro e o senador. Os fuzileiros estavam armados. O senador e Saboia vestiram coletes à prova de bala. Ninguém usou disfarce ou se escondeu no porta-malas do carro.
Após a apresentação do plano, houve sentimentos mistos do senador boliviano. Depois de 454 dias preso, isolado, se sentiu triste. Não pelos riscos da operação que se seguiria. Mas por enfrentar a necessidade de recomeçar, que significaria a vinda para o Brasil.

Saboia e Pinto rezaram juntos. Toda a preparação foi fotografada por uma máquina do senador. O diplomata deu as instruções: a viagem seria direta, sem paradas. O que poderia significar riscos. Para isso, teriam de levar fraldas. Frutas e alguns lanches eram o suficiente para se alimentarem no caminho. Vários "planos B" foram traçados.
Para despistar a polícia boliviana, o senador deixou seu computador ligado, a página no Facebook aberta, e o celular em cima da mesa. "Na Bolívia tem escuta. Dentro do plano, meu celular, meu Facebook, ficou tudo aberto. Como o governo monitorava tudo, eles achariam que eu estava lá no prédio da embaixada." O senador despediu-se da cama, da mesa, da cadeira no quarto improvisado e partiu.
O plano de fuga foi elaborado sem a participação do senador boliviano, segundo seu relato. Levou tempo, análise, planejamento. "Creio que, pelo menos, uma semana." Ao revelá-lo, o diplomata tranquilizou o senador: "Sua vida corre perigo, mas eu também vou correr porque vou lhe acompanhar", disse Saboia a um interlocutor incrédulo. "Poderia ter sido fácil para o Saboia dizer: 'Há muito risco, vá embora'. Mas ele disse 'eu vou com você, eu vou acompanhar os riscos que estão aí , eu respondo por sua vida'. Ele sabia que em qualquer barreira da polícia e podíamos ter problemas, sermos detidos".
O trajeto incluía entrar em área do narcotráfico, onde o senador é inimigo número 1 por ter denunciado os negócios entre os produtores de cocaína e membros do governo. Foi o momento de maior tensão, aumentada por uma neblina e chuva intensa. "Não se enxergava nada, absolutamente nada." Mas o diplomata avisou que não havia outra opção e era preciso correr o risco.
"Deixa eu morrer, mas voltar ali eu não volto."
Passada meia hora da saída da embaixada, o senador passou mal. Os sintomas eram o de um enfarte. O lado direito do peito doía, a respiração ficou difícil e o braço adormeceu. O diplomata queria abortar o plano, levar o senador para um hospital, mas não teve escolha. "O diplomata sugeriu voltarmos, irmos para um hospital. Isso significava abortar a operação. O fracasso de tudo. Eu assumi que preferia morrer a ter de voltar. Eu disse: 'Deixe-me morrer, mas voltar ali eu não volto'. Eles entenderam."
Um silêncio se fez. Quase todo o caminho, o diplomata foi rezando, lendo a Bíblia. Quando um fuzileiro conseguiu cochilar no banco de trás, foi acordado pelo flash da máquina do senador. Todos riram. Foi um dos poucos momentos de distensão na viagem.
Veja também:
link 'Não havia clima para o CD do Pink Floyd' 

'Não havia clima para o CD do Pink Floyd'

29 de agosto de 2013 | 2h 05
Andreza Matais - O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - O silêncio e as orações deram espaço por um momento para um CD da banda britânica Pink Floyd emprestado de um dos fuzileiros. Logo, a música foi interrompida. "Não tinha clima", diz o senador.

