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terça-feira, 13 de junho de 2017

Roberto Campos: liberalismo e pobreza (1996)

O liberalismo e a pobreza
ROBERTO CAMPOS
FSP, São Paulo, domingo, 1 de dezembro de 1996

"Esperemos que os socialistas, que no passado adoraram o Deus da História, aprenderão suas lições. Dar-se-ão conta, afinal, que não apenas a economia de comando fracassou, mas também que o Estado social democrático assistencialista é um Deus que falhou"
Deepak Lal

As esquerdas brasileiras (ou será que só restam canhotos?), mesmo após a derrota mundial do socialismo, que elas consideram apenas um sucesso mal explicado, se atribuem duas superioridades: maior decência ética e maior ternura pelos pobres. Na realidade, sucumbem a interesses do corporativismo burocrático, em detrimento das massas, e reduzem a velocidade do crescimento econômico. E este é o único remédio efetivo para a pobreza.
Um esplêndido livro recente "The political economy of poverty, equity and growth" (Clarendon Oxford Press, 1996), de autoria de dois economistas asiáticos -um indiano, Deepak Lal, e outro birmanês, H. Myint-, ambos testemunhas da ineficácia do socialismo dirigista em seus respectivos países, desmistifica ilusões sobre o socialismo e sobre seu filho dileto, o "welfare state". É uma análise filosófica, política e econômica dos sucessos e insucessos da luta contra a pobreza em 21 países (inclusive o Brasil), entre 1950 e 1985.
As conclusões são interessantes:
. O crescimento rápido sempre alivia a pobreza, independentemente dos esforços da burocracia assistencialista;
. Não há um efeito claro e certo do crescimento sobre a disparidade nos níveis de renda, podendo esta aumentar ou diminuir durante o processo de rápido crescimento. Mas a experiência dos tigres asiáticos desmente o fatalismo da chamada "Lei de Kuznets", segundo a qual a distribuição de renda pioraria inicialmente no desenvolvimento capitalista, para só melhorar depois;
. O instrumento mais eficaz para a correção da pobreza absoluta não é o Estado Interventor, fantasiado de engenheiro social benevolente, e sim o Estado Liberal (ou seja, o Estado Jardineiro).
Este libera as energias produtivas do mercado, tributa pouco e procura assistir os pobres e desvalidos por benefícios específicos para eles direcionados, preferencialmente através de entidades privadas, e não por esquemas globais de seguridade social, administrados por políticos e burocratas.
A pobreza pode assumir vários aspectos: a pobreza "estrutural", ou de massa, que até a revolução industrial parecia uma fatalidade humana; a pobreza "conjuntural", que tradicionalmente advinha de desastres climáticos ou de guerras e conflitos políticos, mas que, na civilização moderna, provém também de ciclos econômicos que provocam desemprego e recessão; e o "desvalimento", ou seja, a situação dos que não têm capacidade de trabalho por deficiências físicas ou mentais.
No tocante à questão global da pobreza, há um conflito histórico entre duas visões do mundo que se apresentam em várias formas e graus: o liberalismo e o dirigismo.
Os liberais insistem em separar duas questões que são habitualmente confundidas no debate corrente: a cura da pobreza e o igualitarismo. A extinção da pobreza absoluta é realizável e deve ser um objetivo social. O igualitarismo é utópico, e todas as tentativas de alcançá-lo geraram ineficiência ou despotismo.
Os liberais certamente lutarão pelo alívio da pobreza; mas rejeitam o igualitarismo socialista. Em outras palavras, consideram a "equidade" desejável e a "igualdade" impossível.
