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quarta-feira, 20 de setembro de 2017

A reconstrucao do Brasil, com a ajuda da globalizacao: livro de Jose Fucs - Paulo Roberto de Almeida


A reconstrução do Brasil, com a ajuda da globalização

Paulo Roberto de Almeida

Tenho em mãos este livro: José Fucs, A Reconstrução do Brasil: os grandes desafios do País para alcançar o desenvolvimento sustentável, a estabilidade política e o bem-estar social (São Paulo: O Estado de S. Paulo, 2017, 149 p.), que foi elaborado a partir das muitas reportagens feitas pelo repórter especial do Estadão entre setembro de 2016 e janeiro deste ano, às quais foram acrescidos alguns editoriais do jornal, feitos justamente a propósito de temas especiais levantados nas matérias sobre inúmeros problemas do Brasil nesta fase de transição para uma nova situação que ainda não sabemos exatamente do que será feita. Partimos da suposição de que esse futuro será melhor do que a atual fase de crise econômica, política, social (e profundamente moral), na verdade a maior recessão já enfrentada pelo Brasil em toda a sua história econômica, um legado maldito do governo companheiro anterior.
Como é meu hábito, e vício profissional enquanto diplomata, busquei no livro quais seriam os problemas detectáveis neste série de reportagens que teriam origem no cenário internacional ou que poderiam ser atribuídos a questões externas ao Brasil. Para minha frustração, não encontro nenhum: simplesmente não existem, nos diversos problemas focados por José Fucs, com base em pesquisas extensas, leituras intensas e conversas com especialistas em cada uma das áreas selecionada, qualquer um que possa ser vinculado a algum obstáculo internacional, a alguma característica negativa do sistema de comércio mundial, alguma defecção de investidores estrangeiros, sabotagem dos centros financeiros, má vontade de organismos internacionais; simplesmente não consigo detectar qualquer restrição externa ao Brasil enquanto economia emergente. Na verdade, existe sim, uma questão, que é a da questão da abertura comercial (objeto de um editorial do jornal publicado em 8/12/2016, com base numa das matérias feitas por Fucs), mas que não constitui de fato um problema, e sim trata-se de uma solução, ou seja, é algo que o Brasil precisa fazer em seu próprio benefício, não para fazer favor a qualquer exportador externo, ou atender a acordos comerciais.
Todos os demais problemas detectados, e objeto de uma quinzena de capítulos, segundo as matérias publicadas, são problemas perfeitamente brasileiros, totalmente construídos no Brasil, inteiramente made in Brazil, a 150%, se ouso dizer. Listo aqui, pela ordem: a reforma das reformas (a tal de Constituição cidadã, que é propriamente esquizofrênica do ponto de vista econômico), o ajuste fiscal, a batalha contra os privilégios, o rombo recorde da Previdência, a flexibilização do trabalho (parcialmente empreendida recentemente), a luta contra a burocracia, o cerco à roubalheira, o peso colossal dos tributos, um ambiente mais amigável para os negócios, o peso absurdo do protecionismo comercial (incorporado sob o conceito de “renascimento na arena global”, e que foi justamente objeto do editorial mencionado acima), o desmonte do Leviatã, os desafios da retomada do crescimento, a descentralização do poder e a modernização dos sindicatos (uma tarefa que eu mesmo julgo impossível, pois eles se converteram em “máquinas de extração de dinheiro” e em obstrutores das reformas).
Segundo depreendo do conjunto das matérias preparadas e muito bem editadas por José Fucs, a totalidade dos problemas e a integralidade das reformas necessárias são devidas única e exclusivamente a nós mesmos, erros, equívocos, deformações de nossas políticas públicas e de funcionamento das instituições, questões que cabem apenas ao Brasil e aos brasileiros resolver, para superar o atual quadro pavoroso feito de milhões de desempregados, o crescimento medíocre ou inexistente, as desigualdades sociais e regionais persistentes e a infraestrutura deficiente. O mundo, a globalização, o sistema internacional, como constatado pela experiência de crescimento de países emergentes, na própria região e especialmente na Ásia Pacífico, são absolutamente favoráveis à retomada de um processo sustentado (e sustentável) de crescimento no Brasil. Sob qualquer critério que se examine, cabe reconhecer uma massa colossal de liquidez ávida de aplicação, sob a forma de investimentos diretos ou de capitais de empréstimos, a permanência de um protecionismo comercial setorial ou limitado ((com a possível exceção da área agrícola), um ambiente cada vez mais favorável à interdependência entre economias abertas e propensas a aceitar os novos requerimentos dos intercâmbios globais (que não se limitam a tarifas ou acesso a mercados, mas passam por regras e padrões em serviços, propriedade intelectual e normas relativas a investimentos e fluxos de capitais). O mundo, enfim, está aberto a quem é aberto e participante, o que talvez não seja o caso atual do Brasil.
A recente decisão tomada pelo governo Temer, no sentido de solicitar adesão (ou acessão) à OCDE, pode ajudar nesse processo de reformas e retomada do processo de crescimento, desde que o Brasil não adote, como antes no caso do Mercosul, uma atitude defensiva, restritiva ou de abertura limitada. Se TODAS as medidas dependem mesmo do Brasil, cabe ler este livro, ou reler as matérias publicadas, estabelecer uma lista de reformas, e começar a empreender a difícil tarefa de converter o Brasil num país normal, o que ele absolutamente não é, atualmente. Devemos ser gratos a José Fucs por ter começado essa missão, pela listagem absolutamente clara dos problemas: ele já deu a sua contribuição. Cabe a nós, agora, isto é, a cidadania ativa, para não mencionar os altos responsáveis governamentais, empreender a tarefa de empreender o dever de casa, conscienciosamente. Allons enfants...


Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 20 de setembro de 2017

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