Os dois carros pararam apenas uma vez no meio da estrada. Todos desceram, esticaram as pernas e seguiram viagem. "Paramos uma vez. O plano era seguir direto até o fim da viagem."
"Esse carro que vem lá é diplomático, por favor, deixe passar, respeite."
O trajeto feito pelo grupo incluía passar por 12 barreiras policiais, chamadas de "trancas". O plano foi seguido à risca. O carro da frente parava e avisava que o de trás conduzia o embaixador que não queria ser incomodado. A tensão aumentava nessas ocasiões, principalmente nas áreas de tráfico. Todos sabiam que não iriam para uma delegacia caso fossem descobertos nessa zona. "Tinha um carro na frente, um fuzileiro que ia medindo o grau de periculosidade. Geralmente ele falava: 'Esse carro que vem lá é diplomático, por favor, deixe-o passar, respeite.' A polícia boliviana respeitou. 'Lá vem o ministro, deixa passar'.
Em nenhum momento a polícia revistou o carro em que eu estava, mas no carro da frente sim." Mas havia um "plano B" em caso de a polícia decidir revistar o carro mesmo assim e comunicar ao governo boliviano. "O plano B era a gente ficar dentro do carro, sentado até encontrar uma saída. A gente não abandonaria o carro, se eles fossem levar teriam de guinchar o carro. O carro é território brasileiro. A estratégia era, em nenhum momento, abandonar o carro.
Se alguma coisa acontecesse o embaixador avisaria que estariam invadindo território brasileiro." Os policiais só não aceitaram a sugestão uma vez, na região dominada pelo narcotráfico.
Houve um momento em que todos pensaram que o plano B seria acionado. Na região do Cochabamba, os policiais não atenderam ao pedido para não incomodar o embaixador e pediram para que ele baixasse o vidro do carro. Ninguém respirou naquele momento.
O diplomata Saboia abaixou apenas três dedos o vidro, acenou para os policiais que liberaram o veículo.
Ninguém nem comemorou tamanho o nervosismo da situação.
"Quando passamos a fronteira, nos abraçamos, choramos muito"
Na última barreira antes de chegar ao Brasil, a sensação era que o plano havia sido descoberto. Já havia se passado horas da fuga e, certamente, a polícia boliviana havia descoberto. O combinado era o carro da frente passar pela barreira e, se fosse parado, o senador passaria a pé pela barreira, enquanto o diplomata e os fuzileiros distrairiam os policiais. Nada disso foi preciso. Eles conseguiram entrar no território brasileiro sem perguntas. Abraçaram-se, choraram e tiraram fotos. A primeira parada foi numa churrascaria. Mas ninguém conseguiu comer.

Dilma Humilha o Itamaraty - Cesar Maia

DILMA HUMILHA O ITAMARATY! 

Coluna de Cesar maia, 29/08/2013

1. A Comissão de Inquérito que foi criada pela julgar o Ministro Eduardo Saboia é formada por dois Diplomatas, um Auditor Fiscal da Receita Federal e um Assessor da Controladoria Geral da União, que a presidirá.
      
2. Desde as épocas dos Chanceleres Celso Amorim e Antônio Patriota, o Itamaraty vem perdendo espaço, inclusive em áreas administrativas. Mas jamais ocorrera uma comissão de inquérito com pessoal de fora.
      
3. Quando os militares assumiram o poder em 1964, eles queriam colocar um dos seus à frente da Divisão de Segurança e de Informações, bem como das comissões de investigação sumária. O então Ministro Leitão da Cunha se opôs ferozmente a tal intromissão.
     
