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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Coronel do Exército diz sentir nojo de Bolsonaro - Marcelo Pimentel Jorge de Souza (Revista Forum); toda a minha solidariedade, Paulo Roberto de Almeida

 É preciso ter uma boa disposição em defender sua própria honestidade intelectual para vir a público denunciar claramente as autoridades que desmantelam a própria dignidade do cargo que ocupam, ao atuar CONCRETAMENTE contra os interesses do país, de suas instituições, da honra da sociedade.

Toda a minha solidariedade ao militar da reserva Marcelo Pimentel Jorge de Souza, que ousa contrapor-se à passividade da maior parte dos seus colegas, ao empreender uma ofensiva contra os desmandos a que assiste no país. Eu não poderia concordar menos com sua atitude, e ele conta não apenas com meu apoio, mas também com minha companhia na denúncia dos desmandos a que assisto em minha própria instituição.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 22/12/2020


Coronel do Exército diz sentir nojo de Bolsonaro

“Sinto melancolia em ver boa parte dos oficiais de minha geração e ex-comandantes participando de um governo chefiado por uma pessoa política e intelectualmente despreparada”, afirmou Marcelo Pimentel Jorge de Souza, militar da reserva

 Revista Fórum, 

Marcelo Pimentel Jorge de Souza, coronel da reserva do Exército, postou, em sua página no Facebook, um texto contundente contra o presidente brasileiro. O militar afirma sentir nojo de Jair Bolsonaro e vergonha por ter se formado na mesma Academia Militar que ele.

O coronel diz, ainda, que Bolsonaro e seus ministros militares desmoralizam as Forças Armadas. “Sinto melancolia em ver boa parte dos oficiais de minha geração e ex-comandantes participando de um governo chefiado por uma pessoa política e intelectualmente despreparada”.

Leia a íntegra do texto:

Como oficial da reserva do Exército e de acordo c/o direito que me é assegurado pela Lei 7.524/86, declaro ter/sentir:

– NOJO da pessoa que preside meu país;

– DESPREZO por quem participa de seu governo;

– REPÚDIO por quem ainda hoje o apoia;

– ASCO em escutar sua voz ou a pronúncia de seu nome;

– VERGONHA de que tenha um dia passado pela mesma Academia Militar que me formou oficial do EXÉRCITO BRASILEIRO;

– CONTRARIEDADE com quem, minimamente informado, votou nessa pessoa pra ser PRESIDENTE DO BRASIL;

– MELANCOLIA em ver boa parte dos oficiais de minha geração e ex-comandantes participando de um governo chefiado por uma pessoa política e intelectualmente despreparada, inepta e incompetente, além de desumana e extremamente grosseira e mal-educada;

– DESESPERANÇA em perceber que grande parte dos oficiais e praças das novas gerações está seguindo o MAU exemplo de alguns chefes e ex-chefes insensatos, ambiciosos, tolos ou idênticos ao capitão manobrado por generais;

– MEDO que o Exército, por intermédio da maioria de seus integrantes, seja transformado numa instituição à imagem e semelhança de seu atual ‘comandante supremo’, que continua sendo tratado como ‘MITO’ nos quartéis em que comparece, SEMPRE acompanhado por generais-ministros políticos que COMANDAVAM, CHEFIAVAM e GUIAVAM as forças armadas brasileiras… até outro dia; e

– DESCONFIANÇA de que alguns generais que se apresentam hoje como ‘dissidentes do governo’ e críticos (exclusivos) ao presidente, mesmo sendo, antes das eleições, as pessoas que mais o conheciam na face da Terra exceto a própria família (dele), sejam apenas aproveitadores de nova ocasião para manutenção do ‘PARTIDO MILITAR’ no centro do poder e do cenário político nacional, agravando o processo de POLITIZAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS e seu reverso – MILITARIZAÇÃO DA POLÍTICA e da SOCIEDADE -, ambos nocivos para as Forças Armadas (DEFESA) e o BRASIL (ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO)…hoje, amanhã e SEMPRE.

