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quarta-feira, 24 de março de 2021

O patético chanceler acidental MASSACRADO no Senado, com razão: Ernesto: CAIA FORA! - Congresso cobra demissão imediata de Araújo - Daniel Rittner, Murillo Camarotto e Renan Truffi (Valor)

 Congresso cobra demissão imediata de Araújo

Em um depoimento de quase quatro horas, Araújo alternou momentos em que desafiou parlamentares com outros nos quais parecia acuado, gaguejando e com suor escorrendo pela testa
Por Daniel Rittner, Murillo Camarotto e Renan Truffi, Valor — Brasília, 24/03/2021
Mais de dez senadores -- de diferentes partidos -- cobraram duramente o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, pela condução errática da política externa e elevaram a pressão por sua saída imediata do cargo. Em um depoimento de quase quatro horas, Araújo alternou momentos em que desafiou parlamentares com outros nos quais parecia acuado, gaguejando e com suor escorrendo pela testa.
"Com toda a humildade, faço um apelo: renuncie. O senhor não tem mais condições de continuar à frente do ministério", pediu o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). "Pode ser um excelente diplomata, mas não é o seu momento. Pelos brasileiros, renuncie a esse ministério".
Durante toda a audiência, Araújo foi questionado sobre sua postura em episódios como a demora em reconhecer a vitória eleitoral de Joe Biden nas eleições americanas, a invasão do Capitólio (na qual chamou manifestantes de "cidadãos de bem"), as rusgas públicas com o embaixador da China em Brasília, o uso do termo "comunavírus" e da expressão "pária internacional" para designar a forma como o Brasil deveria ser visto no mundo.
"O senhor realmente cursou o Instituto Rio Branco?", questionou o senador Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele reclamou que faltavam sujeito, verbo e predicado na maioria das respostas de Araújo. "O senhor faria bem ao corpo diplomático brasileiro se deixasse o seu posto".
Em vários momentos, Araújo questionou as "fontes" que subsidiavam os questionamentos dos senadores e usou um tom desafiador. Em uma ocasião, ironizou: "Deixe eu tentar encontrar alguma pergunta objetiva aqui".
"Nós não somos 80 idiotas", retrucou Tasso. A senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) queixou-se da "falta de respeito" e apontou confusão do chanceler em suas intervenções. "Não sei se o chanceler não entende ou se faz-se de desentendido. Provavelmente seja assim nas nossas relações exteriores", disse Daniella. Jorge Kajuru (Cidadania-GO) veio em seguida: "Saia do Ministério das Relações Exteriores!".
Pela manhã, durante a reunião convocada pelo presidente Jair Bolsonaro para a criação de um comitê de crise sobre a pandemia, Araújo ouviu uma reprimenda pública do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O parlamentar cobrou uma atuação mais incisiva da diplomacia brasileira para a busca de vacinas no exterior e chegou a dizer que “o Itamaraty precisa funcionar”.
Segundo autoridades que participaram dessa reunião, o chanceler demonstrou desconforto com as declarações de Lira, mas não respondeu. Saiu antes do término e seguiu para o Congresso, onde ouviu ataques e sugestões de demissão por horas a fio, especialmente no Senado Federal.
"Vossa Excelência é unanimidade em rejeição e incompetência nesta Casa", disse, em tom forte, a senadora Simone Tebet (MDB-MS). "Faço um desafio: peça exoneração por 30 dias. Veja se, com esse gesto, não conseguimos mais rapidamente as vacinas da Pfizer e [o excedente de vacinas] dos Estados Unidos. Com esse gesto, estaríamos nos redimindo perante a China e os americanos".
Simone atribuiu ao chanceler uma "guerra ideológica desnecessária" e a "a radicalização ao extremo de irmãos brasileiros que hoje não se sentam à mesma mesa". "Não é pessoal. O senhor não foi bom para o Brasil. Peça para sair e durma com a consciência tranquila", completou Mara Gabrilli (PSDB-SP).
O ambiente da sessão no Senado, que já era de cobrança, ficou ainda mais tenso com um episódio no meio do depoimento. O assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins, irritou senadores ao fazer um gesto considerado "obsceno" durante a audiência pública. O gesto com as mãos foi feito durante o discurso do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), num momento em que Filipe Martins aparecia ao fundo da transmissão, na TV Senado.
O líder da oposição na Casa, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), chamou atenção para o fato e pediu providências. "Eu estou acompanhando aqui a sessão quando, também pelas redes sociais, tenho conhecimento de que, durante a fala de Vossa Excelência, o senhor que estava localizado logo atrás, o Filipe Martins, que é analista político e assessor especial para Assuntos Internacionais do presidente Jair Bolsonaro, estava demonstrando gestos obscenos. No meu sentir, [foram] gestos obscenos", afirmou Randolfe.
O senador do Amapá sugeriu que Filipe Martins explicasse o movimento com as mãos. "Eu não sei qual o sentido do gesto do senhor Filipe. Era bom que ele explicasse, mas isso é inaceitável, presidente".
Araújo tentou se defender. "Nós não somos perfeitos, mas estamos convencidos de que estamos defendendo os interesses nacionais, estabelecidos pela Constituição. Eu tenho a certeza de que tenho feito tudo, absolutamente tudo, para ajudar o meu país. Tenho um amor profundo pelo povo brasileiro e não admito que ninguém questione", disse o ministro, emocionando-se e segurando lágrimas.
"Saia do Ministério das Relações Exteriores!", afirmou o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO).
Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores, falou em uma condução "desastrosa" da política externa e lamentou o "tratamento descortês" dado ao diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, durante a pandemia.
Enquanto os senadores repudiavam a postura de Araújo, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, pediu a palavra e repreendeu o assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins, que acompanha Araújo na audiência pública e estava sentado ao fundo da sala.
Em um vídeo que circulava entre os senadores, Martins foi flagrado fazendo gestos considerados obscenos enquanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), conduzia a sessão. Randolfe pediu retratação imediata do assessor presidencial ou sua condução imediata pela polícia legislativa para fora da Casa. "É um circo de horror que eu nunca vi", completou Rose de Freitas (MDB-ES).
Gaguejante e aparentemente nervoso, o chanceler repetiu sua tradicional cartilha, repudiando avaliações de que o Brasil foi subserviente aos Estados Unidos durante a gestão de Donald Trump e buscando ilustrar os esforços do governo em busca da viabilização da oferta de mais vacinas.
Em vários momentos, no entanto, ele questionou as "fontes" que subsidiavam os questionamentos e usou um tom desafiador. Em uma ocasião, ironizou: "Deixe eu tentar encontrar alguma pergunta objetiva aqui".
Araújo também se emocionou num trecho do depoimento. "Nós não somos perfeitos, mas estamos convencidos de que estamos defendendo os interesses nacionais, estabelecidos pela Constituição. Eu tenho a certeza de que tenho feito tudo, absolutamente tudo, para ajudar o meu país".
"Tenho um amor profundo pelo povo brasileiro e não admito que ninguém questione", ainda disse o ministro, segurando lágrimas.
Gestos obscenos
O gesto com as mãos foi feito pelo assessor Filipe Martins durante o discurso de Rodrigo Pacheco, num momento em que Filipe Martins aparecia ao fundo da transmissão, na TV Senado.
Logo após o ocorrido, Randolfe chamou atenção para o fato e pediu providências. "Eu estou acompanhando aqui a sessão quando, também pelas redes sociais, tenho conhecimento de que, durante a fala de vossa excelência, o senhor que estava localizado logo atrás, o Filipe Martins, que é analista político e assessor especial para Assuntos Internacionais do presidente Jair Bolsonaro, estava demonstrando gestos obscenos. No meu sentir, [foram] gestos obscenos", afirmou Randolfe.
O senador do Amapá sugeriu que Filipe Martins explicasse o movimento com as mãos. "Eu não sei qual o sentido do gesto do senhor Filipe. Era bom que ele explicasse, mas isso é inaceitável, presidente. Em uma sessão do Senado Federal, durante a fala do presidente do Senado, um senhor está procedendo com gestos obscenos, está ironizando o pronunciamento do presidente da nossa Casa. Isso é inaceitável, é intolerável", complementou.
Em resposta, Pacheco afirmou que iria pedir à Secretaria-Geral da Mesa e à Polícia Legislativa que identificassem o fato apontado, mas optou por dar seguimento aos trabalhos. "Não prejudicarei o andamento desta sessão do Senado Federal, porque é muito importante nós ouvirmos o ministro de Estado das Relações Exteriores, que aqui comparece para poder fazer os esclarecimentos necessários aos senadores", afirmou.
Filipe Martins é um dos principais integrantes da chamada ala "ideológica" do governo e foi promovido a assessor-chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos (Sae) da Presidência da República no ano passado. Ele é bem próximo dos filhos de Bolsonaro e um dos principais auxiliares do presidente, tendo acompanhado Bolsonaro em diversas de suas missões ao exterior.
O gesto feito pelo assessor durante a sessão lembra a representação de "OK". Segundo a BBC Brasil, esse sinal de mão ganhou nova conotação para grupos extremistas e, por isso, foi adicionado recentemente a uma lista de símbolos de ódio. O gesto com forma arredondada entre o indicador e o polegar, que também é um emoji popular, foi classificado como "uma verdadeira expressão da supremacia branca" pela Liga Antidifamação, organização dos Estados Unidos que monitora crimes de ódio. Os três dedos esticados simbolizam a letra "w" (em referência à white, do inglês para branco), enquanto o círculo formado significaria a letra "p" (power, do inglês para a palavra poder).

