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segunda-feira, 1 de abril de 2024

Ainda sobre o golpe de 1964 e a memória da ditadura e seus crimes - Luiz Carlos Azedo entrevista Caetano Araújo

 

Existe um fio de história que liga os acontecimentos de 1964 aos dias atuais, que passa pelas reformas de base na marra, a luta armada, o voto nulo, o não apoio a Tancredo Neves, a rejeição ao Plano Real e o fracasso do governo Dilma Rousseff: o voluntarismo e a frustração de esquerda porque a queda da ditadura não se confundiu com a revolução.”

 

domingo, 31 de março de 2024

Luiz Carlos Azedo - Por quem os sinos dobram neste 31 de março 

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Correio Braziliense

Há um pacto de silêncio entre Lula e os comandantes militares, que proibiram as comemorações nos quartéis do golpe de 1964, enquanto golpistas prestam contas à Justiça

É preciso fugir ao senso comum e ao passado imaginário para ter um novo olhar sobre o dia 31 de março de 1964. O regime militar que ali se instalou somente se encerrou com a eleição de Tancredo Neves, em 1985, e a bem-sucedida transição à democracia presidida por José Sarney, cujo coroamento foi a promulgação da Constituição de 1988. Desde então, temos uma democracia representativa de massas, de caráter social-liberal. Não é pouca coisa a preservar.

Um velho amigo, o sociólogo Caetano Araújo, consultor do Senado, a propósito da polêmica sobre se o governo Lula deveria comemorar ou não o golpe de 1964, fez uma sensata separação entre a verdade e a Justiça, que não são mesma coisa, embora devam caminhar juntas. É verdade que os órgãos de segurança cometeram crimes hediondos, sobretudo no caso dos desaparecidos, mas a aprovacão da anistia em 1979, que não foi exatamente como os militares queriam, foi o grande pacto entre o governo e a oposição que deu início efetivo à ultrapassagem pacífica do regime autoritário.

Era a justiça possível, como correu em outras transições complexas da época. O Chile até hoje convive com uma constitucionalidade herdada do governo de Augusto Pinochet. O Uruguai promoveu um plebiscito que anistiou os militares. A Argentina puniu seus ditadores, depois do desastre das Malvinas, mas também motoneros e militantes do ERP envolvidos em crimes de sangue. Na África do Sul, sob liderança de Nelson Mandela, a Comissão da Verdade promoveu uma reflexão para que o passado do apartheid não se repetisse, não teve papel criminal.

Seguiram o rastro da Espanha, profundamente dividida desde a década de 1930. Após a morte de Franco, em meio à crise econômica e social, sem a mínima estrutura democrática, com apoio do rei Juan Carlos I, Adolfo Suarez abriu o diálogo entre esquerda, centro e direita. No Palácio la Moncloa, em 1977, em Madri, todos os partidos assinaram um pacto no qual predominava a preocupação econômica, mas que abarcava previdência, trabalho, liberdade, direito, energia, defesa e educação. A Espanha tornou-se uma democracia sólida, que sobreviveu à tentativa de golpe militar de 1981.

“Por quem os sinos dobram” (Bertrand Brasil), de Ernest Hemingway, que lutou como voluntário nas Brigadas Internacionais, é uma grande história de amor, tendo por referência a experiência pessoal do escritor na Guerra Civil Espanhola. Entretanto, narra a extrema violência das tropas de ambos os lados: os nacionalistas, auxiliados pelo governo italiano e nazista alemão, e os republicanos, apoiados pelas brigadas e a União Soviética. O livro é inspirado no poema “Meditações”, do pastor e poeta John Donne: “Quando morre um homem, morremos todos, pois somos parte da humanidade”. Empresta o título à coluna.

Mortos e desaparecidos
Sim, os sinos hoje dobram por 434 mortos e desaparecidos, vítimas do regime militar, a maioria dos quais na tortura ou executados em confrontos simulados com os órgãos de repressão. Mas também dobram por cerca de 119 mortos pelos grupos armados que se opuseram à ditadura. E quatro militantes de esquerda que foram executados pelos próprios companheiros. Não eram “cachorros”. Qualquer tentativa de ajuste de contas punitivo com esse passado é um equívoco. Isso não significa confinar essa memória ao culto doméstico dos familiares de mortos e desaparecidos.

