O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 7 de junho de 2014

Pausa para... piadinhas maldosas sobre o Papa Francisco

Recebido, como sempre ocorre, por uma dessas listas a que somos afiliados por interesse e de onde acabamos recebendo coisas que renovam nosso interesse por elas, justamente por causa dessas coisas alternativas...
Paulo Roberto de Almeida 

Piadinhas sobre o novo Papa

1) - Do jornal Corrieri de la Siera:- "Em um surto inédito de humildade um  Argentino aceitou um cargo abaixo de Deus."

2) - De um escriba brasileiro anônimo:- "Eu sempre sonhei em ver um Argentino beijar o solo brasileiro."

3) - Os Argentinos desejam que os primeiros atos do Papa Argentino sejam:

- Canonização de Evita Perón;
- Início do processo de beatificação do comandante Chavez;
- Excomunhão de todos os cardeais e bispos norte-americanos;
- Rompimento com o governo italiano;
- Rompimento com o governo inglês (novamente);
- Criação da Diocese das Malvinas, localizada em Puerto Madero;
- Mudança da sede do Vaticano para Bariloche;
- Cisma Norte-sul (a exemplo do Cisma do Oriente), com a criação da Igreja Católica do Hemisfério Sul;
- Criação da moeda própria do Vaticano: o “Peso Santo” ou “Santo Peso”; e
- Substituição da hóstia por Alfajor.

4) E, last but not least, a mudança do nome da Capela Sistina para Capela
CRISTINA.

Comenta-se que quem dominou o conclave foram os Cardeais dos EUA. Como eles sabiam que o Cardeal Brasileiro era o mais cotado, escolheram o Cardeal de
Buenos Aires, por ser a capital do Brasil.

Já que o Papa é Argentino, a Dilma vai convidar o Vaticano para entrar no Mercosul.

Vingança Histórica:- a Inglaterra fica com as Ilhas Malvinas e a Argentina fica com o Vaticano.

O Papa Libera o bife de chorizo na sexta feira santa.

Dizem que o novo Papa é o homem mais importante do mundo e um dos mais importantes da Argentina.

Antes de escolher o nome "Francisco", os cardeais tiveram um enorme trabalho para convencer Dom Bergoglio de que "Jesus II" não ia pegar bem.

Comentário à boca pequena que está se espalhando nos corredores do Vaticano:- "Não havia um Argentino tão perto de Cristo desde Judas".

O Papa vai autorizar o uso da Hóstia em pó, para que o Maradona possa comungar... (excelente, essa!)

E para terminar, mais esta:

O PAPA FRANCISCO JÁ CONSEGUIU O PRIMEIRO MILAGRE, FAZER COM QUE O MUNDO GOSTASSE DE UM ARGENTINO.

O poder desqualificou o PT - Ruy Fabiano (sempre foi, na verdade)

Discordo do jornalista, para quem o motivo da desqualificação é a chegada ao poder. Não! O PT sempre foi assim, e a chegada ao poder apenas acentuou e exacerbou traços que já faziam parte de sua estrutura constitutiva, ou seja, sua total falta de escrúpulos na conquista e na tentativa de manutenção do poder, a qualquer custo, sem qualquer limite moral ou sentido ético.
Os pretensos intelectuais citados pelo jornalista NUNCA tiveram qualquer importância na estrutura de poder DENTRO do PT, que sempre comandado, com mµao de ferro, por um pequeno grupo de apparatchiks divididos em duas categorias: (a) sindicalistas alternativos reciclados como os novos líderes das máfias sindicais brasileiras; (b) ex-guerrilheiros reciclados na luta política sem armas, derrotados que foram pelos militares.
Ambos subgrupos atuam de forma clandestina, mesmo para DENTRO do partido, manipulando verbas, pessoas e empreendendo ações na maneira bolchevique-castrista que eles aprenderam a fazer (e que cultivam sempre, por necessidade e por maus hábitos).
De forma geral, constituem uma organização criminosa aparentada à Mafia, com seus soldados e mercenários a serviço dos chefes mafiosos. Tem também os vínculos externos, com ditaduras desprezíveis, que no passado investiram no partido e hoje estão obtendo o apoio em retorno, inclusive no plano financeiro.
Este é o PT, e isso era um processo "natural", que pouco tem a ver com a mudança de status do partido: ele já era assim em sua essência, apenas acentuou sua natureza...
Paulo Roberto de Almeida 