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Querida, encolheram o chanceler acidental - Br Político, El País

 Querida, encolheram o chanceler acidental: ele não vale um tostão furado para a diplomacia real. Só está ali para animar a galera de fanáticos...

Paulo Roberto de Almeida


Tereza Cristina no Itamaraty?

BR Político | 8/2/2021, 9h30

Pessoas influentes dentro do governo têm defendido o deslocamento da ministra da Agricultura, Tereza Cristina, para a pasta das Relações Exteriores, no lugar de Ernesto Araújo. Os apoiadores do movimento argumentam que, por causa de sua atuação na abertura de mercados externos e pela ajuda na solução de impasses internacionais, teria mais capacidade do que Araújo para conduzir a diplomacia brasileira. Além disso, não é segredo para ninguém o desgaste que o atual chanceler vem passando pelo seu mau desempenho no posto.

Se o movimento acontecer, a Agricultura poderia ser destinada a atender os pleitos do Centrão, que deseja mais espaços no primeiro escalão do governo. Nesse caso, poderia caber a própria Tereza indicar quem a substituiria na Agricultura, já que tem bastante peso com a bancada do agronegócio desde o tempo em que presidiu a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

Mas não se trata de uma mudança simples. Mesmo desgastado, Araújo faz parte da chamada ala ideológica do bolsonarismo. Além disso, o presidente Jair Bolsonaro reconhece a lealdade política demonstrada por ele nos dois últimos anos. Mas a pressão interna contra o chanceler hoje é bem forte.

https://brpolitico.com.br/noticias/tereza-cristina-no-itamaraty/

Desmonte do Itamaraty abre brecha para projeção internacional de governadores e prefeitos

Com o chanceler brasileiro priorizando assuntos internos, governadores, prefeitos e deputados estão virando interlocutores-chave de governos, empresas e ONGs no exterior

El País | 8/2/2021, 14h59

Quando os assessores de Anthony Blinken, secretário de Estado do presidente americano Joe Biden, começaram, recentemente, a discutir o futuro da relação entre os Estados Unidos e o Brasil, surgiu uma pergunta incomum: quem no Governo Bolsonaro seria o principal interlocutor do novo Governo americano? Em tempos normais, seria o chanceler brasileiro, é claro. Na prática, porém, Ernesto Araújo não é uma opção para gerenciar a relação bilateral. Afinal, o novo Governo americano avalia, corretamente, que o papel fundamental de Araújo não é a condução da política externa brasileira, mas, por meio da promoção de teorias conspiratórias, a mobilização permanente da base bolsonarista. Mesmo se Araújo priorizasse a gestão das relações exteriores do Brasil, seus comentários sobre o ataque ao Capitólio em 6 de janeiro (segundo ele, os invasores seriam “cidadãos de bem”) e a respeito das eleições presidenciais americanas (para ele, fraudadas) já seriam suficientes para torná-lo persona non grata em Washington. O cenário em Berlim, Paris, Pequim e Buenos Aires é o mesmo: alguma comunicação oficial e um aperto de mão protocolar até podem envolver Araújo, mas a maioria dos governos já estabeleceu canais alternativos.