(a) Marcelo Pimentel J. de Souza, cel R-1 EB.

Observações:

1) indico posto hierárquico na manifestação de meu pensamento político (coronel), em contrariedade ao estabelecido na Lei 6.880/80 (Estatuto dos Militares), Art 28, inciso XVIII (determina q o oficial da reserva se abstenha de usar seu posto qdo ocupar cargo público ou ‘discutir política’ publicamente), SIMPLES e EXCLUSIVAMENTE para demonstrar o poder do ‘MAU EXEMPLO’ de inúmeros generais (veja o perfil pessoal de rede social do gen villas boas ou heleno, pra citar apenas dois) que descumprem os preceitos ÉTICOS (é disso que trata o Art 28 do Estatuto dos Militares) mais elementares, traduzido num raciocínio bem simples: “SE UM GENERAL FAZ, QUALQUER OUTRO MILITAR PODE FAZER TAMBÉM” – eu fiz tão somente para mostrar a impropriedade dessa conduta;

2) é o mesmo que dizer… ‘SE UM GENERAL DA ATIVA FAZ POLÍTICA’ (é/era o que fazem/faziam – os generais Pazuello, Ramos, Braga Netto, Rego Barros, respectivamente ministros da saúde, secretaria de governo, casa civil e ‘porta-voz’) ‘QUALQUER MILITAR, DE CORONEL A SOLDADO, PODE FAZER TAMBÉM’;

3) o marechal Osório, comandante da força terrestre na Guerra da Tríplice Aliança, já dizia: “É FÁCIL A MISSÃO DE COMANDAR HOMENS LIVRES; BASTA MOSTRAR-LHES O CAMINHO DO DEVER”;

4) o dever do militar das forças armadas NÃO é governar (independentemente de sua visão político-ideológica, e é livre para tê-la) nem, muito menos, tutelar o poder político civil;

5) lugar de militares e de forças armadas é no ‘fundo do palco’, não protagonizando as lutas políticas normais e legítimas de uma sociedade;

6) pra ajudar a resolver ‘polarizações’ não se deve aderir a um dos polos, muito menos estimular, apoiar ou criar um;

7) ISENÇÃO funcional, NEUTRALIDADE política, IMPARCIALIDADE ideológica, APARTIDARISMO absoluto, PROFISSIONALISMO estrito e CONSTITUCIONALIDADE são os ‘ingredientes’ da argamassa que sustenta o MURO que deve (deveria) separar forças armadas da política. Quem é ou foi chefe e comandante, que ‘PRECEDE, GUIA e LIDERA’ seus subordinados, DEVERIA ser o primeiro a PRATICAR esses 6 princípios, posto que o ‘EXEMPLO ARRASTA’ – ‘ARRASTA’ para a trilha do DEVER profissional ou para as profundezas do ABISMO institucional.

8) eu e muitos oficiais de minha geração formada na AMAN/1987 ajudamos a reerguer aquele MURO nos 30 anos que se seguiram à Constituição que fundou o Estado Democrático de Direito. Ajudamos a reconstruir a IMAGEM POSITIVA de credibilidade, confiança e respeito da sociedade em seu Exército, após 21 anos de autoritarismo inaugurados e protagonizados por chefes militares que se formaram no ‘Estado de Indisciplina Crônico’ dos quartéis nos anos 1920-60 e que, percebendo ou não, transformaram-se em generais ‘DITADORES’ nos anos 1960-70;

9) falo porque é necessário reparar, URGENTEMENTE, as muitas avarias no ‘MURO’, antes que desmorone por completo e tenhamos risco de retroceder institucionalmente àquele ‘Estado de Indisciplina Crônico’ anos pré-64 ou, por outro lado, que se transformem as forças armadas num monolito político-ideológico de sustentação a desvarios autoritários como no período 1964-68-77-85. Como dizia o General Peri Bevilacqua, Ministro do STM cassado pelo AI-5: ‘QUANDO A POLÍTICA ENTRA NO QUARTEL POR UMA PORTA, A DISCIPLINA SAI PELA OUTRA’);

