1 – Por que o sr. escreveu A diplomacia na construção do Brasil?
Porque não consegui encontrar nas
livrarias o livro que procurava quando comecei a dar aulas de história
das relações internacionais do Brasil, quarenta anos atrás. Precisava de
um texto que me ajudasse a ensinar como a política externa era um fio
inseparável da trama da história nacional, uma parte integral de tudo o
que acontecia naquele momento, ligada, não separada da sociedade como um
todo.
2 – Não havia nenhuma obra que tratasse desse tema?
Na época, as obras gerais sobre história
do Brasil quase não falavam da política externa, no máximo alguns
parágrafos ou notas ao pé da página. O mundo exterior não existia, era
como se a história de um país constituísse um todo suficiente, fechado
em si mesmo. Já as histórias diplomáticas cometiam o erro oposto: só
tratavam da diplomacia, sem mencionar a política interna e a economia,
como se a política externa funcionasse dentro de um vácuo. Uma das
originalidades desta obra é que ela tenta não separar diplomacia,
política e economia interna. Sobretudo nos capítulos sobre os períodos
mais recentes, a atenção dedicada à economia e à política é quase igual
ao espaço da diplomacia.
3 – Qual a linha mestra do livro?
Além de narrar uma história, a da
política externa, procurei mostrar como a diplomacia ajudou a dar forma à
história e à identidade do Brasil, como vieram da diplomacia alguns dos
valores e ideais básicos da imagem que os brasileiros fazem de si
próprios. Por exemplo, o pacifismo, a tendência de resolver conflitos
pela conciliação, a negociação, a transação, a repulsa à violência, ao
militarismo, à conquista pela força, a opressão de outros povos. Ainda
que essa imagem seja interesseira, que não corresponda inteiramente à
realidade, a própria escolha desses valores é melhor do que se imaginar
como povo conquistador, predestinado a impor a democracia ao mundo, com
direito a anexar território dos vizinhos, ideologias frequentes em
muitos países.
4 – A que tipo de leitor se destina a obra?
O livro se dirige não apenas aos
professores, estudantes de relações internacionais, ciências sociais,
diplomatas, internacionalistas, mas aos leitores que se interessam pela
história do Brasil e querem compreender como o país se relacionou com o
mundo exterior e foi influenciado por acontecimentos e tendências
externas. Mesmo aqueles que tentam entender porque o Brasil mergulhou na
profunda crise atual talvez encontrem no texto algumas reflexões úteis.
Evitei o tom apologético das histórias antigas, para as quais o governo
brasileiro sempre tinha razão. Há um esforço de compreender e valorizar
as perspectivas do outro, de nossos vizinhos, às vezes adversários, e a
disposição de assumir que em alguns casos, tivemos uma parcela de culpa
nos conflitos e guerras na região do Rio da Prata.
5 – Qual o papel da diplomacia brasileira para a conformação de nosso atual território?
Se não fosse o êxito da diplomacia
brasileira, o Brasil teria hoje um território de apenas um terço do
atual e não seria um país continental capaz de fazer parte dos BRICS. A
aceitação pacífica e a legalização da expansão territorial foram o
produto da perseverança com que a diplomacia se dedicou à questão até
1910 mais ou menos. Atribui-se ao barão do Rio Branco a frase
“território é poder”. É óbvio que território apenas, sem
desenvolvimento, não representa grande coisa. O território, porém, é a
condição que torna possível não só o poder, mas a soberania. Definir o
território constitui o ato inaugural do relacionamento do país com o
mundo. Sua importância é fundamental: a maioria das guerras teve origem
em disputas territoriais. Consolidar o território pela diplomacia, sem
guerra, faz uma diferença enorme no destino histórico de qualquer nação.
6 – O sr. enaltece no livro a chamada “diplomacia do conhecimento”. Por que?
Entre as histórias que conto no livro,
uma ilustra bem como nossa diplomacia se baseou sempre no conhecimento.
Uma vez, o médico de Rio Branco chegou de manhã ao Itamaraty e o
encontrou de roupa amassada. Constrangido, o Barão apontou para um
enorme mapa desdobrado no chão e confessou que tinha querido examinar
detalhes do mapa e adormecera em cima dele. Esse episódio
verídico explica o êxito da diplomacia na negociação dos limites do
Brasil. As vitórias nas negociações e nas arbitragens foram preparadas
por anos de busca e estudo de velhos mapas e documentos em arquivos e
bibliotecas.