A radicalização política que antecedeu o golpe de 1964 dividiu profundamente a sociedade, inclusive as classes sociais e as famílias. Nem tudo foi fruto da “guerra fria”. Havia, como há ainda, um ambiente de iniquidade social propício. E também uma visão de ambos os lados de que as coisas se resolveriam pela força bruta do Estado e não pela sociedade, por via democrática.

A esquerda deveria se perguntar: por que Juscelino Kubitscheck e Ulyssses Guimarães apoiaram o golpe? A resposta é simples: foram empurrados para os braços de Carlos Lacerda e Magalhães Pinto, que empunharam a bandeira da democracia contra o radicalismo de esquerda. Os militares deveriam também se perguntar: por que Juscelino e Ulysses passaram à oposição, logo após o golpe de 1964? Outra resposta simples: o regime cancelou as eleições e derivou para uma ditadura sanguinária.

Existe um fio de história que liga os acontecimentos de 1964 aos dias atuais, que passa pelas reformas de base na marra, a luta armada, o voto nulo, o não apoio a Tancredo Neves, a rejeição ao Plano Real e o fracasso do governo Dilma Rousseff: o voluntarismo e a frustração de esquerda porque a queda da ditadura não se confundiu com a revolução.

Outro fio de história liga a frustração dos militares que ingressaram na carreira quando era uma via de ascensão ao poder político, cuja recidiva se deu no governo Bolsonaro, à tentativa de golpe de 8 de janeiro da extrema direita bolsonarista, inspirada no passado imaginário do regime militar: a mentalidade de que às Forças Armadas cabe tutelar a nação, por representar “o povo em armas”.

A polêmica sobre a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de não relembrar oficialmente o golpe militar de 31 de março de 1964 é fruto dessas vicissitudes históricas. De fato, há um pacto de silêncio entre Lula e os comandantes militares, que proibiram as comemorações nos quartéis, enquanto generais e outros oficiais golpistas prestam contas à Justiça comum, fato inédito na história.

Entretanto, a sociedade não está proibida de reverenciar seus mortos, como fizeram os professores da Faculdade de Direito de Niterói (UFF), ao propor o título de Doutor Honoris Causa ao seu ex-aluno Fernando Santa Cruz, sequestrado e assassinato em 1974, depois de diplomá-lo bacharel post mortem. 

quarta-feira, 13 de março de 2024

A visão a favor do Comício da Central do Brasil - Luiz Carlos Azedo, comentário: Maurício David; releitura de Paulo Roberto de Almeida

Minha visão das famosas reformas de base: 


 O governo Goulart e o mito das reformas de base”, Brasilia, 13 março 2024, 14 p. Revisão, aos 60 anos, do famoso comício da Central do Brasil, em 13/03/2024; divulgado no blog Diplomatizzando (13/03/2024; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2024/03/o-governo-goulart-e-o-mito-das-reformas.html).

Paulo Roberto de Almeida


Um comício que marcou a história do Brasil 


Luiz Carlos Azedo 

Correio Braziliense, quarta-feira, 13 de março de 2024


Era mais útil respeitar as decisões do Congresso e convencer a sociedade de que as reformas eram necessárias, em vez de tentar impô-las, fiando-se no “dispositivo militar”

A memória do ex-presidente João Belchior Marques Goulart (PTB) será lembrada nesta quarta-feira num evento convocado pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI), sob a presidência do jornalista Octávio Costa, a propósito dos 60 anos do Comício da Central do Brasil, em 13 de março de 1964. Estarão presentes a viúva do ex-presidente João Goulart, dona Maria Thereza; Clodsmidt Riani Filho, organizador do comício; e o jornalista, professor de literatura e ex-capitão do Exército Ivan Proença, ex-presidente do Conselho Deliberativo da ABI, que pertencera ao chamado “dispositivo militar” de Jango, como oficial de sua confiança nos Dragões da Independência.

