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terça-feira, 20 de abril de 2021

O ministro sonâmbulo, entre o orçamento e o caixa da reeleição do degenerado - Paula Cristina (IstoÉ )

 Na corda bamba


Paula  Cristina

 

ISTOÉ DINHEIRO, 16/04/2021

 

Fura-teto, Liberal de Taubaté e Evergreen. Podem parecer apelidos de crianças em um acampamento de férias, mas são as mais recentes denominações que o ministro da Economia, Paulo Guedes, recebeu de parlamentares. Claramente incomodados com a demora do governo federal em liberar o Orçamento de 2021 – aquele desenhado pelos deputados e senadores e que libera para os parlamentares uma vergonhosa cifra de R$ 48,8 bilhões em emendas –, os congressistas pressionam o presidente Jair Bolsonaro. A mensagem é clara. Caso o texto seja vetado, a lua de mel acaba antes mesmo de o casal voltar da viagem de núpcias. Na missão de tentar apresentar uma alternativa ao presidente, Guedes caminha em uma corda bamba.

 

Ele sabe que, do jeito que está, o Orçamento fere a Lei de Responsabilidade Fiscal. Também tem conhecimento de que convencer o presidente a vetar o Orçamento seria, além de tarefa difícil, levar ao erro da ex-presidente Dilma Rousseff: o de romper de vez com os parlamentares e sua irrefreável indisciplina fiscal. O caminho escolhido pelo ministro foi tentar desenhar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que deixaria fora do teto de gastos valores que teriam como destino o combate ao coronavírus. O problema é que mesmo essa ideia foi se desviando assim que nasceu. A princípio o plano era que cerca de R$ 20 bilhões ficassem fora do limite de gastos. Logo a cifra subiu para R$ 30 bilhões e chegou a R$ 48 bilhões quando R$18 bilhões foram adicionados oriundos de emendas parlamentares que tinham como destinos obras. Vale uma explicação. Estes R$ 48 bilhões são além dos R$ 48,4 bilhões nas emendas contidas dentro do Orçamento. Esse é o preço indecente e irresponsável do apoio que Bolsonaro compra para ter o Congresso ainda mais em tempos de CPI. Quando todos perdem a razão, bodes expiatórios – culpados ou não – passam a ser escalados. E Guedes cabe com perfeição no papel. O ministro afirmou que a inclusão das emendas na PEC foi a “variante que escapou do laboratório.” Daí o apelido de Liberal de Taubaté – em alusão à mulher da cidade do interior paulista que, em 2021, fingiu estar grávida de trigêmeos.

 

Uma fonte próxima ao ministro admite que Guedes se mostra cético sobre o andamento do Orçamento deste ano. “Ele já está assimilando a derrota. Trabalhamos para evitar que mais danos sejam causados”, disse ele à reportagem, em condição de anonimato. A saída, explica o assessor, seria construir um acordo, com aval do presidente Jair Bolsonaro, para retirar as emendas da PEC a ser enviada. Uma navalhada nos R$ 18 bilhões que nunca deveriam estar ali. O argumento da equipe de Guedes seria que, quanto mais elementos entrar nessa PEC, mais daria a sensação de a Emenda ser uma saída fácil para driblar o controle fiscal.

 

PIOR DA HISTÓRIA Guedes agora sabe que subiu na corda bamba com o Orçamento parido. Everaldo Loures, doutor em economia aplicada e ex-secretário da Fazenda de Minas Gerais afirma que o Orçamento de 2021 é, de longe, o pior desde a redemocratização. “O único Orçamento descente do governo Bolsonaro foi o desenhado durante o governo Michel Temer”, disse. Na avaliação do economista, são muitos os erros. “O problema não é o gasto acima do teto, o problema é que ele parte de uma premissa errada. É preciso refazer do zero.” Nesse sentido, Everton Perusin, consultor político do MDB de Brasília, entende que faltou articulação do governo. “Ele falhou nesse diálogo direto. O governo abriu mão da condução do Orçamento em nome da PEC Emergencial.” E tanto um quanto outro se tornaram aberrações.

 

Em uma conversa no final de março, Guedes teria dito diretamente à Bolsonaro que havia pessoas próximas a ele o levando para o buraco. “Vão te empurrar para o impeachmment”, teria dito o ministro ao tentar convencer Jair Bolsonaro sobre o andamento do Orçamento de 2021. E se em um primeiro momento o intuito era avisar o presidente, não demorou muito para Guedes repensar seu próprio papel dentro do governo ao tentar criar soluções criativas, que envolvem PEC, Orçamento de Guerra, estado de Calamidade, Crédito Orçamentário e tudo que envolva saída para agradar o Congresso, o presidente e os anseios do mercado. “Quero crer que [vocês] não me enganaram para eu virar o novo Arno Agustin!”, teria dito Guedes à Bolsonaro, citando o ex-secretário do Tesouro do governo Dilma Rousseff, pai das pedaladas fiscais.

 

segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Lambança fiscal - Claudio Adilson Gonçalez (OESP)

O desgoverno Bolsonaro nunca teve planos para nada, só para sua própria reeleição e para a defesa dos crimes em família. Este economista apresenta algumas ideias sensatas para a tal Renda Brasil que é uma obsessão eleitoreira do presidente, mas que apresenta alto sentido social.

Paulo Roberto de Almeida

Lambança fiscal

    CLAUDIO ADILSON GONÇALEZ

    O Estado de S. Paulo05/10/2020

    A lambança criada pelo governo em relação ao financiamento do programa apelidado de Renda Cidadã, que provocou grande nervosismo no mercado financeiro, não é um fato isolado. A política econômica, aparentemente submissa aos desejos eleitoreiros do presidente, tem sido marcada por completa falta de rumo e de planejamento. Sobram discursos ideológicos, supostamente liberais, e faltam iniciativas bem estruturadas para promover o crescimento econômico, com estabilidade fiscal.

    Desde o início do governo, Paulo Guedes e sua equipe, em parte composta por técnicos de excelente formação, mas com pouca experiência em políticas públicas, tentam reinventar a roda. Anunciam medidas mirabolantes, antes de estarem devidamente estudadas e formuladas. Atropelam projetos já em curso no Legislativo, alguns em fase adiantada de debates. Esses foram os casos da chamada PEC emergencial, agora fundida com a do pacto federativo, e da reforma tributária. Impera a falta de planejamento. As maluquices propostas para financiar o Renda Cidadã (que, como Paulo Guedes, continuarei chamando de Renda Brasil) evidenciam tal improvisação.

    Deixando de lado o objetivo eleitoreiro que move quase todas as ações de Bolsonaro, era evidente, desde o primeiro semestre, que o auxílio emergencial não poderia ser retirado, em 2021, sem a ampliação do Bolsa Família, seja lá como o programa fosse batizado. Mas o governo deixou para a última hora a questão do financiamento da nova despesa, o que resultou na descabida proposta de postergar o pagamento dos precatórios e de avançar nos recursos do Fundeb.

    Tecnicamente, a solução é simples, embora não o seja politicamente, pois demanda boa formulação e eficiente e tempestiva negociação com o Congresso. O caminho é cortar gastos obrigatórios, com a combinação de medidas emergenciais duras, mas temporárias, com reformas estruturais duradouras.

    Entre as medidas emergenciais, destacam-se a redução da jornada de trabalho com respectivo corte de vencimentos de servidores públicos e a desindexação, por dois anos, das despesas obrigatórias. Propostas nessa linha já foram encaminhadas ao Legislativo, mas a articulação política para aprová-las tem sido precária, até porque elas não contam com a simpatia do presidente da República.