Foi graças a essa “diplomacia do
conhecimento” e a métodos de “poder suave” como a negociação que o
Brasil, país sem grande poder militar ou econômico, conquistou um
território de vastidão continental e imensas riquezas naturais. Jamais
teríamos chegado perto desse patrimônio se tivéssemos recorrido a meios
militares.
7 – Qual o balanço que o sr. faz de nossa diplomacia de 1750 até os dias de hoje?
Com seus acertos e erros, a diplomacia
marcou profundamente cada uma das etapas definidoras de nossa história: a
abertura dos portos, a independência, o fim do tráfico de escravos, a
inserção no mundo pelo comércio, os fluxos migratórios, voluntários ou
não, base da população, a consolidação da unidade nacional ameaçada pela
instabilidade na região platina, a modernização, a industrialização e o
desenvolvimento econômico.
8 – A maior parte dos problemas enfrentados por nossos diplomatas
durante o século XIX foi com os nossos vizinhos sul-americanos. Como o
sr. avalia essa relação?
O que distingue o caráter internacional
do Brasil é o grande número de vizinhos, dez, comparados aos Estados
Unidos (dois), ao Canadá (um), à Austrália (nenhum). Além de muitos,
esses vizinhos são heterogêneos, vão da Guiana Francesa ao Uruguai, do
Suriname à Bolívia, do Peru à Guiana ex-inglesa. Conseguir estabelecer
limites com todos por meio de negociação, transação, arbitragem, sem
guerra de conquista, não é tarefa menor a ser subestimada. Basta
comparar a experiência brasileira com a de outros países com numerosos
vizinhos (Rússia, China, por exemplo). Em março de 2020, aniversário do
fim da Guerra do Paraguai, o Brasil completará 150 anos sem nenhuma
guerra com um vizinho. Quantos países poderão dizer o mesmo?
9 – E como o sr. explica esse êxito da política de fronteiras?
Pela opção não violenta da delimitação, a
preparação cuidadosa, a continuidade na defesa de uma linha coerente de
ação diplomática, a perseverança. A definição pacífica poupou ao Brasil
a condição de refém de litígios fronteiriços que teriam paralisado boa
parte da nossa capacidade de iniciativa diplomática. Também o senso de
oportunidade de resolver relativamente cedo todas as questões pendentes
criou condições para desenvolver diplomacia voltada não para resolver
conflitos, mas para dar ao relacionamento com os vizinhos conteúdo
concreto de cooperação e de comércio. A diplomacia precisa, para isso,
saber captar a realidade exterior, interpretar corretamente o mundo e
suas oportunidades. Em sentido inverso, necessita igualmente explicar o
país ao mundo, torná-lo admirado, digno de atrair apoio político, de
receber capitais, imigrantes, tecnologia.
10 – Apesar do caráter pacífico de nossa diplomacia, o Brasil interveio em territórios vizinhos.
É verdade, mas as intervenções se
concentraram em período relativamente curto, entre 1850 e 1870. Com
razão ou sem ela, os estadistas da monarquia se resignaram a intervir no
Uruguai e, de modo mais limitado, na Argentina de Rosas, devido à
percepção defensiva de que as guerras civis na fronteira do Rio Grande
do Sul e dentro daquela província ameaçavam a unidade do Império. Havia o
temor de que a hegemonia de Rosas conduzisse à anexação do Uruguai e do
Paraguai pela Argentina, impedisse o acesso fluvial a Mato Grosso e
atraísse a adesão de revolucionários gaúchos. Fora esses exemplos,
prevaleceu na prática diplomática brasileira obediência ao princípio de
não intervenção. Só em época muito recente, a afinidade ideológica e
partidária motivou afastamentos quase sempre controvertidos da posição
tradicional.
11 – E a Guerra do Paraguai? Não foi uma intervenção?
