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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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terça-feira, 2 de março de 2021

Dois anos do terceiro ostracismo, começo de uma nova travessia do deserto - Paulo Roberto de Almeida

Dois anos do terceiro ostracismo, começo de uma nova travessia do deserto

 Paulo Roberto de Almeida 

 Fazem exatamente dois anos que o chanceler acidental mandou me exonerar da direção do IPRI, função que eu exercia desde agosto de 2016, depois de 13 anos e meio de uma longa travessia do deserto sob o lulopetismo, que foi uma espécie de terceiro ostracismo, depois de meu autoexílio sob o regime militar, nos anos de chumbo da ditadura repressora, e de alguns entreveros na carreira, pela minha mania de pretender expressar meu pensamento numa instituição basicamente feudal. Sempre assumi os custos de pensar com minha própria cabeça e de expressar meu pensamento, a despeito da disciplina rígida da diplomacia profissional.

Não sei quanto tempo durará este novo ostracismo e não tive tempo ainda de redigir algo a respeito. Isto virá em algum momento.

Por isso tomo a liberdade de reproduzir um texto que produzi ao final do meu segundo ostracismo, quando recém começava a trabalhar no IPRI. Um relatório que produzi sobre meu trabalho naquela instituição de pesquisa pode ser consultado neste arquivo: 

3383. “Relatório de Atividades como Diretor do IPRI de 2016 a 2018”, Brasília, 24 dezembro 2018, 27 p. Organizado segundo o modelo próprio, usando dados do modelo adotado no IPRI, eliminando alguns eventos, incluindo outros. Total de eventos: 2016=38; 2017=74; 2018=102; total=214. Disponibilizado na plataforma Research Gate (DOI: 10.13140/RG.2.2.11298.89288; link:https://www.researchgate.net/publication/329905640_Relatorio_de_Atividades_Gestao_do_diretor_do_IPRI_Paulo_Roberto_de_Almeida) e em Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/e66d6c1639/relatorio-do-ipri-diretor-paulo-roberto-de-almeida-2016-2018); anunciado no blog Diplomatizzando (25/12/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/12/ipri-meu-relatorio-de-atividades-2016.html).

Reproduzo abaixo o que escrevi em dezembro de 2016, copiado e divulgado novamente dois anos depois: 

Uma longa travessia do deserto: testemunho pessoal - Paulo Roberto de Almeida

Alguns poucos meses depois do término de uma longa travessia do deserto, que durou praticamente 14 anos – o dobro de meu primeiro exílio, sob a ditadura militar –, eu escrevi um pequeno testemunho pessoal, que alguém ainda relembrou recentemente, ao buscar esse texto na plataforma Academia.edu. Eis a ficha do trabalho: 

3066. “Como atravessar o deserto (e permanecer digno ao fim e ao cabo)”, Brasília, 18 dezembro 2016, 7 p. Divulgado no blog Diplomatizzando(link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/12/como-atravessar-o-deserto-e-permanecer.html) e disponibilizado na Academia.edu (link: http://www.academia.edu/30511412/3066_Como_atravessar_o_deserto_e_permanecer_digno_ao_fim_e_ao_cabo_2016_).

Transcrevo-o novamente aqui, desta vez acompanhado dos comentários que recebi de amigos, colegas e novos leitores.
Paulo Roberto de Almeida 


Como atravessar o deserto (e permanecer digno ao fim e ao cabo)

Paulo Roberto de Almeida
 [Memórias, balanço]