    A maior focalização das ações assistenciais, com a incorporação, no Bolsa Família, do abono salarial e do seguro-defeso, que apresentam problemas de gestão e mostram pouca eficácia no combate à pobreza, poderia se constituir em fonte adicional para o financiamento do Renda Brasil, mas foi vetada pelo presidente.

    No âmbito estrutural, o grande destaque é para a reforma administrativa, que alcance os atuais servidores, preservando, obviamente, os direitos adquiridos. Incluem-se aqui o congelamento dos salários por dois anos (para valer, não como tem sido até agora), a redução ou o fim das promoções automáticas, a queda do salário inicial de carreira, a extinção dos penduricalhos que permitem salários acima do teto, o fim das férias acima de 30 dias e menor taxa de reposição.

    Tais medidas possibilitariam cortes de gastos muito superiores aos necessários para bancar o Renda Brasil.

    Segundo a Carta de Conjuntura do Ipea do terceiro trimestre de 2020, que trabalhou com um conjunto semelhante de propostas, considerando União, Estados e municípios, a economia poderia superar R$ 800 bilhões em dez anos. O impacto fiscal seria superior ao da reforma da Previdência, aproximando-se do tal trilhão tão sonhado por Paulo Guedes.

    Por fim, o maior abalo na confiança dos agentes econômicos foi provocado pela tentativa de adoção de subterfúgios para burlar o teto de gastos, pondo em dúvida a disposição do governo de honrar seus passivos. Tal lambança é perigosa, porque pode elevar ainda mais o custo de rolagem da dívida pública e, com isso, frear a retomada do crescimento econômico.

    ECONOMISTA, DIRETOR-PRESIDENTE DA MCM CONSULTORES, FOI CONSULTOR DO BANCO MUNDIAL, SUBSECRETÁRIO DO TESOURO NACIONAL E CHEFE DA ASSESSORIA ECONÔMICA DO MINISTÉRIO DA FAZENDA.

    segunda-feira, 13 de julho de 2020

    ‘Brasil virou pária do investimento internacional’ - Entrevista Persio Arida

    ‘Brasil virou pária do investimento internacional’
    Para economista, governo Bolsonaro tem feito uma “política ambiental horrenda, na contramão do mundo”
    Entrevista com Persio Arida, economista
    Adriana Fernandes, O Estado de S. Paulo
    12 de julho de 2020 | 05h00

    Para o economista  Persio Arida, presidente tem feito uma “política ambiental horrenda”  
    Foto: FOTO: HÉLVIO ROMERO/ESTADAO

    política ambiental do governo Bolsonaro transformou o Brasil em pária do investimento internacional e poderá trazer sérios problemas econômicos para o País, avalia o ex-presidente do Banco Central (BC), Persio Arida. Um dos signatários da carta de ex-ministros da Fazenda e do BC em defesa de uma retomada econômica “verde”, que será lançada no dia 14, Arida observa que o presidente tem feito uma “política ambiental horrenda” e na contramão do mundo.
    Um dos formuladores do Plano Real, Arida avalia, em entrevista ao Estadão, a resposta do governo à pandemia da covid-19, fala sobre as prioridades para a retomada econômica e responde à crítica recente do ministro da Economia, Paulo Guedes, ao programa de controle da inflação que completa esse ano 26 anos: “Ressentimento e inveja são assuntos para divã de psicanalista.”
    Veja abaixo os principais trechos da entrevista:
    O sr. assinou uma carta de ex-presidentes dos BC e de ministros da Fazenda com alertas para o risco da política ambiental do governo Bolsonaro. O problema se agigantou para a economia?
    Meu primeiro artigo sobre o tema, chamado Pensando a Destruição da Natureza, tem quase 40 anos. Ignorar os efeitos do aquecimento global é praticar roleta-russa seguidas vezes porque nós somos parte da natureza. Diferentemente da covid-19, o processo de degradação do meio ambiente é uma catástrofe em câmera lenta. O que mudou subitamente de um ano e meio para cá foi a postura governamental. As queimadas e o desmatamento da Amazônia, com a desconstrução dos controles ambientais, mostram um governo na contramão do mundo e da história. O governo Bolsonaro fez do Brasil um pária do investimento internacional.
    O governo insiste na tese que é pressão geopolítica por interesses comerciais do agronegócio.
    É uma tese errada. O agronegócio brasileiro não precisa desmatar para ser competitivo. Entidades internacionais e países mais avançados nos pressionam porque a preservação do meio ambiente é um problema global. Eles estão certos, mas nós devemos cobrar deles o respeito aos objetivos de emissão de gases poluentes.

    Quais os riscos do isolamento do Brasil por conta da política ambiental de Bolsonaro?
    O investimento corporativo no mundo todo é crescentemente orientado pela preocupação com o meio ambiente e as desigualdades sociais. É uma política horrenda com o meio ambiente e extremamente prejudicial à economia.
    O governo Bolsonaro vai reagir à pressão com mudanças efetivas na política atual?
    Eu nada espero desse governo. Que dizer de um governo que desrespeita a ciência, se mostra incapaz de coordenar uma política nacional de saúde, incapaz de escolher um ministro da Educação que mereça esse nome ou elogie um secretário da Cultura nazista.
    No início da pandemia, o senhor escreveu, em um artigo, que nenhuma sociedade tolera seguir com a vida econômica como se nada estivesse acontecendo, enquanto pessoas morrem na fila de espera do hospital. Passados quatro meses, como avalia o resultado do caminho que o governo tomou no combate à pandemia, com a justificativa de preservar a economia?
    A tese de que é necessário escolher entre economia e saúde é mais uma tese errada. Quem controla a epidemia mais cedo e com mais determinação se sai melhor do ponto de vista da economia também.
    Como avalia a resposta do ministro Paulo Guedes no enfrentamento dos efeitos da pandemia sobre a economia?
    Evoluímos muito desde que o ministro disse que, com R$ 5 bilhões, o problema da saúde seria resolvido. Mas a implementação foi falha. Boa parte do dinheiro da saúde não saiu do papel. Os programas de apoio às empresas não funcionaram ou ficaram aquém do necessário. No caso das pessoas físicas, o auxílio de R$ 600 foi mal focalizado. Numa reencarnação da Dilma, o governo deu o monopólio da distribuição do auxílio à Caixa. Obviamente, para se apropriar politicamente dos R$ 600, mas também para a Caixa conseguir ter um amplo cadastro digital de clientes e ficar um pouco mais competitiva. Inacreditável. Em contraste, o Banco Central foi muito rápido e eficaz em aumentar a liquidez na economia. E está tocando bem a agenda de reduzir o spread bancário e aumentar a competição no setor financeiro.
    Cresceu a pressão para mudanças no teto de gastos. Ele deve mudar no pós-covid para ajudar na retomada?
    teto de gastos deve ser mantido após a epidemia. O que não devemos fazer é aumentar impostos. A carga tributária já é muito alta e nossa história mostra que aumentos de impostos acabam abrindo espaço para um novo round de gastos. Da década de 90 para cá, a carga tributária foi de 23% para 33% do PIB e o déficit é maior agora do que era antes.

