Paulo Roberto de Almeida
Opinião
Respostas à altura
da crise
Armínio Fraga Neto
O Globo, 13/09/2015
Com frequência se diz
por aí que nunca se viu situação econômica tão ruim quanto a atual. Discordo.
Entre 1982 e 1993, a “década perdida” do caos da hiperinflação e da moratória
externa, o Brasil amargou queda na renda por pessoa de cerca de 1% ao ano!
Mas o Brasil vive
hoje, sim, uma crise grave, que escancara as consequências do modelo político e
econômico atual.
Esse modelo se
caracteriza pela captura, pelo agigantamento, pela incompetência e falência do
Estado. Captura por interesses partidários e privados, que sem nenhum escrúpulo
montaram não um, mas dois enormes esquemas de corrupção voltados para sua
preservação no poder e enriquecimento pessoal. Agigantamento porque o gasto
público se aproxima de 40% do PIB, um número elevado, especialmente para um
país de renda média. Incompetência, por não entregar os serviços de qualidade
que a sociedade demanda, apesar dos recursos despendidos. E falência pela perda
da disciplina fiscal, fator que pesou na recente perda do grau de investimento,
com destaque para a admissão pelo próprio governo de sua incapacidade de manter
um superávit primário capaz de evitar a explosão da dívida pública.
Estamos em maus
lençóis, pois não há na História caso de país que se tenha desenvolvido
plenamente sem um Estado decente, eficaz e solvente.
Outras
características do atual modelo econômico incluem elevado grau de dirigismo,
claro desprezo pela eficiência em geral, e pelo mercado em particular, relativo
isolamento do mundo, má alocação do capital (em boa parte feita pelos bancos
públicos), políticas setoriais mal desenhadas, um sistema tributário complexo,
que distorce e encarece a atividade empresarial, e um aparato regulatório
desprestigiado e em alguns casos mal tripulado. Não surpreendentemente, a
produtividade da economia vem sofrendo bastante.
As consequências
disso tudo, em boa parte previsíveis, estão aí, visíveis a olho nu: juros
estratosféricos, incerteza elevada, baixo investimento (especialmente em
infraestrutura), profunda recessão e, o que é pior, uma economia incapaz de
crescer. Os impactos sociais já se fazem sentir e tendem a se agravar. A esta
altura não se pode descartar a hipótese de que o segundo mandato da presidente
Dilma Rousseff seja o início de uma nova década perdida.
Esta crise requer
tratamento proporcional ao seu tamanho. Isso não tem sido possível em razão de
barreiras ideológicas e de incompetência, além das naturais dificuldades de um
governo corrigir algo feito por si mesmo, e da crise política, que deve
perdurar.
Não surpreende,
portanto, que a atual resposta à crise não venha obtendo bons resultados,
limitando-se, na prática, a alguma austeridade fiscal, ao aperto monetário
(posto que a inflação está há tempo bem acima da meta), à liberação de preços e
ao anúncio de algumas boas reformas, no geral não implantadas. Ao mesmo tempo,
medidas irresponsáveis do ponto de vista fiscal vêm sendo aprovadas, como o
Plano Nacional de Educação (tema crucial, solução inadequada) e a revogação do
fator previdenciário. Ademais, a queda nos preços das exportações e as
paralisantes implicações de curto prazo da mais do que bem-vinda Lava Jato
agravam ainda mais o quadro.
Com o intuito de
ajudar a mapear os desafios no campo econômico, e sem ilusões quanto à superior
importância da política em fazer as opções certas e conduzir o processo, listo
abaixo dois conjuntos de respostas à crise. Se posto em prática, o primeiro
sinalizaria o entendimento do Executivo e do Legislativo quanto à gravidade da
situação. O segundo lista algumas questões mais fundamentais para que o Brasil
volte a crescer e se desenvolver. As dificuldades de se efetuar um ajuste
fiscal rápido são bem conhecidas: recessão, rigidez do gasto e a já elevada
carga tributária.
Acredito que uma
forma de ganhar tempo e afetar positivamente as expectativas seria compensar um
inevitável gradualismo no ajuste com medidas que afetem positivamente a
solvência do País no longo prazo. Outro campo fértil é o lado da produtividade,
de natureza mais microeconômica, que merece bem mais espaço do que tenho aqui hoje.
Medidas
emergenciais:
1) Metas de saldo
primário de 1%, 2% e 3% do PIB para os próximos três anos, baseadas em
premissas realistas e em receitas recorrentes (as metas atuais não estão sendo
cumpridas e de qualquer forma são insuficientes).
2) Aprovação da
idade mínima de 65 anos para a aposentadoria de homens e mulheres (para
gerações futuras) e reaprovação do fator previdenciário.
3) Desvinculação do
piso da Previdência do salário mínimo (a vinculação é cara e regressiva).
4) Introdução de um
limite para a dívida bruta do governo federal como proporção do PIB.
5) Reforma do
PIS/Cofins e do ICMS já proposta, acrescida da unificação e simplificação das
regras do ICMS (por muitas razões, inclusive a integração interna do País).
6) Mudança das
regras trabalhistas também na mesa (em que o negociado se sobrepõe à lei).
7) Aumento da
integração do Brasil ao mundo (um primeiro passo seria transformar o Mercosul
em zona de livre-comércio).
Sem algo nessa
linha a crise deve se aprofundar e alongar.
Medidas mais
fundamentais relativas ao Estado:
1) Discussão sobre o
tamanho e as prioridades do Estado (requer limite ao crescimento do gasto, o
que, por sua vez, demanda as reformas abaixo).
2) Fim de todas as
vinculações e adoção de um Orçamento base zero (sem prejuízo de espaços
plurianuais, nunca permanentes).
3) Meritocracia e a
boa gestão no setor público.
4) Revisão da
cobertura da estabilidade do emprego no setor público.
5) Revisão do
capítulo econômico da Constituição (adotar a economia de mercado. Qualquer
interferência do Estado deverá ser justificada e seus resultados posteriormente
avaliados).
Sem algo nessa
linha o Brasil dificilmente se desenvolverá plenamente.
*Armínio Fraga
Neto é economista
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