A economia e a política do
Brasil em tempos não convencionais
(nunca antes mesmo...), 8
Paulo
Roberto de Almeida
Palestra
na UnB: 24/04/2014, 19hs
Em
voo, de Bradley a Atlanta, e a Brasília, 17-18/04/2014
(continuação da parte
anterior)
Existe saída do fascismo
corporativo já instalado entre nós?
Não gostaria de terminar por uma nota pessimista, mas, leitor da
História, sempre penso nos possíveis paralelos, ou analogias em torno da
decadência de certos países, aliás algumas grandes civilizações. Três exemplos
contemporâneos me veem à mente – e deixo de lado a Roma dos Césares e o império
otomano – e me detenho nos casos da China, da Grã-Bretanha e da Argentina.
A China foi, outrora, o Estado weberiano mais avançado do mundo,
muito antes de Weber obviamente, uns quatro mil anos antes, a civilização mais
refinada, na vanguarda das descobertas científicas e das invenções práticas: a
bússola, o papel, a pólvora, o spaghetti e várias outras mais, sem esquecer o
kung fu. No entanto, a China decaiu, durante dois ou três séculos, sendo
humilhada pelas potências ocidentais e esquartejada pelo militarismo japonês.
Como isso foi acontecer? Parece que bastou um imperador idiota que resolveu
fechar a China aos estrangeiros, privando-a da revolução industrial e de outras
inovações importantes, sobretudo no terreno militar. A cupidez de hordas de
mandarins empenhados em assaltar o Estado, e os camponeses, fez o resto. Bem,
parece que nós já temos os mandarins, sem ter tido civilização sofisticada...
Pensem na Grã-Bretanha, não o império britânico, mas a pequena ilha
que Deus na Mancha ancorou, como diria nosso poeta condoreiro. Depois de
oferecer ao mundo o know-how da revolução industrial, ela estagnou, e foi
ultrapassada pela Alemanha e pelos Estados Unidos, e vários outros, inclusive
por sua colônia de Hong Kong. Não foram só os socialistas Fabianos que a
inviabilizaram: conservadores também se renderam aos mitos do Estado de
bem-estar social, da nacionalização, ou estatização, dos serviços públicos, e
por aí veio a decadência. Ela declinou durante o pós-guerra, até que uma dama
de ferro conseguisse resgatá-la de uma condição de terceira classe, invertendo
um declínio que parecia inevitável.
Mirem os hermanos, aqui ao
lado, que já foram muito ricos, cem anos atrás, aliás mais ricos do que vários
europeus, com 70% da renda per capita dos americanos, já então o povo mais rico
do planeta (o que não é o caso atualmente). Primeiro, eles foram sequestrados
por um caudilho fascista, depois pela esposa, mesmo mumificada, e ainda hoje
são reféns mentais de dois cadáveres, cultivados pelas máfias sindicais e por
políticos medíocres, que continuam afundando a Argentina, contra toda lógica e
contra toda racionalidade instrumental. Também tem o caso de um outro caudilho
fascista, mais acima, que conseguiu destruir a economia do país mais rico da
região, mesmo se à base de uma vaca petrolífera que só confirma a maldição do
petróleo, que espero não se abata sobre o Brasil.
Seriam capazes, os companheiros, de nos arrastar para trás, como o
fizeram os mandarins chineses, os Fabianos britânicos, a máfia sindical do
peronismo argentino e os socialistas anacrônicos do chavismo moribundo? Talvez!
Em todo caso, eles são tão incompetentes economicamente – ainda que espertos politicamente
– quanto os êmulos de outras decadências. Eles não apenas sonham, como já
praticam o fascismo tropical, qualquer que seja o rótulo sob o qual escondem os
seus intentos e instintos. Eles só não conseguiram, ainda, desmantelar o
Brasil, como o fizeram esses companheiros de outras paragens, não porque não
queiram, mas porque não podem, temporariamente, ao menos. Mas eles já
conseguiram arrastar o Brasil para trás, atrasá-lo, em mais de uma vertente.