    O que é prioridade na agenda para a retomada?
    Uma coisa é a recuperação cíclica que sempre acontece, até porque não há recessão que dure para sempre, outra coisa é a mudança estrutural no patamar de crescimento. Para sair de forma sustentada do patamar de 1% a 2% ao ano, temos de abrir a economia, fazer uma reforma administrativa para dar eficiência à máquina pública, privatizar para valer, aprovar a reforma tributária e melhorar o aprendizado nas escolas públicas. Nada disso avançou no governo Bolsonaro. Com o fim do bônus demográfico, temos de aumentar a produtividade para crescer.
    O que acha do “Renda Brasil” que o governo quer implementar para substituir o Bolsa Família?
    Um dos poucos legados positivos da epidemia foi colocar o tema da renda mínima universal na agenda política. Há ótimas propostas já prontas. Infelizmente não há como gastar mais do que já gastamos, mas unificar e focalizar melhor vários dos programas sociais existentes é um passo importante para reduzir a pobreza. O risco é a apropriação política da renda mínima para fins eleitorais.
    O ministro Paulo Guedes criticou o Plano Real ao afirmar que, se ele se fosse tão extraordinário, o PSDB não teria perdido quatro eleições. Como um dos formuladores do Plano, como recebeu essa declaração?
    Ressentimento e inveja são assuntos para divã de psicanalista. O plano foi de um extraordinário sucesso. O presidente Fernando Henrique foi eleito duas vezes no primeiro turno. Na esteira do plano, foram aprovadas as bases de funcionamento do Brasil moderno: Lei de Responsabilidade Fiscal, tripé macroeconômico, montagem das agências regulatórias, as grandes privatizações, o alongamento da dívida do Tesouro etc. A lição que fica é que, quando há uma liderança política capaz de unir o País em torno de uma visão de futuro, capaz de criar uma base parlamentar sólida e montar uma boa equipe, é possível mudar o Brasil. 

    sábado, 17 de agosto de 2019

    Mercosul: desconhecimento do ministro da Economia preocupa empresários

    Guedes diz que Brasil pode sair do Mercosul se Kirchner vencer eleição e fechar economia da Argentina

    'Desde quando o Brasil precisou da Argentina?' pergunta ministro sobre o país que é o terceiro maior parceiro comercial brasileiro

    Leo Branco
    O Globo, 15/08/2019 - 16:23 / Atualizado em 15/08/2019 - 22:04
    O ministro da Economia, Paulo Guedes Foto: Reuters
    O ministro da Economia, Paulo Guedes Foto: Reuters
    SÃO PAULO - O ministro Paulo Guedes disse nesta quinta-feira que o Brasil pode sair do Mercosul caso a candidatura do peronista Alberto Fernández, em que a ex-presidente Cristina Kirchner é candidata a vice, vença as eleições presidenciais da Argentina, marcadas para outubro.
    — Não podemos ficar pendurados na crise da Argentina. O Mercosul, claro, é um veículo de inserção do Brasil no comércio internacional. Mas, se a (Cristina) Kirchner quiser entrar e fechar a economia deles? Se quiser fechar a gente sai do Mercosul. Se ela quiser ficar aberta? Beleza, continuamos. O Brasil é uma economia continental. Temos que recuperar a nossa economia — disse Guedes, em evento a empresários e investidores promovido pelo banco Santander, em São Paulo.
    Para Guedes, uma continuidade do governo Macri facilitaria a abertura comercial do Brasil, inclusive com os Estados Unidos, por causa da proximidade entre Macri, Bolsonaro e o presidente americano Donald Trump.
    — Evidentemente há química excelente do (Mauricio) Macri com o presidente Bolsonaro, e os dois com Trump. Isso tudo facilita as coisas (para uma abertura comercial). Agora, o destino é dos argentinos. Nós somos um país continental e precisamos resolver a nossa dinâmica de crescimento. Desde quando o Brasil precisou da Argentina? — disse Guedes, dizendo que o governo tem preocupação “zero” com um eventual aprofundamento da crise no país vizinho.
    À tarde, em palestra durante seminário de gás natural no Rio, Guedes disse que não teme efeitos de uma eventual crise na Argentina ou no mundo, e que o Brasil poderá se aproveitar de eventuais oportunidades em tal cenário — promovendo, por exemplo, o crescimento da atividade de setores da indústria.
    — Não vai ser nenhum ventinho do Sul, ou ventania do mundo inteiro que vai dessincronizar o Brasil — disse Guedes. — Não tenho nenhuma preocupação. É evidente que, quando se tem o vento favorável,  fica melhor para o país. Mas nós temos muita convicção de que a dinâmica de crescimento da economia brasileira é própria. O Brasil é uma economia continental. Durante os últimos 15 anos o mundo estava crescendo aceleradamente  e nós não estávamos participando disso. Agora pode ser o contrário, o mundo pode desacelerar e podemos acelerar.
    De acordo com o ministro, o país sempre teve uma dinâmica própria de crescimento.
    — O Brasil foi até um pouco desindustrializado durante o período em que o câmbio se valorizou  — disse  Guedes. — Agora pode ser o contrário, se o mundo desacelera e caem os preços das commodities, o dólar pode subir um pouco menos e em compensação, com  energia mais barata e o câmbio um pouco mais alto, você  vai reindustrializar vários setores, como autopeças, móveis, sapatos, indústria têxtil. Nós não devemos temer o efeito contágio, o Brasil tem uma dinâmica própria. É  uma ventania que incomoda um pouquinho.
    A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, depois da China e dos Estados Unidos. Atualmente, a Argentina compra mais do Brasil do que países como Alemanha e Holanda, e é a principal compradora de produtos manufaturados brasileiros.
    No domingo, a candidatura de Fernández ficou com 47% dos votos nas primárias obrigatórias, uma espécie de prévia da votação de 27 de outubro. A chapa do presidente Maurício Macri, de cunho liberal, ficou com 32% dos votos.
    O fraco desempenho de Macri, muito abaixo das previsões de analistas, provocou pânico no mercado financeiro na Argentina e com repercussões no Brasil. O risco, para muitos analistas, é de que a volta de Cristina ao poder prejudique a abertura comercial e a liberalização econômica promovida por Macri e, também, o acordo comercial assinado entre Mercosul e a União Europeia, assinado em julho.
    Guedes avaliou ainda que o Brasil está preparado para a turbulência global causada pela guerra comercial entre Estados Unidos e China, e agravada entre os países do Mercosul pela incerteza causada pelo resultado pré-eleitoral da Argentina. Para o ministro, a economia brasileira tem uma “dinâmica de crescimento própria” por ser uma das mais fechadas do mundo.
    — Vamos continuar abrindo a nossa economia. Não somos dependentes da crise. Fechamos a nossa economia e por isso somos uma ilha, temos uma dinâmica própria de crescimento — disse à plateia.
    Mais cedo, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, não quis fazer uma previsão sobre o futuro do Mercosul caso Alberto Fernández vença a eleição presidencial na Argentina. Fernández e Cristina são tratados por Jair Bolsonaro como “ bandidos de esquerda ”. Em resposta, o candidato da oposição argentina chamou o brasileiro de "racista, misógino e violento".
    — Temos que ver qual a plataforma que eles trariam nesta hipótese — disse o ministro.
    Após três dias de perdas, a moeda argentina se valorizou 4,88% nesta quinta-feira, fechando a 57,10 pesos, um dia depois que Macri e o candidato opositor Alberto Fernández pediram calma aos mercados. Os papeis das empresas argentinas em Wall Street também subiram, e risco país, que mede o risco de não pagamento da dívida, caiu 8,5%, para 1.780 pontos — uma queda de 166 pontos em relação ao fechamento anterior.

    sábado, 11 de maio de 2019

    Reforma da Previdência: os dados foram lançados pelo ministro Paulo Guedes - Editorial Estadao