O Poder desqualificou o PT

Ruy Fabiano

O Globo, 7/06/2014

Embora, na origem, fruto de uma inédita conjunção entre intelectuais de esquerda, Igreja Católica da Teologia da Libertação e a vanguarda do sindicalismo paulista, o PT tornou-se, com o exercício do poder, um partido sem quadros.
Perdeu os seus aliados intelectualmente mais respeitáveis – gente do porte de Hélio Bicudo, Fernando Gabeira, Carlos Nélson Coutinho, Leandro Konder, Francisco de Oliveira, para citar apenas alguns - e, com eles, vestígios de substância, credibilidade e coerência. O poder mudou-lhe o caráter e o conteúdo.
A busca de maioria a qualquer preço (e bota preço nisso) aproximou-o de inimigos (não apenas adversários) do passado, como, entre outros, Sarney, Collor, Jader Barbalho e Renan Calheiros. Sua maioria parlamentar é calcada no mais abjeto baixo clero. Pior que isso, investiu em práticas que no passado se notabilizara por condenar – e o Mensalão não é caso isolado -, credenciando-se, a cada eleição, à confiança popular.
Hoje, o partido tornou-se uma espécie de símbolo da corrupção, que prometia varrer do mapa da política. Basta dizer que seu alto comando está hoje na Papuda.
O filmete publicitário que exibiu nas eleições de 1998, em que ratos roíam a bandeira nacional, ajusta-se hoje mais ao partido de Lula que a qualquer outro, não obstante o descrédito da população se estenda a todas as legendas.
O efeito dessa perda de substância e respeitabilidade tem reflexos no campo administrativo e econômico. O cenário pré-Copa do Mundo se soma ao fiasco da economia, em que os efeitos da inflação, sobretudo nos alimentos, já se fazem sentir no bolso da população. A sensação de que o partido não possui quadros capazes de oferecer soluções a problemas que ele mesmo criou é geral nos meios empresariais, que apoiaram Lula com entusiasmo.
A queda de Dilma Rousseff nas pesquisas gerou alta na bolsa, fato provavelmente inédito. Diante disso, o comando da campanha de Aécio Neves, do PSDB, decidiu explorar a fragilidade dos quadros petistas, sobretudo na área técnica, exibindo o nome de seus principais apoiadores, que, nesses termos, surgem também como futuros ministros na eventualidade de sua vitória.
Ele promete para o próximo mês, quando sua candidatura já estiver oficializada, anuncia-los. Mas, desde já, adiantou o nome de Armínio Fraga, como coordenador econômico de sua campanha. Fraga presidiu o Banco Central no governo FHC, credenciando-se à confiança do mercado, pela estabilidade que sua gestão propiciou. Está sendo visto como futuro ministro da Fazenda, na eventualidade de vitória tucana.
Com isso, Aécio não apenas provoca debandada entre os empresários que apoiaram o PT – e o fizeram por mero pragmatismo, inerente ao meio -, como gera contraste com a pífia gestão econômica de Guido Mantega, que, tanto quanto Dilma já confessou, não tem a mínima ideia das razões por que o país não cresce e a inflação dispara. O PT não tem quadros para a economia, para convencer o país de que o modelo que patrocina é o melhor.
Com relação à administração, basta ver o cronograma das obras da Copa do Mundo, cujo fiasco, cercado de suspeitas e denúncias, já caiu na boca do povo.
Ao contrário das eleições anteriores, marcadas pela ânsia de continuidade de grande parte da população – e que o PSDB tentou em vão capitalizar com o slogan “continuidade sem continuísmo” -, a tendência agora é inversa. O anseio é por mudança. E o desafio de convencer o eleitorado de que isso ocorrerá com o mesmo partido que há 12 anos governa é, no mínimo, colossal.
Ruy Fabiano é jornalista.

Espanha aprova o retorno dos judeus sefarditas

Spain: Citizenship Plan for Sephardic Jews

The Associated Press, June 6, 2014

Spain’s cabinet on Friday approved a bill allowing descendants of Jews forced into exile centuries ago the right to dual citizenship, but applicants will have to take a Spanish culture test in addition to having their ancient ties to the nation vetted by experts. The plan aims to fix what the government calls the “historic mistake” of sending Sephardic Jews into exile starting in 1492, forcing them to convert to Catholicism or burning them at the stake during the Inquisition. It is expected to pass easily in Parliament because the governing Popular Party has an absolute majority. The measure will allow dual nationality, enabling the newly minted Spaniards to retain their previous citizenship. The term Sephardic means Spanish in Hebrew, but the term has come also to apply to one of the two main variants of Jewish religious practice. The other — and globally dominant one — is Ashkenazic, which applies to Jews whose lineage, in recent times, is traced to Northern and Eastern Europe. There is no accepted figure for the global Sephardic population. Reasonable estimates would range between a fifth and a third of the world’s roughly 13 million Jews.

Tordesilhas: a primeira divisao do mundo, entre portugueses e espanhois

NESTA DATA

É assinado o Tratado de Tordesilhas

O acordo dividia entre Portugal e Espanha as terras descobertas nas Américas


O Tratado de Tordesilhas criou uma linha imaginária como referência para a divisão das terras sul-americanas (Reprodução/Internet)
No dia 7 de junho de 1494, Portugal e Espanha assinaram na cidade de Tordesilhas, na Espanha, o tratado que dividia as terras do chamado “novo mundo”. Esse documento, batizado de Tratado de Tordesilhas, foi criado um ano e meio após a chegada de Cristóvão Colombo à América.
A Espanha se preocupava em proteger o que acabara de descobrir e pediu ao papa Alexandre VI que concedesse a posse de todas as terras descobertas a 100 léguas a oeste da ilha de Santo Antão, no arquipélago de Cabo Verde.
A autorização concedida pelo papa impedia que Portugal tivesse a posse de territórios recém-descobertos no continente americano. Além disso, o limite de 100 léguas dificultava a navegação portuguesa no oceano Atlântico.
Assim como a Espanha, os portugueses eram uma potência militar e econômica na época e, para evitar conflitos, foi estabelecido um novo acordo. No Tratado de Tordesilhas, espanhóis e portugueses aumentaram o limite, que passou de 100 para 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão.
Essa linha imaginária era referência para os dois países na divisão das terras. O território ao oeste pertenceria à Espanha e ao leste, a Portugal. Com o passar do tempo, os portugueses começaram a invadir o território espanhol, fazendo com que o território brasileiro ganhasse o contorno atual. Mesmo com o desrespeito português ao tratado, os espanhóis não se defenderam, pois estavam ocupados com o restante do continente americano, ao norte, ao oeste e ao sul do Brasil.
O Tratado de Tordesilhas deixou de vigorar em 1750, com a assinatura do Tratado de Madrid, no qual as coroas portuguesa e espanhola estabeleceram novos limites de divisão territorial para as colônias na América do Sul.

