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terça-feira, 7 de novembro de 2017

Um manifesto de apoio 'as reformas no Brasil - "intelectuais" do PSDB, Paulo Roberto de Almeida



Paulo Roberto de Almeida
Comentários a programa de reformas de intelectuais do PSDB

Eu nunca chamaria um manifesto como esse, reproduzido abaixo, de propostas de reformas das políticas públicas e sobretudo de reformas constitucionais, pelo nome de um político de ocasião ou de oportunidade, ainda que ele possa merecer o apoio momentâneo de filiados ao partido. Pela simples razão de que se trata de um conjunto de reformas racionais, necessárias, em qualquer tempo e circunstância, para que o Brasil se converta em um país normal, mormente nesta fase de transição para algo que não sabemos exatamente do que será feito. Por isso mesmo, não se poderia vincular esse conjunto de reformas a um nome, que pode ser passageiro, e não revelar-se como "a" solução para os problemas do país (pois homens públicos podem sempre transigir e conciliar).
Eu não aceitaria conciliação em torno de reformas que, objetivamente, são absolutamente necessárias, indispensáveis, independentemente de quem esteja na presidência de um partido que se contaminou na corrupção, na total indiferenças dos líderes partidários (ou até com a sua conivência).
Dito isto, apoio a maioria, senão a totalidade das reformas propostas, e até acrescentaria várias outras, mas que entendo estejam embutidas nestas descritas genericamente. Mas quando se fala em “privatização radical”, caberia precisar o que significa ser “radical”. Inclui os bancos públicos, a Petrobras, todas as demais estatais de infraestrutura? Eu privatizaria todas as estatais, sem distinção.
Além das reformas políticas, acredito que o Brasil necessite, por exemplo, de uma revolução educacional, com alteração radical das bases sob as quais têm funcionado as diversas instâncias do ensino público (e influenciado, negativamente, o privado) no Brasil. As universidades federais precisam ganhar total autonomia, o que significa não apenas uma alocação básica federal, para pesquisa fundamental, e total liberdade para contratações, pagamentos diferenciados aos professores, fim dessa escolha irracional de reitores por votação do próprio corpo acadêmico – e escolha de profissionais de mercado que sejam gestores especializados nesse tipo de atividade – fim da gratuidade absoluta – com pagamento generalizado, e financiamento e bolsas para os merecedores e providos de renda insuficiente – e associações livres com o setor privado, em quaisquer níveis e setores.
Da mesma forma, o manifesto possui propostas para abertura econômica externa – com as quais eu concordo absolutamente, mas até iria além, no sentido de não se requerer negociações externas para acordos de livre comércio, mas simplesmente abertura unilateral, incondicional e irrestrita, por parte do Brasil, uma vez que somos nós os protecionistas, e os parceiros externos não têm nenhuma culpa nisso, e não se deve obrigá-los a fazer concessão em troca de uma abertura que só beneficia o próprio povo brasileiro – mas não possui nada em relação à política externa stricto sensu. Não vou elaborar agora a esse respeito, mas eu me permitiria simplesmente referir a necessidade de uma revisão completa – eu disse completa – na política externa seguida nos últimos quinze anos, que considero seriamente enviesada por concepções sem qualquer conexão com as necessidades brasileiras de inserção internacional.
Tratarei desse aspecto em documento à parte.
Finalizo dizendo que se trata de um bom começo.

Paulo Roberto de Almeida  
Recife, 7/11/2017

Manifesto de Apoio a Tasso Jereissati
6/11/2017

Este é um manifesto em apoio à candidatura de Tasso Jereissati à Presidência do PSDB. Mais do que nomes ou correntes partidárias, o que está em jogo é a postura que se requer do partido diante do Governo Temer. O PSDB deve aprovar as reformas que modernizem o Brasil, independentemente de quem as envie ao Congresso ou as proponha. Mas não deve participar de um Governo que não parece ter se comportado de acordo com os preceitos éticos na condução dos assuntos de interesse público.
Além da postura ética, o Brasil precisa de um Governo que entenda as prioridades nacionais e tenha como foco o bem-estar da grande maioria dos brasileiros. O PSDB precisa voltar a ser o PSDB do Plano Real, capaz de formular e implementar a agenda de reformas necessária para que o Brasil volte a crescer de forma sustentável, com justiça social e respeito aos direitos civis.
Caberá ao Presidente do Partido conduzir as discussões que levarão a um novo programa do PSDB e ninguém melhor do que Tasso Jereissati para liderar esse processo de renovação das ideias de que o País tanto precisa.
Oferecemos à reflexão de todos algumas ideias e princípios que deveriam, em nosso entendimento, nortear um novo Programa do PSDB e a atuação do Governo a partir de 2019.

Visão de Brasil

• Uma economia sustentável, moderna, competitiva e aberta ao mundo.
• Um governo ágil, eficiente e capaz de responder aos anseios dos cidadãos.
• Políticas públicas focadas em educação, saúde e segurança pública.
• Uma sociedade democrática, fundada no respeito aos direitos humanos, na liberdade de expressão e respeito aos direitos das minorias.
• Um sistema político que represente seus eleitores de forma efetiva.