Como sabem muitos dos meus colegas e amigos, certamente todos os inimigos – e até pessoas que desconheço, com as quais não tenho relações, mas que acompanharam meus escritos e minha trajetória ao longo da última década –, acabo de atravessar, talvez não inteiramente, um longo deserto de atividades e funções, justamente naquela que deveria ser (e foi assim nos primeiros 25 anos de carreira), minha ocupação principal: a diplomacia. A travessia não terminou ainda, pois que ainda não retornei às atividades que caracterizam a carreira: representação, informação, negociações. Atualmente, mais exatamente, a partir de 3 de agosto de 2016, encontro-me numa atividade subsidiária, que é a de Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, IPRI, um órgão assessor da Fundação Alexandre de Gusmão (Funag), junto com o Centro de História e Documentação Diplomática (CHDD), com sede no Palácio Itamaraty do Rio de Janeiro.
A longa travessia do deserto quer dizer, mais precisamente, que, desde o início do governo dos companheiros, em 2003, até meados do presente ano, não tive nenhuma função, não ocupei nenhum cargo, não desempenhei nenhuma atividade vinculada à área do serviço público federal para a qual fiz concurso, na qual me desempenhei desde o final de 1977, e à qual eu deveria, teoricamente, servir, inclusive por obrigações de direito administrativo, e mais não fosse, para simplesmente justificar o salário que eu recebia todo o mês desde aquela longínqua data treze anos e meio atrás (ainda que meus vencimentos tenham sido reduzidos ao mínimo, sem qualquer remuneração por desempenho de função justamente). À parte a irregularidade administrativa cometida pelo ministério ao qual estou vinculado, uma tão longa desvinculação do serviço ativo na diplomacia só poderia ser explicada por duas razões objetivas: 
1) eu seria, presumivelmente, um péssimo diplomata, um mau servidor público, um inepto funcionário de carreira, um trabalhador totalmente incompetente para ocupar qualquer cargo ou função na diplomacia lulopetista;
2) eu fui julgado incompatível com os objetivos e propósitos da dita diplomacia lulopetista, e assim considerado um dissidente, um opositor, um outcast, um funcionário totalmente inadequado, indesejado, um contrarianista, e um objetor declarado dos tais objetivos e propósitos da referida diplomacia, e por isso mesmo mantido à distância, como um desses leprosos da Idade Média, condenados a viver apartados da sociedade, um pestiferado, uma espécie de vírus qualquer, capaz de contaminar perigosamente mentes e vontades naquela Santa Casa toda ela devotada a cumprir os altos desígnios dos novos dirigentes da nação e da sua diplomacia.
Os que me conhecem, e até os que não me conhecem pessoalmente, mas sabem de meus escritos e publicações, saberão escolher a hipótese que convém, das duas opções colocadas acima. A mim, cabe apenas, neste curto texto, expor objetivamente o que foram esses anos de travessia do deserto, quase que um segundo exílio – depois daquele enfrentado durante o regime militar – com a particularidade de que este durou exatamente o dobro do primeiro, aquele voluntário, este totalmente involuntário, uma vez que eu estava pronto e disposto a trabalhar, apenas que fui obstado por uma barreira impenetrável de negações e tergiversações. Nem vou entrar em considerações sobre os aspectos subjetivos dessa longa travessia, como a destruição da minha carreira, pois isso faz parte dos imponderáveis funcionais a ela associados: nela se é, ou não, promovido, pela avaliação que fazem colegas e superiores de seu próprio desempenho – supondo-se que todo o processo de ascensão funcional se faça por mérito efetivo, e não pelo mais comum “quem indica, quem apoia” – e não se pode prejulgar que eu teria sido merecido promoção ao longo do período, pois essa é uma possibilidade, não uma certeza. Vou ater-me apenas à descrição factual do processo, como convém a um depoimento com finalidades unicamente descritivas.
Minha última designação para um cargo na carreira diplomática, e para uma função no quadro da Secretaria de Estado das Relações Exteriores tinha ocorrido em meados dos anos 1990, quando eu fui nomeado chefe da então Divisão de Política Financeira e de Desenvolvimento (temas de investimentos, finanças, acordos e negociações nessas áreas e assuntos correlatos, regionais, bilaterais e multilaterais). No final da década fui indicado para exercer o cargo de ministro-conselheiro na embaixada em Washington, a convite do embaixador Rubens Barbosa, com quem já havia trabalhado algumas vezes anteriormente. Foram quatro anos muito felizes na capital americana, onde aprendi enormemente um pouco sobre tudo, o que teoricamente faz do feliz ocupante do cargo um servidor habilitado a exercer qualquer função na Secretaria de Estado ou qualquer outro posto e missão da carreira, uma vez que em Washington se trabalha sobre praticamente todos os dossiês e assuntos de uma Secretaria de Estado. 
Ao cabo da experiência, e já com intenção de retornar ao Brasil, fui convidado pelo então Diretor do Instituto Rio Branco, nossa academia diplomática, para servir como coordenador do curso de mestrado em diplomacia, que tinha sido iniciado em 2001, e ao qual eu já estava associado como professor orientador de teses (tendo vindo ao Brasil de férias, em 2002, voluntária e especialmente para discutir suas teses com meus seis ou sete orientandos). Já estávamos no início de 2003, e o convite deve ter sido formulado entre o final de março e o começo de abril, ao qual respondi positivamente, a despeito de meu desejo primário de voltar a servir na Secretaria de Estado, tendo em vista, justamente, minhas habilidades nas mais diversas áreas da diplomacia econômica, em especial em suas vertentes comercial e financeira. Mas, como eu também tenho essa inclinação para as atividades acadêmicas, já tendo me desempenhado como professor do Instituto Rio Branco e da UnB (e de algumas outras instituições em caráter temporário), julguei que seria uma boa experiência didática e intelectual, possivelmente como passo preliminar para ocupar a própria chefia do IRBr, cargo para o qual eu me julgava plenamente habilitado e competente, inclusive para mudar algumas coisas ali existentes.
A surpresa, mas não a frustração imediata, veio poucos dias depois, quando o mesmo diretor que tinha formulado o convite telefonou-me de modo algo desconsolado, para dizer que, infelizmente, não poderia confirmar o convite porque o “secretário-geral do Itamaraty tinha outros projetos em mente”. Uma desculpa diplomática, digamos assim, pois imaginei imediatamente, e realisticamente, que o dirigente em questão se opunha a que eu fosse trabalhar numa área que ele provavelmente julgava de extrema importância para o futuro da diplomacia na gestão lulopetista que então se iniciava, e que prometia ser uma “ruptura com tudo o que havia antes no Brasil” (como de fato foi, e como descobrimos, para o bem e para o mal, na sequência do regime celerado). Assim foi que permaneci por mais alguns meses em Washington, até surgir uma outra função ou cargo, em Brasília ou em qualquer missão ou posto no exterior. Mas preocupado com arranjos familiares – término na universidade do filho mais velho, Pedro Paulo – e necessidade de decidir quanto a renovação de aluguel e outras providências práticas, ou o próprio fato que eu já me aproximava dos quatro anos no posto, levaram-me a tomar uma atitude proativa nesse processo, tirando mais alguns dias de férias para tentar resolver em Brasília minhas atribuições ou destino futuros. 
Na Secretaria de Estado, onde cheguei justo no momento em que o chanceler único e resplandecente do lulopetismo proclamava a necessidade de os diplomatas “vestirem a camisa do governo” – o que era de certa forma surpreendente, numa carreira que se orgulha de dizer que serve ao Estado, mais do que aos governos, como tinha já sintetizado um século antes o Barão do Rio Branco – eu fui finalmente apresentado ao quadro formal e realista de minha condição no novo governo: não havia nada previsto para mim na Secretaria de Estado, e a administração não estava removendo para Brasília ministros que não tivessem já uma função definida, pois já havia muitos, como fui informado, que estavam sem funções na Casa, situação a que vulgarmente se dava o nome de DEC, não o Econômico, mas o “Departamento de Escadas e Corredores”. O que me foi oferecido foi ficar mais tempo em Washington, ou negociar algum outro posto, ou seja, partir como embaixador comissionado em algum posto perdido em continentes longínquos (isso imaginei eu, em função das “boas” disposições dos meus interlocutores para comigo, que não preciso indicar quem fossem). 
Não havia como não concluir que havia um veto em curso ao meu nome, para qualquer função na Secretaria de Estado, e eu já deveria ter imaginado as razões desse veto. Eu sempre manifestei minhas posições e opiniões sobre tudo e qualquer coisa da carreira diplomática e das posturas do Brasil em política externa, e nunca escondi de ninguém o que pensava de tudo isso, aliás expresso em dezenas de artigos publicados e, nessa altura, em pelo menos, seis livros editados por diferentes editoras. Minhas ideias sobre o novo governo lulopetista estavam por sinais disponíveis em meu site e em blogs e veículos diversos do mundo acadêmico, tendo sido publicado, já no início do governo lulopetista, um artigo meu na revista Sociologia e Política (da UFPR), no qual eu dizia, claramente, que o PT era um mero partido esquerdista tipicamente latino-americano – ou seja, socialista, anti-imperialista e antiamericano – mas que, a despeito disso, a política externa e a diplomacia não seriam significativamente alteradas, ou seja, haveria mais continuidade do que ruptura nas relações internacionais do Brasil. Imagino, mas já retrospectivamente, que essa última afirmação, arriscada em si mesma, deva ter deixado mais de um companheiro irritado, e provavelmente seus auxiliares diplomáticos comprometidos com a gloriosa missão de mudar tudo o que existia antes, inclusive e principalmente na diplomacia. 
O fato é que as portas estavam fechadas para mim na Secretaria de Estado, e assim permaneceram durante todo o regime lulopetista, ou seja, exatamente treze anos e meio, ao longo dos quais enfrentei, como disse, um deserto quase interminável. Mas, paradoxalmente, fui convidado, por um dos próceres mais importantes do novo regime, para trabalhar no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, dirigido justamente por um dos membros da troika que assessorava o novo demiurgo nos assuntos mais importantes do governo salvacionista. Não preciso me estender agora – tanto porque pretendo escrever a respeito mais detalhadamente no futuro – sobre os três anos durante os quais eu me desempenhei em funções que eu imaginava importantes do ponto de vista do planejamento governamental, mas que os companheiros pretendiam transformar numa espécie de “revival” do dirigismo geiseliano sobre a economia e a política no Brasil. Depois da saída do governo do grão-petista que dirigia o NAE, eu me desliguei daquelas funções e me apresentei novamente na Secretaria de Estado, no final de 2006, disposto a assumir quaisquer funções que me fossem oferecidas para trabalhar pela Casa e no Estado (bem menos, já pensava eu, por um governo que se tinha revelado inerentemente corrupto, inepto e incorrigível). Não preciso dizer que encontrei o mesmo quadro de tergiversações e de embromações que já se tinha manifestado três anos antes. 
Em síntese: nada me foi oferecido como funções ou cargos na Secretaria de Estado. Mas, corrijo: a chefia de gabinete do então ministro ativo e altivo chegou a oferecer-me três cargos para posse imediata, talvez sem saber que meu nome já tinha entrado no rol daqueles seres condenados a um dos círculos do inferno lulo-dantesco. Aceitei um dos cargos, mas depois nada, ou seja, não aconteceu nada, quando então descobri que não apenas o SG, mas igualmente o chefe da Casa tinha objeções ao meu nome. Obtive a confirmação disso logo depois, quando o próprio titular reagiu negativamente a uma abordagem fortuita que lhe fiz, numa recepção de fim-de-ano no Clube das Nações, ao manifestar-lhe minha intenção de voltar à Casa: ele simplesmente me disse, acerbamente, que “minha entrevista [que havia dado pouco antes ao Estadão sobre a “construção intelectual” do Bric] não tinha ajudado em nada”, e virou as costas para mim. Nunca mais falei com o personagem, hoje na tropa de choque, junto com o mesmo SG, do chefão mafioso, ou seja, o pelotão de defesa de um dos maiores bandidos da política brasileira (que já conheceu vários, mas nenhum maior). 
A bem da verdade, o mesmo chanceler altivo chegou a oferecer-me a chefia de uma embaixada no exterior, poucos meses depois, ao que respondi negativamente, por razões puramente familiares, mas agradecendo a concessão (que obviamente deveria ser considerada como um afastamento providencial de um opositor moderado das políticas esquizofrênicas dos lulopetistas na frente diplomática). Não preciso dizer que, a partir daí, minha carreira simplesmente terminou, passando a amargar vários anos adicionais de “DEC”, com imensos prejuízos em termos profissionais, familiares e financeiros. Não obstante, persisti, mesmo no deserto a que estava relegado, na mesma atitude que sempre foi a minha: ler, refletir, escrever, eventualmente publicar, aquilo que julgava correto de um ponto de vista meramente epistemológico, ou seja, o resultado de uma reflexão própria, independente, sobre questões da política internacional, da diplomacia brasileira, de nossas posturas em política externa, unicamente com o espírito acadêmico que sempre foi o meu.
De certa forma, devo agradecer a meus “algozes” a oportunidade que me deram de aprofundar essas pesquisas, ideias, reflexões e escritos, pois ao me obrigarem a fazer da biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho, ofereceram-me tempo e lazer – ainda que com remuneração reduzida – para ampliar minha produção de caráter acadêmico. Nesse período, em nenhum momento tive acesso a qualquer forma de comunicação interna ao Itamaraty – telegramas ou quaisquer outros tipos de expedientes – e minhas únicas fontes de reflexão e de escrita eram as mesmas a que tinham acesso quaisquer acadêmicos e jornalistas, ou seja, material de imprensa e artigos e livros em disponibilidade pública. De certa forma, eu já fazia isso em qualquer época anterior, mas apenas nos momentos de lazer, no recesso do lar, no tempo livre do trabalho em dedicação integral. Ao permitirem “férias compulsórias”, meus “inimigos funcionais” me habilitaram a produzir um volume anormalmente elevado de artigos e livros, que eu provavelmente não teria tido condições de conduzir em uma situação normal de trabalho.
Talvez, outros diplomatas colocados nesse tipo de situação poderiam ter exibido algum comportamento depressivo, o que não foi absolutamente o meu caso: eu tinha forças morais para atravessar o deserto e, ao fazê-lo, pude dedicar-me a atividades acadêmicas que sempre fizeram parte de minha “segunda vida”, ao lado da carreira profissional. A escrita de livros, artigos e outros materiais – uma infinidade de comentários em blogs próprios ou de outros internautas – ocupou o restante do período em que estive no exílio lulopetista. Com duas pequenas alterações: em 2012, sem perspectiva de alteração em minha condição na Secretaria de Estado, aproveitei uma licença oficial para dedicar seis meses do ano a atividades docentes na Sorbonne; e de 2013 a 2015 aceitei um posto subalterno num pequeno consulado da costa leste dos EUA, expressamente com o objetivo de estudar mais, ler intensamente, viajar um pouco, e esperar o fim do regime lulopetista. Pensei que ele viesse nas eleições de outubro de 2014, e aí sim experimentei uma grande frustração, pois o poste lulopetista foi reconduzido à presidência, numa campanha de mentiras e de grandes falcatruas, como aliás esperado por todos os conhecedores dos meandros do regime.
Resolvi voltar ao Brasil no final de 2015, sem qualquer perspectiva de mudança no quadro geral da política podre do lulopetismo, e de fato permaneci no deserto por mais seis meses adicionais, sem quaisquer perspectivas concretas de retomada de algum cargo ou função na Secretaria de Estado. Retomei minhas atividades acadêmicas, mas no contexto do processo de impeachment, deslanchado no final daquele ano. Foram exatamente seis meses de golpes e contragolpes, de mais falcatruas e patifarias, até que, finalmente, os companheiros corruptos foram apeados do poder, em maio de 2016. Foi quando, finalmente, os novos barões da Casa se decidiram por extinguir o meu exílio, com um convite para exercer o cargo prestigioso, mas inoperante em termos de política externa, de Diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, o que de toda forma é uma distinção e um prêmio, na perspectiva de meus interesses intelectuais.
Foram ainda necessários mais três meses para que a função fosse efetivada, período no qual colaborei informalmente com a instituição, ao organizar seminários, livros e publicações, sem ainda dispor de título ou remuneração condigna. Por uma dessas ironias da história, meu cargo é o mesmo do qual tinha sido defenestrado meu colega dissidente – em outros termos – da política externa do ancien régime tucanês, e que por isso mesmo se tornou um mártir da causa lulopetista, e daí passou a ocupar a função a partir da qual me vetou para qualquer cargo na Secretaria de Estado. Não tenho nenhuma animosidade ao companheiro – em duplo sentido – e até pretendo convidá-lo para participar de atividades acadêmicas do IPRI, no que ele decidir aceitar, mas não pretendo, tampouco, deixar de fazer aquilo que fiz ao longo dos treze anos e meio do nefasto regime lulopetista: analisar, sintetizar, descrever e expor os absurdos teóricos e práticos perpetrados pelos companheiros apparatchiks e seus aliados diplomatas.
Não sei se devo julgar-me “reabilitado”, pois essa é uma avaliação que não me cabe pessoalmente fazer, mas sim devo confirmar que não pretendo mudar de atitude, que corresponde, finalmente, a uma postura intelectual que sempre mantive ao longo desses anos de “exílio”, e invariavelmente ao longo de uma vida dedicada ao estudo, à reflexão, e à exposição de minhas ideias sobre uma gama variada de assuntos: manter um ceticismo sadio sobre todas as questões de interesse público que sejam objeto de políticas, encarar interrogativamente qualquer postura acadêmica, de pesquisa, que possa ser feita sobre os mesmos problemas, e expor de forma independente e honesta as conclusões ou resultados que extraio de meus estudos, leituras e reflexões. Não tenho razões para mudar de atitude, seja para galgar distinções políticas que não almejo, seja para agradar superiores ou colegas que se exercem nos mesmos campos que são os meus desde sempre: a dupla carreira na diplomacia e na academia.
Vale!

Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 18 de dezembro de 2016.

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Mensagens recebidas: 

Achilles Emilio ZaluarO grande erro que muitos cometem é afastar as vozes dissidentes, o que os franceses chamam os "empêcheurs de penser en rond". Foi um erro, para o Governo da época, demitir Samuel Pinheiro Guimarães. Foi um erro para o Governo subsequente colocar um diplomata do seu valor na geladeira. Como você não "quebrou", isto é, não caiu na depressão e no desânimo (não te conheciam bem...), você acabou sendo muito mais influente e eficaz, com a liberdade de trabalhar por fora contra os projetos deles na batalha mais importante, que é a das idéias. 
O Itamaraty precisa, a cada momento, manter uma diversidade ideológica que permita um debate interno saudável. Isso é positivo mesmo do ponto de vista da eficácia do projeto no poder em cada momento (que é alertado sobre os erros táticos que é tentado a cometer, sob a ilusão da onipotência que aflige os detentores do poder), e ainda mais do ponto de vista dos interesses permanentes do Brasil. 
Mesmo os militares mantiveram dentro do MRE um número considerável de diplomatas "de esquerda", que ocuparam funções importantes. A tentativa de impor uma monocultura ideológica termina sempre como todos as monoculturas: pragas, rendimentos decrescentes, ciclos de boom and bust. Benvindo de volta, Paulo.

Minha resposta ao Achilles:Paulo Roberto de AlmeidaConcordo com absolutamente tudo, ou quase tudo, meu caro Achilles Emilio Zaluar, e agradeço imensamente as palavras generosas e simpáticas. Também acredito que a batalha das ideias é a mais importante. Mas eu não afirmaria que, no meu caso específico, se tratou de um "erro", pois eu acho que eles "acertaram", ao me julgar um "empêcheur de penser en rond", ou um contrarianista fundamental. Simplesmente pretenderam me silenciar, e até me impedir de trabalhar, o que aliás é uma violação de normas de direito administrativo (o que me habilitaria, teoricamente, a processar o Ministério, para obrigá-lo a me designar para qualquer coisa, até chefe da garagem que fosse). No cargo atual, pretendo, justamente, debater todas as questões relevantes, em aberto aquelas que podem ser feitas em aberto, e em reuniões fechadas aquelas questões sensíveis. Vamos ver até onde será possível...

Cyro AndradeReceba meu abraço de plena solidariedade (o adjetivo vai como reforço proposital).

Carlos Eduardo Véras NevesLeopoldo Faiad da Cunha

Adivo Paim FilhoUm cordial Abraço Dissidente, desde o centro geográfico do sertão gaúcho! Description: https://www.facebook.com/images/emoji.php/v6/f4c/1/16/1f642.png:)

Carmen Lícia PalazzoAdorei o blog com esta nossa foto. Description: https://www.facebook.com/images/emoji.php/v6/f4c/1/16/1f642.png:)

Carlos Alberto AsforaPaulo, dá vergonha alheia lembrar de tudo que passamos, pelas mãos dos companheiros, você, talvez mais do que todos. Eles me dão nojo, muito nojo. É só o que eu posso sentir.

Hadassah SantanaSempre uma boa reflexão! Description: https://www.facebook.com/images/emoji.php/v6/f57/1/16/1f609.png😉

Marco Tulio Scarpelli CabralBem-vindo de volta, Paulo. É um privilégio trabalhar com você.

Pedro Fernando Bretas BastosE eu aposentado, no Rio, o seguirei, sempre com a minha admiração, apreço e respeito. Forte abraço do Pedro Fernando Bretas Bastos

Vera Do Val GalanteParabéns, Paulo Roberto, pela retidão e coerência. O Itamaraty perdeu esse tempo todo. Agora começa a se redimir, mas ainda falta...


