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quinta-feira, 4 de agosto de 2011
Ministros do Supremo vao oficializar racismo no Brasil (e justificar o Apartheid oficial sendo criado...)
Tenho certeza de que com a atual composição do STF -- ministros que mostraram o que pensam (ou não) em julgamentos recentes, notórios, para dizer o mínimo -- a corte suprema deste país que já não é o meu vai decidir que praticar racismo é, sim, legal e legítimo, desde que seja para reparar injustiças históricas advindas de uma situação secular de opressão de toda uma categoria de pessoas que, mesmo não tendo sido escravizadas, padecem ainda hoje de algum mal incurável que faz com que o Estado tenha de vir em seu socorro com esse tipo de medida discriminatória.
Não tenho nenhuma dúvida de que esses ministros que aí estão -- com algumas exceções, que me parecem ser a daqueles que foram indicados antes da era do Guia Genial do Povos -- votarão a favor do racismo no Brasil. Não só isso: eles justificarão, por meio de alguma argumentação abstrusa cuja fundamentação filosófica desconheço agora, mas que saberei dentro em pouco, a sua tomada de decisão como um meio, entre outros, de reparar essas injustiças históricas. Só desejo que eles durmam em paz depois de votarem. Claro, um ou outro podem sempre pensar se não estão se dobrando às conveniências do momento, ao "clamor das ruas", ao Zeitgeist, seja lá o que for, mas acredito que os preclaros ministros dessa corte algo bizarra ratificarão, em sua maioria o regime de cotas raciais, que se encaixa perfeitamente no Estatuto da (Des)Igualdade Racial já aprovado no parlamento (também com letras minúsculas), e que visa as mesmas coisas: ou seja, a construção do racismo no Brasil e a legalização do Apartheid.
Nessas horas sempre penso na minha avó italiana, que veio ao Brasil muito pequena para substituir os escravos de origem africana (alguns já nascidos no Brasil, é verdade) nas fazendas de café, cujas condições de trabalho não diferiam muito daquelas dos seus predecessores. Ela morreu analfabeta, mas tinha orgulho de meus estudos, e sempre me dizia para estudar bastante para "ficar inteligente".
Não tenho certeza, mas acho que alguns ministros do supremo não estudaram bastante...
Paulo Roberto de Almeida
A lei dos juízes
Demétrio Magnoli
O Estado de S.Paulo, 4 de agosto de 2011
Franschhoek, cidade de vinhedos e alta cozinha na província sul-africana do Cabo Ocidental, é o núcleo cultural dos descendentes dos huguenotes franceses que emigraram para a Colônia do Cabo após a revogação do Edito de Nantes, em 1685. Esses refugiados da perseguição religiosa se somaram aos também calvinistas holandeses estabelecidos na região para configurar a colonização bôer na África do Sul. Eles adquiriram escravos, se insurgiram contra a abolição da escravidão promovida pelos britânicos em 1833, participaram do Grand Trek que resultou na fundação das colônias africânderes do interior e ajudaram a sustentar as leis do apartheid, introduzidas a partir de 1949. Desde 1789, até hoje, Franschhoek celebra a Revolução Francesa, que derrubou a monarquia católica dos Bourbons.
Liberdade, para eles, significava as liberdades de falar com Deus segundo suas próprias regras e de possuir escravos. Igualdade significava, exclusivamente, o estatuto de equivalência de direitos religiosos com os católicos consagrado pelo Edito de Nantes. Não se tratava da igualdade dos indivíduos perante a lei, mas da igualdade de direitos entre distintas comunidades religiosas cristãs. Nessa acepção, a igualdade pressupunha a diferença: os nativos africanos não teriam prerrogativas de cidadania, pois não eram cristãos.
