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sábado, 16 de setembro de 2017

Angus Deaton: contra a ajuda internacional, pela busca da riqueza (FSP)

 Já li o livro Prêmio Nobel, em formato Kindle, e considero-o bom, sem ser excelente. Essa preocupação de brilhantes economistas com a igualdade me parece uma questão de fundo moral, não diretamente econômica, mas apenas política, ou social. Economistas precisam trabalhar na criação de riqueza, e também podem investigar sua distribuição. Mas ficar prescrevendo como deve ser distribuída essa riqueza me parece uma função não econômica, ou seja, não estritamente técnica no plano do ferramental econômico. Torna-se uma questão de opinião pessoal.
Paulo Roberto de Almeida

"Ajuda a países pobres é tiro que sai pela culatra", diz Nobel
Folha de S. Paulo, 16/09/2017

 - "Imagine uma multidão, todas as pessoas do mundo, cada uma carregando a bandeira de seu país, como numa gigantesca cerimônia de abertura da Olimpíada", sugere o escocês Angus Deaton, premiado com o Nobel de Economia em 2015 por seus trabalhos sobre pobreza, consumo e bem-estar. É com imagens como essa que o economista consegue fazer um livro agradavelmente compreensível para o público geral, mesmo quando a discussão é bastante técnica – técnica o suficiente para interessar aos especialistas. Na alegoria olímpica, Deaton descreve a evolução econômica dos países. As pessoas avançam em uma velocidade proporcional à do crescimento de seus países: chineses e indianos correm, enquanto haitianos e congoleses (e brasileiros, recentemente) andam para trás. Mas a marcha é mais complexa: as velocidades variam também entre os cidadãos de um mesmo país. As bandeiras dos EUA se espalham da dianteira até muito atrás, se confundindo com outras. O mesmo fenômeno que distancia líderes de retardatários ocorre em várias nações. São minoria aquelas em que as bandeiras evoluem cada vez mais próximas. Se a marcha representa o caminho mundial em direção ao progresso e ao bem-estar, a humanidade está tendo sucesso nesse trajeto? Deaton, professor da Universidade de Princeton (EUA), é cético em sua resposta. 
Já no prefácio, remete ao filme "The Great Escape" ("Fugindo do Inferno", no título brasileiro), em que 250 soldados aliados escapam por um túnel de um campo nazista. No filme, a grande maioria é recapturada e 50 fugitivos acabam mortos. Na obra de Deaton, não faltam exemplos de progresso tecnológico ou econômico que deixam um rastro de desigualdade. Ele defende que a sociedade não se beneficia de regras e instituições que permitem a poucos enriquecer muito mais e pergunta o que mudar para que todos escapem da pobreza. As respostas, porém, não são simples, a começar pela dificuldade de computar crescimento econômico e bem-estar com precisão. O economista critica detalhadamente as medidas atuais de pobreza. (É uma pena que explicações tão didáticas e claras sejam acompanhadas por gráficos acanhados e de difícil leitura, tanto na edição on-line original quanto na impressa brasileira.) Um segundo problema é político, expõe Deaton. No capítulo sobre a crescente disparidade de renda entre os americanos, ele argumenta que não há igualdade de oportunidades e que decisões políticas estão sob domínio da elite financeira, num processo que reforça o enriquecimento do 1% mais rico e ameaça a democracia. O livro alerta para o fato de que, apesar do avanço médio geral, há quase 1 bilhão de pessoas que ainda patinam em miséria, desnutrição, doenças e morte precoce. E os programas de ajuda criados pelos países ricos pioram essa situação em vez de melhorá-la, afirma Deaton, porque inibem o desenvolvimento das instituições que fariam as nações se desenvolver por conta própria. "Precisamos parar de perguntar o que 'nós' deveríamos fazer. Quem 'nos' deu a responsabilidade de zelar por 'eles'? Nossas tentativas desastradas de ajudar têm feito mais mal que bem." Seria mais útil, diz ele, criar incentivos para pesquisa médica e científica que solucionasse problemas dessas populações, como a malária e a tuberculose, por exemplo.
Outra forma de combater a pobreza e a desigualdade entre países seria flexibilizar a imigração. Deaton nota que o dinheiro remetido por imigrantes a seus países natais supera em muito o das "ajudas financeiras", com uma diferença fundamental. Quando os recursos vão para as mãos das famílias, elas se fortalecem para exigir mais de seus governos. Já a ajuda internacional costuma chegar aos governos e tende a inibir sua eficiência. O professor de Princeton vê ameaças no futuro: mudanças climáticas, ataques fundamentalistas contra a ciência, novas doenças infecciosas e patógenos hiper-resistentes a antibióticos. A desaceleração do crescimento econômico também é danosa. Quando o bolo para de crescer, a única forma de manter o tamanho da fatia é reduzindo a dos outros, o que torna mais violentos os conflitos distributivos. Ainda assim, ele se diz "cautelosamente otimista": "O desejo de escapar está profundamente enraizado, e os meios para isso são cumulativos. Os próximos fugitivos podem subir nos ombros de gigantes. Alguns poucos privilegiados podem ter bloqueado o túnel pelo qual passaram, mas não podem bloquear o conhecimento de como cavar novos túneis.

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