Não há vácuo de poder na política, e o mesmo vale para a política externa. Na ausência de um chanceler disposto ou capaz de gerir as relações do Brasil com o resto do mundo, outros políticos brasileiros tornaram-se figuras-chave nos palcos internacionais. Durante o primeiro ano do Governo Bolsonaro, enquanto Araújo cumpria seu papel de cheerleader do presidente Trump, o vice-presidente Mourão e a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, se empenhavam no âmbito diplomático. Em viagem a Pequim, por exemplo, os dois souberam desfazer o estrago feito pelo presidente brasileiro na relação bilateral. Coube a eles acalmar os ânimos dos chineses porque Araújo, com seu histórico de ataques verbais à China, tinha perdido credibilidade em Pequim. Para diplomatas chineses, ficou claro que, se for preciso resolver alguma questão com o Governo brasileiro, Mourão e Tereza Cristina serão interlocutores bem mais úteis do que o chanceler brasileiro. O cenário repetiu-se quando o ministro foi excluído das negociações com Pequim para a compra de vacinas contra a covid-19 e quando o governador de São Paulo, João Doria, e o então presidente do Congresso, Rodrigo Maia, tornaram-se interlocutores-chave para o Governo chinês e empresas farmacêuticas chinesas.

Nada disso é por acaso. Afinal, a marginalização do Ministério de Relações Exteriores (MRE) é um objetivo-chave da gestão atual, em uma tentativa de combater o que o bolsonarismo chama de deep state, estrutura composta por tecnocratas que supostamente sabotam as ideias do Governo. Como Eduardo Bolsonaro declarou depois da vitória de seu pai nas eleições presidenciais, o Itamaraty era “um dos ministérios onde mais está arraigada essa ideologia marxista e onde haveria uma maior repulsa ao presidente Jair Bolsonaro”. Ao permitir que outras figuras no Governo se ocupem de temas internacionais, Araújo está cumprindo sua missão de diminuir o controle do Itamaraty sobre a articulação da política externa. Mesmo no período pós-Bolsonaro, o MRE demorará para reconquistar o espaço perdido, um processo que dependerá muito da capacidade de futuros e futuras chanceleres.

A estratégia bolsonarista, porém, representa um risco político para o próprio presidente. Afinal, não são apenas ministros e familiares a preencher o vácuo que a atuação de Araújo está criando. Opositores de Bolsonaro, como o governador João Doria, também estão conseguindo se destacar no exterior com muito mais facilidade e são vistos por entidades públicas, privadas e da sociedade civil fora do país como interlocutores fundamentais para tratar de temas da relação bilateral. Em vez de chamar o chanceler brasileiro para participar de reuniões sobre o Brasil, cada vez mais, organizadores de eventos internacionais convidam governadores ou prefeitos capazes de articular uma visão mais pragmática. Na hora de avançar a pauta ambiental com o Brasil, governos estrangeiros mantêm laços fortes com governadores e prefeitos da Região Norte, cientes de que é mais fácil trabalhar com eles do que com Ernesto Araújo ou Ricardo Salles, o controverso ministro do Meio Ambiente. Governadores e até prefeitos, como Eduardo Paes, têm hoje uma interlocução comparável ou até melhor do que a do chanceler com tomadores de decisão no exterior, uma situação sem precedentes na história do Itamaraty.

Esse novo cenário da multiplicação dos atores envolvidos na política externa brasileira ―um processo descrito por especialistas como pluralização ou fragmentação― pode ajudar a mitigar, em parte, o impacto nefasto da atuação internacional bolsonarista. O protagonismo de vários governadores no contexto do combate à pandemia e a obtenção de vacinas do exterior é apenas um dos vários exemplos disso. No futuro, porém, a perda de influência do Itamaraty complicará tentativas de governos pós-Bolsonaro de articularem e implementarem um projeto coeso de política externa. Quanto mais Araújo permanecer no cargo, mais árdua será a tarefa de seus sucessores de reerguer o Itamaraty.

É claro que governos estrangeiros, como a nova administração de Joe Biden nos Estados Unidos, não podem lidar apenas com entidades subnacionais brasileiras. Resta saber, no entanto, com quem no Governo Bolsonaro o novo Governo americano, por exemplo, buscará estabelecer um diálogo produtivo. Desta vez, o vice-presidente Mourão dificilmente poderá desempenhar o papel de interlocutor racional e “adulto na sala” porque tem sido visto como isolado em Brasília. O mesmo vale para Paulo Guedes, cuja palavra já não tem tanto peso no exterior. O mais provável é que os EUA e outros países com relações delicadas com o Brasil identifiquem seus interlocutores caso a caso, seja Tereza Cristina, da Agricultura, seja Roberto Campos Neto, do Banco Central, seja Mourão.

O uso do Itamaraty para animar a base bolsonarista traz vantagens inegáveis para o presidente, e o combate contra o “globalismo” e o “comunismo” são populares nos grupos de WhatsApp pró-Bolsonaro. Ao mesmo tempo, fica cada vez mais claro que o presidente também acaba entregando, de bandeja, a oportunidade ímpar aos seus adversários de se tornarem atores-chave na política externa brasileira e dar visibilidade às consequências desastrosas da estratégia internacional de seu Governo.