Minha resposta geral: 
Meus sinceros agradecimentos aos muitos amigos e colegas (recebi e-mails diretamente também) que se manifestaram a respeito dessa postagem, que de ordinário não teria sido feita se não tivesse ocorrido a "provocação" de um colega: normalmente sou extremamente discreto quanto a tudo o que se refere a questões pessoais e apenas me pronuncio sobre temas objetivos, separados de minha própria condição. Mas como ele abordou o "deserto", achei que minha resposta -- e de certa forma explicação, pois muita gente ainda me cumprimenta pela direção do IPRI -- merecia ser veiculada de forma pública, uma vez que a situação era, efetivamente, pública: todos sabiam que eu estava no deserto, mas ninguém sabia exatamente como e porque, em que circunstâncias isso tinha ocorrido, e o que eu tinha feito nesse longo período de treze anos e meio (talvez mais), em que estive totalmente -- enfatizo totalmente -- afastado de quaisquer funções na Secretaria de Estado. Voilà...

 Paulo Roberto de Almeida 

sexta-feira, 10 de maio de 2019

Mais uma travessia do deserto: desta vez no Arquivo - Paulo Roberto de Almeida

Uma trajetória involuntária no deserto da diplomacia


Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 9 de maio de 2019

Entre 2003 e 2016, ou seja, durante todo o regime lulopetista no Brasil, eu não tive NENHUM cargo na Secretaria de Estado, começando por um veto da nova administração – que tomou posse em janeiro de 2003 – a um convite que eu havia recebido para dirigir o mestrado em diplomacia no Instituto Rio Branco. 
Desde essa época, nunca tive nenhum trabalho nas áreas de trabalho diplomático estrito senso; trabalhei primeiramente no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República – a convite do então ministro da Secom e chefe do NAE Luiz Gushinken, que eu conhecia de seus tempos de deputado do PT –, depois, a partir de 2006 até 2010 – passei anos e anos no chamado DEC – Departamento de Escadas e Corredores do Itamaraty – fazendo da Biblioteca o meu escritório de trabalho –, fiz um serviço provisório na China durante alguns meses em 2010 (por ocasião da Expo Universal em Shanghai), voltei novamente para o DEC em 2011, em seguida tirei licença-prêmio e fui dar aulas no Institut de Hautes Études de l'Amérique Latine, vinculado à Sorbonne, em Paris (no primeiro semestre de 2012), voltei novamente para o DEC, fazendo novamente da Biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho – onde escrevi alguns livros: um, na minha série de "clássicos revisitados", O Moderno Príncipe, seguindo os 26 capítulos do clássico de Maquiavel, outro sobre o lulopetismo diplomático: Nunca Antes na Diplomacia (2014) –, para, finalmente, aceitar um posto secundário num modesto consulado brasileiro nos EUA, entre 2013 e 2015. Ao voltar, no início de 2016, continuei nas escadas e corredores, até que o impeachment, em meados de 2016, fizesse com que os novos gestores do Itamaraty se lembrassem novamente de mim, convidando-me para ser o diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), órgão da Fundação Alexandre de Gusmão, vinculada ao Itamaraty.
Resumi um pouco dessa trajetória no seguinte texto, aqui disponível:  

Como atravessar o deserto (e permanecer digno ao fim e ao cabo)”, Brasília, 18 dezembro 2016, 7 p. Divulgado no blog Diplomatizzando (24/06/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/06/uma-longa-travessia-do-deserto.html).  

Dois anos e meio de atividades no IPRI me foram extremamente gratificantes do ponto de vista intelectual, pessoal e funcional. Mas a alegria não poderia durar muito tempo, sobretudo depois da mudança de governo, de regime e de "filosofia" diplomática. Já não era o mundo de liberdade relativa da qual eu tinha desfrutado brevemente e tinha inevitavelmente de acabar, em face do autoritarismo (eu até diria da estupidez) da nova administração. Fui exonerado no Carnaval deste ano, e passei novamente a frequentar escadas e corredores, com paragens ocasionais na Biblioteca. 
Bem, acabo de ser lotado no Departamento de Documentação e Arquivo (DCA) e espero passar alguns meses na Divisão de Arquivo, fazendo pesquisa e escrevendo mais algum livro.  Não sei quanto tempo vai durar a nova situação, mas vou tentar ser o mais produtivo possível, esperando que minha presente travessia do deserto termine em algum momento do futuro (breve). 
Ainda não tenho nenhum texto sobre a nova situação, mas não deixo de manter registros privados sobre cada nova etapa da minha vida intelectual.
Informarei oportunamente.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 9 de maio de 2019

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Dever de transparencia, 1 e 2: consolidando os registros - Paulo R. Almeida

No mês de agosto passado, ao "comemorar" dois anos de minha retomada de atuação formal junto ao Ministério das Relações Exteriores, depois de treze anos e meio de um exílio forçado que durou exatamente o dobro de meu exílio voluntário durante a ditadura militar, eu fiz questão de recuperar uma série de escritos que tinham ficado "soterrados" nas dobras do deserto que me serviu de refugio e de ambiente de reflexão durante todo aquele tempo, ou que estavam mesmo "obscurecidos" pela não divulgação durante os anos de "pensamento único companheiro", que não toleravam meus posicionamentos e posturas contrários às políticas praticadas.
Preparei, então, duas listas sucessivas de trabalhos inscritos nessa categoria de "textos marginais", ou seja, que não fizeram necessariamente parte do conjunto de artigos que podem ter sido normalmente publicados por veículos acadêmicos, ou neste espaço, o blog Diplomatizzando, que eu sempre chamei de "quilombo de resistência intelectual", meu pequeno bastião de liberdade.

O primeiro é este aqui, divulgado normalmente no blog e no Facebook, inclusive na plataforma que mais utilizo, a Academia.edu:

3322. “O dever de transparência: flashes da postura pessoal em 2002”, Brasília, 17 agosto 2018, 9 p. Introdução biográfica e listagem seletiva de 33 textos redigidos no decorrer de 2002, um ano antes da assunção dos companheiros ao poder político, no qual eles permaneceram durante mais de 13 anos, período no qual permaneci num total ostracismo profissional, do qual só emergi ao final do regime companheiro. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/08/escritos-que-precederam-o-ostracismo.html), disseminado no Facebook (https://www.facebook.com/paulobooks/posts/2052587324804707) e incluído na plataforma Academia.edu (http://www.academia.edu/37250155/O_dever_de_transparencia_flashes_da_postura_pessoal_em_2002).

O segundo foi preparado poucas semanas depois, mas nunca postado neste espaço, ao que parece, unicamente na plataforma Academia.edu:

3325. “O dever de transparência, 2: flashes da postura pessoal em 2003”, Brasília, 2 setembro 2018, 14 p. Seleção de 20 artigos, dentre 174, como representativos de uma produção focada na minha relação com os companheiros, no primeiro ano dos governos lulopetistas. Divulgado na plataforma Academia.edu (link: http://www.academia.edu/37328919/O_dever_de_transparencia_2_flashes_da_postura_pessoal_em_2003).

Para reparar a lacuna, transcrevo o conteúdo logo abaixo. Pode ser que eu continue a série, fazendo novas listas de escritos não divulgados durante meus anos de travessia do deserto, que foram muitos.

O dever de transparência, 2: 
flashes da postura pessoal em 2003

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: continuidade de exercício anterior; finalidade: esclarecimento público]


O ano em que tudo começou: de forma confusa e crescentemente disfuncional
Poucas semanas atrás, revisando alguns textos de épocas passadas, mais exatamente da fase anterior à assunção dos companheiros ao poder, em janeiro de 2003, eu efetuei uma listagem de trabalhos, divulgados ou inéditos, escritos por mim no decorrer de 2002, e que poderiam explicar – mas provavelmente não justificar – o meu completo ostracismo do trabalho diplomático durante todo o reinado companheiro, ou seja, entre janeiro de 2003 e maio de 2016. No dia 31 de agosto de 2018, completaram-se dois anos do afastamento definitivo da sucessora e última presidente do indescritível regime lulopetista, que ainda não foi completamente afastado do cenário político.
O meu trabalho, com o mesmo título deste, mas relativo a 2002, foi divulgado em meu  blog e na plataforma acadêmica de que me utilizo. Reproduzo aqui a ficha: 

3322. “O dever de transparência: flashes da postura pessoal em 2002”, Brasília, 17 agosto 2018, 9 p. Introdução biográfica e listagem seletiva de 33 textos redigidos no decorrer de 2002, um ano antes da assunção dos companheiros ao poder político, no qual eles permaneceram durante mais de 13 anos, período no qual permaneci num total ostracismo profissional, do qual só emergi ao final do regime companheiro. Postado no blog Diplomatizzando(link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/08/escritos-que-precederam-o-ostracismo.html) e incluído na plataforma Academia.edu (http://www.academia.edu/37250155/O_dever_de_transparencia_flashes_da_postura_pessoal_em_2002).