Conhece o Robsbawm? Associacao involuntaria e lapso freudiano no site do partido totalitario

Do blo do Orlando Tambosi:
No site do PT, Hobsbawm virou Robsbawm. Faz sentido.
O partido totalitário chama o evento de "Copa das Copas" e mente ao dizer que o governo não está jogando dinheiro fora, em obras que, em muitas localidades, jamais passarão de elefante branco. Tirei a nota abaixo do site do PT. É algo redigido por semi-alfabetizado. O historiador Hobsbawm, por exemplo, é chamado de Robsbawm. No caso do petismo, deve ser ato falho - algo a ver com a Copa da Roubalheira, ela própria:

Os gastos com os estádios para a Copa das Copas foram pagos com financiamento do governo federal, aportes de estados e municípios e recursos privados. No caso do governo federal, portanto, não competem os gastos com saúde e educação, uma vez que estas políticas são financiadas com recursos do orçamento tirados de impostos, diferentemente dos empréstimos.

A constatação, feita pela Escola Nacional de Formação, do PT, desmonta um dos falsos mitos fabricados em torno da Copa do Mundo de 2014. Em minucioso estudo, a entidade levanta um conjunto de razões em defesa da competição e mostra porque o Brasil, não por acaso, conquistou nos quatro cantos do planeta o título de país do futebol.

O estudo serve também para desconstruir em definitivo as manipulações produzidas pela oposição e por setores da sociedade, seja por ignorância ou má fé. O mais absurdo deles é o de que o governo federal está jogando dinheiro fora com estádios, sem trazer benefícios à população. Nada mais falso.

Os benefícios são visíveis e imediatos. Entre eles: intensificação da exposição do Brasil ao mundo – a Copa será vista por metade da população do planeta. Houve aceleração de investimentos em infraestrutura, como em mobilidade urbana e aeroportos; ampliação do turismo doméstico e de estrangeiros no país; e amplo retorno financeiro desses empreendimentos.

Ao todo, o plano de investimentos nas cidades-sede da Copa totaliza 25,6 bilhões de reais. Quase 70% desse montante (17,6 bilhões de reais) representam investimentos em infraestrutura e políticas públicas, especialmente em mobilidade urbana (8 bilhões de reais), aeroportos (6,2 bilhões de reais), segurança (1,9 bilhão de reais) e portos (600 milhões de reais).

São investimentos, em sua maior parte, que ocorreriam independentemente da Copa, mas que foram por ela antecipados ou acelerados.

Outro mito desmontado é o de que o brasileiro não está nem aí para a Copa. Nada mais falso. O futebol, garante o estudo, “é parte fundamental da cultura brasileira e uma de suas mais elevadas expressões”. Não por acaso, o historiador Eric Robsbawm assim se pronunciou sobre a magia do brasileiro com a bola nos pés: “Quem, tendo visto a seleção brasileira em seus dias de glória, negará sua pretensão à condição de arte?” (Continua).

Maine: terra de lagostas, de farois e de arte - Carmen Licia Palazzo

Maine: terra de lagostas, de faróis e de arte

O Maine é um dos mais interessantes destinos de viagem nos EUA.  Há opções para todos os gostos:  natureza, arte, ótima comida e muito mar. Entre as maiores atrações estão os faróis (lighthouses) lindos, localizados sempre em lugares com paisagens também incríveis. As lagostas são excelentes, enormes, muito saborosas, mas todos os frutos do mar por ali são também deliciosos. Há uma enorme variedade de restaurantes e é impossível errar, são todos muito bons! Até o famoso lobster roll, pãozinho com lagosta desfiada, é muito gostoso.
A melhor época para visitar o Maine é entre o final de maio até início de novembro. Um bom programa é ficar em Portland e a partir dali sair para diversos passeios, entre eles Cape Elizabeth, com seu farol, e uma vista incrível do mar muito azul. Em Portland o antigo porto é muito agradável e ainda hoje recebe diversos barcos de turismo e tem bons restaurantes e bares variados. As boutiques também são simpáticas e há muitos souvenirs de bom gosto, com temas do mar, entre eles pequenos barcos de madeira, réplicas de barcos de pescadores de lagosta.
Outra atração excelente e que vale a visita é o Museu de Arte de Portland, que possui uma impressionante coleção de pintores europeus e também americanos, com destaque para os quadros de Homer, que era da região.

Um bom site para pesquisar informações para uma visita ao Maine é:  www.visitmaine.com

Carmen Lícia Palazzo
 





PS: Carmen Lícia é a melhor guia cultural, gastronômica e a melhor companhia intelectual que eu poderia ter, além de ser meu amor desde sempre.
Esta postagem pode ser vista neste link:


Por que escrevo? (2) - Paulo Roberto de Almeida


Paulo Roberto de Almeida

Retomo a discussão suscitada pela questão do título, confessadamente inspirada em ensaio de título análogo (mas sem o sinal de interrogação) de George Orwell, em um texto elaborado em 1946, quando ele já tinha se tornado um escritor profissional, mas ainda enfrentando condições de vida bastante modestas, pois Animal Farm não havia conseguido encontrar, até aquele momento, algum editor disposto a desafiar o Big Brother soviético, e o próprio escritor ainda ruminava a possibilidade de escrever sobre o verdadeiro grande irmão, no romance que lhe trouxe fama universal: 1984. Em “Why I write”, Orwell dizia que existem quatro grandes motivos para escrever e estipulava que eles diferem em graus variados de escritor a escritor, sendo que, em cada um deles, os motivos assumem proporções variáveis ao longo do tempo, segundo a atmosfera na qual os escritores vivem. Vejamos quais são eles, e meus comentários sobre cada um.