    A FONACATE, aquele órgão que representa os mandarins do Estado, e que anda falando mentiras para defender os privilégios da categoria, deveria vir desmentir estes dados apresentados pelo ministro da Economia. 
    Se sua resistência lograr conquistar um número suficiente de parlamentares para bloquear ou diluir a reforma, o Brasil vai entrar numa trajetória descendente possivelmente catastrófica para o futuro de nossos filhos e netos. A irresponsabilidade não pode triunfar, mas no Brasil tudo é possível.
    Paulo Roberto de Almeida

    O didatismo do ministro

    Paulo Guedes foi bastante didático sobre os riscos que o País 

    corre se o Congresso não aprovar a reforma da Previdência

    Notas e Informações, O Estado de S.Paulo
    10 de maio de 2019 | 03h00

    Em audiência na Comissão Especial da Câmara que analisa a proposta de reforma da Previdência, na quarta-feira passada, o ministro da Economia, Paulo Guedes, foi bastante didático ao expor os riscos que o País corre se o Congresso não aprová-la. Durante cerca de oito horas, Guedes e o secretário especial da Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, tentaram explicar aos parlamentares que o rombo da Previdência, em resumo, “é um buraco fiscal que ameaça engolir o Brasil e precisa ser atacado” – e, caso não haja reforma, ou se a proposta for muito desidratada, há sério risco de não haver dinheiro para o pagamento das aposentadorias num futuro próximo.
    Ou seja, daqui em diante, ninguém que tenha ouvido o ministro Guedes pode alegar ignorância a respeito do que está em jogo: votar contra a reforma ou impor mudanças que a tornem branda demais significa votar contra o Brasil. Não à toa, até mesmo o eleitorado do País, naturalmente refratário a mudanças que representem endurecimento das regras para as aposentadorias, já demonstra ter compreendido o imperativo da reforma. 
    Uma pesquisa realizada pelo Ibope para a Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que 59% dos brasileiros consideram necessário modificar o sistema das aposentadorias. Além disso, 71% entendem que as regras da Previdência devem ser iguais para todos – e 68% consideram que o conjunto da população é prejudicado sempre que um grupo específico ganha privilégios no sistema previdenciário.
    Um dos aspectos mais duros da reforma, o estabelecimento de uma idade mínima, tem o apoio de 72% dos entrevistados, um aumento significativo em relação aos 65% verificados em 2015. No geral, portanto, parece haver uma base sólida na opinião pública sobre a qual é possível construir o consenso em torno da aprovação da reforma no Congresso.
    O problema, como mostra essa mesma pesquisa, é o desconhecimento da proposta em si. Entre os entrevistados, apenas 36% dizem conhecer pelo menos os principais pontos do texto encaminhado pelo governo ao Congresso – e destes, 51% se dizem contrários ao que propõe o projeto.
    Na Câmara, o ministro Paulo Guedes aludiu ao problema do desconhecimento sobre a proposta de reforma. “Temos esse problema de comunicação”, disse Guedes, salientando que, enquanto a base governista é novata e desmobilizada, “a oposição é aguerrida, sabe bater, criar coisas e se isentar de problemas”. Assim, “até o governo contar a verdade dele, o tempo está passando”, acrescentou o ministro, que fez um apelo aos deputados: “Contamos com a serenidade dos senhores”.
    O próprio ministro reconheceu, contudo, que há adversários da reforma da Previdência mesmo dentro do governo. “Acho que tem gente do governo que pode até ficar feliz” se a reforma for desidratada, disse Paulo Guedes, sem citar nomes. Afinal, até mesmo o presidente Jair Bolsonaro já deu declarações sugerindo que a reforma encaminhada por seu próprio governo pode e deve ser abrandada – atitude coerente com uma carreira política marcada por franca hostilidade em relação a qualquer endurecimento das regras das aposentadorias.
    Ciente do exército bem organizado de inimigos da reforma, o ministro Paulo Guedes e seu auxiliar Rogério Marinho foram à Câmara munidos de números incontestáveis a respeito do problema previdenciário a ser enfrentado: mostraram aos deputados que os 15% mais ricos acumulam 47% da renda previdenciária; que o número de contribuintes por aposentado caiu de 14, há 40 anos, para 7 hoje, e em breve serão apenas pouco mais de 2; e que os gastos previdenciários, que representam metade dos gastos federais, são sete vezes maiores do que os da educação, quatro vezes os da saúde e três vezes a soma dos gastos de saúde, educação e segurança pública. Ou seja, “o sistema já está condenado à quebra”, disse o ministro Guedes, e isso pode levar o País à bancarrota.
    Nenhuma dessas informações é passível de controvérsias. São fatos aritmeticamente sustentados. O ministro Paulo Guedes fez bem em expor serenamente esses números aos senhores deputados, para que compreendam a dimensão do problema. Assim, se escolherem o caminho da oposição irresponsável, eles o farão sabendo perfeitamente o que isso significará para o País.

    terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

    Paulo Guedes prepara abertura do mercado - Financial Times

    Paulo Guedes prepara 'perestroika' de liberalização do mercado 

    Após 20 anos de ditadura e 30 de social-democracia, a virada para a direita é saudável, diz guru de Bolsonaro 


