Paulo Roberto de Almeida
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
domingo, 15 de fevereiro de 2015
A Arte da Resenha (para amantes de livros) - Paulo Roberto de Almeida (2006)
Paulo Roberto de Almeida
sábado, 14 de fevereiro de 2015
Ditaduras latino-americanas: um manifesto a favor das liberdades, e um teste historico...
Venezuela: Memorias do Carcere, versao bolivariana...
Não preciso de respostas, eu já sei...
Paulo Roberto de Almeida
Rei Momo chavista
Leopoldo López, o principal prisioneiro político do chavismo, sofreu uma violenta busca em sua cela na prisão militar Ramo Verde. Um grupo de homens armados e mascarados, liderada pelo diretor da prisão, coronel Homero Miranda, destruiu os pertences pessoais e os documentos do líder do movimento oposicionista.
A Venezuela está se esfacelando. Nicolás Maduro será derrubado pelos militares. Mas vai fazer muitos estragos daqui até lá, com a cumplicidade do governo brasileiro.
Marcha do Impeachment: agora menos marcha e mais protesto mesmo - Guilherme Fiuza
As chances do impeachment, que nunca foram muito grandes -- pois mesmo havendo motivos imperiosos, inclusive do ponto de vista criminal, seria barrado no legislativo -- agora diminuiram de vez. Sobra o protesto do dia 15 de março, a ser antecedido por um pronunciamento da soberana (e beneficiária no esquema).
Nunca antes neste país me senti espectador passivo de um espetáculo tão torpe quanto este.
Acredito que o jornalista Guilherme Fiuza ainda terá matéria para outros artigos entre a gozação e a indignação, que é o tom deste aqui.
Paulo Roberto de Almeida
Todo mundo de preto
Guilherme Fiuza
O Globo, 14/02/2015
O sustento nababesco dos companheiros com dinheiro público é uma das poucas instituições realmente sólidas no Brasil
Depois do carnaval, Dilma Rousseff fará um pronunciamento à nação, em cadeia nacional de rádio e TV, para defender a Petrobras. Providência oportuna. A maior estatal brasileira está afundando, e isso é grave. Como se sabe agora, uma boa fatia do dinheiro que ajuda o PT a ficar para sempre no poder é sugada da Petrobras. É o orçamento da revolução companheira que está em jogo — e com isso não se brinca.
Em defesa da Petrobras, Dilma deveria começar sua fala aos brasileiros condenando esse absurdo, esse descalabro que é a ação da polícia e da Justiça. De forma golpista e neoliberal, os homens da lei insistem em tentar sabotar o duto entre a estatal do petróleo e o Partido dos Trabalhadores. O sustento nababesco dos companheiros com dinheiro público é uma das poucas instituições realmente sólidas no Brasil do século 21 — e esses invejosos são assim mesmo, não podem ver nada funcionando direito que já querem melar. Só falta exigirem que os guerreiros do povo brasileiro devolvam as centenas de milhões de dólares que ganharam da Petrobras com o suor dos seus rostos e das suas mãos ágeis. Dilma não pode permitir esse golpe da elite branca.
No seu pronunciamento pós-carnavalesco, a presidenta mulher e oprimida precisa denunciar o preconceito. Como se não bastasse o trauma do mensalão, lá vêm as vozes reacionárias perseguir novamente as estrelas do proletariado. Será que o Brasil, esse insensível, não se lembra do sofrimento imposto ao nosso Delúbio, só porque o tesoureiro zelava pela segurança das transferências do Banco do Brasil para os cofres da revolução? Não, não se lembra. Senão não estaria impondo a mesma tortura a Vaccari. Só pode ser preconceito contra a categoria dos tesoureiros.
Agora está aí, nas manchetes da imprensa burguesa: João Vaccari e José Dirceu recebiam pessoalmente parte da propina da Petrobras destinada ao PT, segundo a investigação da Lava-Jato. Prezado brasileiro, você não está desconfiando de nada? Não percebe que são sempre os mesmos personagens implacavelmente perseguidos, só porque dão ao dinheiro do contribuinte a honra de financiar a rave deles no Palácio do Planalto?
Chega de discriminação contra o governo popular, chega de humilhar essa gente sofrida e milionária. Se vocês querem saber, seus conspiradores, os heróis do PT nem precisam desse dinheiro. Como acaba de ser revelado, o partido criou e oficializou a propina por dentro. Está dito e confirmado pelas testemunhas do petrolão: o suborno requerido aos fornecedores da Petrobras era convertido em doação legal ao PT. Propina oficial – com recibo, à luz do dia, tudo direitinho. Parem de perseguir quem está roubando honestamente.