Em 1º de abril, após impedir a invasão do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (Caco) da Faculdade Nacional de Direito por um grupo paramilitar de extrema-direita, ao voltar para o Ministério do Exército, Proença foi preso pelos colegas. Jango havia se deslocado para Brasília, o golpe de Estado estava consolidado. Deu errado o famoso “dispositivo” do chefe do Gabinete Militar da Presidência, Argemiro de Assis Brasil, que consistia em promoções e nomeações a comandos importantes de militares supostamente leais ao presidente da República.

A situação havia se radicalizado desde o plebiscito que restabeleceu o presidencialismo, em 6 de janeiro de 1963. A oposição ao presidente João Goulart, que havia assumido o Palácio do Planalto após a surpreendente renúncia de Jânio Quadros, no contexto de um regime parlamentarista negociado com a oposição, acusava Jango de preparar um golpe de Estado aliado aos comunistas.

Em 12 setembro daquele ano, em Brasília, uma rebelião de sargentos da Aeronáutica e da Marinha, que não aceitaram a decisão do Supremo Tribunal Federal de não reconhecer a elegibilidade dos sargentos para o Legislativo com base na Constituição, alimentou as suspeitas. Em protesto, os sargentos tomaram de assalto a Base Aérea e o Ministério da Marinha, fecharam rodovias e o aeroporto, invadiram o Congresso Nacional e ocuparam o prédio do STF.

Os comandantes militares liquidaram a rebelião dos sargentos, mas ficaram ressentidos com Jango, por sua “neutralidade” diante da insubordinação e da quebra de hierarquia militar, que sempre foram vistas como ameaça aos fundamentos organizacionais e operacionais das Forças Armadas. Além disso, desde outubro, quando fora entrevistado pelo jornal Los Angeles Times, o governador carioca Carlos Lacerda (UDN) atacava o presidente da República e os chefes militares que o apoiavam.

Irritado com Lacerda, Jango solicitou ao Congresso a decretação de estado de sítio para intervir na Guanabara, mas houve forte reação dos grandes partidos da época, PTB, UDN e PSD, e até dos comunistas, que rejeitaram a proposta. O desgaste de Jango foi grande. A oposição passou a acusá-lo de inimigo da democracia e da legalidade, ao mesmo tempo em que ela própria conspirava para destituir o presidente da República.

Apelo às massas

A situação econômica do país era delicada, com uma inflação de 79,9%, a economia estava estagnada, com uma taxa de crescimento de 1,5%, o que levou o empresariado e a classe média à oposição. Além disso, num ambiente de guerra fria, a aproximação de Jango com os países socialistas, principalmente União Soviética, China e Cuba, apesar de ter sido iniciada por Jânio Quadros, levou ao bloqueio financeiro pelos credores externos. E os Estados Unidos, presidido por Lyndon Johnson após o assassinato de John Kennedy, se negaram a renegociar a dívida externa brasileira.

Foi quando o assessor de imprensa de Jango, o jornalista Raul Riff, ligado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), procurou Antônio Ribeiro Granja, integrante do secretariado do Comitê Central da legenda, para marcar um encontro de Jango com o líder comunista Luís Carlos Prestes. Os dois se reuniram num apartamento em Copacabana. À saída do encontro, Prestes comentou com Granja que Jango estava se sentindo acuado e temia o colapso financeiro do governo. Por isso, havia sugerido ao presidente da República que “apelasse às massas” para realizar as reformas de base. Dessa conversa resultou o comício da Central do Brasil, para o qual os sindicatos controlados por PTB e PCB promoveram intensa mobilização.

No foyer do nono andar da ABI, será inaugurada a exposição Rio 64 — a capital do golpe, que permanecerá em cartaz até 13 de abril. A exposição traz uma representação iconográfica dos principais acontecimentos que culminaram no golpe de 31 de março, consumado na madrugada de 1º de abril, data desprezada por ser o dia da mentira. Não foi, os militares permaneceram no poder por 20 anos. Há diferentes leituras sobre o golpe de 1964, todas têm em comum a conclusão de que Jango havia se isolado, os Estados Unidos patrocinaram o golpe de Estado e as esquerdas não tinham a força que imaginavam na Central do Brasil. Em vez de apostar num “dispositivo militar”, era mais importante respeitar as decisões do Congresso e convencer a sociedade de que as reformas eram necessárias. E não as impor.