Nesse caso, a iniciativa da guerra
partiu de Assunção. Não se registrou nenhum ataque ou ameaça direta ao
Paraguai da parte do Brasil. A intervenção brasileira no Uruguai (1864)
foi utilizada pelo ditador paraguaio Solano López como motivo sincero ou
pretexto para um ataque surpresa ao Brasil, que estava totalmente
despreparado. Não há dúvida de que Solano López assumiu a
responsabilidade de desencadear a guerra que custaria a vida a milhares
de pessoas, inclusive a dele próprio. Dos 140 mil brasileiros que
participaram da guerra, 50 mil – mais de um terço – morreram. As
informações sobre as perdas paraguaias são precárias. Estimativas
indicam o máximo de 279 mil vidas. Nada que se aproxime do número
fantasioso de um milhão de mortos, às vezes citado, mais que o dobro da
população do país no início da guerra.
12 – Juntamente com a Inglaterra e a
Argentina, os Estados Unidos são o outro ator decisivo na história da
diplomacia brasileira. No livro o sr. trata das diferenças diplomáticas
entre o Brasil e os EUA. Quais são elas?
A experiência diplomática do Brasil
contrasta com a dos Estados Unidos primeiro em relação à expansão
territorial. Tanto o Brasil como os EUA começaram com uma estreita
margem de terras ao longo da costa leste que foi sendo expandida para o
oeste. A semelhança, porém, termina nesse ponto. A expansão dos EUA
começa com a independência, em 1776, enquanto a nossa estava
praticamente encerrada no momento em que nos separamos de Portugal. Se
não fosse a incorporação do Acre (1903), o território do Brasil seria
hoje menor do que na época da independência, em 1822, quando incluía a
Província Cisplatina, o Uruguai de nossos dias, que se separou em 1828.
Quando se fala em “expansionismo brasileiro”, é bom precisar que o
expansionismo foi mais português que brasileiro. Outra diferença foi o
método. A expansão norte-americana se deu muito mais por compras de
territórios e de guerras seguidas de anexação, sobretudo contra o
México, ao passo que a nossa resultou de negociações e arbitramentos.
13 – Que outras diferenças podem ser apontadas entre a diplomacia norte-americana e a nossa?
A principal é a atitude em relação ao
poder. Desde o começo, os norte-americanos tiveram uma experiência
frequente com guerras internacionais. Um historiador da política externa
dos EUA escreveu que cada geração norte-americana desde a Independência
teve sua própria guerra e existe mesmo um livro sobre os Estados Unidos
intitulado “Um país feito pela guerra” (“A country made by war”). O
sucesso nos conflitos com o México, na Guerra contra Espanha, com a
enorme expansão territorial resultante, fortaleceu nos norte-americanos
uma propensão ao uso do chamado “poder duro”, isto é, ao recurso a
métodos militares ou de pressão econômica para resolver conflitos. Em
contraste, o Brasil foi em quase toda sua história país de recursos
militares e econômicos muito modestos e limitados. O insucesso na Guerra
da Cisplatina, as dificuldades nas intervenções no Rio da Prata, os
penosos sacrifícios da Guerra do Paraguai alimentaram na consciência
brasileira aversão à guerra e relutância em recorrer à diplomacia da
força. A política exterior do Brasil se edificou sobre a base do Direito
Internacional, das doutrinas jurídicas a respeito do nosso direito às
fronteiras, à busca de consenso, de compromissos, de soluções por
negociações e arbitragens. O Brasil construiu sua diplomacia com
argumentos intelectuais, jurídicos, históricos, com o “poder suave” dos
métodos de persuasão.
14 – Por que o sr. inicia o livro em 1750?
A maioria das histórias diplomáticas de
nações das Américas começa pela independência, uma vez que, na era
colonial, as decisões podem às vezes ser tomadas no país, mas não pertencem ao país,
como escreveu o diplomata e historiador Paulo Roberto de Almeida. No
caso do Brasil, existe uma especificidade diferente dos outros países. A
expansão do território até aos limites atuais já se encontrava
praticamente concluída e mais ou menos aceita no momento da assinatura
do Tratado de Madri (1750), muito antes do fim do regime colonial. É
preciso, portanto, recuar várias décadas prévias à independência para
entender como se definiu o território. A narrativa se inicia por isso
nos primórdios da ocupação e ampliação do território e toma como exemplo
simbólico da diplomacia de outrora a preparação e as consequências do
Tratado de Madri (1750), mais de setenta anos antes da independência
formal.
15 – No livro o sr. opina que o barão
do Rio Branco foi o fundador da política externa do Brasil na era
republicana ao definir o primeiro conceito abrangente para a diplomacia.