Dilma, vá à televisão e grite contra os golpistas. O dinheiro abençoado do petrolão ajudou a bancar a sua reeleição, não permita que ponham sob suspeita a legitimidade do seu mandato — obtido com o voto consciente e a pilhagem mais consciente ainda. Defenda os companheiros que lhe têm bancado essa aventura inimaginável no leme da nação, com o mesmo ardor com que defendeu os mensaleiros. A nova CPI no Congresso possivelmente levará à discussão do seu impeachment. Corte esse mal pela raiz. Mande avisar que as mesadas serão cortadas e os traidores ficarão a ver navios, como esses que explodem a serviço da Petrobras.
Seu pronunciamento à nação será um sucesso, presidente. Carnaval terminado, todo mundo de ressaca e sem dinheiro — a sua aparição na TV será um bálsamo, tudo que o brasileiro estará desejando para recobrar o ânimo e encarar 2015 com alegria e otimismo. Não economize seu carisma e sua simpatia. Defenda a Petrobras com aqueles argumentos inteligentes usados na primeira reunião ministerial — acusando os inimigos de quererem “desprestigiar o capital nacional”. É bem verdade que naquela ocasião o teleprompter travou, justamente nessa frase. Foi oportuna a sua descompostura no operador da máquina. É muito desagradável gaguejar nessa frase depois do que o PT fez com a Petrobras.
Mas na gravação da mensagem aos brasileiros não haverá problema desse tipo. Errou, repete. Só não permita que seus olhos falem demais — não se esqueça de que eles não estão na delação premiada.
E você, cidadão brasileiro, não fiquei aí parado. Guarde um pouco da sua energia carnavalesca para ajudar Dilma Rousseff a defender a Petrobras e o bloco dos sujos. No dia do pronunciamento histórico, saia de casa de preto — a cor do petrolão, energia vital do governo popular. Se possível, na hora da cadeia obrigatória de rádio e TV vá para a rua trajando seu pretinho básico (não precisa assistir ao pronunciamento, você já sabe que a sua presidenta vai arrasar). Não se esqueça de deixar pendurado na janela também um pano preto, simbolizando a paz (dos cemitérios).
Ah, sim: leve uma vela acesa na mão, para iluminar o apagão governamental e ajudar a chefe da nação a encontrar a porta da saída.
Debate: a meritocracia da meritocracia nao diminui a virtude da meritocracia
Até a bíblia do liberalismo reconhece que a meritocracia é uma ilusão
Flavio Moura – seg, 9 de fev de 2015Foto: ReproduçãoA revista TheEconomist pode ser criticada por vários motivos, mas jamais por ser uma publicação de esquerda. Fundada em 1843, é a mais influente divulgadora do pensamento liberal de recorte clássico, aquele com origem nos pensadores britânicos do século XVIII.
Metade dos colunistas da imprensa brasileira que se auto intitulam “liberais”, quando não estão vocalizando preconceitos de classe, se pautam por matérias publicadas nessa revista.
Por isso é particularmente revelador o silêncio desses mesmos colunistas a propósito da matéria de capa da edição da última semana de janeiro. “Uma meritocracia hereditária”, diz o título do texto principal.
O argumento é simples: nos Estados Unidos, a pátria da ideologia em torno das “oportunidades iguais”, virou piada falar em meritocracia. Pelo simples motivo de que os filhos dos ricos e poderosos estão cada vez mais aptos a ganhar mais dinheiro e poder que os demais.
Claro que as elites econômicas, em todo lugar, sempre souberam se perpetuar e o nepotismo nunca deixou de ser um instrumento à mão.
Mas agora os americanos se deram conta de que a fração privilegiada das crianças e adolescentes, aquela cujos pais têm curso superior, dinheiro e boa rede de relações, é a que se encaixa melhor nos critérios meritocráticos.
Em outros termos: alguns “merecem” mais do que outros.
Há dados interessantes para embasar o argumento. Entre 1960 e 2005, a porcentagem de homens com diploma universitário que se casaram com mulheres que também concluíram o ensino superior subiu de 25% para 48%.
Isso significa um aumento bastante significativo na preocupação dos pais com a educação dos filhos. “As pessoas tendem a encorajar nos seus filhos o que valorizam nelas mesmas e nos seus parceiros”, diz o autor do texto.