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 Comentário Maurício David: 

Meninos, eu vi ! Jovem de 17 anos, presidente do grêmio estudantil do então colégio-padrão do Brasil (o Pedro II), fui um dos 100 mil participantes do comício da Central do Brasil, no qual Jango discursou (ao lado de Brizola, Arraes, Darcy Ribeiro, líderes sindicais) defendendo uma radicalização do seu governo e do que chamávamos então de “A Revolução Brasileira”... 13 de março... Poucos dias depois a insurreição dos marinheiros (lembram do filme “Encouraçado Pontenkin”, do grande cineasta russo Serguei Eisenstein, considerado, ao lado do “Citizen Kane”, do Orson Welles, os dois maiores clássicos de todos os tempos do cinema moderno ?...), que tomaram o Sindicato dos Metalúrgicos, situado na rua Ana Neri, no bairro do Rocha, logo depois a passeata dos marinheiros anistiados pelo ministro da Marinha por ordem do presidente Goulart que, dias depois, selou a sua deposição quando nos dias finais do mês de março radicalizou ainda mais o seu discurso no comício do Automóvel Público, ali na rua do Passeio, para uma plateia de sargentos e líderes da esquerda. Foi o sinal para a milicada ensandecida por-se definitivamente de acordo para a derrubada de Jango. Horas depois, Jango, absolutamente isolado, viu-se obrigado a abandonar o Rio de Janeiro e embarcar no avião presidencial para Brasília para reunir a sua família e seguir para Porto Alegre e daí seguir para o exílio de 12 anos no Uruguai, até a sua morte em 76... Ruíra-se completamente o “dispositivo militar” organizado pelo general Assis Brasil, chefe da Casa Militar do governo Jango que até então parecia inexpugnável na garantia do governo de João Goulart. Quem se interessar por este período da nossa História recomendo muitíssimo o filme “Jango”, do meu queridíssimo amigo Silvio Tendler. E a visita à exposição Rio 64- a capital do golpe, na ABI (rua Araújo Porto Alegre, no centro do Rio) que estará aberta à visitação pública até o dia 13 de abril. 

MD



domingo, 12 de junho de 2016

O marxismo vulgar e o atraso educacional brasileiro - Luiz Carlos Azedo

Nas entrelinhas: O bonde da Educação
Luiz Carlos Azedo
Publicado em 12/06/2016

Professores engajados num projeto de poder não respeitam a maioria dos colegas e a minoria das minorias (o jovem monarquista) não pode se expressar sem apanhar

Um jovem monarquista que protestava contra a convocação de uma greve geral na Universidade de Brasília foi agredido por colegas que desejam paralisar a universidade em protesto contra o impeachment e o governo Temer, na terça-feira passada, porque estendeu uma bandeira do Brasil Império. Debaixo de socos e pontapés, conseguiu recuperá-la. Essas cenas da agressão, do tipo todos contra um, ocorreram na ala norte do Instituto Central de Ciências (ICC), o famoso “Minhocão”, e foram expostas na internet; no dia seguinte, o jovem agredido voltou às redes sociais para dizer que não se deixaria intimidar. Ele acredita que a agressão foi um sinal de que a bandeira da monarquia, diante da crise ética, está incomodando.

Na quarta-feira, durante assembleia da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília (ADUnB), que reuniu 148 professores, o pós-doutor em bioética Volnei Garrafa sugeriu que a delegação da ADUnB apresente, no congresso do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), em Roraima, uma proposta para que o segundo semestre das universidades federais não se inicie enquanto a presidente Dilma Rousseff não voltar ao comando do governo. A maioria apoiou a proposta. O presidente da associação, Virgílio Arraes, disse que a sugestão será encaminhada, mas ponderou que a instituição tem cerca de 2.500 professores.