Cinco pilares para a atuação do Governo em matéria  econômica

(A) Austeridade Fiscal
• O governo nem deve nem precisa aumentar a carga tributária. Se a alíquota de um imposto aumentar a de outro deve ser reduzida.
• Programa anual de revisão dos gastos. Eliminar estruturas ociosas; aumentar a concorrência nos processos de compra; inovar na contratação de serviços e obras públicas assegurando processos transparentes na licitação, autorizando a entrada de capital estrangeiro e coibindo práticas viciadas como aditivos desprovidos de racionalidade técnica.
• Programa anual de revisão de isenções tarifárias, isenções tributárias e benesses de toda ordem que impactam as finanças públicas. Todo subsídio deve constar da previsão orçamentária, eliminando-se todo e qualquer subsídio implícito.

(B) Redefinição do papel do Estado: do produtor/financiador para o regulador e planejador
• Na economia brasileira de hoje o Estado não precisa nem produzir nem financiar a produção. A meta é liberar o capital hoje alocado nas estatais, bancos e empresas públicas para usos socialmente mais legítimos ou para reduzir o endividamento público.

Programa radical de privatização.
• O Estado precisa sim regular as atividades produtivas do setor privado para assegurar a concorrência e a prestação adequada dos serviços públicos a cargo de concessionárias com controle privado.
Para tal é urgente acabar com a captura política das agências reguladoras.
• O Estado precisa sim planejar a infraestrutura e o desenho dos mecanismos de atração do capital privado.
• O Estado deve também fixar a política de preservação e uso sustentável do meio ambiente, em busca de uma economia de baixo carbono, evitando a dilapidação do nosso patrimônio natural na busca por lucros.

(C) Postura não intervencionista
• Respeitar contratos.
• Aumentar a previsibilidade do quadro legal e regulatório.
• Não intervir na formação de preços através de congelamentos de tarifas ou de preços administrados.
• Evitar regras que criem proteção artificial a determinados setores ou atividades (lei do similar nacional, requisito de competência técnica para ganhar concessões etc.).

(D) Abertura
• Diminuição de barreiras e entraves à importação, com redução gradual de todas as tarifas de importação e eliminação de entraves burocráticos.
• Acordos de livre comércio com os parceiros relevantes abrindo espaço para produtos brasileiros no exterior e reduzindo os custos de importação, em especial dos insumos importados utilizados como insumos na produção e nas exportações.
• Simplificação e eliminação as barreiras burocráticas que limitam o fluxo migratório de estrangeiros ao Brasil.

(E) Reformas para modernizar o ambiente de negócios
• Estimular a livre iniciativa e o empreendedorismo.
• Estimular o investimento estrangeiro.
• Simplificar a vida dos cidadãos e das empresas reduzindo o custo de conformidade com as leis e consequentemente o contencioso.
• Desburocratizar, tratar os iguais como iguais, evitar regulamentação excessivamente minuciosa.

Reformas constitucionais
• A reforma da Previdência é fundamental para o equilíbrio das contas públicas. Ajustar os planos atuariais às tendências da demografia e acabar com os privilégios.
• Desconstitucionalizar impostos e vinculações orçamentárias para assegurar uma gestão mais flexível do Orçamento.
• Acordo federativo substituindo todos os impostos de intermediação (IPI, ICMS, Cofins, ISS, PIS) em favor de um único Imposto sobre Bens e Serviços com alíquota nacional única.


Foco na agenda social
• O Governo não precisa ter escolas nem hospitais. Não precisa contratar professores ou médicos. Mas precisa prover saúde e educação de qualidade. Tem que ter indicadores de eficiência na tomada de decisão de como gerir os recursos das áreas de educação e saúde.
• Além de educação básica, o Governo deve priorizar a superação de nosso atraso tecnológico e científico, apoiando pesquisa e inovação. Integração com os centros de pesquisa avançados do exterior.
• Buscar a igualdade de oportunidades no acesso à educação, ao mercado de trabalho e à Justiça.
• Manter a rede social de apoio (bolsa família e seguro-desemprego) evitando distorções e fraudes.
• Adotar uma política nacional contra a criminalidade.
• Acabar com privilégios de apropriação do dinheiro dos trabalhadores (FGTS, contribuição sindical obrigatória).
• Incluir sistema S no orçamento da Educação.

Transformação estrutural na gestão da máquina pública
• Firmeza para enfrentar as pressões corporativas dos servidores públicos. Introduzir a meritocracia no trato com o funcionalismo público, premiando a competência e penalizando quem não trabalha. Limitar a estabilidade a carreiras de Estado estritamente definidas.
• Ampliar o programa de desestatização para focar a atuação Estado nas atividades essenciais e reduzir o número de servidores e funcionários vinculados à aposentadoria pública.
• Impessoalidade na relação com os grupos empresariais e representações classistas (fim de regras ad hoc, isenções e benesses seletivas etc.).
• Transparência como norma. Ajustar as leis orçamentárias para fazer com que todos os fatores que afetam as finanças públicas estejam incluídos no Orçamento da União e sejam inteligíveis ao público.
• Anunciar as metas de cada programa de governo e dar divulgação a seu cumprimento. Lembrar que a meta não é gastar mas sim atingir objetivos socialmente relevantes como reduzir os índices de criminalidade, diminuir tempo de espera de cirurgias etc.
• Submeter os programas e autarquias do Governo, inclusive Universidades, a avaliação externa independente.
• Implementar o Governo Digital com os objetivos de reduzir custos, aumentar controles e dar mais transparência. O Governo Digital deve ser também a plataforma da cidadania oferecendo um canal de avaliação dos serviços públicos e informando os contribuintes sobre os impostos que pagam.