Mais relevante do que isso: casais com ensino superior tendem a ter mais dinheiro para investir em educação. E isso tem gerado uma lacuna cada vez maior, do ponto de vista de renda, entre casais com maior escolaridade.
Eles também têm números para exemplificar: entre 1979 e 2012, a distância entre o rendimento de casais com nível universitário, em comparação aos vencimentos daqueles que têm apenas segundo grau, cresceu quatro vezes mais do que a distância entre os famosos “um por cento” mais ricos e o restante da sociedade.
Como é sabido para todos, o grande funil para a ascensão social é a educação – e o que a reportagem mostra é como esse capital valioso está cada vez mais escasso e dominado pelos mais ricos e bem formados.
Esse truísmo já está entronizado no pensamento de qualquer corrente que se queira preocupada com a desigualdade social. Mas é significativo que mesmo as bíblias do “liberalismo” contemplem essa nuance importante para a noção de “meritocracia”.
É um exemplo contundente de como a discussão está rebaixada por aqui.
O economista de esquerda mais festejado do momento, o francês Thomas Piketty, é a favor da economia de mercado e tira sarro da mentalidade presa na dicotomia da guerra fria.
A bíblia do liberalismo dá matéria de capa para construir uma noção menos chapada de meritocracia.
Já na briga de torcidas que impera por aqui, o pessoal continua gritando os disparates em branco e preto de costume.
Meritocracia para quem, cara-pálida?
Nossos liberais mereciam estudar um pouco mais.
Brasil: o impeachment do impeachment, ou, como os mafiosos ganharam uma vez mais
Luís Inácio corre para salvar Luiz Inácio
Agora ficou claro por que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse a um advogado de empreiteira, em reunião secreta, que a Operação Lava Jato "tomaria outro rumo" depois do carnaval e, portanto, ele "desaconselhava" que os executivos presos partissem para a delação premiada.
Em conluio com Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, dirigiu-se ao Tribunal de Contas da União (TCU), com uma Instrução Normativa redigida no Palácio do Planalto. Por essa Instrução Normativa, aprovada em tempo recorde, o TCU analisará concomitantemente com a Controladoria-Geral da União (CGU) os acordos de leniência firmados com o Estado. Isso garante que os acordos feitos no âmbito da CGU não correrão o risco de serem anulados depois pelo tribunal -- mesmo com um TCU dominado por PT e PMDB, as empreiteiras temiam essa possibilidade quando lhes propunham tal saída.
A aprovação da Instrução Normativa é ótima para Lula, Dilma e os larápios associados porque:
a) Acordos de leniência podem ser feitos diretamente com a CGU, sem passarem pela Justiça
b) Dessa forma, contorna-se o juiz Sergio Moro
c) Pelos termos de um acordo de leniência, as empresas reconhecem que praticaram os crimes, pagam uma multa e não são consideradas inidôneas. Podem continuar a assinar contratos com o governo em qualquer nível
d) Ao contrário do que ocorre com a delação premiada, elas não precisam contar tudo. Ou seja, que Lula e Dilma estão implicados até o pescoço no esquema do Petrolão
e) A chance de Dilma sofrer impeachment reduz-se dramaticamente, visto que será quase impossível imputar-lhe o crime de responsabilidade
f) Sem o perigo de falência, as empreiteiras podem dar um grande cala-a-boca ou um aguenta-aí-até-chegar-no-STF aos executivos presos e aos seus sócios em cana, como Ricardo Pessoa, da UTC, que ameaçavam seguir o caminho da delação premiada. A ameaça de Ricardo Pessoa de partir para a delação foi decisiva para o Planalto armar rapidamente o golpe
Luís Inácio Adams percorreu freneticamente os gabinetes dos ministros do TCU, acompanhado do ministro Bruno Dantas, para aprovar uma Instrução Normativa, repita-se, redigida no Palácio do Planalto, e não pelo ministro Bruno Dantas, como foi noticiado. Ninguém levantou a menor objeção.
A menos que um executivo preso ache insuportável a ideia de passar anos na cadeia, ainda que com o seu futuro assegurado economicamente, ou que a sociedade esboce reação, Luís Inácio salvou Luiz Inácio -- e Dilma.
Diplomacia: um embaixador diz claramente que o chefe de governo mentiu; fez bem...
Marcha do Impeachment: seis crimes e contando...; precisa mais? - O Antagonista
Eles resolveram realmente antagonizar a soberana, que por enquanto só cometeu seis crimes passíveis de impeachment.