    Nova York 
    Financial Times, 11/02/2019

    Paulo Guedes leva o dedo à têmpora. "As pessoas da esquerda têm cabeças moles e bom coração", ele diz. "As pessoas da direita têm cabeças duras, e..." Ele busca a frase correta. "Corações não tão bons".
    É um momento de franqueza para o "superministro da economia" do Brasil, já que o presidente para quem ele trabalha, Jair Bolsonaro, é um capitão reformado do exército, direitista, e visto internacionalmente como uma espécie de protofascista com um fraco por ditaduras militares.
    A declaração também é indicativa da amplitude das posições de Guedes, e de sua crença de que Bolsonaro não é o monstro extremista que muita gente no exterior acredita. "Estamos criando uma sociedade aberta ao modo popperiano", ele diz, em uma das diversas menções que fez ao filósofo austríaco Karl Popper –proponente de uma democracia liberal dinâmica– em uma conversa ampla com o Financial Times em seu escritório em Brasília.
    "Se os modos de Bolsonaro são bruscos, isso é só aparência. Ele vai ser duro com os bandidos", acrescenta Guedes, citando os 64 mil homicídios acontecidos no Brasil em 2017. Que Popper também seja um dos heróis de George Soros, filantropo liberal odiado por alguns dos etnonacionalistas no séquito de Bolsonaro, é uma ironia que parece escapar a Guedes.
    "A ideologia é o verdadeiro inimigo", ele diz. "Já eu sou apenas um cientista fazendo meu trabalho. Cada um tem seu papel". Guedes, economista educado na Universidade de Chicago e bem sucedido administrador de fundos de investimento no Rio de Janeiro, pode ser considerado como o segundo homem mais poderoso do governo brasileiro, com cinco ministérios –fazenda, comércio, trabalho, indústria e desenvolvimento– em sua pasta. E certamente é o mais ativo.
    Enquanto Bolsonaro se recupera de uma cirurgia, o novo governo vem sendo prejudicado por disputas internas; mais recentemente, o conservador Ernesto Araújo, ministro do Exterior, buscou uma linha mais dura quanto à Venezuela, ante a abordagem militar mais cautelosa apoiada pelo vice-presidente, general Hamilton Mourão.
    Em contraste, a equipe econômica de Guedes já começou o trabalho em ritmo acelerado, com propostas ambiciosas de reforma. "O Brasil é a oitava maior economia do planeta, mas está em 130º lugar em grau de abertura, perto do Sudão. Também está em 128º lugar em termos de facilidade de fazer negócios. Quero dizer... Jesus Cristo!", ele diz, saltando da cadeira.
    Guedes –bronzeado, intenso em sua conversação, e movendo as mãos nos gestos largos característicos dos moradores do Rio de Janeiro– diz que deseja cortar essas posições pela metade em apenas quatro anos, por meio de cortes de gastos, reforma do bizantino código tributário brasileiro, eliminação de burocracia e privatização de ativos estatais.
    Nascido em uma família de classe média baixa, Guedes bancou sua educação por meio de bolsas de estudo e conquistou um doutorado em economia pela Universidade de Chicago. Mais tarde, trabalhou no Chile durante a ditadura de Pinochet, e só saiu de Santiago com sua mulher depois de ter surpreendido a polícia secreta revistando seu apartamento.
    "O Chile que encontrei era mais pobre do que Cuba e a Venezuela hoje, e os 'Chicago boys' consertaram o país. Hoje o Chile é como a Suíça", ele diz, desconsiderando custos sociais como o desemprego de 21% que o país registrava em 1983. "Isso é asneira", ele diz. "O desemprego já estava lá. Mas estava escondido dentro de uma economia destruída". É uma opinião contenciosa.
    De volta ao Brasil, ele se tornou administrador de investimentos, "day trader" ocasional, e colunista prolífico na imprensa. Ele diz ter sido apresentado a Bolsonaro "exatamente um ano e um dia atrás", e que rejeitou diversos convites anteriores para postos no governo; Guedes recorre ao jargão dos operadores de mercado para justificar sua escolha de aceitar o convite do presidente.
    "Passei a vida gerando alfa [desempenho superior ao mercado] e vendo sucessivos governos destruírem beta", ele diz. "Agora quero melhorar o beta do Brasil", acrescenta, usando a letra grega que descreve o desempenho subjacente do mercado.
    Depois de 20 anos de ditadura e 30 anos de social-democracia, a virada do Brasil para a direita é saudável, ele diz. "Quando os liberais chegam ao poder, isso é boa notícia, não má notícia".
    Ainda restam dúvidas, no entanto. E quanto à política social, se considerarmos a desigualdade gritante do Brasil? Será que sua magia do livre mercado se manterá compatível com o liberalismo político, dadas as inclinações aparentemente autoritárias de Bolsonaro?
    "Certamente. A Rússia e o Brasil tiveram a glasnost antes da perestroika", ele diz, se referindo a políticas de abertura ou liberalização política e econômica, respectivamente. "As duas coisas são necessárias. Com isso você tem crescimento, e uma classe média que traz estabilidade". O caminho alternativo tomado pelo Brasil conduz a um Estado de rentistas, caracterizado pela corrupção.
    "Somos uma democracia perneta", ele diz. "O sistema é corrupto. Por que outro motivo Lula, o político mais popular do Brasil, seria condenado a 13 anos de prisão por acusações de corrupção?"
    Ele aponta para um televisor, no qual um noticiário acabava de informar sobre a mais recente condenação do ex-presidente. Luiz Inácio Lula Silva já tinha sido sentenciado a 12 anos de prisão. Os críticos dizem que isso foi obra de um Judiciário manipulado pelos políticos, que queriam excluir o líder esquerdista da eleição e abrir caminho à vitória de Bolsonaro.
    Guedes aponta que em lugar disso foi o sistema de compadrio profundamente enraizado na política brasileira que o enredou. A receita para corrigir esse problema é "uma economia propelida pelo mercado e não a economia dirigista fracassada que corrompeu a ordem política". Poucos brasileiros discordariam desse diagnóstico, se levarmos em conta que o país continua a sofrer as consequências da pior recessão e do maior escândalo de corrupção de sua história.
    A visão econômica de Guedes é mais Ronald Reagan que Donald  Trump, e ele parece realista quanto às limitações políticas. "O presidente [sempre pode dizer] não, os votos são meus". Economista teórico que planeja chegar às estrelas, Guedes aparentemente se satisfaria com atingir a lua, e sabe que a viagem será complicada. "Sim, a economia vai crescer mais rápido. Mas não podemos ser ingênuos. Há muitos danos a consertar". 
    Financial Times

    quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

    Retrato do futuro czar da economia: Paulo Guedes

    Paulo Guedes, o oráculo do Estado minúsculo que acalmou Bolsonaro
    Por Fernando Cesarotti; ilustrado por Cassio Tisseo
    VICE Brasil, Nov 30 2018, 7:00am


    Na série que apresenta os ministros do presidente eleito do Brasil, a VICE conta a história do futuro dono da pasta da Fazenda.

    Reduzir a carga tributária. Reduzir o número de impostos. Reduzir o déficit fiscal. Reduzir a inflação. Reduzir o tamanho do Estado, privatizando o máximo de estatais possível – todas elas, se for o caso. Depois de décadas trabalhando no mercado financeiro, sempre pensando em aumentar lucros e ganhos de seus bancos e fundos de investimento, Paulo Guedes assume em janeiro o comando da economia no governo Jair Bolsonaro tendo “reduzir” como palavra de ordem.
    Curiosamente, nem sempre foi assim. A formação em economia de Guedes o fez inicialmente um keynesiano, ou seja, um defensor das ideias de John Maynard Keynes, teórico britânico famoso por defender a importância da intervenção do Estado. Mas a viagem do jovem carioca para estudar nà Universidade de Chicago, com direito a bolsa no CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa) o colocou em contato com Milton Friedman, um dos criadores do pensamento ultraliberal que dominou o mundo nos anos 1970 e 1980, sob a liderança política da premiê britânica Margaret Thatcher e do presidente norte-americano Ronald Reagan. E Guedes se tornou então aquilo que ficaria conhecido, muitas vezes em tom de ofensa, como um “neoliberal”.
    Depois de conseguir seu PhD nos Estados Unidos, Guedes voltou ao Brasil e virou professor em tempo parcial na FGV e na PUC-RJ, onde daria aula para futuros medalhões como Armínio Fraga, presidente do Banco Central no governo Fernando Henrique Cardoso. Mas, sem espaço no governo para implantar suas ideias, aceitou um convite para dar aulas na Universidad de Chile, então sob intervenção da ditadura de Augusto Pinochet.
    O Chile ficou conhecido nesse tempo por ser uma espécie de laboratório do neoliberalismo, com a presença de outros “Chicago boys” além de Guedes. Entre outras medidas controversas, o grupo comandou uma reforma da Previdênciaque adotou, de forma pioneira no mundo, o sistema individual de capitalização, semelhante aos regimes privados em vigor no Brasil hoje. Funciona assim: cada trabalhador economiza para sua própria aposentadoria, sem contribuição obrigatória dos empregadores ou participação do Estado. O problema é que o sistema tem apresentado problemas e o presidente Sebastian Pinera, de centro-direita, estuda uma nova reforma, já que alterações feitas pela esquerdista Michele Bachelet não deram resultado e a renda média dos aposentados chilenos não chega a metade do salário mínimo local.
    De volta da experiência chilena, Guedes entrou de cabeça no mercado financeiro. Foi um dos fundadores do banco Pactual e comandou diversos fundos de investimentos, também sob alguma polêmica – o Ministério Público Federal investiga a existência de fraude na gestão de recursos oriundos de fundos de pensão de empresas estatais, acusação negada pelo economista.
    Há quem diga que Guedes se considera um incompreendido e que decidiu se juntar a Bolsonaro por enxergar uma chance, talvez a última, de aplicar sua cartilha ultraliberal no Brasil. Era uma tabelinha aparentemente complicada, afinal, Bolsonaro é um ex-militar, e os governos militares do Brasil ficaram famosos pelo apego ao desenvolvimentismo com ação direta do Estado, ilustrada pela construção de obras faraônicas e pela criação de dezenas de estatais. Além disso, muitos militares são extremamente nacionalistas, e a própria campanha de Bolsonaro pregou “o Brasil acima de tudo”, enquanto os liberais não são exatamente famosos pelo apego a fronteiras e nações.
    Mas o fato é que a tabelinha deu certo. A presença de Guedes como “posto Ipiranga”, apelido dado pelo próprio Bolsonaro por ser a fonte de todas as respostas sobre economia, fez com que o outrora candidato visto como radical ganhasse ares de moderação e o aval do chamado “mercado”, aquela entidade quase mística que interpreta e respalda as decisões a respeito da economia e, no fim das contas, do dia a dia dos cidadãos.
    O que se espera agora é como Guedes lidará com a questão política. Como gestor na iniciativa privada, ele sempre teve plena liberdade de ação, coisa que não acontece no setor público, onde há fiscalização de outros poderes e necessidade quase infinita de negociações. A primeira impressão junto ao Congresso, por exemplo, não foi nada boa: em reunião com o presidente do Senado Eunício Oliveira (MDB-CE) sobre a aprovação do Orçamento da União para 2019, Guedes deu algumas bolas fora, como tentar forçar a votação da reforma da Previdência para ainda este ano e dizer que votar o Orçamento “não era importante”. “Se vocês não aprovarem tudo aquilo que nós queremos esse ano, o PT volta. Se aprovar a reforma o Brasil vai crescer a 6%, se não aprovar o Brasil não vai crescer, eu vou culpar vocês”, disse Guedes a Eunício, segundo relato do senador.
    Críticos e opositores também estão de olho num possível conflito de interesses, já que fundos ligados a Guedes têm participação, por exemplo, em grupos privados de ensino superior, num cenário em que a redução de verbas para as universidades federais já é um problema crônico. 
    Para aplicar suas ideias, Guedes se cercou de gente ligada ao mercado, como Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central; Roberto Castello Branco, presidente da Petrobras; e Salim Mattar, secretário de desestatização. Joaquim Levy, ex-ministro da Fazenda da Dilma Rousseff numa desastrada tentativa de aceno do PT aos mercados, será o presidente do BNDES. A gestão de Guedes à frente da economia brasileira parece destinada a um ditado popular: a sorte está lançada. Dependendo do que acontecer, talvez seja preciso recorrer a outro: salve-se quem puder.