A Associação dos Docentes da UnB fez uma pesquisa eletrônica para saber a opinião dos colegas sobre os temas abordados na assembleia. Apenas 478 professores responderam ao questionário, dos quais 225 (47,47%) concordam com a tese de que o impeachment é golpe e 249 (52,53%) discordam; 300 professores (63,29%) são a favor de debater o assunto e 174 (36,71%) são contra. Mais: 265 professores (55,91%) foram contra a realização da assembleia; e 209 (44,9 %), a favor. Ou seja, uma situação na qual professores engajados num projeto de poder não respeitam a maioria dos colegas e a minoria da minoria (o jovem monarquista) não pode sequer se expressar sem apanhar. Esse é o ambiente político numa das melhores universidades do país.

Aparatos ideológicos

Nos anos 1970, o livro Os aparatos ideológicos do Estado, do filósofo franco-argelino Louis Althusser, fez muito sucesso entre estudantes e professores que faziam oposição ao regime militar, ao lado do livro Os Conceitos elementares do materialismo histórico, da professora chilena Marta Harnecker Cerdá, que participou do governo socialista de Salvador Allende e foi assessora de Hugo Chávez, de 2002 e 2006. Discípula de Althusser e casada com Manuel Piñeiro, o lendário Barba Ruiva (líder do PC cubano encarregado da relação com a esquerda da América Latina), com seu livro, Marta fez a cabeça da esquerda brasileira nas universidades.

Em consequência, boa parte das lideranças das universidades públicas do país tem uma visão sobre suas instituições próxima das ideias de Althusser, ainda que seu livro tenha sido publicado há quase 50 anos. Grosso modo, atribui aos aparatos ideológicos do Estado o papel de reproduzir a ideologia dominante para garantir a reprodução ampliada do capital. Quais são esses aparatos? A família, as igrejas, os partidos, os meios de comunicação, a cultura (literatura, arte e esporte), os sindicatos e, principalmente, a escola. O sistema jurídico, teria duplo caráter: aparato ideológico e, ao mesmo tempo, repressivo. É uma visão meio “funcionalista” do conceito de hegemonia.

Althusser questiona o papel do professor que se esforça para construir um discurso moderno mas não tem uma prática, digamos, revolucionária. Ao cumprir seu papel como professor, simplesmente reproduziria as relações de poder dominantes. Essa concepção está por trás do ativismo político de boa parte dos integrantes dos conselhos universitários e até de alguns reitores, o que de certa forma explica o apoio incondicional que deram aos governos Lula e Dilma, muito embora a qualidade do ensino e a capacidade de produzir ciência e tecnologia de nossas universidades deixem muito a desejar.

Na cartilha althusseriana, professores devem se posicionar contra o sistema e contra as práticas que os aprisionam e transmitir isso aos seus alunos. A Matemática, o Português, a História, a Geografia e as Ciências só têm sentido ao contestar a exploração e a dominação de classe. O devotamento à Educação contribui para alimentar a ideologia burguesa e faz da escola algo parecido com a Igreja medieval. Enquanto pensam assim, o Brasil perde o bonde da revolução do conhecimento.

https://www.youtube.com/watch?v=-pzPDQ7YWpI

sexta-feira, 5 de junho de 2015

Crimes economicos do lulo-petismo: abusos e mais abusos - Luiz Carlos Azedo

A caixa preta dos campeões
Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense, sexta-feira, 5 de junho de 2015

O BNDES financiou US$ 11,9 bilhões em obras tocadas no exterior por empresas brasileiras, com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT)

O modelo de “capítalismo de estado” adotado no segundo mandato de Lula e no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff era a base de sustentação do projeto de longa permanência do PT no poder, seja pela aliança com grandes grupos empresariais, seja pela capacidade de financiamento eleitoral que o partido passou a ostentar. Desde a reeleição de Lula em 2006, mas principalmente eleições de 2010, foi com espanto que a oposição e mesmo os aliados do PT sentiram o peso das campanhas milionárias dos candidatos petistas.

Esse modelo começou a entrar em colapso com as investigações da Operação Lava-ato, que desnudaram o escândalo de superfaturamento e farta distribuição de propinas na Petrobras. Orgulho nacional, a empresa foi usada e abusada como fonte de financiamento eleitoral, por meio de uma triangulação que passava por 27 empresas fornecedoras de serviços e contratadas para execução de obras. Hoje, o Ministério Público acusa o PT de utilizar as doações eleitorais para supostamente lavar dinheiro sujo de obras superfatruradas ou provenientes de serviços não prestados à empresa.