São várias as razões por que é fútil pretender-se, através do intervencionismo governamental, alcançar uma distribuição igualitária das rendas: 1) Deus não é socialista e distribuiu com profunda injustiça os dotes de inteligência, criatividade e diligência; 2) inexistindo normas objetivas de justiça, ou justiciadores sábios e benevolentes, torna-se perigoso tentar corrigir as injustiças divinas pela "justiça social" ditada pelo ideólogo, burocrata ou político de plantão; 3) fazer justiça social pela abolição da propriedade (solução comunista) ou pela tributação distributivista (solução socialista) redunda em tirania política e expurgos em massa, ou então, em perda de eficiência econômica (a supertributação desincentiva a criatividade e o esforço).
Donde ser melhor, como propõem os liberais, que o Estado seja mais modesto: deve buscar a extinção da pobreza absoluta sem tentar implantar o igualitarismo. Por isso os liberais não falam em "seguridade social universal" e não simpatizam com a "previdência pública compulsória". Preferem falar em "redes de segurança para os desvalidos" ou em "garantia de renda mínima" para os realmente pobres. No Brasil, a coisa é ainda mais rudimentar: a cura da inflação é prefácio e precondição da cura da pobreza.
Uma das deformações dos sistemas assistenciais desenvolvidos nas sociais democracias é aquilo que George Stigler chama de "privilégios dos diretores", isto é, a captura de benefícios pela classe média. Esta, nas sociedades industrializadas, é politicamente muito mais numerosa que os ricos e muito mais articulada que os pobres.
Cria-se assim o "Transfer State", isto é, o Estado Transferidor, de que o nosso INSS é modelo exemplar. O "Transfer State" morde os ricos pela tributação e pune os pobres com aposentadorias ridículas, desviando recursos para o bem-estar da classe média -professores, jornalistas, magistrados, militares, congressistas e burocratas, que gozam de aposentadorias precoces, desproporcionais às contribuições. São os chamados "intitulamentos políticos".
A única maneira de se evitar que o poder político da classe média puna a produtividade dos mais eficientes e explore a passividade dos pobres é substituir o sistema de previdência pública compulsória pela capitalização individual.
É o sistema de cadernetas de poupança previdenciária, onde cada cidadão depositaria sua contribuição, sabendo que os benefícios futuros disso dependem. É o sistema chileno, no qual a contribuição compulsória, anteriormente paga ao governo, é aplicada em fundos de pensão privada, não havendo assim transferências imerecidas de renda.
O governo não intervém para redistribuir rendas, limitando-se a fiscalizar o sistema e a complementar a renda daqueles que, ao fim de sua vida laboral, não recebam um mínimo vital para sua sobrevivência. O curioso é que o tão vilipendiado general Pinochet, sem alardear superioridade ética ou sensibilidade social, intuiu duas coisas fundamentais para a diminuição da pobreza -o crescimento sustentado e a correção dos abusos do "Transfer State".
Lal e Myint demonstram a precariedade das tentativas de distributivismo social em países de baixa taxa de crescimento. Durante algum tempo, Costa Rica, Sri Lanka e Uruguai foram exibidos como exemplos de países bem-sucedidos nessa conciliação. Isso durou pouco porque esses países entraram em crises fiscais, ou estagnação econômica, tendo o Uruguai tido que rever seu pesado Estado Providência a fim de absorver ideias do modelo chileno.
A cura da pobreza não depende da decadência do político, da boa vontade do burocrata ou da piedade do clérigo. Depende do crescimento econômico. E as molas clássicas do crescimento continuam sendo a poupança, a produtividade e o espírito empresarial. Priorizar a realidade humilde, em vez de entronizar a utopia fugaz, é a grande virtude do liberalismo.