4. Mas, agora, com Dilma...

A igualdade companheira e os mais iguais - Ives Gandra Martins

Médicos cubanos

29 de agosto de 2013 | 2h 15
Ives Gandra da Silva Martins * - O Estado de S.Paulo
A preferência da presidente Dilma Rousseff pelos regimes bolivarianos é inequívoca. Basta comparar a forma como tratou o Paraguai - onde a democracia é constitucionalmente mais moderna, por adotar mecanismos próprios do sistema parlamentar (recall presidencial) - ao afastá-lo do Mercosul e como trata a mais sangrenta ditadura latino-americana, que é a de Cuba.
A presidente do Brasil financia o regime cubano com dinheiro que melhor poderia ser utilizado para atender às necessidades do Sistema Único de Saúde (SUS), dando-lhe maior eficiência em estrutura e incentivos.
Em período pré-eleitoral, Dilma Rousseff decidiu trazer médicos de outros países para atender a população do interior do Brasil, sem oferecer, todavia, as condições indispensáveis para que tenham essas regiões carentes hospitais e equipamentos. Empresta dinheiro a Cuba e a outros países bolivarianos, mas não aplica no nosso país o necessário para que haja assistência gratuita, no mínimo, civilizada.
O cúmulo dessa irracional política, contudo, parece ocorrer na admissão de 4 mil agentes cubanos, que se dizem médicos - são servidores do Estado e recebem daquela ditadura o que ela deseja pagar-lhes -, para os instalar em áreas desfavorecidas do Brasil, sem que sejam obrigados a revalidar seus títulos nos únicos órgãos que podem fazê-lo, ou seja, os Conselhos de Medicina.
Dessa forma, trata desigualmente os médicos brasileiros, todos sujeitos a ter a validade de sua profissão reconhecida pelos Conselhos Regionais, e os estrangeiros que estão autorizados exclusivamente pelo governo federal a exercer aqui a medicina.
O tratamento diferencial fere drasticamente o princípio da isonomia constitucional (artigo 5.º, caput e inciso I), sobre escancarar a nítida preferência por um regime que, no passado, assassinou milhares de pessoas contrárias a Fidel Castro em "paredóns", sem julgamento, e que, no presente, não permite às pessoas livremente entrarem e saírem de seu país, salvo sob rígido controle. Pior que isso, remunerará os médicos cubanos que trabalharem no Brasil em valores consideravelmente inferiores aos dos outros médicos que aqui estão. É que o governo brasileiro financiará, por intermédio deles, o próprio governo de Cuba, o qual se apropriará de mais da metade de seu salário.
Portanto, a meu ver, tal tratamento diferencial fere a legislação trabalhista, pois médicos exercendo a mesma função não poderão ter salários diversos. O inciso XXX do artigo 7.º da Constituição federal também proíbe a distinção de remuneração no exercício de função.
Acontece que pretende o Estado brasileiro esquivar-se do tratamento isonômico alegando que acordo internacional lhe permite pagar diretamente a Cuba, que remunerará seus médicos com 25% ou 40% do valor que os outros médicos, brasileiros ou não, aqui receberão.
É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) de que os tratados entram em nosso ordenamento jurídico como lei ordinária especial, vale dizer, não podem sobrepor-se à Constituição da República, a não ser na hipótese de terem sido aprovados em dois turnos, nas duas Casas Legislativas do Congresso Nacional, por três quintos dos parlamentares (parágrafo 3.º do artigo 5.º da nossa Lei Maior).
Ora, à evidência, o acordo realizado pelo governo brasileiro não tem o condão de prevalecer sobre a nossa Carta Magna, por ter força de lei ordinária especial, sendo, pois, de manifesta inconstitucionalidade. Francisco Rezek, quando ministro do STF, certa vez, a respeito da denominada "fumaça do bom direito", que justifica a concessão de liminares contra atos ou leis inconstitucionais, declarou, em caso de gritante inconstitucionalidade, que a fumaça do bom direito era tão grande que não conseguia vislumbrar o rosto de seus pares colocados na bancada da frente. Para a manifesta inconstitucionalidade do ato a imagem do eminente jurista mineiro calha como uma luva. O tratado do Brasil com a ditadura cubana fere o artigo 7.º, inciso XXX, da Constituição federal.
O que me preocupa, no entanto, é como uma pequena ilha pode dispor de um número enorme de "médicos exportáveis", que, se fossem bons, não deveriam correr nenhum risco ao serem avaliados por médicos brasileiros dos Conselhos Regionais, e não por funcionários do governo federal.
Pergunto-me se tais servidores cubanos não terão outros objetivos que não apenas aqueles de cuidar da saúde pública. Afinal quando foram para a Venezuela, esse país se tornou gradativamente uma semiditadura, na qual as oposições e a imprensa são sempre reprimidas.
E a hipótese que levanto me preocupa mais ainda porque foi a presidente guerrilheira e muitos de seus companheiros de então haviam sido treinados em Cuba e pretendiam impor um governo semelhante no Brasil, como alguns deles afirmaram publicamente.
Tenho a presidente Dilma Rousseff por mulher honesta e trabalhadora, embora com manifestos equívocos em sua política geradora de alta inflação, baixo produto interno bruto (PIB), descontrole cambial e déficit na balança comercial e nas contas externas. O certo, contudo, é que a sua preferência pelos regimes bolivarianos e a sua aversão ao lucros das empresas talvez estejam na essência de seu comportamento na linha ora adotada.
Respeito a presidente da República eleita pelo povo, mas tenho receio de que suas preferências ideológicas estejam na raiz dos problemas que vivemos, incluída a importação de agentes públicos de Cuba que se intitulam médicos.
*Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, UNIP, UNIFIEO, UNIFMU, do CIEE/O Estado de S. Paulo, das escolas de Comando e Estado-Maior do Exército e Superior de Guerra, é presidente do Conselho Superior de Direito da FECOMERCIO-SP, fundador e presidente honorário do Centro de Extensão Universitária.