10) falo porque tive (e tenho) a ‘melhor profissão do mundo’ – a de oficial do Exército Brasileiro e, por isso, tenho consciência plena que aquele MURO só será reparado se contar com a participação mutuamente cooperativa das chefias militares das forças armadas e das lideranças políticas da sociedade civil.

Como fazer isso? É resposta ao mesmo tempo SIMPLES e COMPLEXA. Apresentarei somente a parte SIMPLES e IMEDIATA:

– a saída, mais breve possível, de todos (TODOS) os militares da ATIVA que exercem cargos de natureza política e/ou que não tenham claríssima relação com as atividades essencialmente militares (o que inclui atividades administrativas);

– a saída gradual de todos (ou quase todos) militares da RESERVA dos cargos para os quais foram nomeados no governo, estatais, autarquias, fundações, fundos de pensões, embaixadas, tribunais etc., nas mesmas condições dos da ativa; e

– o mais SIMPLES de tudo –> Basta os GENERAIS darem o EXEMPLO. Dar EXEMPLO é fazer primeiro ou junto!

A HISTÓRIA grita aos nossos ouvidos!

Ouçamo-la!

Avatar de Lucas Vasques

Lucas Vasques

Jornalista e redator da Revista Fórum.




O Alienista Alienado, livre adaptação de uma narrativa sobre a loucura de certas pessoas, de Machado de Assis

 Por acaso – por acaso mesmo, pois minha biblioteca está um cafarnaum, como a cabeça do chanceler acidental – caí numa edição para estudantes do famoso O Alienista, de Machado de Assis. Não resisti à tentação de transcrever alguns trechos do prefácio de José Carlos Garbuglio, professor da USP, com algumas livres adaptações à nossa alienada situação:



"Convertendo o Itamaraty [seria Itaguaí] em campo de experimentação a partir de um flexível conceito de loucura, Beato Salu [seria Simão Bacamarte] leva pânico à pequena população que vê atônita as internações em sua Casa de Rio Branco, transformada em laboratório de provas. Confundindo-se com a Ciência, o alienado [seria alienista] recebe ataques ou elogios sempre indiretos e por meio de instrumentos destituído de eficiência: chavões de uma oratória ôca. (...) São resoluções de momento, não atos amadurecidos. (...)

Encarnando a Ciência, Beato Salu [S.B.] se converte em entidade distante, fria e intocável e se coloca acima do bem e do mal. Guardando consigo os segredos apenas revelados aos iniciados, assume feição mágica e se torna elemento sagrado, como repositório ou "templo" do saber científico. (...)

As pessoas se satisfazem com a frase de efeito epidérmico, na qual fica clara a ruptura significado-significante, uma vez que as frases aparecem como elementos independentes, sem relação com o contexto. (...) Na caracterização de Beato Salu, a linguagem perde o empolado para reduzir-se ao mínimo."
(p. 3-4 da edição da Ática, 2002; ilustração da capa: Jayme Leão)

Da contracapa:
"Quem são os loucos? O que fazer com eles?
A inquietação que se origina destas dúvidas leva Beato Salu a subverter a ordem pacata do acomodado Itamaraty, trazendo pânico a todos os seus habitantes. Depois de mandos e desmandos, o alienado ..."

Cada um que imagine o seu final preferido...
Pela transcrição maldosa:
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 22/12/2020

Google Alerts sobre "política externa brasileira": cada matéria mais deprimente que a outra...