O outro braço de sustentação do modelo petista, batizado pela presidente Dilma Rousseff de “nova matriz econômica”, começa a ter que prestar contas à opinião pública de sua atuação. É o BNDES, responsável pelo financiamento bilionário de grandes grupos econômicos, no Brasil e no exterior. São os chamados “campeões nacionais”. Ontem, acatando decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o Ministério da Indústria e Comércio retirou o caráter sigiloso das informações sobre operações de financiamento do BNDES no exterior e a diretoria de banco divulgou pela primeira vez um relatório com informações mais detalhadas sobre o assunto.

Foi o desfecho de uma queda de braço com o Tribunal de Contas da União (TCU) e o Congresso Nacional, que por iniciativa da oposição chegou a aprovar uma lei de transparência para as operações do banco, mas a presidente Dilma Rousseff vetou a nova legislação. Por ironia, o BNDES havia recorrido ao Supremo para manter o sigilo, mas levou uma resposta negativa da Corte, que determinou a abertura da caixa preta.

Transparência
Soubemos, então, que o BNDES financiou US$ 11,9 bilhões em obras tocadas no exterior por empresas brasileiras, com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). As operações fazem parte do segmento “exportações de serviços”, em que as empresas brasileiras que vencem licitações no exterior levam junto o crédito barato para o país que contrata a obra. Os juros são mamão com açúcar: de 4% a 6% ao ano.

No Brasil, atualmente, o financiamento mais barato do BNDES para a área de infraestrutura é o do Programa de Investimento em Logística (PIL), a 7% ao ano. Os prazos de pagamento começam em 120 meses — 10 anos —, mas podem chegar a 25 anos. E, de modo geral, as garantias são dadas pelo próprio Tesouro brasileiro, por meio de um seguro de crédito do Fundo de Garantia às Exportações (FGE).

Entre os negócios, Andrade Gutierrez faz um corredor rodoviário em Gana. O financiamento é de 2,8% ao ano, com 234 meses de prazo de pagamento. Na América Central, Honduras obteve um financiamento de US$ 145 milhões com taxa de 2,83% ao ano, a cargo da OAS. O porto de Mariel, em Cuba, recebeu US$ 642,97 milhões, pelos quais Cuba paga entre 4,4% e 7% de juros. Já a Venezuela obteve 20% dos empréstimos, entre 2007 e 2015, para quatro obras, com juros menores, entre 3,45% e 4,45%.

Algumas empreiteiras investigadas na Operação Lava-Jato lideram o ranking dos projetos beneficiados pelos financiamentos. A Odebrecht recebeu apoio de US$ 8,2 bilhões, 69% de todos os recursos, para financiar 69 obras. A Andrade Gutierrez ficou com US$ 2,81 bilhões para quatro obras, enquanto a Queiroz Galvão recebeu US$ 388,85 milhões para 19 projetos; a OAS, US$ 354,3 milhões para três obras; e a Camargo Corrêa, US$ 255,6 milhões para nove empreendimentos. Além dos contratos internacionais, foram postos no site do BNDES 1.753 operações domésticas no valor de R$ 320 milhões.

Camargo Correa, Andrade Gutierrez, JBS, Queiroz Galvão, OAS, Banco BMG e Galvão Engenharia doaram aproximadamente R$ 496 milhões para candidatos e partidos em 2010. Nas eleições passadas, somente a JBS, detentora das marcas de alimentos Friboi e Seara, doou ao todo R$ 352 milhões, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dos quais R$ 69,2 milhões foram destinados à campanha de Dilma à reeleição. Também desembolsou R$ 61,2 milhões aos postulantes a uma vaga na Câmara dos Deputados e R$ 10,7 milhões aos candidatos ao Senado.

O discurso do PT contra o financiamento privado de campanha tornou-se, por isso mesmo, uma espécie de vacina contra as acusações feitas contra o partido, que é o que mais tem se beneficiado das doações de empresas.