Sua Excelencia, o presidiario (com a ajuda de excelencias togadas)

Em votação secreta, a Câmara dos Deputados manteve o mandato do deputado-presidiário Natan Donadon (sem partido-RO). Houve uma maioria de votos em favor da cassação — 233 a 131, com 41 abstenções —, mas eram necessários 257 votos, a metade mais um dos 513 deputados. Nada menos de 108 se ausentaram. À parte problemas de força maior (saúde ou algo assim), são ainda mais covardes do que os que votaram ou contra ou se abstiveram. Saiba, leitor, que, em situações assim, para que a sem-vergonhice seja diluída, as tarefas são divididas: uns tantos votam contra, alguns outros se abstêm, e outa parcela não vota. Assim, um resultado meticulosamente planejado, que afronta o bom senso e a decência, fica parecendo obra do acaso. Não é corriqueiro que 21% dos deputados faltem a uma sessão com essa importância. Teori Zavascki, Roberto Barroso, Dias Toffolli, Carmen Lúcia, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, todos ministros do Supremo, devem estar orgulhosos. Viram o exercício prático de uma tese acalentada pelos seis. Viram nascer o Bebê de Rosemary, por cuja paternidade (e maternidade) respondem. É num monstrengo como esse que pode resultar o seu notório saber jurídico. Já chego lá e explico por que evoquei o nome dos ministros. Vamos a esse caso em particular.
Por ocasião da condenação de Donadon, o tribunal não se pronunciou sobre o seu mandato, e a questão foi remetida para a Câmara — contra, parece-me óbvio, o que dispõem a própria Constituição e o Código Penal (já chego lá). No julgamento do mensalão, o STF procurou corrigir essa falha.
A manutenção do mandato de Donadon começou a ser tramada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Alertei aqui para o risco de se produzir esse resultado absurdo num post do dia 14. O deputado tucano Jutahy Jr. apresentou um relatório alternativo ao do relator do caso, o deputado Sérgio Zveiter (PSD-RJ), que abria a possibilidade de livrar a cara do agora deputado-presidiário.
Por que? Vocês terão de acompanhar uma argumentação que foi explicitada neste blog muitas vezes. Mas é importante porque será preciso chamar às falas aquela meia-dúzia de togados. O “x” da questão está no Artigo 55 da Constituição, que segue em azul, com destaque para os trechos relevantes para o caso.
Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
I – que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior;
II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar;
III – que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada;
IV – que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;
V – quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;
VI – que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.
§ 1º – É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas a membro do Congresso Nacional ou a percepção de vantagens indevidas.
§ 2º – Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.
§ 3º – Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

O roteiro da indecência
Muito bem. Numa leitura possível (mas absurda para quem pretende lidar com a lógica e o bom senso), que constitui o que chamo de “roteiro da indecência”, cabe aplicar o §2º do artigo (leiam acima). Como Donadon “sofreu uma condenação criminal em sentença transitada em julgado” (Inciso VI), então seria preciso“decidir a perda do mandato por voto secreto e maioria absoluta” na Câmara . Sim, em seu relatório, Sveiter pediu a cassação, mas o fez com base nessa argumentação. Estava, na prática, começando a livrar a cara de Donadon, embora parecesse fazer o contrário.

O deputado Jutahy Jr. apresentou um relatório em separado, alternativo, com outra argumentação — tantas vezes exposta neste blog e que, na prática, saiu vitoriosa no STF (5 a 4) no julgamento dos deputados mensaleiros. Segundo esse outro ponto de vista, muito mais sólido e assentado também nos Artigos 14 e 15 da Constituição (além do 55) e no Artigo 92 do Código Penal, há que se aplicar não o §3º do Artigo 55 da Constituição, mas § 2º, aquele que estabelece que basta à Mesa da Câmara fazer um ato declaratório porque a condenação criminal — em crimes como o de Donadon e dos mensaleiros — já implica a perda automática do mandato. Logo, não é necessário fazer uma votação. Vejamos.
O roteiro da decência
Reza o Artigo 15 da Constituição:
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
(…)
III – condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos.