segunda-feira, 18 de maio de 2020

Quais são os próximos ministros que podem cair? - Revista Veja

Quem será o próximo a cair?
A queda de Nelson Teich do Ministério da Saúde com menos de um mês de governo revela a instabilidade da equipe do presidente Bolsonaro. Acompanhe quais os ministros e assessores importantes que também balançam no cargo:
 Paulo Guedes, ministro da Economia – Ele não quer sair, nem Bolsonaro quer que saia agora, mas os militares acham que seu receituário liberal perdeu prazo de validade. Os generais com cargo no Palácio do Planalto querem na economia um ministro que fale mais de crescimento econômico e menos de ajuste fiscal. Se dependesse apenas deles, indicariam como novo ministro da Economia o ministro Rogério Marinho, mas aceitam um nome palatável ao mercado como o presidente do BC, Roberto Campos Neto. 
– Rogério Marinho, ministro do Desenvolvimento Regional – Paulo Guedes só se refere ao antigo auxiliar com o adjetivo “desleal”.
– Mansueto Almeida, secretário do Tesouro – Na virada do ano, o secretário pediu para sair, depois de receber boa proposta financeira do mercado privado. Paulo Guedes o convenceu a ficar para criar o Conselho Fiscal da República, que agora ninguém sabe se existirá. Mansueto tem relação agastada com a turma que Guedes trouxe para o ministério, Adolfo Sachsida (secretário de Política Econômica), Carlos da Costa (Produtividade) e Salim Mattar (Desestatização).
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– General Edson Pujol, comandante do Exército – É a principal barreira militar para os arroubos autoritários do presidente. Foi contra a nomeação dos generais Ramos e Braga Neto no ministério por considerar que elas fragilizam a independência do Exército em relação ao governo. Bolsonaro já pensou em trocá-lo pelo general Ramos, mas teme a reação da caserna.
– General Luiz Ramos, responsável pela articulação política – O presidente acha que o general cede demais nas negociações com o Congresso e segue se queixando da falta de uma base de apoio. Ramos culpa o líder do governo Vitor Hugo.
 Deputado Vitor Hugo, líder do Governo na Câmara – É um Highlander. Sobreviveu aos ataques de Onyx Lorenzoni, Joice Hasselmann (quando esta era próxima do Planalto) e chegou a ser extraoficialmente destituído da liderança do governo quando Osmar Terra voltou para a Câmara. Agora, enfrenta Ramos.

As cenas de terror nos hospitais públicos brasileiros e as saídas possíveis para mitigar a crise. Leia nesta edição.Reprodução/VEJA

– Abraham Weintraub, ministro da Educação – O ministro chama mais atenção pelos seus tuítes do que pelas formulações pedagógicas, mas passou do limite na agora famosa reunião ministerial de 22 de abril, quando pediu a prisão dos ministros do STF. A AGU considera que a saída de Weintraub poderia melhorar o desgastado clima do governo com o Supremo.
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– Tereza Cristina, ministra da Agricultura – A competente ministra é atacada nas redes bolsonaristas por defender melhores relações com a China, maior parceiro comercial brasileiro. É inusitado alguém poder perder o emprego por suas qualidades, mas é isso mesmo. 
– Regina Duarte, secretaria da Cultura – A atriz conseguiu uma sobrevida ao defender o regime militar (“ah, sempre houve tortura”), mas ainda é por não enfrentar a esquerda e propor um projeto cultural inspirado ao escritor Olavo de Carvalho

segunda-feira, 16 de março de 2020

Política brasileira: carta de Bebbiano ao capitão (fevereiro 2019)

CartaBebbianoBolsonaroDemissao

Um documento histórico, reproduzido no Antagonista:

Exclusivo: “Meu amado Capitão, só há uma forma de isso tudo acabar bem. O senhor precisa romper esse ciclo de ódio”, diz Bebianno em carta a Bolsonaro
Por Claudio Dantas
Brasil, 15/03/2020

Gustavo Bebianno escreveu uma carta para Jair Bolsonaro logo depois de ser demitido do governo. Ele enviou o texto a alguns amigos, para que o divulgassem caso lhe acontecesse algo.
Na mensagem, Bebianno não faz ‘revelações comprometedoras’ sobre o presidente. Trata-se de um desabafo contra as acusações de traição e uma leitura, como espírita que era, do que ele chama de relação de ódio construída por Bolsonaro com todos a sua volta – relação alimentada por Carlos.
“O senhor está obsediado. Obsediado pelo próprio filho. Carlos precisa de ajuda e só o senhor tem esse poder. Não estou falando com rancor. Meu sentimento não é de raiva, acredite. Não tenho uma só gota de raiva do Carlos (a que tive, já passou, graças a Deus), porque ele precisa de ajuda. Isso é visível aos olhos de TODOS.”
Na opinião de Bebianno, “por melhores que possam ser as circunstâncias, Carlos continua odiando e sofrendo”.
“Mesmo o senhor tendo alcançado o objetivo de ser eleito, ele permanece odiando. Ele aprendeu a ser assim e não sabe fazer de outra forma.”
“E o senhor tem alimentado essa situação. E isso só vai mudar quando o senhor RECONHECER A VERDADE.”
O ex-ministro, que morreu de um infarto fulminante na madrugada de sábado, encerra a missiva com palavras de “amor hétero”. Pede a Bolsonaro que “reconheça seus erros (para si próprio). Faça um profundo exame de consciência. Limpe o seu coração”.
“Recupere o Carlos pelo seu exemplo. Ele vai aprender. Ele é um bom garoto. Só precisa da sua ajuda. Fique com Deus e um beijo no seu coração (hétero). O senhor continuará a ser o meu Mito.”

Leia abaixo a íntegra da carta:

“E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará“
João 8:32

Meu Capitão,
Ao longo de dois anos, ouvi essa frase sair da sua boca quase todos os dias, como que de forma automática.
Isso, além de outras coisas, fazia-me acreditar que o senhor era um homem justo, bom, leal e amigo. Acima de tudo, corajoso!
Dediquei dois anos da minha vida para defender uma causa apelidada de Mito. E eu acreditei nesse Mito com todas as minhas forças, com todo o meu coração.
O senhor SABE disso. Por mais que, agora, o senhor tente banalizar tudo o que fiz, para alívio da própria consciência, o senhor SABE que não chegaria até aqui sem o trabalho que fiz (trabalho que só deu certo porque fiz, acima de tudo, com AMOR — amor que intensamente desenvolvi por você. Amor hétero, como costumávamos brincar).
O senhor mesmo costumava verbalizar essa verdade para algumas pessoas do nosso convívio. Essas pessoas também sabem, também conhecem essa verdade. Mas o que importa, de fato, é que o senhor, homem Jair Bolsonaro, SABE: sempre estive ao seu lado, e do seu lado, durante toda essa jornada, sem importar o preço a ser pago.
Ainda que o senhor bata a cabeça, tome remédios, se encha de raivas criadas por fantasias exóticas e curiosas, o FATO, a VERDADE, continuará lá no fundo da SUA consciência, impressa na SUA alma.
Por isso, não vou tomar o seu tempo dissertando sobre as coisas que fiz, acreditando estar, principalmente, trabalhando para o bem do meu país.
Mas, Meu Capitão, o senhor precisa acordar e cair em si.
O senhor está obsediado. Obsediado pelo próprio filho. Carlos precisa de ajuda e só o senhor tem esse poder. Não estou falando com rancor. Meu sentimento não é de raiva, acredite. Não tenho uma só gota de raiva do Carlos (a que tive, já passou, graças a Deus), porque ele precisa de ajuda. Isso é visível aos olhos de TODOS.
Falando dessa forma direta, o senhor talvez não entenda. Por isso, tentarei lhe explicar um pouco mais esse meu sentimento.
Carlos vive em uma prisão mental e emocional. Ele sofre intensamente em função do próprio ódio. Ele cultiva esse ódio contra tudo e contra todos, principalmente contra as pessoas por quem o senhor demonstra AFETO. E o senhor também sabe dessa VERDADE. Ele é consumido pelo ódio 24 h por dia, independentemente do que esteja acontecendo no mundo real.
A despeito do que, de fato, esteja acontecendo no mundo real, por melhores que possam ser as circunstâncias, Carlos continua odiando e sofrendo. Mesmo o senhor tendo alcançado o objetivo de ser eleito, ele permanece odiando. Ele aprendeu a ser assim e não sabe fazer de outra forma. Não é por mal, ele não tem culpa, simplesmente não sabe fazer diferente.
E o senhor tem alimentado essa situação. E isso só vai mudar quando o senhor RECONHECER A VERDADE.
Para manter o vínculo afetivo com ele, para manter a conexão física e emocional, o senhor embarca nessas fantasias, nessas paranoias, nas eternas teorias de conspiração.
Carlos aprendeu a ser assim com o senhor. Foi o senhor que o ensinou, desde pequeno, a viver em confronto. Vide o que assumiu contra a própria mãe, ainda quando jovem. Essas experiências deixam marcas, Capitão. A mente humana é muito profunda e complicada. É bom estar preparado para confrontos. Viver em permanente estado de beligerância nubla a mente e a existência.
O seu erro tem sido fazer exatamente o contrário daquilo que prega. O seu pecado é, nesse caso, não RECONHECER A VERDADE. E, portanto, não se libertar (nem libertar o próprio filho, que é o que mais sofre).
Ao agir assim, o senhor se mantém preso, mantém o seu filho preso, e gera um rastro terrível de destruição à sua volta. O senhor destrói os seus principais amigos e aliados. O senhor se torna uma pessoa injusta com os outros. Além disso, alimenta e incentiva o comportamento viciado do filho, impedindo-o de se libertar do ódio.
Tenha certeza de que, daqui a pouco tempo, o problema envolverá outra pessoa, e depois outra, e depois mais outra, num rastro interminável de ódio e destruição. Leia a Bíblia e veja as consequências invariáveis decorrentes do ódio. O ódio é uma energia terrível e incontrolável que tudo destrói. O ódio abre o canal de sintonia com o que há de pior no mundo espiritual.
Acredite: sem saber, sem querer e sem perceber, Carlos se tornou um canal aberto para influências espirituais negativas. Ele se tornou obsediado. E, por consequência, obsedia o senhor. Isso é um círculo vicioso terrível! O mal opera por aí. Ao contrário do que muita gente pensa, o mal nem sempre age pelas mãos de Adelios. Na maioria das vezes, age de forma ardil e sub-reptícia, pela mente de pessoas próximas a nós, que nos amam e a quem também amamos. Acredite nisso, Capitão.
O mal opera utilizando as fraquezas de cada um (ou, como se diz no jargão religioso, pelo pecado). Se a pessoa tem a tendência de beber, será influenciada a beber. Se a pessoa tem a tendência a sentir ciúmes, será colocada em circunstâncias propícias a sentir ciúmes. Se a pessoa tem a tendência de odiar, essa será a ferramenta usada).
No seu caso, essa é a chave por meio da qual o mal opera. É por meio do seu próprio pecado. O senhor cultiva e alimenta teorias de conspiração, intrigas e ódio, e ensinou seus filhos a fazerem o mesmo. O melhor discípulo foi o Carlos, pois é o que tem maior conexão espiritual com você. O problema é que ele é muito forte, muito intenso, e o senhor perdeu o controle sobre o “pitbull”. Hoje, ele morde aleatoriamente as pessoas, sem que o senhor consiga segurá-lo. Pior do que isso, quando o senhor tenta segura-lo, ele se vira e morde o senhor mesmo.
E, com esse canal aberto, o mal segue operando. Os obsessores instigam vocês dois a desconfiarem das pessoas e sentirem o ódio. Vocês ficam cegos e sentem o ódio contra alguém injustamente — como no meu caso — e atacam. A vítima do ataque também passa a sentir ódio, pois foi atacada (no meu caso, fui atacado injustamente em público). Ao sentir ódio, eu também tenho vontade de atacar, de retribuir a agressão. E, assim, o círculo vicioso se amplia, num rastro sem fim de destruição, cumprindo a missão dos obsessores que pretendem manter o BRASIL no mesmo padrão moral inferior.
Portanto, meu amado Capitão, só há uma forma de isso tudo acabar bem, em benefício do nosso BRASIL.
O senhor precisa romper esse ciclo de ódio. Do fundo do seu coração, do fundo da sua alma, com toda a sua força. O senhor é um homem bom, justo, permita que isso venha à tona. Quebre os padrões negativos. Só o AMOR pode fazer isso. Só o amor tem o poder de salvar o Brasil e livra-lo das influências negativas que o prejudicam.
Peço perdão ao senhor pelos maus sentimentos que tive nos últimos dias.
O senhor pode ficar tranquilo. Vou embora em paz. Quero apenas que dê certo. Não posso crer que tudo o que foi feito tenha sido em vão.
Tenha a certeza que nunca o traí. Nunca fiz nada pelas costas. Nunca plantei nota desfavorável ao senhor ou a seus filhos, nunca vazei áudio. Não há complô algum. Talvez o senhor nunca enxergue isso. Mas minha consciência sabe. Isso é o que basta.
Minha missão chegou ao fim aqui. A sua, não. Reconheça seus erros (para si próprio). Faça um profundo exame de consciência. Limpe o seu coração. Recupere o Carlos pelo seu exemplo. Ele vai aprender. Ele é um bom garoto. Só precisa da sua ajuda.
Fique com Deus e um beijo no seu coração (hétero).
O senhor continuará a ser o meu Mito.”

domingo, 4 de agosto de 2019

What a difference a year makes: lembrança de um outro verão...