(1) Egoísmo puro. O escritor, segundo Orwell, quer parecer inteligente, ser reconhecido como tal, objeto de comentários dos contemporâneos e ser relembrado após a morte. “Seria desonestidade não reconhecer que esse é um forte motivo”, disse ele, terminando esse tópico por um comentário vinculado às duas condições: “Escritores sérios... são, no conjunto, mais vãos e autocentrados do que os jornalistas, ainda que menos interessados em dinheiro” (p. 312, de A Collection of Essays, edição Harbrace, impressa nos EUA, em 1953). Não tenho certeza de que escritores estejam menos interessados em dinheiro do que os jornalistas; provavelmente o contrário, pois estes, supostamente, trabalham geralmente para algum veículo de comunicações, e dispõem de um rendimento regular, enquanto assalariados, ao passo que os primeiros são talvez um pouco como os artistas: só ganham dinheiro quando obtêm sucesso de mercado e quando conseguem vender suas obras em grande número, ou a preços altos.
De minha parte, ainda que os motivos de orgulho e de reconhecimento pessoais possam ter contado em algumas fases de minha atividade de escrevinhador – jamais de escritor – não foi isso que essencialmente me levou a me dedicar à palavra escrita, tanto porque quase nunca pensei em publicar o que escrevo, até quando já não dependia em nada desses parcos rendimentos de uma atividade irregular. Obviamente, fama e glória só existem quando se é publicado – contra ganhos ou não, e no meu caso raramente a primeira hipótese esteve em jogo – e, do total de meus escritos, apenas uma ínfima parte encontrou o caminho da divulgação pública. A proporção cresceu, está claro, na era digital, quando o custo associado à divulgação eletrônica se tornou ínfimo, comparado às edições comerciais para o mercado de massa, mas ainda assim não posso dizer que escrevo com o objetivo de ser lido para obter reconhecimento público, ou em nome do egoísmo (ou vaidade) de que falava George Orwell.

(2) Entusiasmo estético, ou seja, percepção da beleza das palavras, de seu impacto no mundo circundante, ou desejo de expressar e partilhar uma experiência que é considerada relevante para si próprio e eventualmente para os demais. “O motivo estético”, reconhece Orwell, “é bastante fraco em muitos escritores, mas mesmo um panfletário, ou um autor de livros-texto, terá palavras ou frases que lhe são preferidas por razões não utilitárias; (...) Além do nível de um guia de trens, nenhum livro está desprovido verdadeiramente de considerações estéticas” (idem, p. 312)
Acho que, sob esse critério, eu devo ser um desastre, pois meu estilo é pesado, prolixo, no mais das vezes descuidado na forma e desengonçado na composição das palavras, com uma redação tortuosa e torturada, que apenas reflete minha rebeldia inicial e constante em me dedicar às boas regras da gramática e à redação bem cuidada. Sou tão atento às palavras, pelo seu significado e conteúdo substantivo, quanto sou desatento à forma pela qual elas devem ser ordenadas no texto, sua correção formal: as frases se sucedem, longuíssimas. Trata-se de um defeito grave, eu sei, mas é um pecado original do qual nunca soube me desfazer quando realmente comecei a me dedicar de modo mais sistemático à palavra escrita, um refúgio ao qual recorremos quando estamos longe do ambiente natural em que nos movimentamos desde as primeiras letras.
Essa fase correspondeu ao meu autoexílio voluntário, a partir dos 21 anos (e durante mais de sete anos), quando passei a ler, a estudar e a escrever em outras línguas, numa notável confusão de regras e de estilos. Minha língua de trabalho passou a ser preferencialmente o francês – que não difere muito, no estilo ou na gramática, do português, mas é altamente mais exigente no plano formal – mas também me exerci bastante em espanhol, com intensas leituras paralelas em inglês e em italiano, e breves incursões pelo alemão. Por outro lado, não creio que textos de natureza política, sejam especialmente favoráveis a um domínio erudito da palavra escrita, perdendo de longe, por exemplo, para a boa literatura, da qual estive infelizmente afastado, justamente em função de uma dedicação doentia às questões políticas. Tenho plena consciência de que minha estética das palavras é horrível, e não cultivo nenhum entusiasmo por isso.