Bolivar Lamounier, Edmar Bacha, Elena Landau, Luiz Roberto Cunha, Persio Arida

Militar condenado na Lava Jato diz que foi preso por interesse internacional: Angra 3 (FSP)

 Militar condenado na Lava Jato diz que foi preso por interesse internacional
 Folha de S. Paulo, 7/11/2017

 Acusado de receber propina de R$ 4,5 milhões de empreiteiras que tinham obras em Angra 3, o ex-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva ficou preso por dois anos e recebeu uma das maiores condenações da Lava Jato: 43 anos de prisão por corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e organização criminosa. Considerado um dos mais importantes cientistas brasileiros e o pai do programa nuclear do país, o almirante Othon, 78, como é conhecido, ficou isolado em uma cela e diz que aprendeu a comer com as mãos. Solto no mês passado, ele pouco sai às ruas e chora com frequência.
Folha - Como o senhor se aproximou da empreiteira Andrade Gutierrez?
Almirante Othon - Em 1994, quando fui para a reserva, a primeira coisa que fiz foi prestar um concurso para o Instituto de Pesquisas Nucleares da Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear). Havia duas vagas para pesquisador. Concorri com 16 doutores e tirei primeiro lugar. Mas nós estávamos em 1994, numa fase de muita globalização. E eu não fui chamado. A minha cara é nacionalista. E eu sou mesmo. Como não deu certo, montei uma empresa de consultoria, a Aratec. No início de 2004, um camarada da Andrade Gutierrez, o senhor Marcos Teixeira, apareceu lá. 
E o que ele queria?
Ele disse: "Nós [construtora] temos um contrato de 1982 [para as obras civis da usina nuclear de Angra 3]. Mal começamos a mexer na fundação e ele foi interrompido". Eles achavam que eu poderia ajudar [na retomada das obras], por ter influência militar. Eu disse "não tenho mais, saí [da Marinha] faz tempo". Aí veio a ideia de fazer um estudo para eles. Eu não estava no governo e nem imaginava que ia voltar [Othon foi convidado para presidir a Eletronuclear um ano depois, em 2005].
O Ministério Público Federal considerou que o estudo assinado pelo senhor para a Andrade Gutierrez era simplório e entendeu que ele é fictício.
É um desconhecimento total ou uma vontade de não querer reconhecer [a importância do trabalho]. São anos de pensamento sobre o Brasil. O que ocorreu no país, e sobre o que falava no meu estudo? O consumo de energia cresceu e o estoque de água das hidrelétricas estacionou na década de 80. Antes disso, o Brasil poderia passar por vários anos "secos" porque tinha estoque de água. Mas isso mudou e veio o apagão. O Brasil agora precisa de energia térmica de base. Termelétricas têm que ser [movidas a] carvão ou [energia] nuclear. E nuclear é melhor para nós porque temos reservas [de urânio] correspondentes a 50% do pré-sal. Nós temos que aproveitar o que a natureza nos dá. Ah, se eu tivesse mais [usinas] nucleares. O custo do investimento é maior mas o do combustível é menor [do que o de outras alternativas]. No caso da hidrelétrica, o custo [do combustível, a água] é quase zero. E no caso da nuclear, é pequeno. Se eu tiver a energia nuclear, eu economizo água e não chego nessa situação [de apagão]. A energia nuclear não compete com a hidrelétrica. Ela complementa. Era isso o que o estudo mostrava. 
Depois o senhor foi para o governo e a obra de Angra 3 foi retomada.
Em julho [de 2005], eu soube que tinha uma lista [no governo Lula] para escolher o presidente da Eletronuclear. Eu não queria. Mas aí eu fiz a grande bobagem da minha vida. Fui convidado. Bateu a vaidade e eu aceitei. Em outubro de 2005, assumi o cargo.
E como passou a receber dinheiro da empreiteira?
Tudo o que eu fazia na época [em que prestava consultoria] era na base do sucesso. E coincidiu que fui para o governo e houve a decisão [de retomar Angra 3]. Quem decidiu foi o Conselho Nacional de Política Energética, do qual eu não fazia parte. Como presidente, eu apenas executei as diretrizes. Mas passei a fazer jus [à remuneração] do trabalho [estudo para a Andrade] que eu fiz antes. 
Quanto passou a receber?
Eu cobrei R$ 3 milhões, em valores de dezembro de 2004 [a Polícia Federal diz que o almirante recebeu R$ 4,5 milhões em valores atualizados]. Comecei a receber depois que houve a decisão da retomada das obras. Como era um troço completamente diferente, eles falaram "vamos pagar através de outras empresas". Aí virou outro crime. Se fosse hoje, eu exigiria deles [Andrade] um contrato de confissão de dívida para que me pagassem só depois que eu saísse. Eu não receberia no cargo. Eu tinha direito, foi um trabalho que eu fiz antes. Não era imoral nem ilegal. Apenas com a experiência de hoje eu teria feito diferente.
O Ministério Público Federal e a Justiça consideraram que era propina.
Não era propina, não foi mesmo. Eu achava que tinha direito de receber. Agora, tive o cuidado de não tomar nenhuma decisão [que beneficiasse a empreiteira], não tem nenhum ato de ofício assinado por mim. Tivemos [ele e a Andrade]inclusive um atrito inicial, porque eu exigi que o TCU aprovasse os detalhes do aditivo [para o pagamento do serviço nas obras de Angra 3]. Eles ficaram irritadíssimos. Fui uma decepção para eles. Houve outras divergências, chegaram a parar as obras. Oras, se eu tivesse ligação com eles, isso teria ocorrido? 
Delatores da empresa afirmaram que o senhor, na verdade, cobrava percentual sobre os contratos de Angra 3.
A Andrade já tinha um ressentimento em relação a mim. E delação premiada é um processo muito danado. O cara acha que agrada [os investigadores] e senta a pua. Ele não tem compromisso.
O senhor diz que sua prisão interessa ao sistema internacional. Que evidência tem disso?
Como começou tudo isso? Num depoimento que o presidente de uma empreiteira fazia sobre um contrato com a Petrobras. Ele mencionou que ouviu dizer algo sobre o presidente da Eletronuclear estar de acordo com um cartel. Isso serviu de pretexto para os camaradas vasculharem a minha vida desde garoto. Havia um direcionamento. 
Mas haveria um comando externo nas investigações?
Não comando, mas influência forte, ideológica. Não posso provar mas tenho um sentimento muito forte. Houve interesse internacional.
E por que haveria interesse internacional em sua prisão?
Porque tudo o que eu fiz [na área nuclear] desagradou. Qual o maior noticiário que tem hoje? A Coreia do Norte e suas atividades nucleares. A parte nuclear gera rejeição na comunidade internacional. E o Brasil ser potência nuclear desagrada. Disso eu não tenho a menor dúvida. 
Há setores que acreditam que o Brasil deveria desenvolver a bomba atômica. O país fez bem em abrir mão dela?
Eu acho que fez. O artefato nuclear é arma de destruição de massa e inibidora de concentração de força. Mas, no nosso caso, se tivéssemos a bomba, desbalancearíamos a América Latina, suscitando apreensões. E a última coisa que a gente precisa na América Latina é de um embate.
O país, no entanto, não abriu mão da tecnologia. Se necessário, em quanto tempo faríamos uma bomba?
Em uns quatro meses. Com a tecnologia de enriquecimento que nós usamos, podemos fazer a bomba com o plutônio, como a de Nagasaki, ou com o urânio, que foi a de Hiroshima. Temos os dois porque quem tem urânio enriquecido pode ter o plutônio também. 
Voltando às investigações, o senhor foi acusado de contribuir para a desvalorização da Eletronuclear.
Quando assumi, ela era chamada de vaga-lume. Em poucos anos, passou a figurar entre as centrais de melhor desempenho do mundo. As ações se valorizaram. Como então eu contribuí para desvalorizar as ações? Nada disso foi levado em conta no meu julgamento. O meu passado serviu como agravante. Eu peguei cinco anos de cadeia a mais porque, se eu tinha aquele passado, eu tinha que ter um comportamento [exemplar]. É a primeira vez que antecedente virou agravante. Vida pregressa ilibada virou agravante. Tá lá, escrito [na sentença]. É só ler. Eu li. Me deu uma revolta tão grande... [levanta da mesa, chora].