A politica externa e a crise politica - Rubens Barbosa (OESP)

A POLÍTICA EXTERNA E A CRISE POLÍTICA
Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 13/06/2017

Apesar da crise politica ter sido agravada por denúncia contra o próprio Presidente da República, foi significativa a decisão do PSDB, do PMDB, do DEM e de outros partidos em separá-la da discussão no Congresso das reformas estruturais (trabalhista, previdenciária, tributária e política). A contaminação pela radicalização política do exame e da sua eventual aprovação seria danosa para o Brasil. Fizeram bem as lideranças desses partidos em colocar os interesses do pais acima das disputas político-partidárias, pois, caso as reformas não sejam votadas, estará em jogo a estabilidade da economia, a volta do crescimento e a redução do desemprego.
Não há dúvida de que a crise política e o temor de denúncias da Lava Jato têm afetado o funcionamento normal da Administração pública. 
Apesar disso, nos primeiros treze meses do atual governo, o apoio institucional e a nova orientação imprimida por Jose Serra e agora por Aloysio Nunes Ferreira revitalizaram o Itamaraty, fortalecendo seu papel central na formulação e execução da política externa, e retiraram o Brasil do isolamento das negociações comerciais. Os recursos recebidos permitiram que o Brasil voltasse a honrar seus compromissos financeiros nos organismos internacionais e facilitaram um planejamento mais adequado dos gastos com a manutenção da máquina administrativa no Brasil e no exterior. As correções de rumo na politica externa afastaram a influência ideológica que colocou o Brasil a reboque dos acontecimentos, sobretudo na América do Sul, e  recuperaram o tempo perdido nas negociações comerciais externas com a aceleração das negociações Mercosul-União Europeia e a abertura de conversas exploratórias com o Canadá, o Japão e a Coréia. O Itamaraty retomou, em larga medida, sua capacidade de iniciativa e voltou a defender os interesses permanentes do pais, ao contrário do que passara a acontecer no segundo mandato do governo Lula e nos tempos de Dilma Rousseff. As relações com a Argentina foram relançadas, permitindo uma reavaliação do Mercosul e a tomada de medidas para fazê-lo retornar às suas origens como instrumento para abertura de mercados e liberalização de comércio. Os entendimentos com os EUA avançam de forma pragmática, naquilo que é possível e nossas fronteiras passaram a ter uma atenção especial para controlar o contrabando de drogas e de armas. A Venezuela passou a ser um dos itens principais da agenda diplomática pelas violações à democracia, ao desrespeito dos direitos humanos e pela ameaça de um crescente número de refugiados em nosso pais; A dura nota do Itamaraty contra o comunicado conjunto emitida pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que tratou de maneira distorcida e tendenciosa a reação do governo aos lamentáveis acontecimentos ocorridos em Brasília no dia 24 de maio, com a destruição e o incêndio de prédios públicos, e de maneira capciosa menciona a violência agrária no sul do Para e as medidas da prefeitura de São Paulo contra o consumo e o tráfico de drogas. 
É lamentável que a SAE, Secretaria de Assuntos Estratégicos, ignorando a rapidez dos ajustes de rumo da política externa visando defender    os interesses permanentes do Brasil em tão curto espaço de tempo, faça crítica desfocada à diplomacia brasileira e ao Itamaraty. Ao traçar um quadro de falta de visão estratégica do Brasil, de improvisação da política externa e de ações apenas reativas, a SAE defende uma grande estratégia, que nem ela própria sabe qual é.
Qualquer que seja  o futuro do presidente Temer, a defesa do interesse nacional exige que não haja descontinuidade na agenda da atual política externa que busca retomar sua voz independente e voltar a projetar suas prioridades, em especial:
- a conclusão do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a   União Europeia
- a negociação para o ingresso na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) depois do pedido de adesão; 
- a presença do Brasil nos esforços da comunidade internacional para conter os excessos do governo Maduro na Venezuela e permitir um avanço negociado para evitar um conflito de grande escala.
- a proposta de início das negociações com os EUA para um acordo de salvaguarda tecnológica que torne viável o aproveitamento comercial da Base de Alcântara. 
- assumir a efetiva liderança na América do Sul, com propostas concretas de maior integração, sobretudo na área de infraestrutura física.
- ampliar as medidas para a segurança das fronteiras com a cooperação dos países vizinhos  para combater a criminalidade no Brasil;
- reforço da presença do Brasil na África, com a visita do Ministro do exterior a seis países, como estão fazendo o Japão, a Índia, a Turquia, sem falar na China;
- aprofundar o relacionamento com o BRICS e com o Novo Banco de Desenvolvimento;
- reforçar a APEX, agora no Itamaraty, e a promoção comercial;
- implantar até o fim do ano o visto eletrônico para os EUA, Canadá, Japão e Austrália para estimular o turismo;
Todas essa agenda proativa, porém, poderia ficar inviabilizada se for mantido o atual contingenciamento de 43% do orçamento do Itamaraty. Sem um significativo descontingenciamento, o Itamaraty poderá deixar de cumprir seus compromissos e pagar suas contas a partir de agosto/setembro. Voltaríamos ao tempo de Dilma Rousseff de completa paralisação da máquina diplomática, calote nos postos e ameaças de cobrança judicial.
O Governo Federal terá de examinar pragmaticamente a situação     financeira do Itamaraty para evitar que seja perdido o esforço feito agora para    aumentar a projeção externa do pais, elevar seu perfil e influência regional e se reinserir plenamente nos fluxos dinâmicos da economia e do comércio   internacional.

Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Ricardo Paes de Barros: Escola realimenta a desigualdade social

Escola no Brasil reproduz loucamente a desigualdade, declara pesquisador

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Publicado em 8/06/2017
As escolas no Brasil não oferecem aos alunos de baixa renda oportunidades de ascensão social. Ao contrário, elas reforçam as diferenças educacionais herdadas do ambiente familiar.
"A escola brasileira é loucamente reprodutora de desigualdade", diz o pesquisador Ricardo Paes de Barros .
PB, como é conhecido, se tornou referência no estudo de temas como pobreza, desigualdade de renda, mercado de trabalho e educação.
Depois de quatro anos como subsecretário de Ações Estratégicas no governo de Dilma Rousseff, assumiu o posto de economista-chefe do Instituto Ayrton Senna (IAS) e passou a lecionar no Insper.
Desde então, tem se dedicado a buscar e testar evidências de que a introdução de habilidades socioemocionais nos currículos tem impacto educacional positivo.
Para ele, se a escola brasileira sair na frente com um ensino que estimule características como curiosidade, criatividade e persistência, talvez elimine uma década de atraso na educação:
"É importante que a escola estimule a curiosidade, a flexibilidade para buscar diferentes caminhos. Se a escola faz o contrário e destrói a autoconfiança do aluno, ela matou o aluno pobre."
Folha - O que te atraiu na pesquisa sobre habilidades socioemocionais?
Ricardo Paes de Barros - Foi a Viviane [Senna, presidente do IAS] que mandou [risos]. Eu acredito nas preocupações dela.
O ensino dessas habilidades tem impacto positivo?
Cientificamente, a gente sabe que isso é a questão? Não. Mas tem um monte de evidência que aponta que talvez seja, sim. Os problemas humanos hoje são muito menos do tipo ter uma doença que não sabemos de onde vem, e muito mais o fato de que as pessoas não conseguem se entender.
Falta capacidade para resolver conflitos, ter compaixão e lidar com a diversidade. Numa economia que é mais globalizada, se você não tem essas características, vai gerar mais conflito e confusão do que não saber trigonometria ou geometria espacial.
Por que esse tema está em evidência? Há quem cite mudanças no mercado de trabalho.
Eu tenho dúvida. Acho que as pessoas estavam muito preocupadas com letramentos básicos, saber ler, escrever, fazer contas. Depois que você supera isso, o cara fala "bom, espera aí, será que educação é só isso?" É a mesma coisa que qualidade de vida. A gente começa perguntando se você passa fome, se sua casa tem luz, saneamento. Mas, quando você faz pesquisa sobre qualidade de vida na Suécia, tem que usar uma dimensão mais sofisticada.
Faz sentido focar esse tipo de ensino Brasil, onde ainda não atingimos o domínio de letramentos básicos?
É uma boa questão. Não acho que você tenha uma demonstração definitiva disso. Mas o Brasil está tão atrasado que, se continuar andando na velocidade de todo mundo, nunca vai chegar lá. Investir nisso pode te permitir andar mais rápido do que os outros. A noção de escola e o que a escola faz está mudando. A Coreia e a Finlândia estão desesperadas tentando descobrir para onde vão suas escolas. O Brasil tem que dar um salto para, em vez de seguir todo o caminho dos outros caras, dar um balão e encontrar o cara. Nesses países, a preocupação é que, se você estimular a criatividade, o pensamento crítico, a curiosidade, pode dar um salto, porque o cara com essas características quase aprende sozinho. Mas, para isso acontecer, ele tem que saber aprender, tem que ter meta, ser criativo, curioso. Se você criar uma geração de crianças que já tenham isso, pode ser então que você dê um salto.
