A TIRANIA DA MEDIOCRIDADE
O Estado de São Paulo, 22/08/2023
Poucos pensam e discutem o BRASIL acima de preocupações político-partidárias e de interesses pessoais. Não se trata de criticar a ação do governo de turno e de outros que o precederam. Hoje, na prática, o país está sem projeto de nação, que defina os rumos da economia, sem estratégia nacional de segurança, que defina o lugar do Brasil no mundo em rápida e profunda transformação, sem uma clara definição de objetivos modernos para a educação que dê base para a inovação e o desenvolvimento tecnológico, e sem saber como equacionar seus problemas sociais e ambientais a médio e longo prazo. Com forte influência populista, o país está dividido ideologicamente e politicamente. Ao não ousar, vê seu crescimento reduzido, as desigualdades aumentando, a violência crescendo, a base industrial se deteriorando e as vulnerabilidades econômicas, comerciais, sociais, militares e de defesa aumentarem. A segurança jurídica está abalada por decisões contraditórias e a competitividade da economia paralisada pela ineficiência da burocracia e do tamanho do Estado.
A mediocridade da discussão e das ações burocráticas em grande parte explica essa situação de falta de perspectiva do país. A polarização política e a intolerância deixam a burocracia semiparalisada com receio de assumir decisões que possam ser vistas como partidárias e que poderiam gerar consequência políticas ou mesmo jurídicas contrárias. A sociedade civil está sem liderança para propor a revisão de políticas institucionais de desenvolvimento e reforma política de interesse do país e sem força para propor uma nova relação entre civis e militares, desgastados pelos envolvimentos recentes, para virar a página da histórica interferência militar na política. Os empresários, sobretudo no setor industrial, estão sem projetos e se acomodam aos governos de turno para defender seus interesses setoriais. O sistema político partidário é disfuncional pelo número de partidos, sem uma clara ideologia, atuam na defesa de seus próprios interesses econômicos, comerciais e patrimoniais. O Congresso Nacional tem avançado o exame e a aprovação de algumas reformas, mas a percepção é de que, sem programas claros na defesa dos interesses maiores do país, fica enredado na discussão menor de privilégios e muitos de seus representantes aparecem envolvidos com corrupção. O Judiciário sofre desgaste pela judicialização de questões que o Legislativo e o Executivo não conseguem resolver. Em muitos casos, decisões são tomadas com forte viés político, alterando substancialmente decisões anteriores ensejando a visão de que a política menor, e não a Constituição, prevalece em suas decisões.
Em um mundo em que o conhecimento está na base das grandes mudanças, com os desafios da aplicação da Inteligência Artificial, o país não consegue superar as deficiências do sistema educacional. As escolas e Universidades, com honrosas exceções, não respondem às necessidades dos novos tempos. Os recursos públicos são mal administrados e o Brasil está muito baixo nos índices internacionais.
As ONGs e os think-tanks, com uma visão setorial em suas atuações, examinam e atuam com competência nas matérias que discutem, mas, em raros casos, tem força e poder para influir na definição de políticas públicas que possam ser avaliadas e tenham um sentido e uma visão de médio e longo prazo.
Nessa breve análise que não pretende esgotar o assunto, mas chamar a atenção para as armadilhas de que a sociedade foi vítima, em todas as áreas mencionadas, o que ressalta, lamentavelmente, é o triunfo da mediocridade.
A mediocridade da classe dirigente historicamente refletida na incapacidade de aproveitar as potencialidades do país para deixar de ser um país do futuro e transformá-lo em uma força global, como ocorreu em Cingapura e na China.
Para superar essa situação em que a mediocridade prevalece, inclusive pelo despreparo, pelo nepotismo, apadrinhamento, formas disfarçadas de corrupção, nas nomeações para o serviço publico e para as filiações partidárias, o Brasil teria de dar força à meritocracia, para buscar a eficiência e resultado nas políticas em todas as áreas. O termo meritocracia é um neologismo inventado nos anos 1950 pelo sociólogo britânico, Michael Young. No romance The Rise of Meritocracy (O surgimento da meritocracia), Young descreve uma sociedade onde os melhores e mais aptos detém o poder. Ao morrer em 2002, Young estava decepcionado com a vida pública estratificada na Inglaterra, mas tinha esperança na Terceira Via de Tony Blair.
O valor do mérito é atacado hoje no Brasil todos os dias e em todos os lugares: veja-se como se desenvolve a carreira na classe política e o nivelamento por baixo, por muitos anos, nos principais setores do serviço público. Para muitos dos que o desprezam, o mérito seria uma vitrine enganosa, que dissimula mal a sobrevivência das elites. Os que atacam a meritocracia, com hipocrisia e cinismo, são os principais responsáveis pelos seus desvios.
A busca da eficiência e de resultados com visão de futuro, com uma nova liderança política e uma burocracia mais competente, é o que o Brasil precisa. O setor privado fará sua parte.
Abaixo a tirania da mediocridade.
Rubens Barbosa é embaixador aposentado e presidente do IRICE.
Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE) e membro da Academia Paulista de Letras.
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