Resenha do livro "O Evangelho do Barão" de Luis Claudio Villafane G. Santos - Lucas Berlanza

Artigos

“O evangelho do Barão”: um reencontro entre Rio Branco e o Brasil


Por Lucas Berlanza, publicado pelo Instituto Liberal

Quando as referências escasseiam, toda iniciativa de resgate dos grandes é motivo de júbilo. Em especial quando se trata da diplomacia e das relações internacionais – expediente fundamental no esforço de tornar o mais harmonioso possível o contato entre as diferentes nações, reduzindo o recurso ao arbítrio e à força bruta, invariavelmente desinteressante, mesmo quando inevitável, aos indivíduos e sua busca pela prosperidade. Estamos tentando sair de uma fase de amarga prostituição de nosso Itamaraty a interesses e projetos menos felizes, mas já fomos exemplo nessa seara, e o ícone desse prestígio é José Maria da Silva Paranhos Júnior (1845-1912), o Barão do Rio Branco.
Lançamento de 2012, O evangelho do barão – Rio Branco e a identidade brasileira é um pequeno estudo de autoria do diplomata Luís Cláudio Villafañe G. Santos, pesquisador ligado ao Instituto Rio Branco. Em vez de uma biografia dessa notável personalidade brasileira, o autor procura fazer de sua obra uma análise de seu impacto na construção de uma identidade nacional e estudar as razões pelas quais ele se tornou uma inspiração para toda a nossa diplomacia – a ponto de sua vida e obra serem chamadas de “evangelho” desde o título.
“O Barão segue como uma referência, ainda que já passível de revisão, na discussão dos rumos da política externa brasileira. Trata-se de um caso paradigmático de consolidação de uma doutrina para as relações exteriores de um país, observada – e até reverenciada – por tão longo tempo”, comenta o autor. A grande chave para entender Rio Branco, porém, é sua inspiração na monarquia – não por acaso manteve, em pleno período republicano, a designação associada a um título de nobreza, tendo estado à frente do Ministério das Relações Exteriores entre 1902 e 1912, sob quatro diferentes presidentes.
 