 Os alertas do Google não conseguem trazer NENHUMA notícia positiva para o chanceler acidental, para a sua desastrosa política externa (que na verdade não existe, como alertam várias das matérias aqui selecionadas), para o desgoverno do capitão, para o Brasil. Todas são profundamente deprimentes, vergonhosas para o corpo profissional do Itamaraty, para a nação como um todo...

Quem fala muito em soberania, é porque, no fundo, tem o pressentimento de que ela não está sendo suficientemente defendida, e de fato é isso que ocorre, pois esse bando de malucos alienou a nossa soberania a um mentecapto estrangeiro, um pouco mais poderoso do que os mentecaptos nacionais.

Nem dá vontade de abrir qualquer uma dessas matérias, pois elas dizem o que já sabemos.

Paulo Roberto de Almeida

Google
politica externa do Brasil
Atualização semanal  21 de dezembro de 2020
NOTÍCIAS 
Publicado em 20/12/2020 - 09:42 Por Agência Brasil - Brasília. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araujo, será entrevistado neste domingo (20) ...
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A destruição da política externa. O País nunca esteve tão isolado e os interesses nacionais nunca foram tão mal defendidos.
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A rejeição do Senado à indicação do embaixador Fabio Marzano para a delegação do Brasil junto à ONU em Genebra (Suíça) foi um recado político ...
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... do Brasil, com consequências para as políticas externa e interna do país, ... e externa americana, será um tema delicado na relação com o Brasil”, ...
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Profissionais não podem reclamar quando permitem que amadores mandem na política externa. William Waack, O Estado de S.Paulo.
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Em dois anos de governo, a política de Araujo-Bolsonaro só rendeu ao Brasil perda de prestígio e influência, isolamento e desmoralização. Mas a ...
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Sem política externa. Governo não moveu uma palha para evitar a perda do poder de voto do Brasil na ONU.
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Com as eleições americanas no horizonte e o alinhamento do Brasil à política externa dos Estados Unidos, diz Caramuru, o presidente e a ...
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Especialistas em política externa, no entanto, demonstram certo ceticismo com a perspectiva de uma adesão rápida do Brasil como membro.

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Do lado do Brasil, vemos uma politização histórica da política externa", afirma Guilherme Casarões, professor de relações internacionais da ...
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segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Coronéis pedem saída de Pazuello da Saúde e criticam Bolsonaro - Marcelo Godoy (OESP)

 Demorou para que os militares dessem conta que o capitão que desgoverna o país está destruindo a reputação deles, pois se trata de um psicopata perverso. As FFAA vão sair muito mal desse desgoverno.

Paulo Roberto de Almeida


Coronéis pedem saída de Pazuello da Saúde e criticam Bolsonaro

Críticos à presença de militares na Esplanada, os oficiais apontam as falhas do ministro; general não teria seguido, nem ao menos, os princípios do manual de logística

Marcelo Godoy

O Estado de S.Paulo, 21 de dezembro de 2020 | 10h00

Caro leitor,

Há militares que apoiaram Jair Bolsonaro, pois acreditavam que qualquer coisa seria melhor do que o PT. Dizem que lutavam contra a corrupção. Outros se mantiveram distantes do capitão. Após dois anos, eles veem o governo se aliando ao Centrão ou buscando, por todos os meios, livrar o filho do presidente de seu encontro com a Justiça. Há um mês, o general Francisco Mamede Brito escreveu: "O apreço entre as instituições de Estado deve se basear no ideal republicano. Subserviência, fisiologismo e corporativismo não fazem parte desse ideiário". Não são apenas oficiais generais, como Santos Cruz, Brito e Sérgio Ferolla que apontam o dedo para o governo. Há também coronéis. Dois deles se destacam: Marcelo Pimentel Jorge de Souza e Péricles da Cunha.

