A economia e a política do
Brasil em tempos não convencionais
(nunca antes mesmo...), 6
Paulo
Roberto de Almeida
Palestra
na UnB: 24/04/2014, 19hs
Em
voo, de Bradley a Atlanta, e a Brasília, 17-18/04/2014
(continuação da parte
anterior)
E as novas elites: quem
são elas, o que fazem elas?
Qual a diferença entre as velhas elites, hoje submissas, e as novas
elites? As antigas elites brasileiras viviam SOB o Estado, ao passo que as
novas elites, vivem DO Estado, PARA o Estado, PELO Estado, COM o Estado. A nova
classe, a Nomenklatura do partido neobolchevique, parece ter a intenção de
manter indefinidamente o controle do Estado, se possível exclusivamente, se não
der, em coalizão, desde que ela mantenha a hegemonia do processo decisório e
dos mecanismos pelos quais fluem os recursos. As antigas elites obtiveram do
Estado o que necessitavam para sobreviver e prosperar: proteção à indústria
infante, subsídios setoriais generosos, políticas acomodatícias, como a lei do
similar nacional, tarifas comerciais sempre defensivas, em todo caso muito
elevadas, fechamento quase completo da economia e, como consequência de tudo
isso, um grande mercado interno cativo, passivo, ao seu inteiro dispor. Elas
desfrutaram do Estado varguista, que foi também o Estado dos militares, os
mesmos que derrubaram Vargas, mas que continuaram a sua obra econômica,
aperfeiçoaram o Estado interventor e o levaram aos seus extremos. Tem gente que
adora esse tipo de coisa.
Os militares, tanto nos anos 1930-45, quanto no período 1964-85
fizeram no Brasil aquilo que Stalin estava fazendo na União Soviética com o seu
socialismo num só país: eles praticaram o que pode ser chamado de stalinismo
industrial, e construíram um sistema integrado verticalmente, pouco dependente
do exterior, com um índice de nacionalização da oferta interna poucas vezes
visto em outras experiências desse tipo: ao final do regime militar, o “made in
Brazil” representava provavelmente perto de 95% dos produtos de consumo. Os
militares praticaram esse capitalismo num só país em benefício de grandes grupos
nacionais, de algumas multinacionais integradas a esse espírito industrial e em
benefício do próprio Estado, obviamente.
E as nossas novas elites? Quem
são, o que fazem, como vivem, do que vivem? Elas não são mais, obviamente,
aqueles coronéis de chapelão, aqueles burgueses de cartola e charuto (mas as
novas não dispensam os charutos cubanos), elas não são mais os industriais que
se beneficiaram do stalinismo industrial praticado tanto pelo Estado varguista quanto
pelo regime militar. As novas elites, quando ainda não eram tão ricas quanto
hoje – mas elas já eram, de certa forma, elites, ainda que do tipo da
aristocracia operária que conhecemos bem, ou como guerrilheiros reciclados que também
sabemos quem são –, nos velhos tempos do Ancien Régime burguês (desculpem a
contradição nos termos), essas novas elites que se tornaram velhas antes do
tempo viviam às turras com o Estado burguês, com a sociedade capitalista,
imaginem vocês. Antes desses tempos de fim da História, elas pretendiam – vejam
que pretensão – derrocar o Estado burguês, aplastar o capitalismo perverso, e
colocar em seus lugares respectivos o glorioso Estado proletário e o modo de
produção socialista, com algumas loucuras maoísta em complemento.
Patriotas equivocados, como diria o Partidão – e eu fui um deles –,
ou ainda, guerrilheiros improvisados, brincando de mocinho e bandido com os
gorilas da ditadura militar. Fomos derrotados, obviamente, embora eu
continuasse a lutar contra o regime militar até o final, ainda pensando em
construir o socialismo, mas já numa feição mais democrática, à face humana como
se dizia na ocasião, para distinguir do sovietismo já esclerosado, não mais dos
tempos do stalinismo com Gulag, que funcionava apenas na base da repressão a
dissidentes e internação em clínicas psiquiátricas. Eu já tinha feito minhas
observações ao vivo, tendo morado num dos socialismos reais durante breve
tempo, mas visitado todos os outros socialismos, do real ao surreal, e conhecia
bastante bem os diversos capitalismos, do ideal ao perverso, como se encontra
na periferia.
Mesmo marxista, nunca fui fundamentalista, e sempre li meu Raymond
Aron ao lado de Marx e Sartre, e Roberto Campos para compensar os economistas
estruturalistas e keynesianos a que estávamos acostumados na faculdade. Ou seja,
fiz o meu dever de casa, aquilo que os camaradas do Partido Soviético chamavam
de autocrítica, algo que os companheiros atuais nunca fizeram. Isso me
habilitou a tirar certas conclusões, não apenas sobre o sentido da História,
como gostam de dizer os marxistas, mas também sobre as políticas públicas,
macroeconômicas ou setoriais, que funcionam e as que não funcionam. Minhas
conclusões são muitas, mas eu vou me ater às características das novas elites.
(continua)
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