No começo do verão passado, no final de junho de 2018, eu e Carmen Lícia Palazzo estávamos fora do Brasil, mais precisamente em Portugal, onde eu estava participando pela segunda vez do Estoril Political Forum, uma grande iniciativa do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, sob liderança do Professor João Carlos Espada.
Lá fui surpreendido com a notícia de minha promoção ao último grau da carreira, ministro de primeira classe, usualmente chamado de embaixador, mas esse título não corresponde verdadeiramente, pois o "embaixador" é apenas aquela pessoa, da carreira diplomática ou não, que exerce a função de chefe de posto, em missão diplomática permanente no exterior. 
Eventualmente, alguns chefes de missão temporária – assembleias da ONU, grandes conferências diplomáticas internacionais, missões especiais a serviço do país no exterior, etc. – também podem passar a ostentar o título, em se tratando de grandes personalidades do mundo político, jurídico ou cultural, a exemplo de alguns ministros de Estado das Relações Exteriores que se destacaram na área, mas isso é mais raro. 
Nunca foi o meu caso, e acredito que não o será, por circunstâncias conhecidas.

Naquela oportunidade, comecei a receber mensagens de cumprimentos de diversas pessoas, colegas de carreira, amigos, conhecidos diversos, às quais eu mal podia responder individualmente, tantas eram, por estar envolvido com as atividades do seminário, que se estende por três dias. Depois disso ainda passeamos um pouco por Portugal. O próprio SG-MRE, embaixador Marcos Galvão, me escreveu cumprimentando, lamentando apenas que a promoção tivesse ocorrido tão tardiamente.


O que fiz então? O que sempre faço: sento, penso e escrevo.

Acabei redigindo uma mensagem geral alusiva ao fato, que publiquei, como também sempre faço, neste meu espaço de liberdade: 


Duas pedras no meio do caminho... (a propósito de uma promoção tardia)”, Estoril, 26 junho 2018, 4 p. Esclarecimento a propósito de minha promoção tardia na carreira. Postado no blog Diplomatizzando(26/06/2018; link:  https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/duas-pedras-no-meio-do-caminho-paulo.html).

Era uma explicação e uma informação. Eu estava bem, então, como diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), vinculado à Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) do MRE, cargo ao qual tinha sido convidado ao cabo de 13,5 anos de ausência de qualquer função na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, ou seja, durante todo o regime lulopetista, "exílio" do qual fui retirado apenas a partir do impeachment do seu desastroso quarto e último governo (por enquanto).

Pouco antes eu havia estado com a equipe econômica que já estava trabalhando no programa de governo do então candidato que se revelou vencedor em outubro. Fui muito bem recebido, pois tinham tomado conhecimento de alguns textos meus, e me queriam como associado naquela equipe. Recusei de pronto, não a eventualmente enviar textos e reflexões sobre a política externa, mas a me associar a uma equipe de um candidato do qual eu não seria eleitor, nem jamais votaria por ele, digamos que por incompatibilidade total de "programas", ou antes, de "personalidades". Ficamos em bons termos, mas quando da divulgação do programa do dito candidato, escrevi um novo texto comentando rapidamente sua parte econômica – que considerei boa, ainda que vaga – e critiquei asperamente, duramente, a parte de "política externa", uma horrível assemblagem mal costurada de ideias estapafúrdias que já antecipavam o desastre que seria sua diplomacia, caso eleito.
Esse foi o último contato que tive com a equipe econômica, embora tenha conversado posteriormente com um dos membros da equipe, por telefone, e novamente confirmado minha indisponibilidade para colaborar diretamente, mas aberto a oferecer sugestões e subsídios.

Na ocasião, lembrei-me de um outro texto, que havia escrito antes no final de 2016, quando já estava exercendo o cargo de diretor do IPRI, quando desejei rememorar os anos de travessia do deserto no Itamaraty. Eu o coloquei novamente na mesma ocasião da promoção, aqui novamente disponível: 
“Como atravessar o deserto (e permanecer digno ao fim e ao cabo)”, Brasília, 18 dezembro 2016, 7 p. Divulgado no blog Diplomatizzando (24/06/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/uma-longa-travessia-do-deserto.html).
    

Eu sempre preferi manter minha independência de pensamento e de ação, independentemente de cargos, promoções, situações na carreira. Senti que minhas funções se terminariam com a eleição desse novo governo, e assim foi. Logo nos primeiros dias deste governo, em janeiro, recebi a instrução de "não fazer nada" no IPRI, até que as "chefias" decidissem o que poderia ser feito. Já era uma antecipação do que viria pela frente. Fui exonerado no cargo no Carnaval deste ano de 2019, por postar em meu blog três textos convidando a um debate sobre a política externa do governo: uma palestra do embaixador Rubens Ricupero, um artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e um outro artigo-resposta do próprio chanceler, respondendo acerbamente aos dois. Isso deve ter sido em torno das 2hs da manhã do dia 4 de março. Fui acordado às 8hs pelo chefe de gabinete do chanceler, comunicando-me a dispensa do trabalho. Ainda argumentei que eu estava fazendo exatamente o que o chanceler fazia: alimentar um blog pessoal com comentários diversos e, no meu caso, artigos de imprensa, todos eles livremente disponíveis, inclusive no próprio clipping do Itamaraty. Enfim, minha sorte já estava selada desde antes, como eu já tinha total certeza.

Em tempo: o referido chanceler tampouco tem o direito de ser chamado de "embaixador", pois jamais exerceu qualquer chefia de missão permanente, assim como jamais teve cargos relevantes na Secretaria de Estado, sendo apenas um ministro de segunda classe chefe de departamento. Foi promovido a ministro de primeira classe junto comigo, em junho de 2018, provavelmente a pedido de seu sogro, duas vezes Secretário Geral do Itamaraty. Este é apenas um esclarecimento.