Os estudos que vocês têm feito mostram que isso é possível?
A evidência não prova que isso é verdade, mas é consistente com que seja. Se você fala "deixa a Finlândia fazer isso" você pode estar naturalizando décadas de atraso.
A escola no Brasil contribui para reduzir a desigualdade?
A escola brasileira é loucamente reprodutora de desigualdade. O Brasil é um dos países onde o ambiente familiar mais influencia o resultado educacional. Não só temos pouca escolaridade, mas a escolaridade que temos é completamente dependente do ambiente familiar, o que é um absurdo. Por isso, é importante que a escola estimule a curiosidade, estimule a ter flexibilidade para buscar diferentes caminhos. Se a escola faz o contrário e destrói a autoconfiança do aluno, ela matou o aluno pobre. Porque se ela afeta a autoconfiança do aluno rico, a mãe e o pai chegam lá e a reconstroem, eles falam "esquece esse professor, ele é maluco". Agora, se o professor destrói a autoconfiança do aluno pobre, a mãe vai e destrói junto. Ela acredita que, se a escola disse que o aluno é burro, é porque ele é burro mesmo. Se a escola ensina para o aluno que o mundo é diverso e flexível e que ele precisa ter autoconfiança e persistir, ela elimina o impacto do ambiente familiar. Colocar o ensino de habilidades socioemocionais na base [nacional comum curricular] é uma aposta de que isso poderá nos fazer ganhar uma década.
Como avançar da base para a prática em um país tão grande e diverso como o Brasil?
O fato de o país ser diverso não me assusta. Você precisa fazer com que o aluno seja curioso, criativo, tenha senso crítico. O básico é o mesmo para todo mundo. Mas estamos longe de especificar o básico. O que está escrito na base é muito amplo.
Como deveria ser?
A base australiana ou as bases das províncias do Canadá são muito mais específicas sobre o que significa cada coisa que você tem que ensinar e dão muito mais dicas ao professor sobre como ensinar. Os Estados e os professores em sala de aula vão ser obrigados a fazer isso aqui.
Qual é o impacto da crise atual para a educação?
Claro que é péssimo, tira um monte de dinheiro da educação porque a arrecadação cai, atrapalha a pobreza.
Mas mostra o quanto o socioemocional é importante, porque estamos falando de valores, ética. Você tem uma crise em que as pessoas perderam a noção do que é certo e errado, de ética, do que pode e não pode fazer. No Japão, metade das pessoas já teria se suicidado se tivesse se envolvido numa coisa dessa magnitude. Ou seja, a noção do certo ou errado é mais sólida. O cara falsifica carne e perde mercado. Não tem nada de produtivo nisso, é um problema de um querendo levar vantagem no outro, escondendo, mentindo. Não estamos sabendo resolver certos conflitos, se fazer greve é bom ou ruim. Daqui a pouco, as pessoas vão começar a se questionar se pagam imposto ou não. Isso é um problema socioemocional, de valor, atitude, ética, de tomar decisões coletivas.
Ricardo Paes de Barros é membro da Academia Brasileira de Ciências. Tem mestrado em estatística pelo Impa (Instituto de Matemática Pura e Aplicada) e doutorado em economia pela Universidade de Chicago. Foi pesquisador do Ipea por mais de 30 anos e subsecretário de Ações Estratégicas da Presidência da República (2011-2015). Atualmente é economista-chefe do Instituto Ayrton Senna e professor do Insper.

