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terça-feira, 30 de agosto de 2016
Crise politica na Venezuela recrudesce na vespera de manifestacao oposicionista
Governo suspende prisão domiciliar do ex-prefeito Daniel Ceballos e proíbe voo de jatos particulares no país por uma semana
ALFREDO MEZA
Caracas 29 AGO 2016 - 18:34 BRT
A Venezuela viverá nesta quinta-feira um novo capítulo de sua infindável polarização. A oposição planeja ocupar as ruas de Caracas, a capital, com uma passeata que partirá de vários locais, confluindo para se concentrar em seu feudo, a região leste da cidade, para exigir que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) acelere a realização do plebiscito revogatório do presidente Nicolás Maduro. O Governo, por sua vez, também decidiu sair às ruas, em um esforço de mobilização para tentar se contrapor ao repúdio à sua gestão anunciado pelas pesquisas e agitando a bandeira da existência de um possível golpe de Estado em curso contra si, recurso clássico do chavismo quando a temperatura do conflito aumenta no país.
O Governo organizou um dispositivo para a venda de alimentos controlados, que se tornaram escassos devido às condições impostas pelo seu próprio modelo econômico, e anunciou “a ocupação da Venezuela”. A expectativa é de que, nesse dia, seus simpatizantes se concentrem nas praças públicas e avenidas em todas as cidades do país. Os funcionários mais leais a Maduro reiteraram as ameaças de demitir altos cargos de sua administração que respaldaram uma saída antecipada de Maduro.
No sábado, o Governo deu sinais de que parece estar levando muito a sério as manifestações de quinta-feira. Durante a madrugada, membros do Serviço Bolivariano de Inteligência invadiram a casa de Daniel Ceballos, ex-prefeito de San Cristóbal e considerado o número três do Partido Vontade Popular, organização dirigida pelo famoso oposicionista Leopoldo López, para executar a ordem de um tribunal de suspender a sua prisão domiciliar. Horas depois, o Ministério da Justiça emitiu uma nota em que afirmava ter descoberto que Ceballos, um dos líderes das violentas manifestações ocorridas no primeiro semestre de 2014, planejava fugir para coordenar “ações violentas” na clandestinidade a partir de 1 de setembro. Ceballos foi, então, recolhido a uma penitenciária na região central da Venezuela.
Uma parte da mais alta direção do partido de López –o prefeito David Smolansky e os deputados Luis Florido e Freddy Guevara—também está sendo ameaçada de prisão, segundo denúncia veiculada no Twitter pelo presidente da Assembleia Nacional, Henry Ramos Allup. O regime está convencido de que a Vontade Popular tem conseguido convencer o restante da oposição a transformar uma manifestação como a de quinta-feira em um pretexto para derrotar Maduro. Florido, que é também presidente da Comissão de Política Externa do Parlamento, afirmou que o governo planeja criminalizar a chamada “ocupação de Caracas”.
Durante todo o dia de sábado, esperava-se que o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, preso em sua residência desde 2014 após os violentos incidentes do primeiro semestre daquele ano, também fosse transferido, como Ceballos, para uma penitenciária. Apesar das medidas especiais adotadas pelos responsáveis por sua segurança, o rumor não se concretizou.
O Governo dos Estados Unidos se disse “profundamente preocupado” com a decisão de se colocar Ceballos novamente na prisão. Em nota divulgada neste domingo, o porta-voz do Departamento de Estado, John Kirby, condenou a manobra, vista por Washington como “uma tentativa de intimidar e impedir o direito dos venezuelanos de expressar a sua opinião livremente em 1 de setembro”; o documento exige a “imediata libertação” de Ceballos. “Em uma sociedade democrática, não há espaço para usar os instrumentos do Estado com o objetivo de intimidar e silenciar a oposição política”, diz a nota.
Suspensão de voos particulares
O Instituto Nacional da Aeronáutica Civil acrescentou mais lenha na fogueira daqueles que avaliam que o governo quer evitar que se façam registros visuais para mostrar a dimensão da manifestação marcada para esta quinta-feira. Desde sábado, estão proibidos os voos de jatos particulares e de drones em todo o território venezuelano. A medida é válida até o dia 5 de setembro.
Na ausência de explicações oficiais, o argumento referente ao temor do governo começa a ganhar corpo nas redes sociais e entre os analistas políticos. Foi uma medida surpreendente que visaria também, segundo essas interpretações, a evitar o deslocamento de dirigentes políticos estrangeiros para participar do protesto. A mulher de López, Lilian Tintori, havia anunciado na semana passada a presença, em Caracas, de representantes de várias organizações estrangeiras.
As expectativas criadas em torno da manifestação não repercutiram na disposição das autoridades eleitorais, que sempre aguardam pelo vencimento de todos os prazos estabelecidos pelo cronograma do plebiscito a fim de anunciar os passos seguintes. “A passeata da oposição não altera os nossos planos em nada”, afirmou a Socorro Hernández, integrante do CNE, alertando para o fato de que qualquer ocorrência violenta na manifestação poderá levar à suspensão do processo que pretende colocar um fim ao mandato de Maduro.
Segundo esse plano, o segundo passo do longo caminho da oposição será dado no fim de outubro. Durante três dias, em datas ainda não definidas, a oposição tentará recolher apoio de 20% do eleitorado para finalmente obrigar à convocação do plebiscito. Falta definir alguns detalhes para que essas datas sejam marcadas e anunciadas.
Duas integrantes governistas do CNE –a própria Hernández e Tania D’Amelio— defendem, porém, que cada uma das 23 províncias do país precisaria registrar pelo menos 20% de eleitores favoráveis à consulta para que esta seja convocada. Se essa condição prevalecer, será um novo marco na história da Venezuela para esse tipo de consulta popular. No processo anterior, convocado em 2004 contra o então presidente Hugo Chávez, o que se considerou foi o total de assinaturas recolhidas em todo o país, independentemente dos percentuais obtidos em cada região.
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