Cabe esclarecer que, no início do governo companheiro, ainda exercendo funções como ministro-conselheiro na embaixada em Washington, eu tinha sido convidado a exercer o novo cargo de coordenador do mestrado do Instituto Rio Branco, a academia diplomática do Itamaraty, uma vez que eu já exercia a função, desde a abertura do mestrado, dois anos antes, de professor orientador das dissertações, como um dos poucos diplomatas que, então, possuíam doutoramento. Poucos dias depois de ter sido convidado, e aceito, esse cargo, fui no entanto vetado – o termo é exatamente esse – pelo Secretário Geral das Relações Exteriores, que provavelmente estava preocupado com minha atitude independente em relação ao regime lulopetista e, mais grave ainda, exibir inaceitáveis credenciais liberais. Agradeci a atenção do Diretor do IRBr e permaneci mais alguns meses em Washington, até que em meados de 2003, uma oportunidade de trabalhar apareceu em Brasília, mas fora do Itamaraty, ainda que no próprio coração do regime petista, num novo órgão chamado de Núcleo de Assuntos Estratégicos (NAE), coordenado por um dos condestáveis do novo regime.

O que eu produzi no decorrer de 2003, que interessa registrar?
Pois bem, cabe agora verificar o que escrevi no decorrer de 2003, o ano que eu nunca pensei que se estenderia por 13 longos anos de afastamento de qualquer função na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, ou seja, o serviço exterior brasileiro, para o qual fiz concurso em 1977 e no qual vinha exercendo normalmente atribuições ao longo do período final da ditadura militar e na redemocratização. Em 2003, entendo que ocorreu um assalto contra o poder, contra o Brasil, contra os brasileiros, por um grupo heteróclito de militantes de causas obscuras que, no conjunto conforma aquilo que eu denominei, depois de algum tempo, de “organização criminosa”. Mas isso eu só fui perceber algum tempo depois, basicamente a partir do Mensalão, em 2005, quando pude comprovar que a inépcia demonstrada nos dois anos anteriores, não apenas o fruto da incompetência administrativa dos companheiros, mas um propósito deliberado, um objetivo claro, para eles: o de dominar o sistema político, o de extorquir capitalistas, o de dilapidar o Estado, o de roubar os brasileiros, para fins de monopólio do poder e de enriquecimento pessoal. Uma quadrilha, enfim, como amplamente demonstrado, depois, pelos muitos processos e investigações ainda em curso. 
Em 2003, isso não estava muito claro para mim. Mas foi ficando claro muito rapidamente, à medida em que, tendo retornado ao Brasil em meados desse ano, eu comecei a trabalhar com os companheiros, numa coisa chamada “Núcleo de Assuntos Estratégicos”, vinculada à Presidência da República e liderado por um dos grão-vizires do novo regime, o ministro das Comunicações de Governo, Luiz Gushiken, um dos três membros da Troika – junto com José Dirceu e Antonio Palocci – que assessora o novo presidente diretamente. Foi um período curioso em minha trajetória, pois a rigor eu era um opositor político do novo regime, ainda que desfrutando da confiança do chefe do NAE, e nunca hesitei em criticar as políticas que estavam sendo implementadas, por achar, no início, que elas eram inadequadas, no mínimo, no máximo equivocadas e provavelmente prejudiciais ao Brasil. Depois vim a descobrir que a inépcia era mais do que deliberada, eram talhadas a propósito para desviar recursos e roubar o erário, assim como todos os intermediários, empresas públicas e privadas. Ou seja, a máfia...
No decorrer de 2002, já plenamente consciente de que os companheiros iriam conquistar, legitimamente, o poder, eu escrevi uma série de ensaios de natureza política que foram sendo publicados, em sua grande maioria, num revista digital tipicamente esquerdista, como soe acontecer nas faculdades de humanidades das universidades brasileiras, chamada Espaço Acadêmico, com a qual vinha colaborando desde 2001; esses textos foram reunidos de forma algo improvisada, no último trimestre de 2002, num livro, finalmente publicado no início de 2003 por uma nova editora, formada pelo antigo editor da Senac-SP, Alberto Quartim; para colaborar na tarefa de divulgação, produzi um texto, finalmente nunca divulgado, para apresentar o livro: a ficha aqui comparece sob o número 994, que abre a lista reproduzida in fine.
O primeiro texto mais diretamente vinculado ao exercício do poder da nova equipe de dirigentes foi, obviamente, o publicado na revista Sociologia e Política, logo no primeiro semestre de 2003 (n. 1010), dedicado à “diplomacia” do novo regime, que eu imaginava não muito distante da tradicional. Foi um julgamento errado como se viu, pois o partido, basicamente, transformou enormemente a política externa, colocando-a a serviço dos seus interesses, que por acaso se pareciam muito com os interesses cubanos. Registre-se que eu era contra salário mínimo, propaganda de governo e diversas outras políticas que seriam as do governo que começava, e nunca deixe de expressar minha opinião como ficou registrado no trabalho 1011, respostas às perguntas de um jornalista para a única resenha de meu livro A Grande Mudança, que estava sendo publicado naquele começo de ano: a manchete foi a de que o meu livro pretendia acabar com o salário mínimo, o que deve ter chocado muita gente. Continuo pensando a mesma coisa.
Logo ao início da nova administração do Itamaraty, foi criado um “canal de diálogo” com os diplomatas, e estes foram solicitados a dar sua contribuição para eventuais reformas da carreira, não sei exatamente com qual intenção. Limitei-me, em todo caso, a falar sobre mecanismos de ascensão funcional e sobre a necessidade de por um fim à famigerada “Lei da Mordaça”, sob a qual eu já tinha sido punido, na gestão anterior, por publicar artigos sem autorização prévia. Minha opinião sobre ambos os temas está expressa no trabalho n. 1013, um número talvez sugestivo...
Em março de 2003, o Diretório Nacional do PT, em meio às contestações de sua ala esquerda, resolveu esclarecer essas contradições internas, emitindo uma resolução, que foi cuidadosamente analisada por mim. Escrevi então um texto comentando cada um dos pontos que mereceram minha atenção, mas não o divulguei, senão a poucos interlocutores (que já não sei quem foram). Mais adiante, revisei o trabalho, n. 1043, que foi publicado numa Revista Autor, hoje desaparecida. Divulguei, portanto, esse texto em meu blog, e ele fica à disposição dos interessados.As contestações então feitas ao “neoliberalismo” do PT no poder continuaram, e até recrudesceram. No dia 1o. de maio, data simbólica para os trabalhadores e para o PT, um grupo de “intelectuais” (assim foram autodesignados) divulgou uma carta ao Presidente com fortes críticas à sua política econômica, ao presidente do Banco Central (Henrique Meirelles) e ao próprio ministro da Fazenda, Antonio Palocci, um trotsquista da boa cepa – dizem que os trotsquistas fazem os melhores capitalistas, quando convertidos – e a vários outros aspectos da condução do governo, que eles certamente esperavam “revolucionária”, e que estavam achando reformista, ou burguesa demais. Pela primeira vez explicitamente saí em defesa do presidente, não por ele, claro, mas em defesa da racionalidade da política econômica. Esse texto ficou inédito, ou teve circulação extremamente restrita, o que me leva a divulgá-lo neste momento (trabalho n. 1044).
Chegou um momento em que o próprio think tank do PT, a Fundação Perseu Abramo, começou a criticar a política econômica do governo. O boletim eletrônico Periscópio, da Fundação e da Secretaria Nacional de Formação Política do PT, publicou um artigo de análise crítica a propósito do documento da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, “Política econômica e reformas estruturais” (redigido pelo economista Marcos Lisboa). Enviei meus comentários ao boletim Periscópio, publicados na seção Cartas do n. 25, maio de 2003, com comentários dos editores ao final do meu texto. Refiro-me ao trabalho 1047, segundo a lista abaixo. Eu estava, portanto, defendendo o governo do PT contra o próprio PT. Para consolidar os textos nos quais eu praticava esse tipo de exercício, ou seja, o ato de criticar as críticas dos militantes de esquerda (inclusive membros do próprio PT) à política econômica do governo do PT, redigi uma pequena nota, para divulgar os trabalhos que eu vinha escrevendo em defesa, não do PT ou do governo do PT, mas da racionalidade, do simples bom-senso na formulação das políticas públicas, sobretudo a econômica. A mesma nota era acompanhada de uma lista de trabalhos redigido até ali, nem todos divulgados devidamente; esse trabalho, de n. 1049, permaneceu inédito até aqui, tendo sido finalmente divulgado em meu blog Diplomatizzandocomo informo abaixo.
Em julho de 2003, ainda trabalhando como ministro-conselheiro em Washington e ocasionalmente atuando como chefe de missão interino, nas ausências ocasionais do chefe do posto, o embaixador Rubens Barbosa, eu provavelmente cometi, aos olhos do então chanceler do lulopetismo, o maior pecado do ponto de vista de quem, junto com os outros arautos do regime, já tinha firme a intenção de implodir a Alca: ousei, num comentário a um artigo dele na FSP, criticar métodos e estratégia, assim como deixar transparecer, de forma moderada, de que alguma acomodação seria possível entre o Brasil e os EUA na questão do projeto americano de um zona de livre comércio hemisférica. Mesmo escrevendo em nome do chefe do posto – pois que o telegrama deveria ser expedido oficialmente, ousei alinhar argumentos, em resposta a circular telegráfica (ou telegrama) da SERE justamente solicitando comentários a esse artigo. Não tenho certeza de que tenha sido deliberado por parte do chanceler calculista, talvez pensando justamente em montar uma armadilha, talvez para demonstrar ao chefe do Estado que o “pessoal de Washington” – o embaixador Rubens Barbosa e eu mesmo – era irremediavelmente pró-americano e pouco confiável para o projeto de implodir a Alca que todos eles entretinham. 
