Uma matéria de quase um ano atrás, de que tomo conhecimento apenas agora. Não que haja algo surpreendente para mim, praticamente nada, pois já sabia desse programa estarrecedor, mas que apenas confirma que os companheiros estão a serviço, e sob as ordens, dos companheiros cubanos, aos quais eles devolvem agora ajudas prestadas no passado.
Uma coisa, porém, me surpreendeu: os valores envolvidos, que são substanciais. Não imaginava que fosse tanto dinheiro assim. Os montantes são, sim, estarrecedores. Não estamos falando apenas de uns poucos milhões de dólares (o que é isso para os companheiros, não é mesmo?; desde 2003 eles nadam em dinheiro, sobretudo dinheiro da Petrobras, e esse dinheiro dos cubanos é como se fosse uma corrida de taxi, digamos assim), mas de
dezenas de milhões de dólares.
Só encontro duas explicações para isso: (1) os ditadores cubanos estão realmente precisando de muito dinheiro, agora que os venezuelanos enfrentam sérias dificuldades para manter o nível do mensalão chavista e fizeram um apelo desesperado aos seus companheiros brasileiros, a quem eles ajudaram no passado, inclusive como investimento...; (2) estes últimos estão fazendo uma operação triangular, dessas clássicas, na qual o dinheiro sai para fins aparentemente legais, e termina alimentando dutos menos legais, ou muito mais legais, dependendo do ponto de vista, claro.
Tenho uma dúvida e ele é absolutamente pertinente, para saber se ainda vivemos em uma democracia normal, ou se já estamos numa ditadura companheira: saber se esse acordo foi formalmente aprovado pelo Senado brasileiro, como compete cada vez que existe uma operação financeira externa. Se não houve aprovação congressual, ou se o dinheiro foi remetido antes que houvesse a ratificação formal pelo Senado, as remessas são claramente ilegais e inconstitucionais, e pode haver neste caso crime de responsabilidade política da parte do ministro da Saúde -- o anterior e o atual -- e provavelmente até da presidente da República. Está na constituição: qualquer acordo gravoso para o país tem de ser submetido à aprovação do Congresso brasileiro.
E não me venham dizer que não se trata de um acordo com Cuba, e sim com a OPAS, que isso não cola e não vale igual. Mesmo que o dinheiro fosse para o Espírito Santo, no Vaticano, ele teria antes de ser aprovado pelo Congresso.
Assusta-me viver num país em que os dirigentes se arrogam o direito de afrontar a Constituição, como se vivêssemos em ditadura. Talvez já seja o caso e ainda não percebemos...
Paulo Roberto de Almeida
5/08/2014
RAPAPÉS
— Carissa Etienne, diretora da Opas, com o ditador Raúl Castro, em
Havana, em julho: elogios à obsoleta medicina cubana (Foto: Granma)
Reportagem de Leonardo Coutinho, publicada em edição impressa de VEJA
ESTAVA TUDO COMBINADO
Documentos oficiais mostram que o Mais Médicos foi
concebido para enviar dinheiro à ditadura de Cuba — e que o governo
brasileiro escondeu o acordo durante meses
Desde o colapso da União Soviética, no início dos anos 90, Cuba ficou
à míngua, sem um padrinho para financiar sua ditadura comunista. Na
década passada, esse papel passou a ser desempenhado pela Venezuela de
Hugo Chávez e por outros países latino-americanos governados por
simpatizantes.
Com o PT no poder, o Brasil tem contribuído sem alarde com
empréstimos camaradas do BNDES e, descobre-se agora, com a importação de
médicos.
Em maio passado, o então chanceler Antonio Patriota anunciou o plano
de trazer 6.000 médicos da ilha para atuar nos rincões do Brasil. O que
Patriota não disse é que o “plano” era, na verdade, um fato consumado. O
acordo para a importação de médicos cubanos já havia sido assinado no
mês anterior, valendo-se de um subterfúgio para não tornar pública a
verdadeira natureza do negócio.