Os ideais de Rio Branco
Rio Branco era fundamentalmente um saquarema (alinhado ao Partido Conservador monárquico), simpático aos anos de maior estabilidade do Império, sob D. Pedro II. “As descontinuidades na condução da política exterior” entre Império e República “podem ser, e o são rotineiramente, embaçadas ou mesmo ocultadas”, mas a “sensação de permanência”, comenta o autor, “tem também bastante de construção ideológica. (…) Ao recuperar muitas das doutrinas do período monárquico, ou ocultar as rupturas em outros casos, o Barão soube incorporar em sua ideia de Brasil um importante patrimônio e o grande investimento que havia sido feito durante os anos do Império na construção de uma identidade coletiva política e socialmente operacional”.
Rio Branco teria sido importante na superação da crise simbólica de legitimidade do Estado brasileiro, equacionando-a com a consolidação de uma autoimagem calcada no caráter de um Estado nacional pacífico, não intervencionista e seguro dentro de fronteiras bem definidas. “O ideal da ‘conciliação’ e da criação de consensos, que marcou o apogeu do Segundo Reinado”, sob a hegemonia saquarema e a ordem do gabinete do Marquês do Paraná, “voltou a ser um ponto central do discurso que permeou a estabilização da nova ordem oligárquica que caracterizou a República Velha. O sucesso alcançado pelo Barão do Rio Branco na criação de uma visão percebida como consensual na condução das relações internacionais seria, inclusive, mais duradouro e se projetaria por muitas décadas depois de seu desaparecimento físico”.
Após longa análise do histórico imperial e do começo da República Velha no campo da diplomacia, Luís Cláudio insere o Barão e sua trajetória de esforços para, embora mais próximo à elite saquarema que ao grupo que a contestava, conseguir uma posição de proeminência dentro do Império, o que estaria prestes a alcançar quando, para sua infelicidade, veio a República. O texto então oferece um retrato muito curioso da transição de regime, com os gestos de força do governo Floriano Peixoto e a situação degradante do período conhecido como República da Espada, com destaque para a reação dos monarquistas inconformados, compreendidas aí as queixas de figuras como Joaquim Nabuco e Eduardo Prado.

As realizações de Rio Branco
Avalia também de que forma, ao ingressar ao governo, Rio Branco lidou com a desconfiança, de um lado, dos republicanos radicais com seu monarquismo, e de outro, com a pressão de monarquistas que viram nisso um ato de traição. “Em tese, independente de afiliação partidária, todos podem concordar com o objetivo de definir e assegurar as fronteiras, ou mesmo de conseguir ganhos territoriais. Em termos simbólicos, as fronteiras demarcam também a alteridade, o ‘outro’ em relação ao qual se constrói a identidade nacional. A questão da unidade e grandeza do território era um tema que vinha sendo explorado desde a independência como base do discurso sobre a identidade brasileira. E nesse campo, com as vitórias nas questões de Palmas e do Amapá, Paranhos Júnior já havia acumulado um capital político insuperável”, sendo alçado ao posto máximo da diplomacia. Não que o Barão não desse motivos para irritar os radicais: o autor comenta que ele apagava expressões de teor positivista dos documentos, irritando os adeptos da autoritária ideologia comteana que teve tanta relevância na República.
Villafañe relaciona também, é claro, as realizações práticas de Rio Branco, como os esforços, ao lado do liberal republicano parlamentarista gaúcho Assis Brasil, pela resolução da questão acreana em defesa dos brasileiros do Acre contra as autoridades bolivianas; a priorização das relações com os Estados Unidos, protetores da América diante do imperialismo efetivo das nações europeias, que entornaria na Primeira Guerra Mundial, apesar de as simpatias históricas e estéticas de Rio Branco e Nabuco serem francamente mais europeias, denotando seu senso absoluto de pragmatismo e interesse brasileiro; e a conclusão da definição das fronteiras com os países latino-americanos. É ainda explicada a brilhante performance de Rui Barbosa na Conferência de Haia, sob a autoridade do Barão. A ênfase, no entanto, é no aspecto simbólico e no peso de Rio Branco e suas políticas para uma ideia de Brasil.