Seja como for, coloquei no telegrama, que redigi inteiramente sozinho (ainda que interpretando o que poderia pensar o chefe do posto), todos os argumentos objetivos e honestos, que poderiam sustentar a postura do Brasil na fase difícil que já estava aberta. Esse trabalho n. 1081 – “A Alca Possível: Comentários a artigo do Ministro de Estado”, de julho de 2003 – pode ter marcado definitivamente, na concepção dos dirigentes do Itamaraty, a ideia de que eu não seria confiável do ponto de vista da política externa dos companheiros. Evitei colocar as “espertezas” que eu percebia que já estavam sendo preparadas para implodir a Alca, e fui bastante moderado na avaliação da postura confrontacionista formulada em Brasília.A partir desse momento, foram 13 anos de afastamento de quaisquer funções na Secretaria de Estado, enquanto durou o regime lulopetista no poder (e eles ainda tentam voltar). Esse meu texto talvez explique algo.A Alca continuou a ocupar-me em diversos outros trabalhos, como o que aqui aparece na listagem sob o número 1087, consolidando três outros textos.
Nessa mesma época, ou seja, em meados de 2003, eu já tinha recebido um convite para trabalhar nesse “Núcleo de Assuntos Estratégicos”, mas também para assessorar diretamente o seu chefe, enquanto um dos ministros mais próximos do presidente. Durante os dois anos em que o assessorei, elaborei uma série de “memos” sobre os mais diversos assuntos, que talvez um dia consolide numa pequena brochura informativa sobre meu trabalho, à margem da agenda normal do NAE. Mas, comecei a assessorá-lo imediatamente, ainda em Washington, enviando material que considerava útil ou pertinente à própria agenda externa da Presidência da República. Exemplo disso é o trabalho 1083, elaborado numa curta passagem por Brasília (exatamente para definir o meu futuro profissional), quando o presidente hesitava em fazer sua primeira viagem à África, por causa de greve de funcionários públicos – os mandarins da República – contra projetos de reforma da Previdência. Elaborei parágrafos para pronunciamento do chefe de Estado à nação, tocando nas duas questões, mas no caso da África, nunca tive essa ideia, formulada pelos petistas e outros “intelequituais” da mesma vertente, de que nós, brasileiros, tivéssemos uma “divida histórica” com os africanos por causa dos séculos de escravidão. Acredito que meu texto não serviu para nada, como vários outros que elaborei ao longo desse período em que fui colaborador direto do regime (embora nunca tenha abandonado meu olhar crítico sobre o regime e suas políticas). 
Em agosto de 2003, estando eu mais uma vez como Encarregado de Negócios ad interim em Washington, recebi despacho telegráfico da SERE cobrando resposta a uma circular telegráfica solicitando comentários a discurso do chanceler do lulopetismo (ele, visivelmente, não só admirava seus próprios textos, talvez escritos por colaboradores, como fazia questão que todos os diplomatas lessem e comentassem), o que tive, talvez em meu próprio detrimento, de comentar, o que fiz abundantemente, numa proporção ainda maior do que o próprio texto original. Esses comentários nunca foram publicados em sua versão original, o que faço agora, para registrar que esse trabalho (n. 1092), pode ter contribuído para “agravar” o meu caso junto à nova administração, pois nele está refletida uma concepção bastante diferente daquele mantida pelos companheiros.
Ao final do mês de agosto de 2003, ainda em Washington, mas já trabalhando em função de meu futuro cargo de assessor de um membro da troika de aconselhamento presidencial, sabedor do comparecimento do presidente, pela primeira vez, à AGNU de setembro desse ano, resolvi propor um artigo a ser assinado por ele, e destinado a ser publicado na imprensa americana (NYT ou WP). Escrevi, assim, o trabalho de n. 1100 e o mandei a Brasília, mas sem qualquer ilusão de que pudesse ser aproveitado. Logo em seguida, confirmando a constatação de que o PT é o seu próprio inimigo, manifestei-me a propósito de dissensões internas ao partido em torno da reforma da Previdência, o que resultaria, como se sabe, na expulsão dos membros opositores. Meus comentários permaneceram inéditos até hoje, razão pela qual julguei que eles merecessem ser conhecidos, como registro no trabalho n. 1105. Como se pode igualmente confirmar, ao início do governo do PT, eu estava defendendo as políticas do governo, por deduzir que elas eram necessárias, de um ponto de vista absolutamente racional, não partidário.
Preparando-me para partir de volta ao Brasil, em pouco menos de um mês, depois de quatro anos em Washington, comecei a colaborar de maneira discreta com uma publicação periódica, por meio de curtos artigos críticos às políticas do PT no governo; devido à sua natureza especial, eles não são considerados aqui para fins de divulgação pública, e permanecerão inéditos até que eu consiga reorganizar a série. Mas já com a mente fixada no trabalho em Brasília, passei a redigir o que me parecia ser uma orientação geral das iniciativas do Núcleo de Assuntos Estratégicos, menos num estilo “produtivista”, como parecia ser a orientação dos companheiros – que não escondiam sua preferência por um modelo de crescimento muito próximo daquilo que eu chamei de “stalinismo industrial” da era militar –, e mais no sentido de privilegiar a formação de capital humano. Este era o objetivo do trabalho n. 1107, que pode ser agora publicado pela primeira vez.
O FMI sempre foi o bode expiatório preferido da esquerda brasileira, desde quando JK recusou um programa de austeridade para poder construir Brasília torrando o dinheiro que não tinha (ou seja, provocando inflação). Vieram com o tal slogan FMI = Fome e Miséria Internacional. O desconhecimento do que seja o FMI, suas funções, seus limites, era proverbial ao início do governo Lula, talvez até hoje. Em setembro de 2003, ainda em Washington, li um artigo no boletim Periscópio, do PT, e me dei ao trabalho de comentar exaustivamente. Nunca ficou conhecido esse meu trabalho, de n. 1113, pois não foi publicado em lugar nenhum. Permito-me assim transcrever em meu blog, em primeiro lugar o artigo publicado pela Fundação Perseu Abramo, e depois o meu longo comentário a esse artigo.
Meu último grande trabalho antes de partir de Washington, com importância para este depoimento de “transparência”, foi feito para meu primeiro trabalho que seria apresentado no Brasil, logo ao desembarcar. Convidado que estava para o Congresso da Anpocs, em Caxambu, eu tinha de participar de uma mesa sobre “Por onde tem ido e por onde irá o governo Lula?”, tendo como colegas debatedores: Luiz Carlos Bresser Pereira (FGV-SP), Luiz Werneck Vianna, (Iuperj) e Ricardo Carneiro (UniCamp). Minha apresentação, feita de forma muito resumida, mas provocadora, foi, junto com a de Bresser – considerado o ministro neoliberal do desmantelamento do Estado –, foi vaiada, o que me confirmou que eu estava correto, tanto em meus propósitos, quanto em relação à atitude dos acadêmicos, petistas, mas contrários à política econômica do PT. O texto foi objeto do trabalho 1133, já postado desde 2016 no blog Diplomatizzando
Finalmente, já a caminho de casa, ainda me permiti redigir em Miami, um texto crítico, bastante irônico, sobre um fantasmagórico “Consenso de Buenos Aires”, que os companheiros mais aloprados achavam que serviria para substituir o famoso “Consenso de Washington”. Se por acaso os companheiros chegaram a tomar conhecimento de minha gozação, imagino que isso deva ter agravado o meu caso. O trabalho, que foi republicado no meu blog em 2015, tem o n. 1136, como registrado na lista.
Ainda antes de desembarcar em Brasília, fazendo trânsito por Porto Alegre, eu redigi, e enviei ao futuro chefe, uma nota bastante crítica quanto ao momento vivido no Brasil, nos planos econômico, político e moral, sendo progressivamente pessimista em cada um deles. Esse trabalho, exageradamente intitulado de “breve diagnóstico” e de “propostas para ação”, recebeu o n. 1137, e permaneceu inédito durante todo o tempo, sendo apenas agora divulgado sem cortes.Ainda não completamente instalado em Brasília, eu continuei em minha missão voluntária de salvar o governo dos seus próprios críticos, ou seja, os economistas de esquerda e os acadêmicos desmiolados. Tendo lido mais um manifesto da mesma tribo contra a política econômica e a favor de mudanças em sua orientação, redigi um novo trabalho (n. 1149), depois ampliado e renomeado, mas que permaneceu relativamente inédito durante muitos anos, tendo sido divulgado de modo amplo neste ano de 2018. 
Mesmo já integrado, plenamente, às minhas novas funções, supostamente de planejador, em princípio, “a favor” do governo, e de assessor de um dos principais caciques do partido companheiro, eu nunca me eximi de formular as mais severas críticas a esse governo, sempre com a intenção de “melhorar” seus métodos de trabalho e de focar mais precisamente os objetivos de suas políticas setoriais. Talvez eu ainda tivesse alguma ilusão de que os companheiros poderiam aprender, ser “melhorados” e colocados a contribuir para a prosperidade dos mais pobres. Só a partir do ano seguinte que fui perceber que eles não podiam ser melhorados, pois sua natureza essencial e sua função básica era simplesmente a de dominar toda a máquina pública, e submeter todos os capitalistas à sua vontade de dominação monopólica e de enriquecimento pessoal, ou seja, corrupção pura e simples, e em grande escala, na verdade, gigantesca proporção. Este foi o sentido de meu trabalho n. 1152, depois revisto sob n. 1196, tentando fazer com que os companheiros passassem de um projeto de poder a um projeto de governo. Esforço inútil, como eu logo percebi, e por isso, ainda no decorrer de dezembro, eu decidi usar o título do famoso conto de Kafka, “Metamorfose”, para descrever a transmutação que já tinha sido operada no partido em relação ao seu anterior discurso político, mas sobretudo em relação às suas práticas. 
Ao aproximar-se o final do ano, eu ainda teci várias considerações dirigidas aos responsáveis do NAE sobre a (não) reforma universitária – os acadêmicos estavam sempre reclamando de falta de verbas – e sobre a situação econômica, já que quase todos os institutos de pesquisa começavam a liberar seus prognósticos para 2004. De minha parte, consoante meu espírito galhofeiro, eu me dedicava a fazer as minhas “Resoluções de Ano Novo”, ou “sete tarefas presidenciais que não serão feitas”, ou seja, metas de governo deixadas por cumprir. Um dos últimos trabalhos, de n. 1166, foi um “debate” indireto com Roberto Mangabeira Unger, demonstrando certos equívocos conceituais e erros factuais em torno do debate da “universalização” ou “focalização” dos gastos públicos. Como esse trabalho, relativamente longo em relação ao pequeno artigo que havia publicado o professor de Harvard, ainda não havia sido divulgado, fiz, como nos casos anteriores, uma postagem recente em meu blog Diplomatizzando.