(Erica Fraga para Folha de SP / Foto: Bruno Santos, Folhapress)

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Seis meses atras, o balanco de seis meses do novo governo; e um ano depois? - Paulo Roberto de Almeida

Seis meses atrás, após seis meses de novo governo no Brasil, eu fazia um pequeno balanço das reformas empreendidas (ou não), com base na minha proposta de reformas que julgava necessárias e mesmo indispensáveis para a retomada do crescimento no Brasil.
Passado um ano, agora, seria preciso fazer um novo balanço, mas haveria grandes coisas a dizer? Talvez: um pouco de avanço na reforma laboral, ainda nada na Previdência, negociações com os Estdados, mas a máquina mesmo do governo ficou mais e mais enrolada nos inúmeros casos de corrupção, dentro e fora do governo.
O Brasil parece um país à deriva. Ou estarei exagerando?
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 9 de junho de 2017.



Seis meses de um novo governo: o que foi feito em termos de reformas? Meu balanço preliminar sobre o que foi, e o que não foi feito...

Paulo Roberto de Almeida


Antes mesmo de se encerrar a vida inútil do governo podre dos companheiros, em vista do avanço previsível do processo de impeachment, eu formulava uma lista de reformas necessárias para serem empreendidas pelo governo que surgiria em seu lugar, e eu não tinha a menor ideia de que tipo de governo teríamos sob o comando do então vice-presidente, que, segundo os companheiros, estava “conspirando” com a direita, a mídia monopólica, os grandes capitalistas e o imperialismo, para dar um “golpe” no Brasil e acabar com as conquistas sociais.
Registre-se, preliminarmente, que o processo de impeachment e a aplicação do Direito foram absolutamente esquizofrênicos, com inúmeras ilegalidades cometidas por aquele órgão que deveria, justamente, assegurar a constitucionalidade dos procedimentos. Limito-me a apontar as mais flagrantes inconstitucionalidades perpetradas por juízes que parecem ter perdido a razão, ou então ter razões que só podem ser explicadas pela famosa teoria da conspiração, que dizem que não existe, mas que teima em aparecer. Primeiro foi a esdrúxula decisão de aprovar um rito totalmente desconhecido da Constituição e da própria lei do impeachment: inventaram uma votação adicional, e preliminar, para a aceitação do processo de impeachment no Senado, quando a Constituição apenas afirma que, uma vez votada a autorização do processo pela Câmara, o processo tem início no Senado sem nenhuma condicionalidade prévia. Em segundo lugar, ocorreu, já na fase final, o inacreditável fatiamento da pena, determinando tão somente a perda do mandato com a preservação (não prevista em nenhum lugar) dos direitos políticos. Finalmente, o STF continuou a perpetrar mais um atentado à Constituição, considerando réu um meliante político instalado na presidência do Senado, mas dizendo que ele não precisa ser apeado desse cargo, mesmo quando a Carta diz que a linha sucessória contempla presidência substituta pelo (qualquer um) presidente daquela Casa, e que decisão tomada pelos mesmos juízes afirma que um réu não pode estar na linha de sucessão. Mas, voltemos as reformas necessárias ao Brasil.
Eu não tinha nenhuma pretensão a determinar como deveria ser o novo governo, ou quem deveria integrá-lo, mas tinha sim, a minha relação de mudanças que qualquer governo, “golpista” ou não, teria de efetuar para retomar um processo de crescimento econômico com pretensões à melhoria dos níveis de produtividade do país, à abertura econômica, liberalização comercial e outras reformas importantes para a modernização do Brasil. Minha intenção neste pequeno artigo é muito simples: colocar essas reformas em perspectiva, passados seis meses do novo governo. Vou apenas listar o que eu tinha alinhado como reformas necessárias em abril de 2016, e a situação na qual o Brasil se encontra atualmente.