Rio Branco e a ideia de Brasil
Um dos aspectos simbólicos que o autor ressalta é o enaltecimento da relação pacífica e da sobriedade institucional do Brasil da República Oligárquica, não mais em contraste com o Império, mas em contraste com a barbárie militarista da República da Espada. Rio Branco passa a valorizar dessa forma uma relação de continuidade com o Império. Sabemos perfeitamente que há muito pouco a aplaudir na República dos coronéis, bacharéis e fazendeiros, porém as vantagens na comparação direta com Deodoro e Floriano são notáveis e permitiram que Rio Branco fizesse seu trabalho. Chegou ao cargo, aliás, por decisão de Rodrigues Alves, também oriundo da elite imperial e um dos nossos melhores presidentes, que recusou, em nome da não-intervenção econômica, ratificar a Convenção de Taubaté.
Curiosamente, chama a atenção o momento em que o autor descreve um conjunto de vitrais inaugurados entre 1949 e 1950 na Washington National Cathedral representando os principais aliados dos EUA na política externa: a Inglaterra, o Canadá e a América Latina – e representando esta última estão dois líderes de movimentos de independência, Simón Bolívar e San Martín, e o brasileiro Barão do Rio Branco (!!). Representar o Brasil com a imagem de um diplomata e não de um príncipe ou soldado dá ideia da importância desse personagem.
Ainda sobre a questão simbólica e identitária brasileira, para Luís Cláudio, o legado da monarquia brasileira em termos de construção dessa identidade não é pequeno, porque ela “conseguiu substituir os laços diretos das províncias com a antiga metrópole pela referência ao Rio de Janeiro. Ela foi responsável pela propagação de um sentimento de patriotismo que superou a lealdade às ‘pequenas pátrias’ locais e regionais em prol da ideia de uma pátria que abrangesse a totalidade do território da antiga colônia.” A escravidão, porém, impedia que se entronizasse, no tecido social, a ideia efetiva de uma nação, calcada em “laços horizontais” entre os brasileiros. “O desenvolvimento de um sentimento nacional brasileiro, como apego à comunidade imaginada” mais do que a um simbolismo dinástico da Família Imperial e da Coroa, foi um projeto que amadureceu depois do golpe militar republicano, apesar da “vaga de patriotismo” verificada em ocasiões como a Guerra do Paraguai.
Tal “consolidação do sentimento nacional” nas bases modernas, particularmente viabilizadas pelos meios de comunicação de massa e o compartilhamento de notícias, permitindo a formação de uma maior “consciência comum”, “foi tarefa da República, e a definição da política externa republicana influiu na construção da identidade do país, o que se traduziu na fixação do Barão como um dos ‘pais fundadores’ do nacionalismo brasileiro, quase um século após a independência. A atuação de Juca Paranhos e a recuperação do mito fundador das fronteiras naturais predefinidas, preservadas pela colonização portuguesa, fecharam as portas de um discurso ideológico fundamental na consolidação do nacionalismo brasileiro”, de maneira que o Barão “passou a simbolizar uma grandeza territorial com a qual todos podiam concordar, acima de classes ou partidos”. Ligou-se, em sua retórica e realizações, a um projeto que, desde José Bonifácio, defende a concepção de uma única nação integrando a antiga América portuguesa.
O legado do Barão
Contemplar a representatividade de Rio Branco é contemplar, sim, a ideia de um Brasil calcado na pretensão de ser o “gigante”, o “colosso”, e simbolicamente ancorado na aspiração de um destino glorioso para essa monumental grandeza territorial. Porém, para aqueles a quem tal ideia soar ufanista e “geográfica” demais, pode ser também contemplar o valor da personalidade humana, fortalecendo um referencial mais pacífico de posicionamento no mundo e internamente, rechaçando as perseguições e convulsões autoritárias da República da Espada em prol de uma proposta de cosmopolitismo saudável e investimento nas negociações para resolução dos conflitos internacionais.
Seu resgate é antídoto, acima de tudo – e isto dizemos à revelia de qual seja a posição política efetiva do autor do livro, que desconhecemos completamente –, para asneiras regionalistas totalitárias que suplantem o interesse dos brasileiros, como nacionalidade e como indivíduos, em favor de interesses alheios aos seus, tal como se fez na última quadra histórica, e ainda há em nosso seio quem intente fazer.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

Trabalhos mais acessados de PRA na Academia.edu, na semana que passou

Estes são os trabalhos mais acessados em minha página da plataforma Academia.edu:


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O calculo CORRETO do deficit da Previdencia Social - Ricardo Bergamini

O cálculo CORRETO do deficit da Previdência Social 
Ricardo Bergamini

Para fins de discussão do equilíbrio da Previdência Social, o que importa é discutir receitas e despesas exclusivamente da Previdência, sem misturar Assistência Social e Saúde nessa conta. Se colocarmos tudo junto, como fazem os defensores da tese do superavit, o que estaremos dizendo é que com o passar do tempo, o crescimento da despesa com aposentadorias e pensões vai usar cada vez mais recursos do Orçamento da Seguridade, deixando menos dinheiro para pagar a conta da saúde e da assistência. Portanto, quem defende a tese do superavit está, na verdade, defendendo que nos próximos anos sejam cortadas despesas da saúde e da assistência para financiar o pagamento de aposentadorias e pensões.

Quando olhamos apenas receitas e despesas da Previdência, tanto do Regime Geral (RGPS) quanto do Regime Próprio dos Servidores Públicos Federal (RPPS) percebemos que a despesa cresce aceleradamente e que o deficit também está em forte trajetória ascendente, como mostra a tabela abaixo. Esse é o verdadeiro problema do desequilíbrio previdenciário: despesas crescendo aceleradamente. Com o rápido envelhecimento da população, redução da natalidade e aumento da expectativa de vida, se não houver reforma, a situação vai se tornar insustentável em poucos anos. Os demais programas públicos, de saúde, educação, saneamento, segurança pública e infraestrutura terão que ser cortados para que se financie o pagamento de aposentadorias e pensões. A sociedade brasileira precisa fazer escolhas sobre quais gastos públicos ela quer ter no futuro.
Em 2016, no RGPS (INSS) o deficit previdenciário foi de R$ 149,7 bilhões, com 30,5 milhões de aposentados e pensionistas, gerando um deficit per capita de R$ 4.908,20, enquanto no RPPS dos servidores públicos federal (civis e militares) o deficit previdenciário foi R$ 77,2 bilhões, com apenas 1,0 milhão de aposentados e pensionistas, gerando um deficit per capita de R$ 77.200,00. 
Já li muitos estudos e artigos de gênios e figurões da economia que fazem as suas análises apenas em termos absolutos afirmando ser muito mais grave o deficit do RGPS, mas quando relativizamos verificamos que o RPPS de menor deficit em termos absoluto é 15,73 vezes mais grave que o RGPS, e o mais difícil de ser corrigido, já que se destina aos iluminados e notáveis donos do poder. 
Cabe lembrar que considerando o deficit previdenciário do RPPS dos estados e municípios de R$ 78,5 bilhões o deficit previdenciário total em 2016 foi de R$ 305,4 bilhões.
O cálculo CORRETO do déficit da Previdência Social: 2003 a 2016 (R$ bilhões)
Tabela 8 – O cálculo CORRETO do déficit da Previdência Social_2003 a 2016 (R$ bilhões)
Fontes: Secretaria de Previdência Social e STN (Relatório Resumido de Execução Orçamentária).