O primeiro é um artilheiro que sempre se recusou a apoiar Bolsonaro por julgá-lo - a exemplo de tantos generais do passado - um mau militar. Suas críticas vão além do presidente. Ele aponta para o grupo de militares que esteve por trás da campanha do capitão. O coronel tem o hábito de fustigar os militares bolsonaristas lembrando-lhes os documentos que alguns parecem esquecer: o Estatuto dos Militares e a Constituição. Pode ser que o acusem de ser esquerdista, como a tantos outros que ousaram criticar Bolsonaro - de banqueiros ao (pasmem!), general Rocha Paiva. Mas essa é uma tarefa difícil quando o discurso do militar lembra o de Ruy Barbosa, ao pedir, em 1893, que fosse construída "a mais alta muralha" entre o Exército e a política.

Ele se diferencia dos generais que se hoje se opõem ao capitão por ter posto cera nos ouvidos e nunca ter cedido ao canto bolsonarista que encantara tantos colegas que hoje ocupam cargos civis na Esplanada. Insiste na necessidade da preservação da neutralidade, da isenção e do apartidarismo como valores fundamentais da instituição militar e dos militares, que se veem ameaçados pela adesão atabalhoada de colegas ao governo de um presidente que acha bonito dar ao seu povo o exemplo de não se vacinar contra uma doença que já matou 186 mil compatriotas. Estivesse ainda em um quartel, o capitão seria enquadrado em razão da fanfarronice.

"Em tese, ele (Bolsonaro) poderia ser alvo de impeachment", disse o coronel à coluna, após avaliar o comportamento presidencial diante da pandemia. Recentemente, Marcelo Pìmentel escreveu um texto no qual avaliou a atuação do ministro da Saúde, o general Pazuello. Em O Logístico que não segue o Manual, o coronel  afirma: "O Manual de Logística do Exército Brasileiro é a 'bíblia' do oficial de logística, de cadete a general. Seja de intendência, de material bélico, artilharia, infantaria ou qualquer outra arma, o oficial que planeja apoio logístico - sempre uma atividade-meio e sempre fundamental - deve tê-lo bem estudado!"

O coronel prossegue afirmando que a "única razão alegada pelo governo para que o general forças especiais (Pazuello), da ativa, oriundo do Serviço de Intendência, seja ministro da Saúde durante a pandemia, em vez de médicos ou políticos, é sua 'enorme capacidade logística'". O manual EB70-MC-10-238 deveria estar, segundo ele,  na cabeceira do gênio da logística que comanda a Saúde do País para as operações de prevenção, tratamento e imunização da covid-19. "Diz o manual em seu capítulo 5: O planejamento logístico na Força Terrestre deve atender às seguintes características:

Ser exequível, adequando-se às limitações de tempo e espaço, quanto à ação e de quantidade e qualidade, quanto aos meios (próprios ou contratados) e ou passíveis de mobilização; antecipar-se às necessidades de apoio ao longo da operação, de modo a garantir sua validade para o futuro. Essa antecipação será tanto maior quanto mais complexo for o problema militar a resolver com a operação; ser flexível, de modo a permitir a introdução de ajustes na sua execução, possibilitando soluções alternativas quando se evidencia uma impossibilidade do atendimento do apoio requerido; integrar-se aos planejamentos dos níveis estratégico e operacional, de maneira a possibilitar interação entre os vetores envolvidos, melhor aproveitamento das capacidades logísticas e direcionamento do esforço para atingir o Estado Final Desejado; e ser simples, de modo que os planos e ordens logísticas sejam de fácil entendimento pelos elementos envolvidos na sua execução, diminuindo o risco de confusão quanto aos resultados desejados."