Igualdade significa coisas diversas em sociedades diferentes. Breve, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará uma ação contra o programa de cotas raciais na Universidade de Brasília (UnB). O veredicto terá repercussões que transbordam largamente os limites do sistema de seleção de candidatos à UnB: estará em jogo o significado do princípio da igualdade no Brasil. A Constituição é cristalina, traduzindo a igualdade como equivalência de direitos de cidadania, independentemente de cor, raça, sexo ou crença. O sistema de cotas raciais implica a negação disso e sua substituição por um conceito de igualdade entre comunidades raciais inventadas. Mas há indícios consistentes de que o tribunal pode votar pela anulação de um dos pilares estruturais da Constituição.
O regime do apartheid costuma ser descrito como um Estado policial semifascista devotado a promover a exclusão política dos negros. De fato, ele também foi isso, mas seu traço essencial era outro. Os fundamentos doutrinários do apartheid emanaram do pensamento dos liberais Wyk Louw e G. B. Gerdener, da Universidade de Stellenbosch, que propugnaram a segregação de raças como imperativo para a manutenção da liberdade dos brancos e das culturas dos nativos. Louw e Gerdener conferiram forma acadêmica às ideias de Jan Smuts, comandante das forças africânderes na Guerra dos Bôeres de 1899-1902. Smuts promoveu a reconciliação entre os africânderes e os britânicos, antes de se tornar primeiro-ministro do país unificado. Em 1929, numa conferência proferida em Oxford, ele delineou o sentido da "missão civilizatória" dos brancos na África Austral: "O Império Britânico não simboliza a assimilação dos povos num tipo único, não simboliza a padronização, mas o desenvolvimento mais pleno e livre dos povos segundo suas próprias linhas específicas".
Louw e Gerdener devem ser vistos como precursores do multiculturalismo. Eles criticavam as propostas de criação de uma sociedade de indivíduos iguais perante a lei, que representaria a "assimilação dos povos". No lugar da "padronização" política e jurídica, sustentavam a ideia de direitos iguais para grupos raciais separados. O grupo, a comunidade racial, não o indivíduo, figuraria como componente básico da nação. É precisamente esse conceito que alicerça o sistema de cotas raciais.
Na UnB, um candidato definido administrativamente como "negro" por uma comissão universitária tem o privilégio de concorrer às vagas reservadas no sistema de cotas. Mesmo se proveniente de família de alta renda, tendo cursado colégio particular e cursinho pré-vestibular, o candidato "negro" precisa de menos pontos para obtenção de vaga do que um candidato definido como "branco", mas oriundo de família pobre e escola pública. Na lógica da UnB, indivíduos reais não existem: o que existe são representantes imaginários de comunidades raciais. O jovem "negro" funciona como representante dos antigos escravos (mesmo que seus ancestrais fossem traficantes de escravos). O jovem "branco" funciona como representante dos antigos proprietários de escravos (mesmo que seus ancestrais tenham chegado ao Brasil após a Abolição). Se o STF ornar tal programa com seu selo, estará derrubando o princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei.
O apartheid fincava raízes nas diferenças de língua e cultura entre os grupos populacionais sul-africanos. A classificação étnica dos indivíduos, seu requisito indispensável, derivava de realidades inscritas no passado e refletidas na consciência das pessoas. O projeto da "igualdade racial" no Brasil, cujo instrumento são os programas de cotas, exige uma fabricação acelerada de comunidades étnicas. As pessoas precisam ser transformadas em "brancos" ou "negros", a golpes de estatutos administrativos impostos por órgãos públicos e universidades. Todo o empreendimento desafia a letra da Constituição, que recusa a distinção racial dos cidadãos. O STF está perto de escancarar as portas para o esbulho constitucional generalizado.
Seria o STF capaz de corromper escancaradamente o princípio da igualdade dos indivíduos perante a lei? A Corte Suprema é um tribunal político, no sentido de que sua composição reflete as tendências políticas de longo prazo da Nação. Há oito anos o lulismo aponta os novos integrantes da Corte. O STF rejeitou a mera abertura de processo contra Antônio Palocci, que, como agora reconhece a Caixa Econômica Federal, deu ordem para a violação do sigilo bancário de Francenildo Costa. Os intérpretes da Constituição não parecem preocupados com a preservação do princípio da igualdade.