Ricardo Bergamini

sábado, 4 de novembro de 2017

Seminario O Brasil e a Grande Guerra: IHGB-RJ, 6/11/2017, 9:00hs



Seminário “O Brasil e a Grande Guerra: Diplomacia e História”
A Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG), o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) e a Embaixada da França no Brasil convidam para o seminário “O Brasil e a Grande Guerra: Diplomacia e História”. O evento será realizado em 6 de novembro, às 9h, na sede do IHGB, Rio de Janeiro. Confira a programação completa.
Inscreva-se.
Serviço
Seminário: “O Brasil e a Grande Guerra: Diplomacia e História”.
Local: Av. Augusto Severo, nº 8, 9º, 13º andar, Glória 20021-040, Rio de Janeiro.
Data e hora: 6 de novembro, às 9h.

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Quando do início da guerra na Europa, fui convidado pelo jornalista Alberto Dines para dar uma entrevista em vídeo para emissão especial que ele preparava para o seu "Observatório da Imprensa". Não disponho do link para essa emissão, se ainda estiver disponível.
Mas transcrevo abaixo a ficha do texto-guia para a emissão que eu tinha preparado para aquela ocasião.


2622. “A guerra de 1914-1918 e o Brasil: impactos imediatos, efeitos permanentes”, Hartford, 26 junho 2014, 5 p. Roteiro para gravação de um depoimento em vídeo para emissão especial do Observatório da Imprensa, sobre o impacto da Primeira Guerra Mundial sobre o Brasil em termos políticos, econômicos, culturais e militares; depoimento por meio de webcam; feitas duas gravações de dois minutos cada. Publicado em Mundorama (28/07/2014; ISSN: 2175-2052; link: http://www.mundorama.net/?p=14424); postado duas vezes no Diplomatizzando (links: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/06/o-brasil-e-primeira-guerra-mundial-no.html e http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/07/a-primeira-guerra-mundial-e-o-brasil.html). Emissão “Os 100 anos da guerra que não acabou”, com Alberto Dines, Programa n. 736 do Observatório da Imprensa (em 5/08/2014; sem link atual). Postado novamente no blog Diplomatizzando (15/08/2017; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/08/a-grande-guerra-e-seus-efeitos-sobre-o.html). Relação de Publicados n. 1138.


Repensando o BRICS, ou um dos BRICS: draft paper - Paulo Roberto de Almeida

Um dos meus trabalhos mais recentes, ainda a ser revisto, se por acaso for publicado. Nada do que eu digo, obviamente, engaja qualquer posição oficial de qualquer país, ou certo país. Cada um decide o que for melhor para si, o que não me exime de expressar minha opinião a respeito, como sempre fiz.
Paulo Roberto de Almeida 

3188. “O lugar dos BRICS na agenda brasileira e internacional: reflexões, papeis e linkages”, Brasília, 3 novembro 2017, 29 p. Texto-guia para palestra no quadro do IV CIRIPE, Congresso Internacional de Relações Internacionais de Pernambuco (7/11/2017), a convite da Faculdade Damas, servindo também para livro (e-book), “O Lugar dos BRICS nas relações internacionais contemporâneas: Anais do IV Congresso Internacional de Relações Internacionais de Pernambuco". Inserido na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/15ebecf062/o-lugar-dos-brics-na-agenda-brasileira-e-internacional-reflexoes-papeis-e-linkages).


O lugar dos BRICS na agenda brasileira e internacional: reflexões, papeis e linkages

Paulo Roberto de Almeida
 
Introdução: uma sigla inventada por um economista de finanças
O BRIC, depois convertido em BRICS a partir de demanda especificamente chinesa quando de sua segunda cúpula, adquiriu um papel relativamente importante na agenda diplomática do Brasil nos últimos dez anos. Uma análise dessa importância, sua adequação ou conveniência política, no quadro de uma estratégia diplomática de maior alcance, na atualidade e nos anos à frente, impõe o dever, que me parece ser de simples honestidade intelectual, de abstrair a retórica oficial, sempre positiva ou otimista em relação a empreendimentos de governos, para justamente examinar o lugar dessa nova entidade no cenário da diplomacia regional, ou de blocos, em função dos interesses nacionais brasileiros, um conceito que já é, por si só, de difícil definição e avaliação.
         Para atender à demanda formulada pelos organizadores do IV Congresso Internacional de Relações Internacionais de Pernambuco, pretendo seguir fielmente o enunciado proposto, qual seja, o de efetuar uma análise de cunho pessoal, formada por reflexões próprias, sobre o papel e o lugar do BRICS na agenda brasileira e internacional, com vinculações entre as diferentes vertentes dessa temática. (...)