(3) Impulso histórico, que é o mais curto dos motivos elencados por Orwell. Ele escreve apenas isto: “Desejo de ver as coisas como elas são, de descobrir os fatos verdadeiros e de guardá-los para uso da posteridade” (p. 312). Parece, dito assim, a mais desprendida das motivações, uma escrita voltada unicamente para a preservação dos eventos, vistos, ouvidos ou lidos, algo como uma vocação à la Ranke: contar os fatos como eles efetivamente aconteceram (wie es eigentlich Gewesen). Ainda que eu tenha sempre cultivado a história como a mais saborosa das literaturas, e a considere como a “mãe de todas as ciências”, como reza o famoso dístico – não sei se desde Heródoto ou Tucídides – não me dedico especialmente à escrita da história, tanto porque não possuo a necessária preparação metodológica para fazê-lo. Mas todos os meus trabalhos possuem forte inclinação histórica, no sentido em que procuro contextualizar os fatos ou eventos analisados em suas causas originais, em seu ambiente de formação e ulterior desenvolvimento, pois tudo se torna mais compreensível quando recolocamos quaisquer fatos ou processos históricos no ambiente que os viu nascer, levando em conta os vetores que os moldaram e as forças que continuaram influenciando seu itinerário.
Espíritos simplórios, e burocracias sem memória, tendem a considerar tais fatos ou processos apenas como eventos ad hoc, como se eles surgissem de repente, e fossem originais ou inéditos. Não se poupam, assim, de cometer os mesmos erros ou equívocos a que estão condenados, segundo Santayanna (ou algum outro filósofo antes dele), todos aqueles que ignoram a história. É certo que a história nunca se repete, mas os espíritos despreparados tendem a cometer os mesmos erros que já ocorreram anos, décadas ou séculos antes, ainda que em circunstâncias diferentes. Não existe nenhuma novidade nas bolhas financeiras, nas valorizações exageradas das bolsas, na especulação com metais ou imóveis, mas aparentemente as gerações sucessivas acabam incorrendo nos mesmos desvios de comportamento que vitimaram os holandeses das tulipas, os franceses de John Law ou, modernamente, os deslumbrados das “ponto.com”.
Mas eu também me desvio do principal nesta questão: escrever com finalidades ou propósitos históricos ou simplesmente pelo prazer da escrita. Creio ter esse impulso da escrita, e também o espírito histórico, o que torna essa escrita mais empiricamente fundamentada, mesmo sem pretender ser um fiel cronista dos eventos correntes. Deixo a história para os profissionais, mas não hesito em penetrar em seu território e roubar algumas de suas técnicas de investigação, questionando documentos de arquivos e consultando relatos de contemporâneos, tanto quanto lendo os historiadores que vieram depois, e que podem iluminar novos aspectos de eventos e processos passados.
Minha escrita é histórica: não tenho nenhuma dúvida quanto a isso, e tal característica só se aprofunda com o tempo. Uma das vantagens de envelhecer – se é que se trata de uma “vantagem” – é a de poder escrever sobre fatos que nos foram contemporâneos, por assim dizer, eventos que depois se tornaram “históricos” e aos quais assistimos com os nossos olhos, ou que estiveram nas páginas de jornais que líamos todos os dias, hoje bem mais a televisão e a internet do que o papel impresso. Atualmente, posso falar com total domínio sobre o último meio século, e talvez até um pouco mais, dado que os livros “contemporâneos” do último meio século falam com grande domínio sobre o meio século precedente.
Assim, o “breve” impulso histórico de Orwell pode ser lido de várias maneiras, ele que foi um homem profundamente marcado pelas tragédias dos anos 1930 e pela Segunda Guerra Mundial. Um de seus textos começa exatamente assim: “Enquanto eu escrevo, seres humanos altamente civilizados estão voando sobre minha cabeça, tentando matar-me” (p. 252 de A Collection of Essays). Se tratava do ensaio “England Your England”, escrito em 1941, quando o pico dos ataques aéreos nazistas contra a Inglaterra já tinha passado, mas a Luftwaffe ainda continuava a fazer incursões ocasionais sobre Londres, tentando quebrar a moral dos ingleses (bem antes que os americanos fossem obrigados a finalmente se envolver na guerra).
O que mais marcou Orwell, entretanto, foi o totalitarismo dos regimes soviético e nazista, o que está muito evidente tanto em Animal Farm quanto em 1984. No mesmo ensaio que serviu de inspiração a este aqui, ele escreveu: “Cada linha de trabalho sério que eu escrevi desde 1936 [quando ele esteve na Espanha da guerra civil, do lado republicano, experiência relatada em Hommage to Catalonia] foi escrita, direta ou indiretamente, contra o totalitarismo e a favor do socialismo democrático, tal como eu o entendo” (p. 314, ênfases no original). É bastante provável que, se não tivesse morrido precocemente, Orwell continuasse um socialista democrático, na Grã-Bretanha dos anos 1950 e 1960, mas é altamente improvável que ele assistisse indiferente à decadência britânica que esse mesmo socialismo ajudou a aprofundar logo em seguida, até culminar nos imensos retrocessos sociais e industrial da fase imediatamente anterior à eleição de Margaret Thatcher. Mesmo continuando um socialista, e inimigo dos conservadores, Orwell provavelmente não discordaria das orientações libertárias dos novos tories, já que, entre sindicalistas estatizantes e defensores das liberdades individuais, ele sempre ficaria com estes últimos, contra o controle das vontades pelos novos totalitários. A história sempre tem algo a ensinar aos espíritos abertos como ele (eu também).