6 comentários:
O que é assustador´é a "insegurança jurídica"..não basta lermos o que está escrito claramente na constituição...o que vale é o que a Corte, que não foi eleita, decide. Se fossem questões técnicas controversas, tudo bem,nada mais correto, mas há certas coisas que estão muito claras na Carta Magna e mesmo assim temos dúvidas se vão valer mesmo...
Primeiro, o Demetrio Magnoli faz o papel de "Datena" dessa discussão toda. Geografo de formação foi se aventurar na sociologia. Dá nisso.
"Louw e Gerdener devem ser vistos como precursores do multiculturalismo" - não preciso falar mais nada né.. O Magnoli nunca ouviu falar em direito à diferença. Prefere discutir com os "intelectuais" dos debates da BAND.
O que não entra na cabeça do pop star Magnoli (que ama a Folha, e a grande mídia) e do Dr.Paulo é só uma coisa (insisto) existe COTAS porque existe PRECONCEITO. E muito do que os doutores que vieram de "berço aconchegante" pensam que existe de fato.
Não existe esse argumento de "representação histórica" entre brancos e negros". Devemos olhar pra frente. E é latente o fato de que o estado brasileiro é por demais omisso em políticas públicas que realmente tenham justificativa e funcionem. Nesse caso, creio que o STF ao julgar procedente a ADPF relacionada às cotas da UNB (o que vai acontecer) num prazo de 20 anos o preconceito de cor no Brasil será consideravelmente reduzido.
Triste mesmo é saber que (com todo o respeito Dr.Paulo) o doutor é professor do mestrado e doutorado em DIREITO da UNICEUB de Brasília.
E que ademais já elegeu os "States" como pátria mãe.
Grande abraço e sempre continuo acompanhando seu blog, (com opiniões bem interessantes)mas esse tipo de notícia me revolta).
Alias, Dr.Paulo procure o lattes do pop star Demetrio Magnoli. Se achar me avise porque nao encontrei. Ele é o filho do Datena mesmo.
ALlan... esta é o diferencial da ciência jurídica pra todas as outras "sociais". Isto não é de forma alguma "insegurança jurídica". Isto é pedaço da pizza chamada democracia - o controle de constitucionalidade. Necessário e irremediável ao bem dessa velha conhecida.
Bruno,
Entendo o papel do STF, no entanto, acho que o judiciário está avançando sobre questões que cabem somente ao Legislativo que é o poder legítimo para alterar as leis.
Dr Ives Gandra Martins tem publicado bastante a respeito.
abraços
boa tarde ALlan. O Ives Gandra Martins não pode servir de referencia doutrinária pra ninguem. Como advogado é um excelente profissional, mas o mesmo em várias oportunidades troca os pes pelas maos em assuntos políticos e institucionais. Tente ler outros artigos deles e verá o que estou dizendo. É o maior reacionário brasileiro. É um fantoche também. Nao conheço sua formação Alan mas o Judiciário não fez a Constituição, e sim o Legislativo. Os artigos 102 e 103 dispõe da legitimidade o STF pra apreciar tais questões. O judiciário não toma o "espaço" do legislativo. Isso é apenas o sistema de freios e contrapesos... Nao entendo sua posição...
abração
BEM RESPEITO A OPINÂO DA SUA AVÓ..A MINHA TAMBEM ERA ITALIANA..LETICI SPINELLI ......NA VERDADE O MUITO ESTUDAR PODERIA TRAZER SABEDORIA ...MAS NA PRATICA NÂO È ASSIM ...COMO SE DIZ AQUI NA ROÇA , ONDE AGORA MORO ...O BRASIL ESTA CHEIO DE BURROS CARREGADOS DE LIVROS ..EU TENHO VISTO MUITOS HOMENS LOTADOS DE LIVROS E DE DIPLOMAS ..DA PENA VER A MENTALIDADE DELES ....E O PIOR È QUE ELES AINDA SE ACHAM SABIOS ...TALVEZ ESTA SEJA A RAZÂO DO BRASIL SER TÂO POUCO DESENVOLVIDO ....
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