O contrato falava, em termos genéricos, de uma “contratação de
profissionais temporários” e em nenhum trecho citava Cuba ou médicos
cubanos. Isso era possível porque, formalmente, o acordo foi fechado
entre o Ministério da Saúde e a Organização Panamericana de Saúde
(Opas).
Na prática, a entidade vinculada à ONU era apenas a intermediária da
transferência de recursos dos contribuintes brasileiros para a ditadura
cubana (o que também não era dito no acordo original).
Tanto esforço para omitir Cuba do acordo intermediado pela Opas se
explica pela reação negativa da opinião pública brasileira,
especialmente das associações médicas, ao anúncio feito por Patriota.
Afinal, a importação de médicos cubanos viola uma série de leis
brasileiras, além de pôr em risco a saúde da população por causa da
qualificação duvidosa dos profissionais.
Criticado pelo “plano”, o governo federal deu sinais de que recuaria.
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, chegou a dizer que a prioridade
não era trazer médicos cubanos, mas portugueses e espanhóis. Puro
diversionismo, pois nos bastidores os trâmites burocráticos para a
contratação dos cubanos seguiam em ritmo acelerado.
Em meio aos protestos de junho, a presidente Dilma Rousseff
ressuscitou o tema, prometendo na TV “trazer de imediato milhares de
médicos do exterior para ampliar o atendimento do SUS”. Daí nasceu o
programa Mais Médicos, sob medida para esquentar o acordo já firmado
para importar profissionais cubanos.
A abertura de inscrições para médicos de outros países e de
brasileiros que trabalham no exterior foi só uma maneira de legitimar a
vinda dos cubanos, pois já se sabia que estes viriam em maior número. O
documento assinado por Padilha em 22 de agosto foi apenas um termo de
ajuste do acordo assinado em abril na surdina.
ENTROSADO — O cubano Joaquín Molina, chefe da Opas no Brasil (Foto: ABr)
Eis por que três dias depois os primeiros 400 médicos cubanos já
desembarcavam no Brasil. Uma semana antes, o governo brasileiro havia
pago 11,5 milhões de reais à Opas, valor que coincide com o custo das
passagens.
Um dos arquitetos da triangulação Brasil-Opas-Cuba foi o dentista
Joaquín Molina, ex-coordenador da Cooperação Técnica Internacional, o
departamento do Ministério da Saúde de Cuba responsável pela exportação
de mão de obra médica. Em 29 de março de 2012, Molina assumiu o posto de
representante da Opas no Brasil – um dia antes de a entidade firmar com
Cuba um convênio, que ele ajudou a negociar, para intermediar a venda
de serviços de saúde da ilha.
A missão de Molina em Brasília era bem definida e servia com
perfeição aos planos de Padilha. Em 17 de dezembro, Molina protocolou no
Ministério da Saúde o projeto Fortalecimento da Atenção Básica no
Brasil, em que a Opas pedia quase 512 milhões reais para ajudar o país a
combater “as iniquidades sociais e limites de acesso aos serviços de
saúde”.
Antes do Natal, o documento venceu cinco degraus da burocracia, mais
rápido do que qualquer outra proposta feita ao ministério na mesma data.
Em fevereiro, a diretora da Opas, a dominiquense Carissa Etienne, veio a
Brasília para dar mais um empurrãozinho na “cooperação médica” com
Cuba, pela qual a Opas viria a receber 24,3 milhões de reais de
comissão.
Em meio às mentiras e dissimulações envolvendo a contratação de
médicos cubanos, há um dado intrigante: o valor de mais de 500 milhões
de reais (dos quais 100 milhões foram pagos no mês passado e os outros
400 milhões já foram reservados no Orçamento federal) pleiteado pela
Opas em dezembro de 2012 é rigorosamente o mesmo do contrato-encenação
feito por Padilha oito meses depois para a importação de 4 000 médicos.
Patriota, porém, havia anunciado em abril a vinda de 6.000 cubanos.
Ou seja, o Brasil está pagando a mesma quantia por menos profissionais.
Considerando a má qualidade do ensino médico em Cuba, talvez seja melhor
não reclamar.