Depois de citar esse logo trecho do manual, o coronel faz seis perguntas: "Você acha que esses princípios - exequibilidade, flexibilidade, antecipação, integração e simplicidade - estão sendo seguidos pelo 'papa' da logística, quando se aposta em uma única vacina com transferência de tecnologia para fabricação nacional (Oxford), em vez de se investir em convênios com outras empresas ou países para criar alternativas? Se milhões de testes próximos às datas de vencimento são esquecidos nos depósitos controlados pelo ministério? Se há falta de integração, de diálogo e bom relacionamento com governadores (é o nível político em que um ministro deve atuar), e do levantamento de necessidades à concentração e união de esforços? Se faltam informações substanciais, há divulgação de dados confusos, um vai-e-vem de decisões, 'ordens e contra-ordens' sobre quase tudo que diz respeito às ações governamentais, do fornecimento de insumos, passando pela divulgação de dados sobre mortos e casos ao plano de imunização? Se há atraso no levantamento de necessidades de seringas e dos processos de aquisição e fabricação desse e de outros insumos para execução da imunização? Se há investimento em tratamentos cientificamente questionáveis, como a hidroxicloroquina e vermífugos?"

E conclui: "Você acha que o 'logístico' está seguindo o manual de logística? Eu acho que não! Logo, pede pra sair...Pazuello!" Diante das críticas contra o negacionismo de Pazuello e Bolsonaro, o coronel escreveu: "Boa parte da sociedade está percebendo. Nenhum de nós, que vestimos fardas, se incomoda? Nenhum de nós, vendo esse tipo de exposição, se põe a refletir, além do argumento fácil a 'culpa é da imprensa'?" À coluna, o coronel afirmou achar o impeachment "o que de pior poderia acontecer para o Brasil". "Estou seguro de  que (Rodrigo) Maia sabe disso, e a oposição que tem juízo também. Bolsonaro não é Trump, mas pode e deve ser derrotado nas urnas. Ele e o partido militar, que não é o Partido Republicano."

Outro coronel crítico a Bolsonaro é Péricles Cunha. Em 1988, por escrever um artigo sobre o governo de José Sarney, Péricles pegou 15 dias de prisão. Participou nos anos 1990 da miríade de grupos de militares da reserva, como mostrou em sua dissertação de mestrado, na Universidade Federal Fluminense, o cientista político Eduardo Heleno de Jesus Santos (Extrema-direita, volver!). Em 1991, Péricles foi defendido pelo general Octavio Pereira da Costa, no artigo Entre Péricles e Sócrates, publicado no Jornal do Brasil: "Primeiro, não resisto em formular esta melancólica interrogação, com base na eleição do nosso Meneguelli militar (Jair Bolsonaro): Será que os militares, cansados de tentar salvar a Pátria, estariam procurando salvar-se a si mesmos?"

Após elogiar Péricles, o general seguiu com Bolsonaro: "Não cometeria a injustiça de glosar que já não se fazem capitães como antigamente, porque tenho certeza de que existem, por aí, em todos os quartéis, centenas de capitães, profissionalmente cada vez mais competentes, silenciosos, dignos e responsáveis". Péricles, que é crítico a Lula e a Bolsonaro e defende uma terceira via, parece vacinado contra os que usam o Exécrito e os camaradas como biombo para seus erros. Ele escreveu: "Se o despreparo do general intendente no Ministério da Saúde equivalesse ao do Exército, a Bolívia poderia conseguir sua saída para o mar. Pelo Atlântico."

E isso antes de Bolsonaro dizer, no fim de semana: “A pandemia, realmente, está chegando ao fim. Temos uma pequena ascensão agora, que chamo de pequeno repique, que pode acontecer, mas a pressa da vacina não se justifica.” Essa postura do presidente e de seu ministro causam desconforto no tenente-brigadeiro Sérgio Xavier Ferolla, ex-presidente do Superior Tribunal Militar de Justiça, ex-diretor do Centro Tecnológico da Aeronáutica e da Escola Superior de Guerra. Homem vinculado à ciência, ele escreveu que o governo Bolsonaro "infelizmente, por deturpação ideológica e incompetência, reprime a correta manifestação de cientistas".