Em que consistia esse conceito?
O barão do Rio Branco é, de fato, o
fundador da política externa do moderno Brasil. Deve-se a ele não
somente a resolução sistemática de todas as questões fronteiriças ainda
pendentes no começo do século XX, a “construção do mapa do Brasil”.
Também foi ele que criou a primeira fórmula abrangente da política
externa brasileira articulando as relações com os EUA, a América Latina e
as grandes potências europeias. Rio Branco era pragmático, sabia da
fraqueza do Brasil, das ameaças potenciais de nossa vizinhança com três
potências europeias, duas das quais a Inglaterra e a França, as maiores
da época. Tinha também consciência do antagonismo latente dos vizinhos
hispano-americanos com os quais tínhamos problemas fronteiriços.
Concebeu uma política pela qual o Brasil se aproximou dos Estados
Unidos, a potência mundial em ascensão, pela qual apoiava as posições
norte-americanas no hemisfério em troca de apoio americano em relação
aos europeus, o que se denominou às vezes de uma “aliança não escrita”.
Esperava também que, nas disputas fronteiriças com os vizinhos, os
norte-americanos veriam com simpatia nossa posição ou ao menos ficariam
neutros, não sustentariam nossos rivais. Com isso, definiu o que se
poderia chamar de primeiro “paradigma abrangente da política exterior”,
que duraria até o começo da década de 1960.
16 – Qual foi o destino desse paradigma?
O extraordinário sucesso do Barão, que
triunfou em praticamente todas as questões muitas vezes perigosas e
delicadas que enfrentou por mais de nove anos (1902-1912) tornou sua
herança algo de intocável. Assim como ele foi o Chanceler de todos os
governos que se sucederam enquanto viveu, da mesma forma sua política
foi rigorosamente seguida pelos sucessores, nem sempre com o mesmo
pragmatismo e inteligência. O ponto mais alto e positivo dessa herança
se deu durante a Segunda Guerra Mundial, quando Getúlio Vargas e seu
ministro do Exterior Oswaldo Aranha fizeram o Brasil se aliar política e
militarmente aos Estados Unidos. O país saiu do conflito muito mais
forte militarmente, aumentou seu prestígio internacional, recebeu ajuda
econômica para construir a usina siderúrgica de Volta Redonda, início da
indústria pesada. Após a guerra, contudo, o Brasil deixou de receber o
apoio econômico que esperava em decorrência de sua participação no
conflito. Apesar do desapontamento com a falta do auxílio a que se
julgava com direito para seu desenvolvimento, o governo continuou
alinhado à política norte-americana em razão do anticomunismo na época
da Guerra Fria.
17 – Como se deu a ruptura com a política de estreita colaboração política com os Estados Unidos?
A ruptura vai ocorrer com a Política Externa Independente
do presidente Jânio Quadros (1961), continuada pelos chanceleres do
governo João Goulart, principalmente San Thiago Dantas e Araújo Castro
(1961-1964). A nova política recusava o alinhamento automático às
posições dos EUA na ONU, na OEA e em relação a Cuba. Deixou de enxergar o
mundo através do prisma ideológico da Guerra Fria. Por exemplo, as
revoltas contra o colonialismo na Argélia, em Angola, Moçambique, em
outros países da África e da Ásia, não eram mais vistas apenas como
conflito entre movimentos apoiados pelos comunistas e pela URSS contra
países colonizadores aliados dos EUA. Além disso, o Brasil restabeleceu
relações diplomáticas com a União Soviética e outros países comunistas,
começou a se aproximar da China, esforçou-se em evitar o isolamento do
regime de Fidel Castro. O golpe militar de 1964 abandonou essa
orientação e retornou ao alinhamento e colaboração com os EUA até que no
governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), o chanceler Azeredo da
Silveira retomou o espírito da Política Independente. O Brasil foi o
primeiro país a reconhecer a independência de Angola sob o governo de
movimento então considerado alinhado a Moscou, o MPLA. O governo
estabeleceu relações diplomáticas com a China, iniciou aproximação com
os países árabes. Desde então, a linha de afirmação da autonomia
diplomática brasileira passou a constituir o novo paradigma da política
externa do Brasil, que se manteve após o fim do regime militar. Com
inovações e expansões, sobretudo nos governos FHC e Lula, mas sem
rupturas essenciais, tal paradigma constitui até nossos dias a base da
diplomacia brasileira.