(4) Objetivo político: Orwell usa o termo político no seu sentido mais amplo, como ele mesmo explica, complementando ao início de sua longa explicação sobre a motivação especificamente política dos escritores: “nenhum livro é genuinamente destituído de algum viés político. A opinião de que a arte não deve ter nada com a política é, ela mesma, uma atitude política” (p. 313). Concordo inteiramente, mas a dificuldade, aqui, está justamente em aceitar que nossas opiniões políticas constituem o reflexo de nossas leituras e experiência de vida anteriores, que refletimos o estado do debate político na sociedade e que podemos, e devemos aprofundar esse debate, e assumir novas posturas, à medida que aprendemos com o tempo, com as leituras, com pessoas mais experientes, com a observação honesta e objetiva da realidade.
Por observação objetiva da realidade, como condição inseparável da honestidade intelectual, eu quero me referir à minha própria trajetória política, iniciada sob o domínio do marxismo teórico e do leninismo prático, continuada sob o signo do socialismo democrático nos anos 1970 e 1980 – como Orwell, ao contemplar as misérias do nazismo e do stalinismo nos anos 1930 e 1940 –, e chegando a uma espécie de contrarianismo libertário nos tempos presentes, certamente mais liberal no seu conteúdo econômico, do que nos tempos socialistas, e mais anarquista nos domínios cultural e político. A migração não foi instantânea, nem desprovida de racionalizações justificativas, mas a recusa do totalitarismo bolchevique foi, sim, imediata, uma vez feito o confronto com a realidade.
Ao sair do Brasil, nos tempos mais obscuros dos chamados anos de chumbo da repressão política (e violenta) do regime militar contra os grupos de luta armada, eu fui direto para o coração do socialismo real, na Tchecoslováquia pós-invasão soviética, quando o socialismo à face humana de Dubcek estava sendo definitivamente enterrado pelas forças brejnevistas do sovietismo esclerosado. Mais do que a miséria material, imediatamente perceptível pelas estantes e prateleiras vazias das lojas e armazéns, o que mais me chocou foi constatar a miséria humana, moral e espiritual do socialismo, que também era perceptível pelo ambiente de vigilância policial, de autocensura mental, de contenção nas palavras e nas atitudes. O totalitarismo não era uma invenção da CIA, da revista Seleções (Reader’s Digest), nem da ciência política ocidental; ele era uma realidade perceptível nos olhares e nos gestos, nas pequenas misérias cotidianas que iam muito além da falta de carne ou de frutas nos mercados, de jornais nos quiosques, e se manifestava diretamente no vocabulário, que Orwell chamou de novilingua em 1984.
Obviamente eu não dominava o tcheco para conversar com a população, mas podia conversar em francês com as senhoras idosas que frequentavam a biblioteca da Alliance Française, onde eu ia para ler o Le Monde – a única fonte de informação que eu tinha no socialismo real – e onde elas iam para se aquecer no inverno, já que o carvão custava caro e talvez fosse extremamente difícil subir tantos sacos em muitos lances de escada, em suas antigas casas patrícias transformadas em residências coletivas para seis ou sete famílias operárias. Aquelas senhoras vinham do capitalismo liberal e da Tchecoslováquia independente dos anos de entre-guerras, e ressentiam intensamente o descenso social que experimentaram a partir de 1948, mas sobretudo estavam profundamente deprimidas pelo clima de repressão policial e de controles do partido sobre a vida dos cidadãos, situação temporariamente flexibilizada durante os anos de Alexander Dubcek à frente do comité central do Partido Comunista. Foi apenas uma primavera, logo interrompida pelos tanques soviéticos e do Pacto de Varsóvia.
Essa foi a miséria do socialismo que me foi dada contemplar nos curtos três meses que passei do outro lado da “cortina de ferro”. Logo em seguida fui trabalhar e estudar no capitalismo explorador, e me senti inteiramente à vontade com livrarias, bibliotecas, olhares desprovidos de medo, bem mais do que com as estantes cheias e a abundância dos supermercados. A partir desse momento, eu reforcei minha vocação de escritor político, profundamente político, sem qualquer resquício do fundamentalismo ideológico que me tinha aprisionado no pensamento único dos neobolcheviques nos anos anteriores. Orwell tinha razão: nenhum escritor, nenhum livro é desprovido de um viés político determinado.
Como ele escreveu, mais para o final de “Why I Write”: “Animal Farm foi o primeiro livro no qual eu tentei, com plena consciência do que estava fazendo, fundir o objetivo político e o objetivo artístico em um único conjunto. (...) Todos os escritores são vãos, egoístas e preguiçosos e, bem no fundo de suas motivações, reside um mistério. (...) Eu não posso dizer com certeza quais das motivações são as mais fortes, mas eu sei quais delas merecem ser seguidas. E olhando retrospectivamente minha obra, eu vejo que foi invariavelmente quando eu não tinha uma motivação política que eu escrevi livros sem vida e fui traído por passagens obscuras, sentenças sem significado, adjetivos decorativos e, em geral, desonestidade” (p. 316).
 Cabe aos que cultivam um mínimo de honestidade intelectual ter consciência desse tipo de viés, inevitável na literatura política, passando então a imprimir o máximo de objetividade observadora, de fidelidade à realidade que nos cerca, e tratar de traduzir uma clara percepção dessa realidade nos escritos que produzimos. É o que eu tento fazer cada vez e sempre que busco um livro na estante, que seleciono minhas leituras de pesquisa, de estudo ou de lazer, e que tomo da pluma, ou que me sento em face do computador, para escrever alguma coisa, qualquer coisa, como esta agora, por exemplo. Sempre...

Hartford, 7 de Junho de 2014

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Mercados se vingam de quem vai contra os mercados

Ah, esses mercados suscetíveis, manhosos, perversos, vingativos...
Curioso que, neste caso, são as próprias ações das estatais que melhoram de cotação quando a suprema administradora vai mal. Pode-se talvez traçar duas curvas inversas, o que seria graficamente dramático...
Paulo Roberto de Almeida 
VEJA.com, 6/06/2014

Depois de encerrar o pregão de quinta-feira com queda de 0,57%, a BM&FBovespa disparou nesta sexta-feira e fechou a sessão com alta de 3,04%, maior variação desde a escalada de 3,5% de 27 de março deste ano. Assim como aconteceu no final de março, a Bolsa foi impulsionada pela queda das intenções de voto na presidente Dilma Rousseff e pela piora na avaliação do governo. Uma pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha nesta sexta-feira mostrou que Dilma caiu três pontos porcentuais em relação à última pesquisa do instituto – a petista oscilou de 37% para 34%. Mas seus adversários na disputa ao Palácio do Planalto não subiram na preferência do eleitor. Aécio Neves (PSDB) tinha 20% e agora soma 19%, enquanto Eduardo Campos (PSB) aparece com 7%, ante 11% na pesquisa anterior.

A piora na avaliação da presidente se refletiu nas ações das empresas estatais listadas na Bolsa. Lideraram as altas do pregão desta sexta as ações ordinárias (ON, com direito a voto) da Eletrobras, que subiram 9,33%, cotadas a 7,15 reais; seguidas pelo papel preferencial da Petrobras, que subiu 8,15%, a 17,65 reais. Também registraram alta as ações do Banco do Brasil, de 5,31%, fechando em 24,40 reais
Desde o final de março tem sido assim. A cada piora de Dilma nas pesquisas eleitorais o principal índice da Bolsa de São Paulo, o Ibovespa, sobe, impulsionado pela alta dos papeis das estatais. Da mesma forma, o movimento inverso da Bolsa é visto toda vez que a petista mostra melhora nas intenções de voto. A oscilação já chamou atenção do xerife do mercado financeiro, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que vê se repetir no mercado financeiro um movimento especulativo semelhante ao visto em 2002, influenciado pela corrida ao Palácio do Planalto.
Dólar
A divulgação da pesquisa também provocou nova pressão no mercado de câmbio. O dólar fechou em queda nesta sexta-feira pela segunda sessão seguida, ficando abaixo de 2,25 reais, com os investidores reagindo aos dados positivos do mercado de trabalho dos Estados Unidos e à pesquisa eleitoral que mostrou queda na intenção de votos de Dilma. A moeda norte-americana perdeu 0,50%, a 2,2496 reais na venda, após chegar a 2,2392 reais na mínima da sessão. Segundo dados da BM&F, o volume ficou em torno de 1,1 bilhão de dólares.