O que mais fiz no ano de 2003? Projetos para vários anos de trabalho
Ademais dos muitos trabalhos listados seletivamente na relação abaixo – e eles são apenas duas dezenas num total de 174 – continuei escrevendo desenfreadamente, sobre os mais diversos assuntos, não refletidos aqui uma vez que se afastam um pouco do universo político-profissional aqui retido na sequência de um primeiro trabalho (referido ao início), de cunho similar, sobre minhas relações, nem sempre amistosas, com o chamado lulopetismo. Mal sabia eu, em 2003, que eu demoraria 13 anos mais para voltar a exercer funções na minha área funcional, a diplomacia, uma vez que eu me chocava não apenas com o lulopetismo diplomático, mas também com outros aspectos do desenvolvimentismo itamaratiano, como resultado de anos de estudos comparativos nos terrenos da história econômica e das políticas econômicas para o desenvolvimento, justamente. Até 2003 eu já tinha tido experiência profissional em Genebra (em especial no Gatt, na Unctad e na Ompi, com algumas outras áreas multilaterais afins), em Montevidéu (integração regional), Paris (Clube de Paris e OCDE) e Washington (FMI, Banco Mundial e BID, sem mencionar todos os think tanks e universidades da capital americana), o que tinha me habilitado a uma visão ampla acerca das melhores políticas para o desenvolvimento do Brasil e dos países emergentes. 
A essa altura eu também já tinha publicado diversos livros sobre a integração, a história diplomática brasileira, o multilateralismo e o comércio mundial, as finanças internacionais e vários outros temas de meu interesse. Em Washington dei continuidade a um velho projeto meu de “revisitar” alguns grandes clássicos, o que já tinha feito com Marx, atualizando o Manifesto Comunistapara os tempos de globalização. Assim, comecei a reescrever o clássico de Maquiavel, que anos depois se transformou em um Moderno Príncipe: Maquiavel para os contemporâneos, adaptando-o ao Brasil, mas com sentido universal igualmente. 
O relativo afastamento da rotina diária do Itamaraty, agravada nos anos a partir de 2006 e nos seguintes por um total ostracismo, me permitiram, paradoxalmente, dedicar bem mais tempo às leituras e aos escritos, pois tive muito mais tempo livre para frequentar a biblioteca e outros ambientes de estudo e pesquisa. Talvez eu devesse, portanto, agradecer aos companheiros do partido, seus apparatchiks no governo e seus associados na diplomacia, o tempo disponível para essas outras atividades bem mais agradáveis, estou certo, do que o festival de absurdos a que passou a estar submetida a Casa de Rio Branco. Um dia vou escrever mais claramente sobre tudo isso, de forma bem mais clara, em todo caso, do que em meu livro Nunca Antes na Diplomacia...: a política externa brasileira em tempos não convencionais(Curitiba: Appris, 2014). 
Finalizo esta já longa introdução à relação abaixo, sem prometer que vou continuar a fazer o mesmo tipo de trabalho para os anos seguintes. A razão é que meus trabalhos são muitos e qualquer seleção é trabalhosa, em vista da natureza diversa de muitos deles, alguns inclusive ainda não prontos a serem divulgados. Em todo, continuarei colocando em ordem meus manuscritos em papel e eletrônicos.

Listagem seletiva de trabalhos relativos ao ano de 2003
(Washington-Brasília, do n. 994 ao n. 1168)

994. “A economia política da mudança no Brasil: um livro de reflexões”, Washington, 1 janeiro 2003, 3 p. Considerações a respeito da maneira como foi concebido e escrito meu livro A Grande Mudança: consequências econômicas da transição política no Brasil (São Paulo: Editora Códex, 2003), em lançamento em janeiro de 2003 no Brasil. Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/a-grande-mudanca-2003-livro-paulo.html).

