No finalzinho de 2003, como é meu hábito todo final de ano, eu elaborei minhas "previsões imprevidentes" para 2004, neste caso adaptadas como resoluções presidenciais para o ano que se iniciava.
Como de hábito, também, eu não acreditava que elas fossem cumpridas e achava que a maioria permaneceria totalmente intocada.
Com exceção da questão dos transgênicos -- terreno no qual o agronegócio conseguiu reverter a posição absurda dos conselheiros ecochatos da presidência -- creio que todas as demais recomendações permanecem válidas, por serem pertinentes e por estarem ainda totalmente intocadas. No que se refere ao imposto único, a despeito de seus efeitos deletérios sobre a economia -- pelos efeitos cumulativos, em cascata -- ele poderia ser uma solução de transição, desde que fosse substituir todos os impostos federais e vários estaduais, como o absurdo do ICMS, mas creio que no computo global não seria uma solução. Proponho agora uma redução linear, escalonada e gradual, de TODOS os impostos, como preparação a uma discussão sobre a reforma fiscal. Tampouco creio que vai vir.
Não custa lembrar: o Brasil perdeu mais de dez anos nas NÃO reformas.
Quem sabe algum estadista resolve assumir as tarefas?
Neste início de 2014, dez anos depois de minhas recomendações, continuo NÃO acreditando que elas venham a ser cumpridas, sequer tocadas,
any time soon...
Paulo Roberto de Almeida
Resoluções de Ano Novo
Sete tarefas presidenciais
que não serão feitas
19 de dezembro de 2003
Fim de ano: revisamos nossos erros e
adotamos resoluções para o novo ano, com a ajuda do anjo da guarda. Presidentes
também têm anjo da guarda, aliás vários: cortesãos, mordomos, seguranças e até
mesmo algum conselheiro bem intencionado.
O nosso presidente também deve estar
pensando em sua lista de obras a cumprir neste ano do espetáculo do
crescimento. Para ajudá-lo, resolvi imaginar sete resoluções que ele poderia
cumprir nos próximos doze meses, com um único senão: tenho absoluta certeza de
que nenhuma delas será cumprida e várias sequer tocadas.
1) Fazer um ministério manejável
Esqueça: o que vai sair será um
arremedo de reforma ministerial, com promoção dos incompetentes a algum outro
cargo e uma abertura para o partido “saco de gatos”. O ideal seria uma super
reforma, com redução à metade do número de ministérios, cartão vermelho para os
titulares incapazes e incorporação de alguns técnicos competentes que hoje
estão no banco de reservas.
2) Reforma tributária que diminua a carga
fiscal
Seria
pedir muito? Afinal a reforma começou com grandes promessas de fim da guerra
fiscal, desoneração do setor produtivo e racionalização do caos impositivo.
Virou tragédia no final de 2003 e promete ser a comédia de 2004. Já que não há
entendimento sobre uma estrutura ideal, porque não pensar naquele imposto único
sobre transações?
3) Aprofundar a reforma previdenciária
Podem
reclamar os servidores públicos, mas ainda não se terminou de cortar
privilégios. Uma nova reforma previdenciária é absolutamente indispensável para
fazer o Brasil crescer em bases sustentáveis. O setor continua produzindo
deficits que serão pagos por nossos filhos e netos. É essa a herança que o
presidente pretende deixar?
4) Reforma laboral de flexibilização
Quase
a metade da força-de-trabalho está na informalidade, à margem de qualquer
proteção ou regime previdenciário. Pequenas e médias empresas que poderiam
contratar muito mais não o fazem por causa de uma legislação trabalhista
decrépita e com alto viés de proteção formal e nenhuma garantia de
empregabilidade. Presidente: enfrente os sindicatos e promova uma limpeza geral
na legislação e deixe patrões e trabalhadores resolverem suas relações em bases
contratuais. Estou sonhando mais uma vez?
5) Autonomia do Banco Central com
Conselho Monetário ampliado
Esses
conselheiros que dizem que a independência do BC será o fim da soberania
monetária devem entender tanto de câmbio e juros quanto eu de física nuclear.
Promova a autonomia e pare de ouvir reclamações do vice-presidente, dos
empresários da FIESP e dos economistas de oposição. Aí poderá dizer: “o assunto
não é mais comigo, juros são resolvidos por um Conselho Monetário de dez
membros, escolhidos de comum acordo com o Congresso dentre economistas
acadêmicos e burocratas do governo, com mandato fixo mas revogável pelo
Senado”.
6) Lei de biossegurança não
esquizofrênica
Sinceramente,
que papelão esse projeto do governo sobre transgênicos. Paralisou todo o
sistema de pesquisa em biotecnologia e pode fazer metade da agricultura
deslizar para a ilegalidade. Liberte-se desse bando de ecochatos e coloque-se
do lado da ciência e da tecnologia, como convém a um presidente moderno e
esclarecido.
7) Aprofundar o superávit primário para
rebaixar os juros
O
superávit de 4,25% está estrangulando os gastos sociais? Essa economia, na
verdade, representa apenas uma parte do déficit real, que continua sendo
criado, pelo fato de o governo gastar mais do que deveria ou porque acumulou
dívidas que cabe remunerar ou amortizar. Um superávit menor significa que o
governo renuncia a controlar os seus gastos, continuará sendo irresponsável e
vai deixar um grande buraco para a sociedade. O correto seria aumentar o
superávit (o governo precisa começar a produzir superávits nominais, para
diminuir a pressão da dívida), única garantia de que os juros baixarão para
níveis civilizados. Os que negam é porque vivem de juros ou recomendam um
calote nos banqueiros. Crie coragem e diga ao Palocci para aumentar o superávit
para perto de 5%. Pense que o Estado tem de deixar de ser um peso para
empresários produtivos e uma mãe para os banqueiros e especuladores.
Aí
estão: sete pequenas resoluções que representam sete grandes revoluções na
forma de fazer política e de praticar economia no novo Brasil inaugurado em
2003 (mas que ainda não deu a partida de verdade, segundo o presidente). Sei
que é duro ter de descontentar políticos, banqueiros, funcionários públicos, juízes,
políticos, ecologistas e economistas utópicos da universidade. Por isso mesmo
já disse ao início que as sete tarefas não serão cumpridas, por mais que elas
sejam benéficas para o povo e podem fazer a felicidade geral da nação. Em todo
caso, não custa nada fazer nossa própria resolução de ano novo e esperar que o
presidente a cumpra. A minha lista está aí. A conferir no final de 2004.
Brasília, 19 de
dezembro de 2003
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Continuamos esperando...
PRA
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