Note, leitor. A condenação criminal transitada em julgado implica a perda dos direitos políticos, certo? Certo!
Perdidos os direitos políticos, então estamos tratando do Inciso IV daquele Artigo 55. E para o Inciso IV, não é o plenário que decide, mas a mesa da Câmara, em ato meramente declaratório. Não fosse assim, seria preciso admitir que existe parlamentar sem direito político. Existe?
Há mais. Sim, antes do Artigo 15 da Constituição, vem o 14. E ali se estabelece, no Inciso II do Parágrafo 3º que, para ser candidato é preciso:
II – o pleno exercício dos direitos políticos.

Ora,  é concebível que, para se candidatar, alguém precise estar no pleno gozo de deus direitos políticos, mas não para ser um parlamentar? Se dispositivos faltassem para a cassação automática — CONSTITUCIONAIS —, há ainda a sanção aplicada pelo Artigo 92 do Código Penal:
Art. 92 – São também efeitos da condenação:
I- a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:
a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;
b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos. 

É bem verdade que as penas do Artigo 92 não são automáticas e têm de ser declaradas em sentença. Mas o Código Penal está aí, à disposição dos juízes — inclusive dos do STF.
Os mensaleiros e a nova maioria do STF
Seguiu-se, no caso de Donadon, o roteiro da indecência. E, assim, se chega à espantosa condição de haver um deputado presidiário. é certo que o lugar de alguns seria mesmo a Papuda, mas não como representantes do povo. É que ninguém dá bola pra Banânia! Imaginem se dessem: “Ah, naquele país, preso não vota em deputado, mas deputado pode ser preso e continuar… deputado!”

No julgamento do mensalão, por 5 votos a 4 — o tribunal estava com 9 porque não haviam sido aprovados ainda os substitutos de Cezar Peluso e Ayres Britto —, o tribunal decidiu que a condenação implicava a cassação automática dos mandatos dos deputados-mensaleiros: defenderam essa posição Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello. Acharam que a decisão cabe à Câmara e ao Senado os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Rosa Weber e Carmen Lúcia. Então os deputados mensaleiros João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) estão cassados, né? Pois é…
Ocorre que a questão voltou a ser examinada na recente condenação do senador Ivo Cassol (PP-RR). E aí se deu o evento espantoso! Roberto Barroso, que, nesta quarta, fez uma candente defesa da moralidade e da ética na política, resolveu abrir o caminho para a mudança. Alegando amor à letra da lei — justo ele, que escreveu um livro sobre um tal “novo constitucionalismo” — houve por bem ignorar os Artigos 14 e 15 e o Parágrafo 3º do Artigo 55 da Constituição e se fixar apenas no Parágrafo 2º. Para ele, a cassação é atribuição exclusiva das respectivas Casas Legislativas. Teori Zavascki o seguiu. Os quatro (Lewandowski, Toffoli, Rosa e Carmen), que já havia expressado essa posição no julgamento do mensalão, repetiram seu voto. E assim se formou uma maioria de 6 votos em favor da tese que permite que se repita o que se deu com Donadon: ter um parlamentar presidiário. É o que pode voltar a acontecer com João Paulo Cunha (PT-SP) caso se consiga rever aquela decisão.
Acinte, deboche, esculacho
A decisão da Câmara é um acinte, É um deboche. É um esculacho. Que fique claro: Barroso, Zavascki, Rosa, Carmen, Toffoli e Lewandowski não têm nada a ver com essa particularidade do caso Donadon. Eu estou aqui a demonstrar quais são as consequências práticas da escolha  esdrúxula que fizeram no caso de Ivo Cassol. E é inútil os doutores dizerem que, “se o Congresso é assim”, a culpa não é deles”. Se nada podem fazer em relação ao caso Donadon, poderiam ter votado — DE ACORDO COM A LETRA DA LEI — para que essa vergonha não se repetisse. Mas fizeram justamente o contrário.

É evidente que a defesa dos deputados mensaleiros vai recorrer para evocar o novo entendimento do tribunal. Donadon pode estar abrindo o prolífico filão de parlamentares presidiários. Sob a proteção intelectual e jurídica de seis togados da mais alta corte do país. Com aquela toga vistosa, precisam  tomar cuidado para não virar os black blocs das instituições.
E Barroso, não obstante, acha que política deve ser uma coisa mais séria. A política e a Justiça, digo eu.