1010. “A política internacional do Partido dos Trabalhadores: da fundação do partido à diplomacia do governo Lula”, Washington 19 fevereiro 2003, 27 p. Análise das posições de política externa do Partido dos Trabalhadores e do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, desde a fundação do partido e as eleições de 1989, até o pleito vitorioso de 2002, com destaque para os temas básicos e a evolução em direção de uma postura mais próxima da forma tradicional de atuação da diplomacia. Publicado na revista Sociologia e Política(Curitiba: UFPR; ISSN: 0104-4478; n. 20 jun. 2003, p. 87-102; Dossiê Relações Internacionais, Rafael A. D. Villa (org.); disponível na plataforma Scielo (http://www.scielo.br/pdf/rsocp/n20/n20a8.pdf). Relação de Publicados n. 435.

1011. “Um diálogo sobre A Grande Mudança”, Washington 21 fevereiro 2003, 9 p. Respostas a questões colocadas por Pablo Pereira, da Editoria de Política do Diário de São Paulo). Matéria publicada sob o título “Livro propõe fim do salário-mínimo para novo país”, Diário de São Paulo(domingo, 16/03/2003). Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/um-dialogo-sobre-grande-mudanca-fev.html).

1013. “Sugestões sobre Formulação e Execução da Política externa”, Washington, 1 março 2003, 2 p. Contribuição em reação à solicitação de comentários e sugestões dos funcionários do MRE acerca da formulação e execução da política externa em todas suas vertentes. Enviada ao endereço eletrônico participe@mre.gov.br. Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/o-que-reformar-no-itamaraty-2003.html).

1043. “O “novo Brasil” em ação: observações sobre a primeira Resolução do PT no poder”, Washington, 30 abril 2003, 17 p. Reformulação do trabalho n. 1018, de 16/03/2003, fazendo análise e observações tópicas sobre a resolução emitida pelo Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) em sua primeira reuniãodesde sua chegada ao poder, realizada em São Paulo, em 15-16/03/2003, com nota explicativa agregada. Publicado na revista eletrônica Revista Autor(a. III, n. 25, jul. 2003; ISSN: 1677-3500; não disponível). Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/a-primeira-resolucao-do-pt-no-poder.html). 

1044. “Uma segunda carta de 1º de maio ao Presidente Lula: Comentando algumas ideias expostas na ‘Carta ao Presidente Lula’”, Washington, 3 maio 2003, 7 p. Desconstruindo uma carta-manifesto de “intelectuais” ao Pres. Lula, a propósito da Alca e da autonomia do Banco Central. Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/intelequituais-criticam-lula-no-poder.html).


1049. “Meu caso com um certo partido”, Washington, 15 maio 2003, 2 p. Introdução a compilação de textos de caráter “polêmico-partidário”, para divulgar de forma agrupada trabalhos de debate “unilateral” com uma certa maioria social. Inédito. Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/meu-caso-com-um-certo-partido-2003.html).


1081. “A Alca Possível: Comentários a artigo do Ministro de Estado”, Washington, 17 jul. 2003, 9 p. Comentários ao artigo do Ministro de Estado, Celso Amorim, “A Alca Possível” (Folha de São Paulo, 8.07.03), do ponto de vista de Brasemb Washington, para ser enviado como telegrama de Brasemb Washington à SERE, tocando em pontos não apenas circunscritos às negociações da Alca. Postado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/a-alca-possivel-comentarios-artigo-do.html).

1083. “Sugestões para Pronunciamento”, Brasília, 23 julho 2003, 2 p. Texto em forma de pronunciamento público do Presidente da República sobre projeto de reforma da Previdência, contendo igualmente elementos sobre viagem à África. Encaminhado ao Ministro-Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e de Gestão Estratégica (xxx), com cópia ao presidente do IPEA (xxx). Postado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/o-presidente-hesita-2003-entre-primeira.html).

1087. “A Alca e o interesse nacional brasileiro: doze questões em busca de um debate racional”, Washington, 28 julho 2003, 23 p. Compilação feita a partir dos trabalhos 1074, 1079 e 1081. Publicado na revista Espaço Acadêmico(Maringá, n. 27, agosto 2003; ISSN: 1519.6186); e como contribuição na obra coletiva coordenada por Wagner Rocha D’Angelis (org.), Direito Internacional do Século XXI: integração, justiça e paz(Curitiba: Ed. Juruá, 2003. 388p.; pp, 127-154). Disponibilizado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/5783482/036_A_Alca_e_o_interesse_nacional_brasileiro_doze_questões_em_busca_de_um_debate_racional_2003_). 

1092. “Governança Democrática: comentários da Embaixada em Washington”, Washington, 6 agosto 10 p. Argumentos e comentários oferecidos a discurso do Ministro de Estado das Relações Exteriores por ocasião da XXXIII Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos, realizada em Santiago do Chile em 9/06/2003, sobre o tema geral da “Governabilidade Democrática nas Américas”. Texto inédito nesse formato. Divulgado no blog Diplomatizzando(1/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/governance-democratica-minhas.html).

1100. “Uma certa ideia do Brasil, e do mundo…”, Washington, 23 agosto 2003, 3 p. Proposta de artigo para ser publicado na imprensa americana quando da presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Assembleia da ONU, em 23 de setembro de 2003. Encaminhado ao Ministro-chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica. Divulgado no blog Diplomatizzando(2/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/um-possivel-discurso-do-pr-na-onu-em.html).

1105. “Reforma da Previdência: por que e a favor de quem?: Comentários às posições dos parlamentares do PT contrários à reforma”, Washington, 1 setembro 2003, 10 p. Comentários à carta dos 8 parlamentares do PT punidos pela Executiva do Diretório Nacional por terem se abstido nas votações da reforma da previdência. Divulgado no blog Diplomatizzando(2/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/a-reforma-da-previdencia-no-primeiro.html).

1107. “Capital Humano Estratégico: Proposta modesta para mudar o país via ‘indústria’ dos recursos humanos”, Washington, 7 setembro 2003, 2 p. Reflexões sobre o sentido de escolhas estratégicas para o desenvolvimento do país. Encaminhado ao chefe do NAE. Divulgado no blog Diplomatizzando(2/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/capital-humano-estrategico-uma-proposta.html). 

1113. “O governo Lula, o FMI e a transição de paradigmas: comentários”, Washington, 15 setembro 2003, 4 p. Comentários breves a matéria homônima no boletim Periscópion. 29, set. 2003, da Fundação Perseu Abramo, do PT. Divulgado no blog Diplomatizzando(2/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/os-companheiros-e-o-fmi-uma-obsessao.html).

1133. “A longa marcha do PT para a socialdemocracia: Algumas ideias vencedoras, outras indefinidas e questões ainda não-resolvidas”, Washington, 9 outubro 2003, 7 p. Paperpara apresentação no XXVII Encontro Anual da ANPOCS (Caxambu, 21-25/10/2003), na sessão “Por onde tem ido e por onde irá o governo Lula?”, tendo como debatedores: Luiz Carlos Bresser Pereira (FGV-SP), Luiz Werneck Vianna, (Iuperj) e Ricardo Carneiro (UniCamp). Blog Diplomatizzando(29/10/2016; link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/10/anpocs-2016-sociologos-continuam.html). 


1137. “Breve diagnóstico e propostas de ação: Nota sobre a conjuntura em outubro de 2003”, Porto Alegre, 26 outubro 2003, 3 p. Análise da conjuntura, nos aspectos econômico, político e moral, para envio a autoridade política. Inédito. Divulgado no blog Diplomatizzando(2/09/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/09/meu-diagnostico-e-propostas-de-acao.html).

1149. “Uma nova traição dos clérigos?: Comentários a um novo manifesto em prol de mudanças na política econômica”, Brasília, 27 novembro 2003, 3 p. Observações críticas a abaixo-assinado de acadêmicos circulado no Jornal da Ciência E-mail(n. 2416, 27/11/2003). Reformulado e ampliado como “A neoliberalização e os seus descontentes: os órfãos do old-PT e os filhos (confusos) do new-PT”. Divulgado no blog Diplomatizzando(8/04/2018; link: https://diplomatizzando.blogspot.com.br/2018/04/a-neoliberalizacao-e-os-seus.html).

1152. “Do projeto de poder a umprojeto de governo: Algumas reflexões sem estilo”, Brasília, 3 dezembro 2003, 8 p. Texto reservado sobre a conjuntura política, com sugestões de elementos para uma política de governo. Revisto e modificado em 27/01/2004, sob n. 1196. Divulgado, nessa versão, no blog Diplomatizzando(22/10/2017; link: https://diplomatizzando.blogspot.com.br/2017/10/o-projeto-de-poder-do-governo.html).



Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 2 de setembro de 2018