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domingo, 30 de agosto de 2009
1325) Metodo infalivel para desincentivar a leitura no Brasil
Quantas vezes você já não viu um livro em livraria e teve vontade de ler, mas desistiu pelo preço?
Pois é, o governo pretende tornar esse produto um pouco mais caro, criando um novo imposto em cima dele.
Sabemos, por exepriência "eterna", que cada vez que o governo pretende fazer alguma coisa, qualquer coisa, ele passa seis meses (ou mais) planejando aquela coisa e depois, para implementar, ele precisa de dinheiro, dinheiro novo, fresco, adicional ao que já gasta com todas as outras coisas que ele já faz. Então não é o governo que está fazendo alguma coisa: ele simplesmente vai buscar o dinheiro no seu bolso e no caixa das empresas e gasta, supostamente naquilo que disse que iria fazer.
Mas, nessa operação, caro leitor, dos cem reais que o governo recolheu, pelo menos vinte já ficaram pelo caminho, no planejamento, na burocracia da coisa, na administração, na fiscalização dos desvios, e sobretudo nos desvios, claro, pois não existe programa no Brasil que não tenha desvios.
Que tal se o governo deixasse o dinheiro no seu bolso para você gastar no que você quiser?
Cide do livro
Miriam Leitão
O Globo, 29.08.2009
O governo quer criar um novo imposto, a Cide do livro. O imposto de 1% sobre o faturamento será pago pelas editoras, distribuidoras e livrarias. O dinheiro iria para um fundo, administrado pelo próprio governo, para incentivar a leitura. Uma das ideias é ter "mediadores" de leitura, pessoas que tentariam incentivar o hábito de ler na população.
A proposta tem outras esquisitices.
A minuta da criação do Fundo Pró-Leitura diz que o comitê gestor, que será dirigido pelo próprio Ministério da Cultura "deverá aprovar as normas e os critérios sob os quais os projetos serão apresentados e avaliados, examinando o mérito dos mesmos". Criação de imposto em época de crise não é o mais sensato.
Mas esse é um dos dois impostos que o governo está tentando criar. O maior de todos, como se sabe, é a neo-CPMF.
A minuta interna do governo diz que: "Fica instituído o Fundo PróLeitura e fica instituída a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), a qual será devida por todas as pessoas jurídicas de direito privado beneficiadas pela redução a zero das alíquotas PIS/Pasep e da Cofins." Vários outros setores foram desonerados sem contrapartida alguma, mas desse específico segmento se pede compensação.
O setor não é contra ter um Fundo Pró-Leitura e isso chegou até a ser negociado com o governo tempos atrás, segundo empresários.
Mas a contribuição seria voluntária, o governo aportaria o mesmo valor dos depósitos privados, e haveria uma administração paritária do governo com as empresas. Virou imposto em cascata, não há garantia do valor dos recursos públicos e agora se fala em administração paritária com a "sociedade", que pode ser qualquer coisa, inclusive instituições dóceis ao próprio governo.
As editoras criaram um fundo voluntário que tem depósito de R$ 6 milhões hoje e que tem feito várias ações de incentivo à leitura.
O cálculo é que se o imposto for mesmo criado ele arrecadaria R$ 60 milhões.
É difícil saber de quanto foi a renúncia fiscal na venda de carros, mas só para se ter uma ideia, o governo deixou de recolher com o IPI dos carros R$ 2,8 bilhões nos primeiros sete meses deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado.
O Fundo Pró-Leitura trabalharia em quatro eixos: "democratização do acesso; fomento à leitura e formação de mediadores; valorização de leitura e comunicação; desenvolvimento da economia do livro." A intimidade com os livros se cria em casa, em primeiro lugar; na escola, em segundo lugar. Uma pesquisa recente mostrou que mais da metade dos professores da escola pública fundamental não têm o hábito de leitura. Esse é o trabalho a se fazer para incentivar a leitura na população.
A ideia de criar "mediadores" para esse trabalho pode resultar em mais dirigismo, principalmente num governo como este e num ano eleitoral.
Os economistas Fábio Sá Earp e George Kornis fizeram a pedido do setor um estudo sobre o assunto.
Concluíram que, a despeito dos méritos de um Fundo Pró-Leitura, a melhor forma de financiá-lo não é um imposto em cascata. Do jeito que está, 1% para cada elo da cadeia vai virar 2,1% no preço final do produto. Eles lembram que a venda de livros está em queda no Brasil.
Em 2008 foram vendidos 77 milhões de exemplares a menos do que em 1998, uma queda de 19%. Uma pesquisa encomendada à Fipe mostrou que houve uma forte recuperação de 2003 para cá; a queda havia sido muito maior. Mesmo assim, está abaixo de 1999. Sá Earp e Kornis calculam que a venda de livros é muito sensível ao preço, que qualquer elevação tem efeito direto no volume de vendas.
O cálculo é que a elevação do preço provocado pela Cide do livro deverá ter um impacto negativo sobre o consumo de livros pelas famílias em torno de 3.600 exemplares por ano.
A indústria do livro tem feito propostas diferentes, uma taxação menor, de 0,33% sobre cada etapa da cadeia produtiva, ou 1%, mas não sobre o faturamento e sim sobre o valor final do livro. Alguns empresários do setor contam que o governo, durante as conversas, tem usado a ameaça velada de volta do PIS/Cofins na negociação.
Insinuam que o imposto pode voltar, o que seria, de fato, muito mais pesado do que a Cide. Como a PIS/Cofins sobre o livro não foi extinta, apenas a alíquota foi a zero, ela pode voltar a qualquer momento.
Ninguém pode ser contra ampliar bibliotecas públicas, fortalecer a indústria do livro, aumentar o acesso de pessoas com deficiência a livros especiais, incentivar o hábito de leitura. O difícil é concordar que mais um fundo estatal, criado por mais um imposto, em que agentes governamentais, os mediadores, é que farão isto. Os ministérios da Educação e da Cultura que usem os recursos dos impostos de todos os brasileiros para ampliar as bibliotecas, melhorar as escolas, formar professores que serão os melhores "mediadores" na formação do hábito de leitura. Ajudaria também se o presidente Lula não demonstrasse desprezo pelo livro. Depois de passar anos sem mencionar um livro que estivesse lendo, outro dia ele contou que está lendo o "Leite derramado".
Mas revelou: "Leio pouco porque me dá sono."
2 comentários:
Não esqueça do detalhe fundamental: será necessário aprovar uma emenda constitucional pra isso, já que a CF proíbe tributos sobre livros e publicações de qualquer natureza...
De fato, qualquer imposto novo, precisa ter lei específica para isso e vigorar no ano seguinte ao da sua aprovação. No caso dos impostos contributivos, como a Cide, sua regulação constitucional pode deixar margem a certa manipulação do poder federal, mas sempre é uma complicação esse fato, pois governadores, por meio de seus representantes no Congresso, colocam dezenas de penduricalhos na selva selvaggia da tributação nacional, irracional por natureza e por vocação.
Nenhum dos impostos ou contribuições criados para "incentivar" -- o verbo é quase uma ofensa à realidade -- serviu para o fim precípuo a que estava originalmente destinado. Tudo cai no caixa do Tesouro e o governo federal acaba usando segundo seu talante.
Acho que congressistas e cidadãos em geral ainda não aprenderam que o Estado é um ogro insaciável, sempre em busca de mais fontes de recursos para continuar fazendo aquilo que a sociedade faz muito melhor, gastar recursos (só que no caso do Estado com um pedágio de pelo menos 20% do valor total).
Quando vamos aprender?
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