Ferolla conheceu o brigadeiro Casimiro Montenegro Filho, o homem que fundou o Instituto Tecnológico da Aeronáutica e o CTA. Ao ser questionado sobre como acredita que Montenegro veria a atuação de Pazuello na  Saúde, Ferolla respondeu: "Com desgosto profundo". Eis um sentimento que parece dominar as manifestações desses oficiais: desgosto. Sente-no ao verem as Forças Armadas arrastadas para o abismo de quem acha que a ânsia de muitos por se vacinar não se justifica. De quem cria fantasias para insinuar que seus adversários políticos são desonestos, como forma de justificar a incompetência para proteger a vida dos compatriotas. O descrédito que o bolsonarismo fomenta sobre as vacinas, combinado com o arrivismo que despreza a vida alheia, arrisca levar dezenas de milhares de brasileiro ao túmulo antes do fim da pandemia. E não será apenas "de desgosto".


Arbeit Macht Frei no Itamaraty? capataz-mor do gabinete do patético chanceler acidental quer todo mundo na linha de montagem

 Chefe de gabinete de Ernesto Araújo cobra presença física no Itamaraty e diz: “pandemia não é desculpa”

Bela Megale

O Globo | 17/12/2020, 14h20

Uma mensagem enviada na terça (15) a secretários do Itamaraty, pelo embaixador Pedro Wollny, chefe de gabinete do ministro Ernesto Araújo, causou grande desconforto entre alguns diplomatas.

No texto enviado por Whatsapp, Wollny cobra a presença física de funcionários. “É absolutamente VITAL que, ao menos em unidades chaves, como as secretarias, haja ao menos um diplomata operacional em horário comercial”. Na mensagem, afirma que a “pandemia não é desculpa” e que seu gabinete, “que trabalha com 100% do seu contingente presencial, é prova disso”.

O embaixador encerra o pedido afirmando que “seria muito boa” a aplicação dessa orientação em outras áreas, como departamentos e divisões.

O aviso foi lido como uma “ordem“ aos funcionários do Itamaraty. Diplomatas ouvidos pela coluna demonstraram preocupação com a retomada do trabalho presencial, mesmo em esquema de revezamento. A determinação acontece em uma fase de aumento de casos de Covid-19 no Brasil. A orientação causou mais preocupação entre aqueles que atuam em áreas com um número menor de pessoas alocadas. A orientação de Wollny, conforme relatos de integrantes da pasta, exigiria uma presença quase que diária de alguns funcionários.

Outro ponto que chamou atenção internamente é que o pedido não foi formalizado em uma portaria do ministério, como seria praxe, mas feito por uma mensagem informal. O movimento foi visto como uma tentativa de Wollny de se blindar de um desgaste político que a formalização da ordem traria.

Além disso, diplomatas entendem que a demanda do embaixador contradiz a portaria número 166 do Ministério das Relações Exteriores, de abril deste ano. O documento diz que os servidores devem comparecer às dependências da pasta “apenas quando necessário o trabalho presencial” e que a atuação in loco deve acontecer em “atividades que não possam ser desempenhadas remotamente”. Diplomatas relataram à coluna que, nos últimos sete meses, seguem trabalhando normalmente de suas casas.

Procurado, Wollny confirmou o envio da mensagem e reiterou que “a pandemia não é desculpa para todo mundo ficar trancado em casa”. O embaixador disse que “nem todos trabalhos podem ser feitos remotamente” e que é preciso ter ao menos uma pessoa operacional, em esquema de revezamento, em cada Secretaria.

O embaixador disse que se guia pelo “espírito público” e que “o horror das pessoas a trabalhar é tamanho, que fazem essa marola toda” com seu pedido.

– Acho que minha atitude é mais do que louvável. Como funcionários públicos, temos que dar o exemplo de procurar manter as atividades. Não acho que a pandemia é desculpa para todo mundo ficar trancado em casa. Se seguir o protocolo, ter cuidados, não há motivo para a pessoa não vir trabalhar. – disse.