O dólar encerrou a semana ainda em leve alta de 0,39%, mas deixa para trás o patamar de 2,30 reais que se aproximou na quarta-feira, quando fechou a quarta sessão em alta, acumulando valorização de 2,68% no período. “A pesquisa (eleitoral) causou a movimentação inicial no mercado”, afirmou o diretor de câmbio da Pioneer Corretora, João Medeiros, acrescentando que a queda do dólar perdeu fôlego na reta final do pregão porque entraram compradores aproveitando a cotação mais baixa da semana.

Brasil: o partido totalitario tenta fazer o seu bolivarianismo

Do blog do meu amigo Orlando Tambosi:
Congresso reage ao golpismo do PT
Dilma com o tirano comunista Fidel Castro
É preciso estar atento ao fim do governo Dilma, com o PT tentando golpear as instituições na calada da noite. A reação do Congresso ao decreto bolivariano do governo é sinal - bom sinal -de quem nem todas as instituições cedem às tentativas golpistas do Partido Totalitário. Editorial do Estadão:

Na política, frequentemente o que importa, mais do que a ação, é a reação. É a capacidade de corrigir os erros, impedindo ou reduzindo os seus efeitos deletérios. Neste sentido, a reação do Congresso ao Decreto 8.243, da presidente Dilma Rousseff, trouxe esperanças de que ainda existem instituições no Brasil não enfeitiçadas pelo lulismo. Dez partidos - DEM, PPS, PSDB, SDD, PV, PSB, PRB, PSD, Pros e PR, sendo que os últimos três integram a base aliada do governo - assinaram requerimento de urgência para que a Câmara dos Deputados vote um decreto legislativo revogando o ato presidencial. Esses partidos decidiram que não querem assistir passivamente ao solapamento das instituições democráticas pelo PT.
Foi uma reação imediata e proporcional a um decreto que fere a democracia representativa consagrada na Constituição, criando canais paralelos de poder, não legitimados pelas urnas, com o consequente aparelhamento do Estado. Conforme já dissemos em editorial, a mensagem subliminar em toda essa história é a de que o Poder Legislativo é dispensável.
A tomada de posição dos dez partidos foi suficientemente forte para que o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, viesse a público defender o decreto, o que também fez, no dia seguinte, a presidente Dilma Rousseff. É compreensível a atitude de ambos. A dela, por ter assinado um ato que, se pode asfixiar o sistema representativo, está perfeitamente de acordo com suas convicções ideológicas. E a dele, porque o tal ato presidencial só aumenta o seu poder, ao subordinar a Política Nacional de Participação Social à sua pasta.
Mas o que diz o sr. Gilberto Carvalho não tem propósito. Afirma ele que o decreto apenas regulamenta o que existe. Ora, a existência de Conselhos não provocou a oposição dos políticos e também de influentes setores da sociedade civil. A reação ocorreu por força da manipulação expressa no Decreto 8.243, que não se limita a regulamentar o que já existe. O que o decreto visa é criar um complexo sistema de "participação popular" e instituir uma verdadeira política de participação ideologicamente orientada, que se sobrepõe ao Poder Legislativo. Tenta-se fazer, sem a incômoda convocação de uma Constituinte e nem mesmo por meio de uma emenda constitucional, a substituição do sistema representativo por uma "democracia direta e participativa".
Até mesmo os brasileiros mais jovens, que felizmente não tiveram a experiência de viver sob um regime que não sabe respeitar nem conviver com um Congresso livre, podem ter uma ideia do que se pretende com essa "sutil" mudança de regime. Basta observar o que acontece em alguns países latino-americanos, cujos líderes chegaram ao poder prometendo governar ouvindo o povo, sem a intermediação de partidos carcomidos. Fizeram o seu próprio partido, organizaram a sua corriola e governam com poderes extraordinários - embora convoquem eleições regularmente. É a essas ditaduras disfarçadas que o governo do PT continua fiel e orgulhosamente envia sinais de simpatia.
E, se ainda pairasse alguma dúvida sobre o que significa o decreto, o próprio ministro Gilberto Carvalho ofereceu um didático exemplo. Em defesa do ato que lhe conferia tão sonhados poderes, disse que o decreto foi construído em parceria com os movimentos sociais e com a sociedade civil. Ora, como pode ter havido ampla discussão sobre o conteúdo de um decreto que, ao ser publicado, surpreendeu a todos - deputados e senadores, juristas, lideranças civis, etc.? Evidentemente, os movimentos sociais e a sociedade civil a que o ministro se refere são predominantemente as militâncias, encabrestadas ou não, que se iludem achando que serão protagonistas da tal "democracia direta e participativa". Mas a história mostra que esse tipo de regime, uma vez instalado, produz ditaduras ferozes.
E essas coisas são contagiosas. Na quarta-feira passada, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), afirmou a quem quis ouvir que não colocaria na pauta de votação da Casa o pedido de urgência dos dez partidos. Indagado sobre suas razões, respondeu, imperioso: "Porque não quero!".