18 – Como o sr. vê o Brasil neste momento?
Para o Brasil, vale neste momento a
exortação dirigida pelo poeta italiano Giacomo Leopardi: “Se queremos
algum dia despertar e retomar o espírito de nação, nossa primeira
atitude deve ser não a soberba nem a estima das coisas presentes, mas a
vergonha”. Também em nosso caso, a primeira atitude terá de ser a
vergonha das coisas presentes como condição para despertar o espírito da
nação. Reformar e purificar as instituições políticas, reaprender a
crescer para poder suprimir a miséria e reduzir a desigualdade e a
injustiça, integrar os excluídos, humanizar a vida social.
19 – Qual o papel da diplomacia neste momento?
Em todo este livro, procurei não separar
a narrativa da evolução da política externa da História com maiúscula,
envolvente e global, política, social, econômica. Durante 200 anos, a
diplomacia em geral fez sua parte e até deu ao país contribuição maior
que a de muitos outros setores. No entanto, a crise política, econômica e
moral a que se chegou é de tal gravidade que não é mais possível a um
setor isolado como a diplomacia ou algumas outras poucas “ilhas de
excelência” continuarem a construir, se o sistema político e partidário
agrava a desmoralização e enfraquecimento das instituições. A partir de
agora, mais ainda que no passado, a construção do Brasil vai depender da
capacidade do Executivo, do Congresso, do Judiciário, das instituições
públicas, de adotarem as reformas indispensáveis à sobrevivência do
sistema. A diplomacia terá muito a contribuir nessa reforma profunda das
instituições, mas o esforço terá de ser universal, sem exceções.
20 – Com que sentimentos o sr. escreveu este livro?
Concluí o texto do livro pouco depois do impeachment de
Dilma Rousseff. Escrevi o fecho definitivo durante a sucessão de crises
que ameaçavam (e ainda ameaçam) engolir Michel Temer. Durante esse
pesadelo de meses, escrever a cada dia um pedacinho da relação do Brasil
com o mundo me forneceu o antídoto de que precisava contra a
desesperança. Tentei narrar como um país fraco e pobre, colônia de uma
quase colônia, construído sobre o trabalho dos escravos e o sofrimento
dos humildes, gradualmente aprendeu a afirmar um espaço crescente de
autonomia na busca de seus interesses.
Antonio Candido comentava que “comparada
às grandes, a nossa literatura é pobre e fraca. Mas é ela, não outra,
que nos exprime. Se não for amada, não revelará a sua mensagem; e se não
a amarmos, ninguém o fará por nós”. Esse pensamento ilumina também o
caminho para lidar com o que a nossa história tem de sombras: a
escravidão, a exclusão, a injustiça, a corrupção, a falta de acesso à
educação. Ninguém por nós poderá superar a herança madrasta de nossa
história e criar em nosso lugar uma sociedade justa e fraterna.
Justificativa, destino e meta de quem nasceu ou escolheu ser brasileiro,
o sonho perene da construção do Brasil é que torna a existência humana
digna de ser vivida em nossa terra.
21 – E qual o caminho para essa sociedade justa e fraterna?
O Brasil só conseguirá enfrentar a
complexidade social contemporânea com um grande contingente de pessoas
formadas com educação de qualidade e a superação das carências e dos
desequilíbrios econômicos. Estamos longe disso. Mas se levarmos em conta
que no início do século passado éramos 17 milhões de brasileiros, dos
quais 84% analfabetos, com expectativa de vida pouco inferior aos 30
anos, é razoável pensar que estamos mais afastados do país da escravidão
e mais próximos da nação próspera e justa que sonhamos alcançar um dia.
Sobre os autores
Rubens Ricupero é embaixador aposentado e autor do livro “A
diplomacia na construção do Brasil – 1750-2016” (Rio de Janeiro: Versal
Editores, 2017).
Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira e diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais – IPRI-MRE.
Como citar este artigo
Mundorama. "A diplomacia na construção do Brasil – uma entrevista com Rubens Ricupero, por Paulo Roberto de Almeida".
Mundorama - Revista de Divulgação Científica em Relações Internacionais,. [Acessado em 18/09/2017]. Disponível em: <
http://www.mundorama.net/?p=23942>.
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