As reformas desenhadas em abril, e o que foi feito até novembro de 2016
N.
Reformas indicadas em abril 2016
Situação em novembro
1
Redução radical do peso do Estado na vida da nação, começando pela diminuição à metade do número de ministérios, com a redução ou eliminação concomitante de uma série de outras agências públicas;
Nenhuma eliminação, apenas fusão de meia dúzia de agências públicas, sem redução real da máquina pública;
2
Fim do Fundo Partidário e financiamento exclusivamente privado dos partidos políticos, como entidades de direito privado que são;
Nada foi feito; o Congresso até aumentou os recursos para esse Fundo;
3
Redução e simplificação da carga tributária, com seu início mediante uma redução linear, mas geral, de todos os impostos atualmente cobrados nos três níveis da federação, à razão de 0,5% de suas alíquotas anualmente, até que um esquema geral, e racional de redução ponderada seja acordado no Congresso envolvendo as agências pertinentes das unidades da federação dotadas de capacidade arrecadatória;
Não existe qualquer projeto de redução ou de introduzir a simplificação de impostos; o governo parece se dar por contente ao dizer que não pretende criar novos impostos ou aumentar os existentes, mas é isso que vem ocorrendo, sutilmente;
4
Eliminação da figura inconstitucional do contingenciamento orçamentário pelo Executivo; a lei orçamentária deve ser aplicada tal como foi aprovada pelo Parlamento, e toda e qualquer mudança novamente discutida em nível congressual; fica também eliminadas as emendas individuais ou dotações pessoais apresentadas pelos representantes políticos da nação; todo orçamento é institucional, não pessoal;
A grande iniciativa do governo, aparentemente boa, foi a emenda constitucional da limitação dos gastos, mas o aumento nominal é fixado a partir da taxa (real) da inflação, não de uma meta de inflação moderada, como deveria ser;
5
Extinção imediata de 50% de todos os cargos em comissão, em todos os níveis e em todas as esferas da administração pública, e designação de comissão parlamentar, com participação dos órgãos de controle e de planejamento, para a extinção do maior volume possível dos restantes cargos, reduzindo-se ao mínimo necessário o provimento de cargos de livre nomeação; extinção do nepotismo cruzado;
O governo se contentou em eliminar alguns poucos cargos e em transformar o provimento de alguns outros como privativo de titulares de cargos públicos por concurso; o governo não tem coragem de despedir;
6
Eliminação total de qualquer publicidade governamental que não motivada a fins imediatos de utilidade pública; extinção de órgãos públicos de comunicação com verba própria: a comunicação de temas de interesse público se fará pela própria estrutura da agência no âmbito das atividades-fim, sem qualquer possibilidade de existência de canais de comunicação oficiais;
Nada foi feito; o governo já não mente mais como o anterior, mas continua gastando dinheiro nosso em publicidade, sem extinguir os caríssimos, e inúteis, órgãos de propaganda governamental;
7
Criação de uma comissão de âmbito nacional para estudar a extinção da estabilidade no setor público, com a preservação de alguns poucos setores em que tal condição funcional seja indispensável ao exercício de determinadas atribuições de interesse público relevante;
O governo não parecer ter nenhuma intenção de fazer qualquer movimento nesse sentido; na verdade, ele tem a intenção de sequer tocar nessa questão;
8
Início imediato de um processo de reforma profunda dos sistemas previdenciários (geral e do setor público), para a eliminação de privilégios e adequação do pagamento de benefícios a critérios autuarias de sustentabilidade intergeracional do sistema único;
Ufa; finalmente, depois de seis meses, o governo decidiu dar início a um processo de reforma mais ou menos razoável, mas deixou os militares de forma (?!);
9
Reforma radical dos sistemas públicos de educação, nos três níveis, segundo critérios meritocráticos e de resultados;
Nada semelhante, apenas o início de uma reforma meia sola no nível médio;
10
Reforma do Sistema Único de Saúde, de forma a eliminar gradualmente a ficção da gratuidade universal, com um sistema básico de atendimento coletivo e diferentes mecanismos de seguros de saúde baseados em critérios de mercado;
Esta parece ser uma não questão, pois o governo não pretende modernizar e racionalizar o SUS; vai continuar gastando...;
11
Revisão dos sistemas de segurança pública, incluindo o prisional-penitenciário, por meio de uma Comissão Nacional de especialistas do setor;
A coisa deve se mover tão lentamente, que a impressão é que não se faz nada...;
12
Eliminação de todas as isenções fiscais e tributárias, ou privilégios exorbitantes, associados a entidades religiosas;
Nada, nadinha, os políticos são todos evangélicos, budistas, cristãos, etc...
13
Reforma da Consolidação da Legislação do Trabalho, no sentido contratualista, e extinção imediata do Imposto Sindical e da unicidade sindical, conferindo liberdade às entidades associativas, sem quaisquer privilégios estatais para centrais sindicais; no limite, extinção da Justiça do Trabalho, que é, ela mesma, criadora de conflitos e de extrema litigiosidade, impondo um custo enorme à sociedade;
Até aqui só se falou da necessidade de reformas, mas não se adiantou absolutamente nada quanto ao conteúdo do que se pretende fazer; os sindicatos vão continuar chantageando o governo, que ficará quieto;
14
Revisão geral dos contratos e associações do setor público, nos três níveis da federação, com organizações não governamentais, que em princípio devem poder se sustentar com recursos próprios, não com repasses orçamentários oficiais;
Nada parece ter mudado nessa área. O Brasil continua tendo o maior número de ONGGs, ou seja, ONGs vivendo de dinheiro público;
15
Privatização de todas as entidades públicas não vinculadas diretamente a uma prestação de serviço público sob responsabilidade exclusiva do setor público.
Nada concreto até aqui, apenas intenções; processos de concessão avançam muito lentamente.
Fonte: Elaboração Paulo Roberto de Almeida, 7/12/2016

Quando vamos, finamente, enfrentar um processo real de reformas estruturais, que coloque o Brasil num patamar de desenvolvimento sustentado? Não tenho a menor ideia, mas o governo fez muito pouco nesse meio ano, ainda que metade do tempo tenha sido ocupado por uma interinidade supostamente moderadora de seus ímpetos mais radicais de reformas relevantes (se é que ele tem algum ímpeto).
Vamos continuar cobrando, e seguindo, as iniciativas do governo que tenham a ver com reformas, não com combinações parlamentares que de fato não mudam grande coisa no panorama atual.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de dezembro de 2016.

