quinta-feira, 7 de março de 2013

Ah, essa mania perversa de estudar e de prosperar - Jose Vicente Lessa

Como é duro dar duro: além disso requerer menos horas de sono, de lazer, de simples far niente, a gente ainda corre o risco de prosperar, ter sucesso, ficar rico, e... pronto: já criamos desigualdades insuperáveis em relação aos que não fizeram como nós, e quiseram apenas levar uma vida "normal", sem essas chateações de uma ambição desmedida pelo progresso individual, pela ascensão solitária em direção à riqueza, à fama, ao poder.
Sem querer estamos alimentando essas famosas assimetrias sociais que justificam todas as políticas públicas de "redução das desigualdades", que como todos sabem são criadas por esse perverso mercado e pelo ainda mais perverso capitalismo.
Ah, se não fossem os companheiros corretores das desigualdades estruturais, nos viveríamos eternamente numa sociedade injusta, cheia de pobres e desvalidos, quando não oprimidos, e teríamos de aguentar, além da miséria da massa e a possível inveja da "burguesia do capital alheio", o nosso próprio remorso, por sermos tão ricos -- eu, por exemplo, não tenho muito dinheiro no banco, mas devo ter pelo menos 5 mil livros -- e os outros tão pobres.
Ops, isso me lembra o título de dois outros livros, clássicos. O primeiro é de um tal de Adam Smith, tenho certeza de que vocês já ouviram falar dele, o tal de "pai da economia política", que proclamou (segundo alguns dos meus alunos), a tal de "teoria da mão invisível" (Senhor, perdoai aos inocentes) e afirmou que a base de toda a riqueza era a divisão do trabalho e a especialização (e eu aqui querendo saber de tudo ao mesmo tempo... que pobreza de espírito). O segundo é um tal de David Landes, que aproveitou o título do Smith, sobre A Riqueza das Nações, e aproveitou também para se questionar sobre a origem da pobreza das nações, que um tal de Jared Diamond acha que está na ecologia (ops, lá vem aqueles chatos com aquela conversa: "eu não disse?, eu não disse?").
Enfim, toda essa introdução caótica para introduzir (com perdão pela redundância e pelo conceito pornográfico), este pequeno texto sobre o mesmo assunto de meu amigo, colega, um dos meus intelectuais preferidos da diplomacia (é, parece que tem alguns, pelo menos), José Vicente Lessa.
Divirtam-se...
Paulo Roberto de Almeida

Nós, os injustos sociais
José Vicente Lessa
(Recebido, indiretamente, em 6/03/2013)

Confesso que o discurso sobre as “desigualdades sociais” é um dos temas que mais me aborrecem. Não porque seja ele enfadonho - longe disso -, mas em razão do envólucro politicamente “correto” e “progressista” que ele invariavelmente assume. O grande divisor de águas da discussão provém do fato de o “progressismo”, subproduto eufemístico do esquerdismo, não nos conceber como indivíduos, mas como categorias sociais. Assim, o pobre, o desvalido, a pessoa em situação (como eles gostam de dizer) de vulnerabilidade ou de precariedade socioeconômica, será sempre prisioneira de uma estrutura “perversa”, incapaz de dela se libertar por si mesma. Mas “incapaz” por quê? Ora, incapazes porque não são exatamente pessoas, mas categorias gerais!

Como se geram as desigualdades? Isto é facílimo de entender. Você, leitor, que adquiriu certa posição social, tem um bom emprego ou é um empreendedor de sucesso, é certamente, também, um injusto social. Quando você estudava, varava noites se preparando para o vestibular, trabalhava para custear seus estudos, frequentava aulas à noite, lia livros e aprendia novas habilidades, estava, sem se dar conta, cavando um fosso de desigualdades com relação a todos aqueles que preferiam ver telenovelas, conversar sobre futebol no bar da esquina, ou simplesmente coçar os “países baixos” à espera de que a sorte ou o governo viesse em seu socorro. Quanta injustiça você, leitor – e admito, eu próprio, minha culpa –, produziu nessa sua insana e estranha compulsão de melhorar de vida às próprias custas...

O problema todo está em que você e eu quisemos progredir como indivíduos. Este foi o nosso grande erro. Deveríamos todos ter ficado em casa, coçando..., como categoria social coletiva, à espera que o governo nos desse casa e comida, proclamando ser estes itens, afinal, nosso direito! Assim, se todos fôssemos “vulneráveis” e “precários”, estaríamos na mesma situação. Deixaria, enfim, de haver desigualdades.

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