Acredito que o atual chanceler, que jamais exibiu as ideias que o "distinguiram" desde outubro ou novembro do ano passado, construiu uma personalidade olavo-bolsonarista que nunca teve, de maneira totalmente artificial, e portanto mentirosa, apenas para ser alçado ao cargo que tem atualmente. Aliás, a atenção sobre si foi chamada por um artigo que saiu publicado na revista que eu editava no IPRI: "Trump e o Ocidente", Cadernos de Política Exterior número 6, segundo semestre de 2017. 
Eu comento esse artigo em meu mais recente livro: Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty, em duas edições, uma de autor, outra pela UFRR, ambas livremente disponíveis a partir de meu blog: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/07/miseria-da-diplomacia-em-edicao-de.html .

Estas são as lembranças que me foram despertadas pouco mais de um ano depois dos eventos que relato aqui. O motivo foi justamente essa canção americana: What a difference a day makes...

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4 de agosto de 2019

domingo, 17 de março de 2019

Mensagem da Republica de Curitiba: um amigo me escreve solidariamente...

Um grande amigo de Curitiba me escreve em solidariedade:


Afastado há mais de 15 dias de minhas atividades profissionais, (...) e inclusive... fora de Curitiba, só nesta semana tomei conhecimento de truculenta e lamentável demissão que lhe tirou a presidência do IPRI.
Confesso que atualmente tenho procurado me distanciar das discussões em torno do maniqueísmo que tomou conta da política nacional. Longe de mim pactuar com a esquerda lírica, patológica, ensimesmada, irresponsável e corrupta que manejou a direção do país nos últimos anos. De outra parte, não há como concordar com os rumos da atual política externa brasileira, conduzida por um alienado sabujo de plantão, e comandada à distância por alguém totalmente inexperiente, inconsequente e temerário nas suas orientações e indicações, conquanto erigido à condição de conselheiro-mor do Executivo pátrio.
Dito isto, venho solidarizar-me com o amigo, renomado diplomata e brilhante intelectual brasileiro, louvado dentro e fora do território nacional, em face do subjetivo, indecoroso e imerecido ato que o removeu de posto dos mais importantes aos rumos da diplomacia nacional.
Vivemos, lamentavelmente, tempos da autoafirmação do pensamento único, que se compraz e necessita, para prevalecimento, de impor o “fechamento do universo do discurso”, e por decorrência, retalhando todos os que ousam discordar ou opinar contrariamente às decisões e ideias do novel governo, tanto em público quanto no privado.
Tenha a certeza, caríssimo Paulo Roberto, de que você não está só em suas manifestações, tampouco sua exoneração foi aceita passivamente pela crítica e/ou pela opinião pública. Aqui em Curitiba, mais que um amigo, tenha em mim, em comunhão, a “pièce de résistence” local contra os ortodoxos e levianos rumos conferidos às relações externas brasileiras.
Receba meu fraterno abraço e minhas melhores homenagens.
Xxxxxx Xxxxxxxx
Curitiba, 15/03/2019

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

O artigo de Zander Navarro: uma critica consistente 'a Embrapa

Meus comentários rápidos sobre este artigo: 
O autor abaixo, Zander Navarro, foi demitido da Embrapa por ter publicado este artigo, como relatei em minha postagem anterior (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/01/embrapa-demite-zander-navarro.html).
Qualquer membro de uma entidade corporativa, SOBRETUDO trabalhando com recursos públicos, ou seja, de cada um de nós, que se dedique a criticar a instituição em que trabalha, deveria ser saudado, em lugar de vergonhosamente demitido, como ocorreu com esse pesquisador.
Todos sabemos, menos os dirigentes atuais da Embrapa ao que parece, que a ciência, a governança, as políticas públicas em geral, só progridem à custa da constante reavaliação dos seus objetivos, dos seus propósitos, do seu mandato. De contrário é a estagnação no burocratismo, na entropia, no foco centrado em seus próprios interesses (da corporação), em lugar de servir a ciência, a sociedade, quem nos paga.
Considero lamentável que alguém que se dedique a revisar os fundamentos da atividade da instituição para a qual trabalha seja varrido para baixo do tapete, pior, atirado pela janela, apenas porque disse coisas que não agradaram os círculos dirigentes.
Mais do que isso: trata-se de escabrosa censura, sanção imoral, e repressão indevida. A mesma coisa diríamos do ato de atirar contra o mensageiro: em lugar de ler a mensagem e refletir sobre o seu conteúdo, elimina-se o mensageiro, como se fatos deixassem de existir apenas porque são fatos.
A direção da Embrapa deveria responder a CADA UM dos argumentos de Zander Navarro, e provar que o dinheiro que recebe está sendo bem empregado, que ele reverte em resultados para a sociedade (quantas patentes, por exemplo?), quais os benefícios reais de suas atividades.
Lembro-me perfeitamente do início do governo aloprado dos lulopetistas, quando a Embrapa foi dominada por aqueles militantes ignaros que queriam fazer reforma agrária ao estilo cubano, ou mexicano, ou só investir em benefícios para a agricultura camponesa, e como ela foi usada -- está no artigo -- como elemento do populismo diplomático do grande meliante político, ao ser obrigada a se instalar em países africanos, a um custo enorme para a sociedade, quando outras formas de cooperaçãoo, mais eficientes e menos custosas, poderiam ter sido empregadas para determinados fins. Foi um período negro na Embrapa, dominada por fantasias ideológicas, em lugar de trabalho sério de pesquisa e desenvolvimento.
Aliás, o Brasil sempre foi o único país do mundo esquizofrênico a ponto de contar com dois ministérios da área rural, completamente opostos um ao outro: um supostamente do agronegócio, mas carente de recursos para campanhas absolutamente necessárias -- como a vacinação preventiva do gado contra epizootias, por exemplo --, e um outro, entregue aos militares do MST, via movimentos políticos alinhados com o PT, que usaram o MDA para seus objetivos nada econômicos, totalmente políticos (e até corruptos). O Brasil embarcou numa esquizofrenia completa, inclusive defendendo políticas contraditórias nas negociações comerciais multilaterais.
Chegou-se ao cúmulo de o diretor da FAO, eleito em função da demagogia diplomática lulopetista, oferecer um prêmio à Venezuela chavista pelo COMBATE À FOME.
Minha solidariedade ao Zander Navarro, com quem compartilho a mesma atitude desafiadora em face de instituições congeladas no burocratismo.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 10 de janeiro de 2018 