Pode ser que já esteja de bom tamanho, mas acho que cavocando, sempre se vai achar mais.
Ou vocês acham que eles só roubaram 1 TRILHÃO?
Eu acho que foi muito mais...
Comparo o governo ao Titanic, não por ser grande e bonito, luxuoso e muito eficiente. Pelo contrário: pelo fato de que ele também vai a pique, direto ao fundo, e vai arrastar muita gente consigo e deixar muitos outros boiando sem salva-vidas (salvo os espertos de sempre, como certo apedêuta, que tem não só uma lancha salva-vidas, mas um iate inteiro, com uisque, companhia, essas coisas de ricaço).
E o iceberg, vocês podem perguntar?
Bem, o iceberg só pode ser a corrupção.
Não porque seja gelada, e vai bater no Titanic.
Ele já bateu. Mas é porque, como os icebergs, só uma pequeníssima parte está emersa. A maior parte, e talvez seja até mais do que 9/10, está submersa, e vamos ter de mergulhar para medir o tamanho.
Brrrr, só de pensar me dá arrepio...
Paulo Roberto de Almeida
3 minutos e 42 segundos de desastres
É o título de um novo vídeo do Financial Times, que resume em três minutos e quarenta e dois segundos todos os desastres econômicos associados a Dilma Rousseff: incompetência, corrupção, estagflação, queda das vendas no varejo, risco de rebaixamento por parte das agências de rating e a ameaça de impeachment por causa do escândalo na Petrobras.
A propósito da Petrobras, o Financial Times cita aquilo que John Kenneth Galbraith chamou de "Bezzle" - a quantidade desconhecida de fraudes dentro das empresas. Não está na hora de investir no Brasil. O que está ruim pode piorar.
Caiu até aqui, mas deve cair ainda mais
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015
Operacao Brasil: a alianca militar com os EUA na Segunda Guerra - livro de Durval Lourenço Pereira Jr.
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Comentários Paulo Roberto de Almeida:
Este livro promete mudar a percepção que temos atualmente sobre as razões da entrada do Brasil na guerra, ao lado dos aliados. Ainda estou aguardando a chegada do livro para constatar quais seriam essas novas informações. Tenho por mim que a ideia já estava sedimentada desde o início na cabeça de Oswaldo Aranha, que convenceu Goes Monteiro, contra as simpatias filo-fascistas, e nazistas, de Dutra e Felinto Muller. Vargas era um oportunista, mas sabia também qual era o lado a escolher. Só que na hora decisiva, quando recebeu Roosevelt em Natal (e quando se acentuaram também ataques de submarinos ao Brasil), ele deixou Oswaldo Aranha no Rio de Janeiro, a despeito deste ter preparado um Memorando precioso sobre o planejamento do Brasil para a guerra e mais além, para a ordem do pós-guerra. Depois, novamente, em abril ou maio de 1994, quando Roosevelt pessoalmente queria falar com Oswaldo Aranha em Washington, para preparar essa ordem do pós-guerra, Vargas não lhe permitiu viajar, para imensa frustração de Oswaldo Aranha e, estou certo disso, EM PREJUIZO do Brasil. Foi pena, pois a história poderia ter sido diferente, se Oswaldo Aranha assumisse a liderança do processo político no Brasil ao final do Estado Novo. Como diria Roberto Campos, o Brasil é um país que nunca perdeu uma oportunidade de perder oportunidades. Agora mesmo: estamos há mais de 12 anos perdendo oportunidades, que talvez nunca mais sejam recuperadas. Azar o nosso, por ter dirigentes tão tacanhos e tão despreparados...
Decadencia brasileira: uma sociedade destruida pela falta de valores - Ricardo Velez-Rodriguez
Petrolao: bandidos sao bandidos, e meliantes sao meliantes; tem tambem os mafiosos... - Veja
Em VEJA desta semana
As conversas impróprias do ministro da Justiça
Em encontro com advogados, o ministro da Justiça tranquiliza empreiteiras ao garantir que investigações da Lava-Jato sofrerão uma reviravolta logo depois do Carnaval
BATE-PAPO - José Eduardo Cardozo diz que se encontrou casualmente com o advogado Sérgio Renalt, que tem contrato com a UTC e trabalhou com Thomaz Bastos no governo Lula. As empreiteiras, porém, gostaram do resultado da reunião (Ueslei Marcelino/Reuters)
Desde a morte do ex-ministro Márcio Thomaz Bastos no ano passado, o PT perdeu seu grande estrategista em momentos de crise. Chamado carinhosamente de “God” (Deus, em inglês) pelos amigos, o onipresente MTB foi convocado para coordenar a defesa das empreiteiras tão logo deflagrada a Operação Lava-Jato. Ele tinha uma meta clara: livrar seus clientes de penas pesadas na Justiça e, de quebra, o governo petista da acusação de patrocinar um novo esquema de corrupção para remunerar sua base aliada no Congresso.