Economicamente, eles conseguiram a proeza de desmentir Keynes,
produzindo inflação sem qualquer crescimento: o Brasil cresce hoje menos do que
a média da região, e mundial, e três vezes menos do que os emergentes
dinâmicos. Politicamente, eles conseguiram submeter vários órgãos do Estado: o
Congresso, certamente, várias, ou todas, as agências públicas, sem nenhuma dúvida;
eles avançam sobre o Judiciário e desmoralizaram até as Forças Armadas,
acusadas de todos os crimes do período militar sem que eles assumam a
responsabilidade pela precedência dos ataques a quartéis que provocaram a sanha
dos militares contra si. Socialmente, estão criando um Apartheid no país, com
suas políticas racistas de divisão do país. Moralmente, também, conseguiram
desmoralizar a ética pública, tentando colocar todo mundo na mesma indústria de
corrupção que foi aperfeiçoada a partir da corrupção artesanal que era comum
nos meios políticos. O retrocesso é mental, por fim, já que a própria burguesia
industrial e os banqueiros de pés juntos rendem visitas ao grande chefe, implorando que ele coloque
um pouco de ordem na bagunça feita por companheiros menos competentes (e que na
verdade tinha sido criada exatamente pelo próprio guia genial dos povos).
Lamento ter de terminar assim, mas é um fato que eu vejo sinais
profundos de decadência institucional se espalhando por vários poros do Estado,
e se disseminando pela sociedade. Nunca antes eu tinha encontrado, nos meus
retornos regulares ao país, tal estado de desalento, de desconforto, de falta
de rumos. Não existe outra conclusão possível: nosso país continua servido por
elites incompetentes, inclusive na oposição. Nossas elites, as velhas e as
novas – aliás aliadas na promiscuidade política – seguem arrastando o Brasil
para trás.
Até quando isso será possível? Sinceramente, eu não sei. Toda
situação de crise, ou de retrocesso, requer, em primeiro lugar, um diagnóstico
correto, para depois se pensar em aplicar as prescrições adequadas. Não
pretendi oferecer aqui um diagnóstico científico da situação brasileira, apenas
quis transmitir minha percepção sobre o estado atual da nação. Meu diagnóstico,
por certo impressionista, é apenas este: nossas elites padecem de atraso
mental. Isso se corrige, mas costuma passar por algumas crises e um doloroso
processo de reformas. Que isso venha o quanto antes!
[Em voo, Bradley-Atlanta-Brasília, 17-18 de
abril de 2014]
FINAL DA PALESTRA
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Textos que guardam relação com o
diagnóstico feito acima:
2035. “De la Démocratie au
Brésil: Tocqueville de novo em missão”, Brasília, 10 agosto 2009, 10 p.
Resumo de relatório da missão ao Brasil empreendida por Alexis de Tocqueville,
a pedido do Banco Mundial, para determinar a situação do Brasil em termos de
democracia e de economia de mercado. Antecipa relatório detalhado, que poderá
ser preparado na categoria dos clássicos revisitados. Publicado na Espaço Acadêmico (ano 9, n. 103,
dezembro 2009, p. 130-138; ISSN: 1519-6186; http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/8822/4947).
Revista Espaço da Sophia (ano 3, n.
33, dezembro 2009). Postado no blog Diplomatizzando (12/07/2011; link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2011/07/tocqueville-de-novo-em-missao-o-brasil.html).
Relação de Publicados n. 939.
2116. “O Direito, a Política e a Economia das Relações
Internacionais do Brasil: Uma abordagem não-convencional”, Brasília, 19
fevereiro 2010, 8 p.; revisto 20.03.2-10. Texto suporte para palestra-debate na
abertura dos cursos de Direito, Ciência Política, Economia e Relações
Internacionais da UnB, no dia 22.03.2010. Postado no site pessoal (www.pralmeida.org/05DocsPRA/2116PalestraDebateAcadem.pdf).
Revisto em 25/03/2010 em Lisboa, para publicação, sob o título de “A coruja de
Tocqueville: fatos e opiniões sobre o desmantelamento institucional do Brasil
contemporâneo”, em Espaço Acadêmico
(ano 9, n. 107, abril 2010, p. 143-148; ISSN: 1519-6186; link: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/9800/5484).
Relação de Publicados n. 958.
Fim
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