Por favor, Embrapa: acorde!
Concorrentes correm à nossa frente e a estatal dorme embalada pelos sonhos do passado

*Zander Navarro
O Estado de S. Paulo, 05 Janeiro 2018
A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), na maturidade dos seus 44 anos, tem sido corriqueiramente apresentada como um luminoso e excepcional caso na apodrecida constelação do Estado. Seria uma das raras estrelas com algum brilho – a “joia da Coroa”. Destoaria da generalizada inoperância dos órgãos públicos. Seria eficiente e até supostamente organizada sobre rígidos cânones fundados no mérito. Mais ainda, seria a principal responsável pelo sucesso da agropecuária, setor que, felizmente, vem salvando a nossa economia há anos.
Mas esse é o senso comum. As afirmações são acompanhadas de rala comprovação e partem da visão superficial de uma sociedade que se deleita com o divertimento de enganar a si mesma. Um provável estratagema mental coletivo operado para escapar da assombrosa realidade que nos cerca.
Existem inúmeros resultados e fatos notáveis associados à organização no passado e, com justiça, precisam ser sempre exaltados. Desafortunadamente, no entanto, a realidade atual é bem diferente. A Embrapa custa US$ 1 bilhão anualmente aos contribuintes e emprega 10 mil empregados em (pasmem) 47 unidades espalhadas por quase todos os Estados. E vai criar mais uma em Alagoas. Mas seu verdadeiro tamanho operacional é o de uma universidade federal de porte médio, como a do Paraná ou a do Rio Grande do Sul, se comparados seus pesquisadores e os professores, também pesquisadores, dessas instituições (em torno de 2,5 mil). Com uma diferença crucial: as universidades também formam profissionais. Em cada uma delas, são pouco mais de cem cursos. A Embrapa desenvolve pesquisa agrícola, sem cursos nem alunos. E aqui começam os problemas. Não são recentes, surgiram desde o final da década de 1990, sem reação eficaz de seus dirigentes. Sendo o espaço limitado, esboçam-se a seguir os quatro maiores impasses concretizados ao longo desse período.
Primeiramente, à luz das espetaculares transformações de um setor que rapidamente emerge como o principal produtor de alimentos do mundo, a Embrapa não se preocupou nem em entender essas mudanças, para achar um lugar virtuoso para si, nem ajustou como deveria a sua agenda de pesquisa às demandas crescentes da agropecuária. Grandes empresas, normalmente multinacionais, ocuparam o seu lugar no fornecimento de tecnologias, nas principais cadeias do agronegócio. Os 1,1 mil projetos ora em desenvolvimento ilustram a absurda e disparatada fragmentação do seu rol de pesquisas. Não existem focos de prioridade. É como se a empresa se tivesse transformado numa universidade, embora sem oferecer cursos. E isso acontece porque a Embrapa não tem, de fato, nenhuma estratégia própria.
Sua missão institucional é uma vaga afirmação de inocentes noções. O mantra atual é “entregar valor à sociedade”. O que isso significaria? É, na verdade, uma fuga da realidade. Ante o desafio, seu presidente deveria esclarecer à sociedade a inquietante pergunta: afinal, para que serve mesmo a Embrapa, uma das raras estatais totalmente dependentes do Tesouro?
O segundo dilema foi a substituição de, acreditem, dois terços dos pesquisadores, por meio de concursos realizados em especial durante os anos petistas. Em troca desse favorecimento, Lula envolveu a empresa na África, buscando votos para tentar a vaga no Conselho de Segurança da ONU e, também, eleger o chefe da FAO. Houve a citada substituição de pesquisadores e hoje a Embrapa é dominada por uma nova geração, usualmente de extração urbana e escassos vínculos com a produção agropecuária e as realidades rurais. Somados às centenas de cargos comissionados, os custos correntes explodiram e, por isso, nos últimos anos a proporção do orçamento destinada diretamente à pesquisa vem caindo para apenas 4% a 6% do total.
Os outros impasses são de natureza moral. O terceiro é um fato estatístico gerador de amplas implicações. A Embrapa, grosso modo, paga o dobro dos salários das universidades federais e suas pesquisas cada vez mais se afastam das demandas da produção. Seus pesquisadores, inexistindo uma estratégia institucional, estão encurralados diante deste chocante dilema moral: como justificar seu bem remunerado trabalho, desenvolvendo conhecimentos de escassa aplicabilidade prática? Uma comprovação: a Embrapa praticamente não realiza pesquisas econômicas, mas apenas com foco agronômico e tecnológico. Como justificar essa bizarra orientação, quando a agropecuária é a mais decisiva atividade econômica em nossos dias?
Finalmente, o quarto impasse é também moral. E simples de ser enunciado. O desenvolvimento da agropecuária está fomentando uma impressionante concentração da riqueza (o que será reafirmado pelos dados do novo censo). Como justificar que uma gigantesca e cara empresa pública, sustentada por toda a sociedade, trabalhe cada vez mais e quase que exclusivamente para os ricos segmentos do empresariado rural?
O ano entrante é decisivo para a Embrapa. Seu atual presidente será provavelmente substituído. Não poderia estatutariamente ser reconduzido. Haverá também a substituição do atual titular do Ministério da Agricultura, onde está alocada a empresa. E teremos eleições presidenciais. Qual será o futuro da Embrapa? É um cenário imprevisível, para o qual a organização está despreparada. Seu funcionamento interno é autoritário e não permite debater a situação e a construção de cenários plausíveis. E existe enorme resistência da direção em promover as mudanças urgentes e necessárias.
Nenhum país do mundo com importância agrícola deixa de ter uma empresa de pesquisa pública forte e “encharcada na realidade”. Nossos concorrentes estão correndo à nossa frente. A Embrapa, no entanto, permanece adormecida em berço esplêndido, embalada pelos sonhos do passado. 

*Sociólogo e pesquisador em ciências sociais - e-mail: z.navarro@uol.com.br