(...)


Reflexões sobre um novo animal no cenário diplomático internacional
A primeira pergunta que vem à mente quando se menciona esse novo bloco é a seguinte: pois não, o que pretendem os quatro do BRIC? Ou ainda: o que pensam fazer os cinco do BRICS? Qual é a sua proposta para o mundo atual, para a economia, para a política, para as relações políticas e econômicas entre os membros maiores e menores da comunidade internacional, para os problemas de desenvolvimento, para os de sustentabilidade, de combate aos ilícitos internacionais? Ou seja, qual é a legitimidade intrínseca do BRICS para se apresentar como grupo coeso, e esperar que os demais membros do sistema internacional o aceite como proponente de novas ideias, respostas, soluções para os inúmeros problemas que sobrecarregam a agenda multilateral e de relacionamento entre seus principais atores? Em uma palavra: para que serve o BRICS? (...)

 (...)


    Existe um papel para o BRICS na atual configuração de poder?
        Ao encarar o processo de formação do BRIC, na fase imediatamente antecedente à sua formalização diplomática, em 2008, eu continuava a encarar aquele conjunto de quatro países com o ceticismo sadio que caracteriza as minhas análises de caráter político em quaisquer circunstâncias, ou seja, feitas tanto no terreno profissional, quanto nas lides acadêmicas. Minha percepção continuava a ser a de que problemas e ambições nacionais de cada um dos países eram profundamente distintos entre si, tanto aqueles observados retrospectivamente, quanto os projetados para o futuro.(...)

(...)


Vínculos e efeitos futuros: um exercício especulativo
           Comecemos por descartar uma bobagem que vem sendo repetida, de forma cada vez mais primária, desde que Friedrich List proclamou, na primeira metade do século XIX, que as nações avançadas – à época só existia a Grã-Bretanha – pretendiam “chutar a escada” para impedir que nações emergentes – no caso a sua Alemanha, dividida e ainda insuficientemente industrializada – pudessem galgar, igualmente, o paraíso do desenvolvimento. Essa noção conspiratória da história veio sendo requentada nos últimos tempos por um economista coreano de Cambridge, Ha-Joon Chang, que apoiou-se nas teses de Prebisch e dos modernos opositores do Consenso de Washington para também recomendar que os países periféricos adotassem todo o arsenal protecionista e subvencionista que supostamente sustentou o esforço industrializador dos países agora ricos e poderosos. Ha-Joon Chang foi um grande aliado das teses desenvolvimentistas do período lulopetista, influenciando inclusive sua diplomacia econômica, no sentido aqui descrito, ou seja, de tentativa de galgar a “escada do desenvolvimento” por meio de políticas que tomavam inspiração em Hamilton, em List, em Manoilescu, em Prebisch, em Celso Furtado e outros luminares do nacional-desenvolvimentismo. (...)
(...)


Se tal cenário de consolidação de um modelo não liberal de governança se confirma, não há nenhuma chance de assistirmos a qualquer tipo de transição para um “fim da História” no sentido dado ao termo pelo cientista político Francis Fukuyama, ou seja, o fim das alternativas autoritárias de governança política e de intrusão ativa dos Estados na vida econômica dos países, uma vez que o modelo do novo Império Global, o antigo Império do Meio, representa todo o contrário, em termos de governança democrática e de respeito aos direitos humanos. George Orwell, se ainda estivesse vivo, teria muito material ilustrativo para uma nova edição, revista e ampliada, do seu famoso romance 1984. Talvez ele ainda possa inspirar romancistas do presente.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3 de novembro de 2017

Referências bibliográficas:


 Ler a íntegra deste paper na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/15ebecf062/o-lugar-dos-brics-na-agenda-brasileira-e-internacional-reflexoes-papeis-e-linkages).
 

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Emilia Viotti da Costa: nota da ABPHE sobre seu falecimento


NOTA DE FALECIMENTO
Emília Viotti da Costa (1928-2017)
É com pesar que a Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica (ABPHE) recebeu a notícia do falecimento, no último dia 02, da professora e historiadora Emília Viotti da Costa, aos 89 anos. Emília Viotti foi autora de livros oriundos de pesquisas sobre o Brasil Colônia e Império, entre eles destacamos "Da Senzala à Colônia" e "Da Monarquia à República" onde fez análises profundas e imprescindíveis sobre a formação e o caráter da sociedade brasileira, no período que vai da Independência até à República. Entre suas pesquisas e publicações mais recentes está um estudo sobre o Supremo Tribunal Federal, indo desde a fundação do mesmo, em 1890, até os dias atuais.
Emília Viotti foi Professora do Departamento de História da USP entre 1964 e 1969, quando foi compulsoriamente aposentada pelo AI-5. Também lecionou a disciplina de História da América Latina na Universidade de Yale. Ao retornar ao Brasil recebeu o título de professora emérita da USP, em 1999.
Durante o V Congresso Brasileiro de História Econômica e 6a Conferência Internacional de História de Empresas, realizada em Caxambu/MG e organizado pela ABPHE em 2003, Emília Viotti proferiu a Conferência de abertura do evento, o que muito nos honra.
A ABPHE se solidariza com seus familiares, amigos e inúmeros discípulos e orientandos.