Economia brasileira: estamos a caminho da recessao? - Claudia Safatle

Recessão
Cláudia Safatle
Valor Econômico, 6/06/2014

Recessão. Essa palavra voltou ao vocabulário dos economistas do setor privado como uma possibilidade concreta para os próximos trimestres, mas é vista como uma conclusão prematura por autoridades do governo. Depois de um crescimento de apenas 0,2% no primeiro trimestre do ano, as expectativas se consolidam para uma contração da atividade no segundo e no terceiro trimestres.

"Já estamos em recessão", adiantou, porém, o ex-diretor do Banco Central, Luiz Fernando Figueiredo, da Mauá Sekular Investimentos. Ele explicou: qualquer contração do PIB igual ou superior a 0,2% no segundo trimestre provocará um ajuste sazonal, pelo IBGE, nos dados do primeiro trimestre que passaria a registrar PIB negativo ao invés do crescimento de 0,2%. Isso caracterizaria uma recessão técnica, entendida como dois trimestres consecutivos de queda do produto.

Modelos estão sendo rodados pelos economistas da área financeira com os dados mais recentes da economia real: queda de 0,3% na produção da indústria em abril e retração mais acentuada, de 0,6%, da indústria em maio, segundo dados divulgados pela Anfavea (associação das montadoras), além de menos dias úteis para a produção em junho com o início da Copa do Mundo.

O resultado seria um PIB negativo entre 0,4% e 0,5% no segundo trimestre. Desempenho que gera uma herança estatística ("carry over") ruim para o terceiro trimestre, que também apresentaria taxa negativa de cerca de 0,25%. Nos últimos três meses do ano, a variação do PIB tenderia a zero. Se confirmadas essas projeções, a expansão da economia no último ano da gestão de Dilma Rousseff pode ficar abaixo de 1%.

Técnicos do governo não descartam de todo a possibilidade de recessão. Mas consideram cedo para tomá-la como um cenário provável. Examinando os resultados do IBC-Br de julho de 2013 até o último dado conhecido, de março deste ano, o que se constata é que o país estagnou: teve, na média, uma taxa negativa de 0,02%.

É difícil entender como a inflação resiste no patamar de 6% com uma economia tão fraca, assim como as expectativas de inflação também não cedem.

A resposta está na ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, que cita o "realinhamento dos preços domésticos em relação aos internacionais e dos preços administrados em relação aos livres". Ou seja, os destinos incertos da taxa de câmbio e dos preços represados pelo governo (energia, gasolina) concorrem para manter a expectativa inflacionária elevada para 2015. De março para cá os prognósticos do mercado colhidos pelo relatório Focus do Banco Central já agregaram mais de 1 ponto percentual na projeção de aumento dos preços administrados em 2015.

Em resumo: para levar o IPCA para a meta de 4,5% será preciso, antes, passar por uma inflação na casa dos 7% em 2015. A convergência da inflação, portanto, só pode ser vislumbrada de 2016 em diante, na avaliação de importantes fontes oficiais.

Outra questão que a ata ressalta é que mudanças relevantes na composição da demanda e da oferta agregada só devem ocorrer no médio prazo. Isso se traduziria pela transição do crescimento centrado na expansão do consumo para um modelo privilegiado pelo investimento. Apesar de essa mudança constar dos discursos oficiais, ela não se materializou.

O consumo das famílias e do governo cresceram ao limite e sustentaram a demanda agregada. Mas, agora, ambos bateram no teto. De pouco adianta o ministro da Fazenda, Guido Mantega, declarar como fez ontem que "a taxa de crescimento da economia seria maior se houvesse mais crédito para o consumo".

Com os níveis de confiança do consumidor e dos empresários próximos ao que estavam no auge da crise global de 2008/09, não há como incentivar as famílias a se endividarem mais frente ao risco de perda do emprego. Os bancos não vão expandir o crédito a contento nem o governo poderá acelerar seu consumo com aumento do endividamento público, por limitações fiscais.

O crédito externo que financiou o aumento da demanda - processo que levou o déficit em conta corrente do balanço de pagamentos para quase 4% do PIB - também rareou.

O aumento do investimento, porém, não ocorreu, deixando a economia estagnada e o governo sem instrumentos para reanimá-la.

A política monetária implementada pelo Banco Central elevou a taxa básica de juros em 3,75 pontos percentuais e seus efeitos começaram a aparecer. O aperto nos juros derrubou a demanda, mostrando que o juro como elemento central do controle da inflação continua eficaz. Não dobrou as expectativas porque elas estão sendo alimentadas por um eventual choque de preços administrados em 2015.

A elevação da taxa Selic não foi o fator preponderante a desestimular os investimentos. A queda vertiginosa da confiança dos empresários no futuro e a corrosão no relacionamento do setor privado com o governo é que estão na raiz da retração dos investimentos, apesar dos generosos financiamentos do BNDES a juros subsidiados.

Conforme a ata do Copom os juros devem ficar parados em 11% ao ano por um bom tempo. Os efeitos do aumento da Selic sobre a inflação, que são defasados e cumulativos, começaram a aparecer nos indicadores mais recentes da atividade econômica. Ficarão mais evidentes quando em agosto, no auge da campanha eleitoral, o IBGE divulgar o PIB do segundo trimestre.

O tempo econômico está andando mais rápido que o tempo político e isso preocupa o PT, principalmente se o desemprego começar a aumentar de forma visível antes das eleições. Dilma Rousseff concorre ao segundo mandato em uma situação bem mais adversa da que embalou sua campanha em 2010, quando o então presidente Lula turbinou o crescimento para 7,5%, deixou a inflação em 5,91% mas crescente e um ambiente de otimismo no país que elegeu sua sucessora. Foi uma herança ruim. A presidente entrega o primeiro mandato com menos crescimento, mais inflação e o pessimismo está disseminado no país.