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sexta-feira, 12 de maio de 2023

Plano de paz do Brasil pode funcionar com cansaço de países na guerra, diz Amorim - Patricia Campos Mello (FSP)

 Guerra da Ucrânia Diplomacia Brasileira Governo Lula

Plano de paz do Brasil pode funcionar com cansaço de países na guerra, diz Amorim

Assessor de Lula se reuniu com Zelenski e sugeriu modelo de 'negociação por proximidade' entre Rússia e Ucrânia

São Paulo

O assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para política externa, Celso Amorim, propôs ao presidente da UcrâniaVolodimir Zelenski, o início de um processo diplomático chamado de "negociações por proximidade", mesmo antes de a Rússia desocupar os territórios que capturou.

Nesse modelo, dois países em conflito se reúnem em uma cidade e se comunicam por meio de intermediários não alinhados a nenhum deles, trocando informações sobre posicionamentos e ideias e se preparando para o contato direto.

O assessor especial para política externa do presidente Lula, Celso Amorim, durante reunião no Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia, em Kiev
O assessor especial para política externa do presidente Lula, Celso Amorim, durante reunião no Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia, em Kiev - Divulgação Governo da Ucrânia

Zelenski tem deixado claro que o único plano de paz aceito pela Ucrânia tem como condição prévia a desocupação dos territórios ucranianos e reforçou esse posicionamento nas redes sociais após o encontro com Amorim nesta quarta-feira (10).

Mesmo assim, o ex-chanceler se mostrou otimista. "Ele ouviu", disse à Folha, descrevendo a reação do ucraniano às ideias do Brasil para a paz.

 

Qual foi o objetivo da sua visita à Ucrânia? O objetivo foi a criação de confiança, manutenção do diálogo. A negociação tem várias etapas, a primeira é a criação de confiança entre os atores. Para isso, ela foi muito positiva.

Zelenski abordou a ideia de criar um tribunal internacional para julgar o crime de agressão? Qual é o posicionamento do Brasil nesse sentido? Não abordou. Para cada lado, a agressão é vista de forma diferente. Se você falar com os russos, eles vão dizer que as populações russas do leste da Ucrânia também estão sendo atacadas. Eu compreendo a posição dos ucranianos, eles querem naturalmente mostrar como foram vítimas da agressão, mas eu não quero ficar nisso.

Acho importante, até comentei com Zelenski, o processo diplomático chamado "negociações por proximidade", citado por Thomas Pickering. É um método usado com sucesso em situações análogas [Pickering foi embaixador dos EUA na ONU e citou a abordagem que envolve países terceiros em artigo na revista Foreign Affairs].

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    O terceiro país seria o Brasil ou a China? A China é um país que tem grande influência, comentei com o presidente Zelenski. Não estou dizendo se ele concordou ou não. E o Brasil também tem muita influência, por suas características. É só ver a importância que a mídia internacional dá à posição do Brasil.

    Em tuíte após a reunião com o senhor, Zelenski afirmou que "o único plano capaz de deter a agressão russa é a fórmula de paz da Ucrânia". Ou seja, ele continua rejeitando a ideia de negociar antes de a Rússia desocupar os territórios ucranianos. Ele vai verbalizar dessa forma, da mesma maneira que os russos dizem que esse não é o melhor momento para negociar. Mas a gente não pode desistir. Desistir é a pior opção. Haverá um momento, até mesmo pelo cansaço dos países que apoiam um ou outro, em que o dano causado pela guerra será maior do que prejuízo causado por alguma concessão. Nesse momento, é importante que já haja países que estejam articulados, para que a oportunidade não escape entre os dedos. Eu acho que esse pode ser o papel do Brasil.

    O secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que "se a Rússia parar de lutar, acaba a guerra. Se a Ucrânia parar de lutar, acaba a Ucrânia", em alusão à possibilidade de que Moscou fique com os territórios capturados. Como vê essa declaração? Temos conversado com os americanos também, sabemos de algumas preocupações deles. Mas as situações econômicas e políticas vão evoluindo. Respeito muito a posição dele, mas acho que tudo isso é muito retórico. Chegará o momento em que os países terão que optar entre a paz e a vitória; a vitória não virá claramente para nenhum dos dois.

    Existe justamente essa aposta da Rússia de que o Ocidente vai se cansar, por motivos econômicos e políticos, de ajudar a Ucrânia, e que assim os russos vencem o conflito. Poderá sim haver o cansaço, mas o que é uma vitória de um ou de outro? É difícil de dizer. Ninguém levará tudo que quer de jeito nenhum. Então qual será a concessão fundamental?

    Como o senhor vê a proposta de Zelenski de fazer uma cúpula Ucrânia-América Latina? Na minha opinião, isso mostra que ele tem confiança no Brasil.

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    Mesmo ele dizendo que o único jeito de parar a agressão russa é a fórmula ucraniana que implica desocupação dos territórios? Eu não esperaria que ele dissesse outra coisa. Eu não fui para lá para dizer "esta proposta aqui está certa ou errada". Eu também conversei com Putin durante uma hora. A gente não tem uma tese, queremos apenas tornar o diálogo mais próximo, possível, talvez inicialmente de uma forma indireta. Eu não o vi reagir negativamente a essa ideia indireta. Mas não estou dizendo que ele concordou.

    Zelenski encarou com boa vontade o Brasil como mediador? Ele ouviu. A gente tem que ir falando, conversando, até surgir uma situação, às vezes algum aspecto específico, humanitário, alimentar, e aí expandir a negociação.

    Eles levaram o senhor para Butcha (cidade ucraniana onde corpos foram encontrados nas ruas e em valas comuns após a retirada russa)? Sim, mas em Butcha vimos uma igreja, e dentro dela, uma exposição fotográfica. Obviamente nós somos contra as atrocidades e as mortes em qualquer lugar que ocorram. São imagens fortes, não vou entrar em detalhes. Mas não dá para tirar conclusões totalmente, são fotos.

    Quais são os próximos passos? Continuar conversando. Esta visita era um passo importante que tinha que ser dado para mostrar que o Brasil é a favor da paz, não de A ou de B.

    Zelenski convidou Lula a ir para a Ucrânia. Há previsão para a viagem? Não discuti isso com o presidente.

    E há um convite da Rússia para o fim de junho. Tudo isso será avaliado.


    Raio-X | Celso Amorim, 80

    Atual assessor-chefe da assessoria especial da Presidência da República, é considerado o principal conselheiro de Lula na área de política externa. Foi chanceler por dois períodos: primeiro no governo de Itamar Franco, de 1993 a 1995, e, depois, nos governos Lula 1 e 2, de 2003 a 2011. Nesse meio-tempo, chefiou a missão brasileira na ONU, em Nova York e em Genebra.