    Nome: Paulo Roberto Nunes Guedes
    Idade: 69 anos
    Ministério: Fazenda
    Formação: Bacharel em Economia pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), com mestrado pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) e doutorado na Universidade de Chicago 
    Partido: não tem
    Acompanhe os perfis de todos os ministros do Brasil na série A banca de Bolsonaro.
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    A seguir: Ricardo Vélez-Rodríguez

    domingo, 11 de novembro de 2018

    Paulo Guedes: o custo do aprendizado - Pedro Paulo Zahluth Bastos

    Normal que quem nunca trabalhou no governo tenha certa dificuldade em adentrar nos arcanos na burocracia governamental, que tem seus ritos, procedimentos, dificuldades e peculiaridades dos processos próprios a cada área, sem necessariamente coordenação entre elas.
    Vai ser um duro processo de aprendizado, embora possam ocorrer surpresas no meio do caminho.
    Vamos aguardar e dar um crédito de confiança.
    Paulo Roberto de Almeida

    Gestão

    Em que mundo vive Paulo Guedes?

    Carta Capital, 09/11/2018 16h53
    O “superministro” não sabe como se prepara um OrçamentoShare
    Fernando Frazão/Agência Brasil
    Em que mundo vive Paulo Guedes?
    Guedes desafia a lógica
    Não acreditei, confesso, quando li a mensagem de WhatsApp: só pode ser fake news. Um técnico do IPEA informava que o futuro ministro da Economia do governo Jair Bolsonaro, Paulo Guedes, tinha acabado de ter uma reunião com integrantes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
    Os técnicos discutiam a LOA e foram interrompidos pelo futuro ministro: o que mesmo é a LOA? Sério? Não pode ser. Como é possível que um economista experiente prestes a assumir o Ministério da Economia não saiba que a LOA é a Lei Orçamentária Anual? Só pode ser brincadeira de petista infiltrado.
    Só que não. A jornalista Cristiana Lobo revelou anteontem em rede nacional que o presidente do Senado, Eunício Oliveira, convidou Guedes para discutir o orçamento e sua lei. A LOA. Guedes não se interessou, respondendo que faria o orçamento de 2019 só depois de tomar posse, no ano que vem. O senador precisou explicar que a LOA era o orçamento “do ano que vem”.
    Os sinais de desorientação na cúpula econômica do novo governo não são novos, diga-se de passagem. Na entrevista em que destratou uma jornalista do El Clarín da Argentina apenas por lhe perguntar se o Mercosul seria prioridade do novo governo, Guedes revelou desconhecer o básico.
    Afirmou que “o Mercosul quando foi feito foi totalmente ideológico...Eu só vou comercializar com Argentina? Não. Eu só vou comercializar com Venezuela, Bolívia e Argentina?... Não, não é prioridade. É isso o que você quer ouvir?”
    Guedes precisa de algumas informações básicas. Número 1: o Mercosul foi assinado por Fernando Collor e Carlos Menem em 1991, e não por Lula e Kirchner em algum ano da década passada. Se “quando foi feito foi totalmente ideológico”, a ideologia do Mercosul era a de neoliberais como Guedes.
    De fato, não há regras trabalhistas, ambientais ou fiscais comuns no Mercosul, o que permite que as empresas se desloquem em busca de normas mais “amigáveis” (livre poluição, por exemplo), ou salários e impostos menores.
    Era exatamente por isso que o pai do neoliberalismo, Friedrich Hayek, era um entusiasta do livre mercado europeu, como Quinn Slobodian nos lembrou recentemente. O ex-embaixador Rubens Barbosa, que de nacionalista parece ter muito pouco, adora certas coisas no Mercosul.
    Ex-sócio da firma da insuspeita secretária de Estado dos EUA no governo Bill Clinton, Madeleine Albright, Barbosa é presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP desde 2013. Nesta condição, promoveu seminário para estimular industriais brasileiras a se deslocarem para o Paraguai.
    Em português claro: na fronteira do lado de lá, podem pagar salários de fome e impostos, digamos, paraguaios, montando bens finais reexportados para o mercado brasileiro. Ah, como se sabe, também podem poluir com menores custos de controle ambiental “xiita”.
    Informação básica número 2: nem Bolívia nem Venezuela, dois dos três países citados por Guedes, são integrantes originais do Mercosul. Foi apenas em maio de 2018 que a Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, com relatoria de deputado neoliberal do PRB, aprovou a adesão da Bolívia ao Mercosul, ainda pendente.
    E desde 2016 a Venezuela está suspensa porque, felizmente, o bloco tem uma “cláusula democrática” entre seus participantes.
    Informação básica número 3: o Brasil tem superávit comercial com o Mercosul e com a América do Sul em geral. As exportações industriais são parte importante deste saldo comercial favorável. Muitas delas são feitas por filiais de grandes grupos multinacionais que tecem cadeias produtivas globais, exportando insumos e bens finais entre plantas produtivas. O Brasil é o principal centro regional delas basicamente porque tem o maior mercado interno e porque o Mercosul facilita as trocas regionais.
    Alguém tem que fornecer outras informações básicas sobre o mundo em que vivemos para os futuros ocupantes do Planalto. Nem Clinton, nem George Bush nem Barack Obama aceitaram abrir o mercado agrícola local para os exportadores brasileiros apesar da insistência de FHC e Lula. Trump, o protecionismo-mor, é quem vai fazê-lo?
    Avisem por favor que Trump incluiu a chamada “pílula de veneno” na renegociação do NAFTA do Canadá e México. Assim, ele pode retaliar caso os “parceiros” fechem acordos com a China, com a qual, aliás, Trump está em guerra comercial aberta.
    Alguém tem de avisar Bolsonaro e Guedes que a China é o principal destino das exportações brasileiras. E é bom que Bolsonaro pense duas vezes antes de voltar a visitar Taiwan, considerada uma província rebelde em Pequim.
    Alertem por gentileza que sair do Acordo de Paris para o clima sujeitará o Brasil a retaliações comerciais da União Europeia. E que os árabes vão deixar de importar carnes halal do Brasil caso mudemos nossa embaixada para Jerusalém por pressão não da comunidade judaica, mas de igrejas evangélicas que apoiaram Bolsonaro. Torçamos para que fanáticos do outro lado não passem a ver a camisa brasileira com ódio nas praias do Egito ou na Copa do Mundo no Catar.
    Talvez alguns industriais tenham apoiado Bolsonaro por  imaginarem que, com ele, não seria mais necessário transferir empresas para o Paraguai para pagar salários e impostos paraguaios. Tudo bem, talvez não saibam que os trabalhadores gastam seus salários antes do fim do mês, transformando-os em lucros de outros empresários aqui mesmo no mercado interno.
    Talvez não saibam também que o corte prometido do gasto público vai afetar vendas e lucros das empresas, pois o governo não compra em Marte e sim no Brasil. Mas ao menos alguns estão arrependidos por terem apoiado um presidente cujo “Posto Ipiranga” disse que vai “salvar a indústria apesar dos industriais”.
    Não vou dizer bem-feito porque, apesar da Fiesp, sou nacionalista. Não proponho rebatizar a Fiesp de Federação das Importadoras do Estado de São Paulo. Só aviso que os níveis de provincianismo e desinformação em Brasília vão aumentar perigosamente no ano que vem. A Barra da Tijuca, apesar da réplica da Estátua da Liberdade, não é Nova Iorque.