Negociador nato, Thomaz Bastos se dedicava a convencer o Ministério Público Federal de que a roubalheira na Petrobras não passava de um cartel entre empresas -- e que, como tal, deveria ser punido e superado com o pagamento de uma multa bilionária. Nada além disso. A morte tirou o criminalista cerebral da mesa de negociação. MTB deixou um vácuo. O governo perdeu sua ponte preferencial com as empreiteiras, o diálogo entre as partes foi interrompido, e as ameaças passaram a dominar as conversas reservadas. Foi nesse clima de ebulição que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, assumiu o papel de bombeiro. Ex-deputado pelo PT e candidato há anos a uma vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Cardozo se lançou numa ofensiva para acalmar as construtoras acusadas de envolvimento no petrolão, que, conforme VEJA revelou, ameaçam implicar a presidente Dilma Rousseff e o antecessor Lula no caso se não forem socorridas. Há duas semanas, o ministro recebeu em seu gabinete, em Brasília, o advogado Sérgio Renault, defensor da UTC, que estava acompanhado do ex-deputado petista Sigmaringa Seixas.
O relato da conversa percorreu os gabinetes de Brasília e os escritórios de advocacia como um sopro de esperança para políticos e empresários acusados de se beneficiar do dinheiro desviado da Petrobras. Não sem razão. Na reunião, que não constou da agenda oficial, Cardozo disse a Renault que a Operação Lava-Jato mudaria de rumo radicalmente, aliviando as agruras dos suspeitos de crimes como corrupção e lavagem de dinheiro. O ministro afirmou ainda que as investigações do caso envolveriam nomes de oposicionistas, o que, segundo a tradição da política nacional, facilitaria a costura de um acordo para que todos se safem. Depois disso, Cardozo fez algumas considerações sobre os próximos passos e, concluindo, desaconselhou a UTC a fechar um acordo de delação premiada. Era tudo o que os outros convivas queriam ouvir. Para defender a UTC, segundo documentos apreendidos pela polícia, o escritório de Renault receberá 2 milhões de reais. Além disso, se conseguir anular as provas e as delações premiadas que complicam a vida de seu cliente, amealharia mais 1,5 milhão de reais. Renault esgrime a tese de que a Lava-jato está apinhada de irregularidades, como a coação de investigados. No encontro, Cardozo disse o mesmo ao advogado, ecoando uma análise jurídica repetida como mantra pelos líderes petistas.
Depois da reunião no ministério, representantes de UTC e Camargo Corrêa recuaram nas conversas com o Ministério Público para um acordo de delação premiada. A OAS manteve-se distante da mesa de negociação. “Na quarta-feira (um dia depois do encontro em Brasília), fomos orientados a suspender as conversas com os procuradores”, confidencia um dos advogados do caso. Cardozo não operou esse milagre sozinho. “Chegou o recado de que o Lula entrará para valer no caso e assumirá a linha de frente. Isso aumentou a esperança de que o governo não deixe as empresas na mão”, diz outro advogado de uma empreiteira.
Procurados por VEJA, Cardozo, Renault e Sigmaringa tropeçaram nas próprias contradições ao tentar esclarecer a reunião no Ministério da Justiça, classificada por eles como um mero bate-papo entre amigos sobre assuntos banais. Cardozo disse inicialmente que não se reuniu com Renault. Depois, admitiu o encontro. A primeira reação de Sigmaringa também foi negar a audiência com Renault no gabinete do ministro, para, em seguida, recuar. Os amigos compartilham, como se vê, do mesmo problema de memória. Na versão de Cardozo, a reunião teria sido obra do acaso. Sigmaringa, um “amigo de longa data”, teria ido visitá-lo. Renault, que estava em Brasília e tinha um almoço marcado com o ex-deputado, decidiu se encontrar com Sigmaringa também no ministério. Pimba! Por uma conjunção cósmica, o advogado da UTC, empresa investigada pela Polícia Federal, acabou no gabinete de José Eduardo Cardozo.