Revista Política Externa Independente
Editor José Honório Rodrigues
Abro a p. 3, Apresentação, da revista "Política Externa Independente", feita pelo historiador José Honório Rodrigues, que só teve três números, infelizmente, que felizmente pude reler graças a meu amigo e colega diplomata Achilles Emílio Zaluar Neto, atual embaixador do Brasil em Damasco, corajoso como ele é.
Em visita que me fez na última segunda-feira 8/08/2016, ele me deu os dois primeiros números da PEI, que encontrou num sebo e me presenteou pois sabia do meu interesse e dedicação a esse tipo de material relevante para o estudo de nossas relações internacionais.
Independentemente de outros comentários que eu possa fazer sobre a revista, e seus densos artigos (os quais pretendo scannear e digitalizar), formulo, neste momento, apenas dois comentários que considero reveladores da alta consciência e de certa paranoia exibida por nossos melhores intelectuais em relação à posição do Brasil no sistema internacional.
Pois bem, o que diz JHR na abertura da nova revista (maio de 1965):
"Uma correta avaliação dos problemas da política internacional constitui premissa de vital importância para a formulação e execução de uma política externa brasileira ajustada ao interesse nacional."
Corretíssimo, impecável.
Mas, logo em seguida, JHR começa a escorregar naquela tradicional paranoia, ou teoria da conspiração, dos brasileiros, em face das grandes potências, o que Nelson Rodrigues chamaria de "complexo de vira-latas".
O que ele diz no segundo parágrafo? Isto:
"Afirmar essa importância fundamental da política internacional significa reconhecer que, a cada instante, o destino do Brasil está sendo decidido nas chancelarias das grandes potências, nos centros financeiros e comerciais das nações ricas, nas universidades dos países desenvolvidos. (...) Na verdade, a vida de milhões de brasileiros é condicionada, é manipulada, a toda hora, em Washington, Londres, Paris, Bonn ou Moscou."
Em que pese o papel fundamental de José Honório Rodrigues no desenvolvimento da historiografia nacional, e sua clarividência na análise de nossa diplomacia passada, creio que ele peca, nesse tipo de argumento, contra o que ele mesmo colocou no primeiro parágrafo de sua apresentação ao número inaugural da revista por ele dirigida, infelizmente cortada no seu terceiro número.
Se ele tivesse feito uma análise correta do sistema internacional, saberia que o nosso destino estava sendo determinado basicamente por nós mesmos, e que a pretensa manipulação externa sobre nossos assuntos internos é um tipo de imaginação equivocada sempre mantida pela nossa esquerda -- e ele fazia parte da tribo, sem qualquer demérito, aliás -- e que em nada contribui para um correto posicionamento da política externa.
Quem se considera manipulado do exterior, vai sempre reagir negativamente a quaisquer ações ou propostas dessas grandes potências, se fechando num tipo de reação defensiva que representa o início do enclausuramento, do protecionismo defensivo (por vezes agressivo), do nacionalismo primário, que eu chamo de rastaquera, de um tipo de autismo e de endogenia que só podem ser danosos, prejudiciais, ao nosso desenvolvimento e nosso relacionamento exterior.
Creio que Moniz Bandeira não diria outra coisa sobre nossa diplomacia, e todo mundo sabe do que estou falando.
Lamento esse tipo de pensamento, ainda que eu possa saudar JHR pelo seu papel como historiador e grande "vulgarizador" -- no mais alto sentido da palavra -- da nossa diplomacia.
E mais uma vez, grato ao Achilles Zaluar por este magnífico presente.
A revista tem diversos artigos importantes sobre nossa diplomacia dos anos 1960.
Salve Achilles.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10/08/2016
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