    quarta-feira, 31 de outubro de 2018

    Reservas internacionais do Brasil: qual o melhor uso? (jornais)

    Matérias da imprensa nesta quarta-feira, 31/10/2018:

    O Estado de S. Paulo – Guedes e as reservas / Coluna / Monica de Bolle


    Em junho deste ano escrevi nesse espaço artigo intitulado “Reservas, para que te quero”. Tratava do volume de nossas reservas internacionais e de propostas sobre como utilizá-las caso houvesse julgamento de que estavam em patamar além do considerado “adequado”. O FMI tem uma metodologia para calcular o nível adequado de reservas para cada país, levando em conta diversas variáveis, inclusive os juros internacionais e o ambiente para os mercados emergentes. De acordo com as contas mais recentes, aponta o Fundo que o nível das reservas brasileiras está cerca de 1,6 vez mais elevado do que o patamar que o FMI consideraria adequado. Isso significa que já podemos começar a usar os US$ 140 bilhões para alcançar algum objetivo?

    Na época em que escrevi o artigo supracitado, argumentei que as reservas poderiam ser usadas para recomprar uma parte da dívida brasileira, o que ajudaria a reduzir seu custo de carregamento. Contudo, alertei que tal medida não poderia ser feita de forma isolada: importante seria pensar no uso das reservas para esse propósito como um dos elementos de uma agenda mais ampla de ajustes que incluísse as medidas fiscais cabíveis para reduzir o déficit público e as reformas que não podem mais esperar, como a da Previdência. Evidentemente, sair vendendo reservas antes de consertar os graves problemas fiscais que tem o Brasil seria medida absolutamente inconsequente, sobretudo tendo em vista o ambiente externo menos favorável para mercados emergentes e a crise que se abateu sobre a vizinha Argentina.

    Por que se fala em um nível adequado de reservas? A razão é que há um cálculo de custo-benefício para mantê-las: de um lado, volumes maiores de reservas servem como um seguro contra crises externas e episódios de extrema turbulência nos mercados internacionais. De outro, quanto mais reservas tem um país, maior o custo de carregá-las – isso porque, para que sirvam como um seguro em momentos de fortes oscilações externas, é preciso investi-las em ativos de alta liquidez, que naturalmente têm taxas de rendimentos menores. A alternativa seria investir esses recursos em ativos com taxas de retorno mais elevadas, porém abrindo mão da possibilidade de usálos em qualquer momento, isto é, da liquidez.

    Há diversos estudos interessantes sobre o nível adequado das reservas internacionais. Em um deles (Kim e Lee, 2017, Asymmetric Stabilizing Impact of International Reserves), os autores mostram como muda o nível adequado em função do ambiente interno e externo.

    Durante períodos de calmaria, o patamar adequado poderia ser menor, pois predomina o impacto do custo de carregar reservas sobre o benefício de tê-las. Em momentos de turbulência, seja externa ou interna, predomina o efeito do benefício – o seguro – sobre o custo potencial de carregar mais reservas. O Brasil não enfrenta calmaria alguma, por mais que tenham reagido bem os mercados à eleição de Jair Bolsonaro. Ainda temos um ambiente de instabilidade política interna, um presidente eleito que pouca clareza deu aos seus planos econômicos, e uma equipe econômica que não parece ainda estar falando com uma só voz.

    Desde domingo, por exemplo, proliferaram informações contraditórias sobre o posicionamento de diferentes membros do círculo íntimo de Bolsonaro sobre a reforma da Previdência. Além disso, o ambiente externo exige cautela, não apenas por causa das dúvidas sobre os efeitos da guerra comercial

    Surgem as consequências de uma campanha sem qualquer discussão sobre a agenda de medidas e reformas

    entre China e Estados Unidos, como também em razão da maior desconfiança de investidores estrangeiros em relação aos países emergentes, haja vista a situação da Argentina e da Turquia. Some-se a isso o quadro de elevação das taxas de juros nos EUA e a falta de clareza sobre o ajuste fiscal brasileiro e o que temos é um ambiente em que qualquer discussão sobre o uso das reservas deveria estar, no mínimo, postergada.

    Contudo, noticiou o jornal Valor Econômico que Paulo Guedes e sua equipe flertam abertamente com a ideia de usar as reservas para reduzir os juros da dívida sem que exista qualquer condição de fazer isso agora. Estão aí as primeiras consequências de termos passado por campanha inteira sem nenhuma discussão sobre a agenda de medidas e reformas econômicas para o País. O resultado disso é muito ruído e pouco sinal em uma economia que exige clareza para se reerguer, evitar uma crise mais profunda, e dar algum consolo aos cerca de 13 milhões de desempregados.

    ECONOMISTA, PESQUISADORA DO PETERSON INSTITUTE FOR INTERNATIONAL ECONOMICS E PROFESSORA DA SAIS/JOHNS HOPKINS UNIVERSITY

    Valor Econômico – Guedes usaria reserva em caso de ataque à moeda


    Por Cristiane Agostine | Do Rio

    Futuro ministro da Economia de Jair Bolsonaro (PSL), o economista Paulo Guedes disse ontem que o governo poderia vender hipoteticamente US$ 100 bilhões das reservas internacionais, aproveitando para, com isso, reduzir a dívida interna. "Se [o dólar] chegar a R$ 4,20, R$ 4,30, R$ 5, vai ser muito interessante, porque vamos vender US$ 100 bilhões de reservas, que são R$ 500 bilhões", afirmou o economista, ressaltando a importância de um "regime fiscal robusto" para se adotar essa estratégia. Isso permitiria ao país ter um volume menor de reservas - hoje, elas estão na casa de US$ 380 bilhões, e têm um custo fiscal elevado.