Hemingway salva Paris dos nazistas (ou pelo menos um bar...) - Is Paris Burning? by Larry Collins and Dominique Lapierre (Delanceyplace)

Um trecho deste extrato de Delanceyplace: 
 
"His first act [was] to liberate the bar of the Hotel du Grand Veneur, a honeysuckle-covered inn favored by week­ending Parisians and their ladies. In the bar he had installed a case of hand grenades, a carbine, a bottle of the grateful owner's best cognac and a prewar Michelin road map on which he had already begun to plot the German positions in the neighborhood. To the FFI [French Forces of the Interior] who had started to drift into the hotel, Hemingway was 'mon capitaine.' By the time Paris was liberated, in one of the most rapid promotions in French military history, he would be 'mon general.'
 
 
Today's selection -- from Is Paris Burning? by Larry Collins and Dominique Lapierre.
  
In August of 1944, the Nazis were losing control of Paris, a city they had occupied since 1940. Aware that the U.S. Army was now marching across France, Parisians began occupying government buildings and putting up barricades. Berlin ordered two Panzer tank divisions south to Paris to "restore order in the city at any price." Hope now lay with the Americans, who were just 30 miles from Paris:

"Two Panzer divisions ... were on their way south. [Generalfeldmarschall Walther Model] had only one sharp parting phrase [for Paris' commander General Dietrich von Choltitz]: 'Restore order in the city at any price.'

"The streets of Paris which, a few hours earlier, had rung with the proud words 'Aux Barricades!' now echoed a more anguished cry, rising up from those first flimsy fortifications. It was 'The tanks are coming.' ... The Panzers that had given Adolf Hitler the key to Paris in 1940 swarmed again into the streets of the capital. ...
"That evening brought the first drops of a new rainstorm and, along with it, a wild and welcome rumor. It buoyed up the spirits of the entire population of Paris. ... Playwright André Roussin set it down: 'A day begun in fear ends in hope,' he wrote. 'It seems the Americans are in Rambouillet. Tomorrow they will be in Paris.'


At the village of Rambouillet, Col. David Bruce (left) OSS commander in the European Theater, Ernest Hemingway (center).

"The Americans were indeed in Rambouillet, only 30 miles from Paris. ... Roussin had, however, some­what overestimated their number. There were three of them, and none of them had any real business being there. The first was a courtly Virginian named David Bruce, a colonel, the head of the OSS for France, whose capture would have afforded untrammeled delight to the Germans. The second was a jeep driver, a taciturn GI named 'Red' Pelkey, from West Virginia. The third was a war correspondent. True to a promise sworn long before, Ernest Hemingway was leading the United States press corps to Paris.

"His first act [was] to liberate the bar of the Hotel du Grand Veneur, a honeysuckle-covered inn favored by week­ending Parisians and their ladies. In the bar he had installed a case of hand grenades, a carbine, a bottle of the grateful owner's best cognac and a prewar Michelin road map on which he had already begun to plot the German positions in the neighborhood. To the FFI [French Forces of the Interior] who had started to drift into the hotel, Hemingway was 'mon capitaine.' By the time Paris was liberated, in one of the most rapid promotions in French military history, he would be 'mon general.'

"Sole liberators of this hunting preserve of the kings and presidents of France, and forty-eight hours ahead of the rest of the Allied armies, the trio found themselves saddled with an embarrassing problem: too many Germans. 'Every time we turned around,' Bruce found, 'one was crawling out of the woodwork to surrender.' Hemingway took away their pants and put them to work in the kitchen peeling potatoes for his growing band of FFI."


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Is Paris Burning? 
Author: Larry Collins and Dominique Lapierre
Publisher: Grand Central Publishing
Copyright 1965 by Larry Collins and Dominique Lapierre
Pages: 174, 177-178

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