Marx ainda tinha certa sofisticação, mas Lênin, apesar de um gênio político (para o mal, ou seja, para o poder absoluto), era um estúpido econômico, e quase destroi a economia da Rússia, que depois se transformou num escravismo contemporâneo sob Stalin.
Samuel Pessoa adota um enfoque mais light, ao criticar o desenvolvimentismo dos ingênuos, mas eu vou à raiz do problema, que é mesmo esse culto das máquinas e dos trabalhadores organizados associados ao coletivismo (socialismo, fascismo e outros fenômenos de intervencionismo estatal).
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 17 de setembro de 2017
Continuamos a ter visão ufanista errada do desenvolvimento
Samuel Pessôa
Folha de S. Paulo, 17/09/2017
República de bananas, para mim, sempre representou países com péssima institucionalidade. Dia sim e dia também, algum general -em geral de direita, mas às vezes de esquerda, com um bigodão, às vezes uma barba bem cultivada- tomava o poder em meio a um golpe militar.
A república de bananas se caracteriza pelas instituições frágeis.
Para boa parcela dos economistas brasileiros, o que caracteriza as repúblicas de bananas são as bananas, ou melhor, a exportação de matérias-primas.
Por esse critério, Chile, Canadá, Nova Zelândia e Austrália são repúblicas de banana.
Como em geral há relação entre desenvolvimento econômico e sofisticação tecnológica da pauta exportadora de um país -mas o que, como vimos, nem sempre é verdade-, muitos economistas brasileiros pensam que desenvolvimento econômico depende do que um país produz.
Não conhecem o trabalho espetacular do historiador Gavin Wright ("The Origins of American Industrial Success, 1879-1940", "The American Economic Review", 1990), que documentou que a pauta exportadora da economia americana até os anos 1920 era essencialmente de commodities. Ou seja, a economia americana era uma economia de bananas.
Ademais, inflam os números dos gastos do governo americano com a política de compras de produtos nacionais e com P&D. Se folheassem o "Cambridge Economic History of The United States", descobririam que a política industrial teve papel muito subsidiário no desenvolvimento americano.
Também verificariam que o grau de fechamento da economia americana da segunda metade do século 19 à segunda metade do século 20 foi elevado, mas não maior do que o grau de fechamento das economias latino-americanas, que, no Brasil, perdura até hoje.
Mas é sempre melhor ficar apegado a preconceitos do passado, que passam por cima de fatos como o de que a taxa de analfabetismo na Nova Inglaterra em 1750 era equivalente à brasileira de 1950.
A história econômica mostra que não há diferença na trajetória de crescimento da economia americana em comparação aos casos canadense ou australiano.
O maior desenvolvimento da indústria nos EUA é essencialmente consequência da maior escala da economia. População grande gera mercado, que naturalmente estimula o desenvolvimento da indústria. É por esse motivo que a economia americana tem mais indústria do que a australiana.
Enquanto lutamos contra as bananas, jogamos R$ 400 bilhões no lixo de incentivos do BNDES, política que os estudos mostram contribuiu para elevar os lucros de algumas grandes empresas, mas não elevou o investimento, outros tantos com uma política desastrada de conteúdo nacional, que lembra a lei "do similar nacional" do nacional-desenvolvimentismo, e tantas outras oportunidades perdidas.
A lista é longa.
Olhando ao passado, só enxergamos a "perda dos termos de intercâmbio", "os lucros, juros e dividendos distribuídos pelas multinacionais", "a lógica do investimento das multinacionais que não obedece aos interesses nacionais", "os juros da dívida externa" e "os juros pagos ao rentismo".
Liderados seja pela esquerda, seja pelos militares, continuamos a ter uma visão ufanista equivocada do desenvolvimento econômico.
O desperdício sem fim produzido pela ideologia conspiratória do nacional-desenvolvimentismo segue firme: desaguou na crise dos anos 1980 e na crise atual.
Enquanto isso, nossas crianças continuam a não saber ler e escrever.
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