    "Se houver especulação e jogarem o dólar para cima, não tem problema nenhum, não temos receio nenhum", reiterou Guedes, por diversas vezes, em entrevista ontem no Rio. "Pode vir, pode especular contra, não tem problema nenhum", repetiu. "Se tiver crise e botarem o dólar lá em cima, a R$ 4, R$ 5, será ótimo. Quem quiser dólar nós vamos vender e depois vamos reduzir a dívida interna."

    Guedes deu essas declarações ao comentar a manchete do Valor de ontem, que relata que ele havia proposto a redução das reservas em discussões internas com a equipe que elabora o plano econômico de Bolsonaro. O futuro ministro da Economia disse que o tema surgiu quando o dólar bateu em R$ 4,10, há cerca de um mês, e acrescentou a informação de que falou num valor de US$ 100 bilhões.

    Em entrevista a jornalistas, Guedes deu ontem mais detalhes sobre o assunto. "Eu comentei com o time [que elabora as propostas econômicas para Bolsonaro]: É interessante como faz falta o ajuste fiscal. Quando existe um regime fisal robusto, não existe essa necessidade de carregar tantas reservas, porque isso é um seguro muito caro", afirmou ele. "Quando entra dinheiro de fora, você acumula reservas e emite reais. Depois você emite dívida interna para esterilizar esse dinheiro que entrou de fora." O volume elevado de reservas e o baixo déficit em conta corrente são fatores que reduzem a vulnerabilidade da economia brasileira, num momento em que a situação das contas públicas é delicada.

    Segundo Guedes, a venda de reservas seria feita apenas em um cenário de crise. "O dólar está a R$ 3,60. Para que vou vender dólar? Para derrubar exportação? Para empurrar para baixo?", disse ele, ao chegar à casa do empresário Paulo Marinho, no Rio. De acordo com ele, não haverá meta para câmbio.

    "Se houver uma crise especulativa, não tem problema nenhum. Isso vai acelerar o ajuste fiscal", disse Guedes. Ele enfatizou que, se o dólar chegar a R$ 5 e forem vendidos US$ 100 bilhões das reservas, isso equivale a R$ 500 bilhões, que seriam usados para abater a dívida interna. "Eu vendo as reservas, reduzo a dívida de R$ 3,5 trilhões para R$ 3 trilhões e depois sigo a vida. Isso já é um ajuste fiscal em si. Isso já me economiza", afirmou Guedes, que tem como um de seus objetivos principais reduzir o endividamento público e, com isso, diminuir os gastos com juros.

    "Qualquer economista bem preparado conhece o que nós chamamos de política de esterilização. Há um ataque cambial, você reduz um pouco as reservas e esteriliza esse efeito recomprando a dívida interna", disse Guedes aos jornalistas.

    O futuro ministro afirmou ainda que o próximo governo vai aprovar um projeto que garanta autonomia ao Banco Central, com mandatos não coincidentes com o de presidente da República. De acordo com ele, a permanência de Ilan Goldfajn no BC seria natural. No entanto, disse que ainda não conversou com o atual presidente do BC. Guedes ressaltou que não quer falar com alguém que não tenha o desejo de ficar. "A motivação é fundamental." Guedes citou ainda que Ilan assumiu o cargo "por acidente".

    "Ilan ficou dois anos com Temer. O desenvolvimento natural qual seria? Eu defendo há 30 anos um BC independente. O Ilan tem uma proposta de BC independente. O que seria a coisa mais natural do mundo? Eu dar um abraço no Ilan e falar que defendo há 30 anos BC independente. Ele falaria que tem um projeto de BC independente. A gente vai junto, aprova o projeto, você ficou dois anos e ficaria mais dois anos", afirmou ele. De acordo com Guedes, essa eventual permanência do presidente do BC teria que ser combinada com a equipe de Bolsonaro e com Ilan.

    Guedes destacou a relevância do projeto de independência do BC para eliminar as incertezas em relação à autoridade monetária em época de eleição. Com mandatos não coincidentes para a diretoria do BC, essa fonte de indefinição seria eliminada.

    Ao comentar a ideia de vender reservas para abater a dívida pública, o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto, diz que qualquer mudança a respeito precisa ser feita com muito cuidado. "Teoricamente faz sentido, mas é necessário avaliar o risco macroeconômico", afirma Salto, ressaltando a importância de o governo se concentrar em medidas para melhorar o resultado primário (que não inclui gastos com juros), com prioridade para o controle das despesas. É preciso avaliar com muita cautela o impacto que a medida teria sobre o câmbio, diz ele. A venda de um volume muito expressivo de reservas pode causar uma valorização muito rápida do real, ao colocar "uma montanha de dólares na economia", diz Salto.

    Há um ganho fiscal, que se daria com a redução das operações compromissadas, pelas quais o BC vende no mercado títulos do Tesouro com o compromisso de recomprá-los depois de um prazo determinado, afirma Salto. Elas fazem parte da dívida bruta, tendo um prazo médio inferior a 30 dias. O fundamental, segundo ele, é avançar na melhora estrutural das contas públicas. Uma eventual venda das reservas para reduzir a dívida deve ser muito cuidadosa, sendo "precedida ou acompanhada" por mudanças no gasto primário, diz Salto. (Colaborou Sergio Lamucci, de São Paulo)

    Valor Econômico – Mercado mostra dúvidas sobre a venda de reservas


    Por Cristiane Agostine, Estevão Taiar, Lucinda Pinto, Lucas Hirata, Silvia Rosa e Ribamar Oliveira | Do Rio

    A ideia do governo Jair Bolsonaro de vender parte das reservas internacionais para reduzir a dívida pública, antecipada ontem pelo Valor, provocou discussões no mercado financeiro. O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, explicou que a venda de reservas, hoje em US$ 380 bilhões, será feita apenas em um cenário de crise especulativa sobre o câmbio no país. "Se botarem o dólar lá em cima, a R$ 4 ou R$ 5, será ótimo. Vamos reduzir dramaticamente a dívida interna". Segundo ele, seria possível vender US$ 100 bilhões com o dólar a R$ 5, o que reduziria a dívida interna em R$ 500 bilhões.

    Cândido Bracher, presidente do Itaú, disse que a ideia é interessante, porque teria impacto fiscal positivo. Mas sugeriu que a venda teria de ser gradual. Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, tem a mesma opinião, com a ressalva de que antes de vender reservas é preciso aprovar as reformas e "mostrar uma trajetória de sustentabilidade fiscal". Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, lembrou que essa discussão não é muito relevante no momento, porque as reservas representam "um seguro" para o país, cujo custo diminuiu em função da redução da diferença entre o juro brasileiro e o americano. Para Luis Costa, do Citi em Londres, o ideal seria reduzir reservas apenas depois de o Banco Central zerar o estoque de swaps cambiais, hoje em US$ 68,8 bilhões.

    Há no mercado relativo consenso sobre o excesso de reservas no momento, em razão do custo fiscal que elas impõem. Mas entende-se que sua redução seria arriscada, porque poderia piorar a percepção de risco do investidor em relação ao país. Argumenta-se, também, que vender reservas num momento de ataque especulativo, com o dólar em disparada, seria o mesmo que "discutir o seguro quando a casa estiver pegando fogo".

    As explicações de Guedes também deixaram duas perguntas no ar: haverá no novo governo um teto para o câmbio? Qual seria essa cotação?