Ela tinha razão, embora não soubesse à época, mas como Churchill, se apegava à ideia da soberania monetária com a libra. Churchill presidiu a um desastre, em 1925-26, quando foi Lord of Exchequers, reintroduzindo a libra no padrão ouro no mesmo patamar do pré-guerra. MThatcher, por sua vez, não teve de enfrentar a séria crise do sistema monetário europeu, de 1992, quando a libra saiu do sistema (derrubado pela Alemanha, na verdade, embora não intencionalmente) e desvalorizou.
Mas ela tinha certos conceitos econômicos muito bem arraigados, o que poderia ter sido lembrado por Celso Ming: não gastar acima do que você ganha, era um deles, típico de quitandeiro, o que ela era, mas sólido e válido, inclusive para o Brasil...
Paulo Roberto de Almeida
A dama do não
Os líderes da Europa no final dos anos 80, especialmente o então chanceler da Alemanha, Helmut Kohl, e o presidente da França à época, François Mitterrand, tinham perfeita noção de que, sem união fiscal (controle central dos orçamentos) e sem união política (controle central do poder e das principais decisões de governo), o euro seria lançado com graves defeitos de fabricação.
O prêmio Nobel de Economia (de 1999) Robert Mundell, já então reconhecido como grande autoridade em moeda, havia deixado claro que o euro nasceria sem um Estado que lhe desse consistência. Os países que a ele aderiam não constituíam uma área monetária ótima - para ficar com a principal expressão criada por Mundell.
Kohl, no entanto, teve a percepção de que o defeito mais grave não era a inconsistência do euro, mas a ausência de unidade da Europa. E entendeu que a crise que eventualmente proviesse da inconsistência da moeda única acabaria por disparar as forças em direção à unidade orçamentária e política. A motivação de Mitterrand parece ter sido outra: uma vez adotada a moeda única, a Europa acabaria por absorver a Alemanha e as ameaças históricas que tantas vezes nasceram dentro dela.
Thatcher não ignorou que, apesar dos seus vícios de origem, o euro poderia ser bem sucedido, como previa Kohl. Nessas condições, a economia do Reino Unido corria o risco de perder densidade e os demais ganhos de escala que proviessem da circulação da moeda única.
Ainda assim, Thatcher preferiu não aderir ao euro. Decidiu abrir mão do direito de influenciar no processo de constituição do Banco Central Europeu e das demais instituições criadas com o euro. O Reino Unido haveria de renunciar à libra esterlina apenas quando o euro estivesse consolidado.
A decisão foi fortemente criticada na Inglaterra, sobretudo dentro do Parlamento. Dizia-se que a política de Thatcher consolidava a tendência a um perigoso isolamento, à custa de crescimento econômico e da perda de empregos. Mas ela permaneceu firme. O Reino Unido ficou de fora.
Depois de tudo o que aconteceu a partir de 2008; depois que se viu que economias tão pequenas, como Irlanda, Portugal e Grécia, foram capazes de abalar o euro; depois da paralisação da atividade econômica e do desemprego recorde no bloco, mais e mais os ingleses passaram a dar razão a Thatcher: "Foi quem salvou o Reino Unido do desastre".
Apesar de tudo, os sonhos de Kohl e de Mitterrand ainda se mantêm válidos. Ninguém mais duvida de que só a união dos orçamentos e a união política serão capazes de dar consistência ao euro. Quando isso acontecer, e apenas se acontecer, a política de cautela adotada por Margareth Thatcher poderá ser superada.
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