O embaixador disse que todas as normas determinadas pelo Ministério da Economia estão sendo seguidas e que funcionários que integram grupos de risco da Covid-19 estão proibidos da trabalhar presencialmente. Afirmou também que os parâmetros de distanciamento entre as pessoas em ambientes de trabalho estabelecidos pela pasta da Economia estão sendo cumpridos e “o que não é permitido, em hipótese nenhuma, não é feito”.

Wollny disse que sua mensagem foi “um apelo aos colegas” e que essa “é uma norma não escrita” que será interpretada de acordo com circunstâncias de cada ambiente. 

– É uma questão de bom senso. Uma das grandes críticas que fazem ao funcionário público é que ele não é dedicado. Qual o problema dele trabalhar todos os dias? Sou cercado de cuidados e, desde o primeiro dia, vim trabalhar por vontade própria. Passo álcool nas mãos, tenho uma sala só para mim, abro portas e janelas. Ninguém que trabalha comigo teve Covid. Não estou diminuindo o risco, o que eu fiz foi um apelo informal. – disse.

https://blogs.oglobo.globo.com/bela-megale/post/chefe-de-gabinete-de-ernesto-araujo-cobra-presenca-fisica-no-itamaraty-e-diz-pandemia-nao-e-desculpa.html


Reflexões sobre a tragédia política brasileira, a de 2018 e uma outra possível em 2022 - Paulo Roberto de Almeida

Reflexões sobre a tragédia política brasileira, a de 2018 e uma outra possível em 2022

Paulo Roberto de Almeida 

Marlos Ápyus pergunta:

"É menos uma questão de "como puderam votar nisso?", e mais de "quais erros foram cometidos para que a população preferisse isso?".
A pergunta errada nunca levará à resposta certa."

PRA: De fato, esta é a GRANDE pergunta, que não remete apenas a 2018, mas a 2022 também. Se não formularmos as perguntas corretas, e não soubermos, a partir do bom diagnóstico, aplicar o receituário clínico-político, vamos estar com a pandemia bolsonarista por muito mais tempo...
Tento responder: não houve um único erro. Foi uma sucessão de erros, causados por prestigiadores da política, a liderança carismática de Lula, as políticas sociais, as belas promessas do lulopetismo, a grande ilusão de que o Brasil decolava, seguidos por uma nova sucessão de erros, por parte da população, dos militares e das elites políticas: a rejeição do eleitorado de classe média à corrupção monumental do lulopetismo e à Grande Destruição Econômica de Dona Dilma e sua Nova Matriz Econômica.
São muitos erros, mas aí "Inês já era morta". Os saudosistas da ditadura militar, os malucos dispersos na sociedade, os direitistas enrustidos nos armários durante 30 anos, todos eles saíram à luz do dia e se converteram em fanáticos do capitão. Muitos ainda continuam fanáticos, inclusive pessoas normalmente normais ou bem informadas como certos diplomatas.
Estamos no meio do pântano.
Minha única resposta seria esta: esquerda, centro, direita racional precisariam estar UNIDOS para vencer o candidato dos Novos Bárbaros. Se não o fizerem, a derrota é certa em 2022.
Os líderes políticos o farão? Superarão suas ambições individuais em troca da renúncia em favor de um projeto comum?
Não tenho certeza. Elites econômicas e militares ainda não fizeram o diagnóstico correto e não tiraram as consequências.
Por que os dirigentes políticos o fariam?
Os acadêmicos, como sempre, continuam falando apenas para si mesmos, sem qualquer conexão com o povo real...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 21/12/2022

O declínio argentino e a trajetória do Brasil - Loris Zanatta e Paulo Roberto de Almeida

 O declínio argentino e a trajetória do Brasil

Loris Zanatta e Paulo Roberto de Almeida

 

Quando a Argentina foi para o brejo? - Não pensem que não se aplica ao Brasil... - El declive argentino, un caso único en la historia contemporánea - Loris Zanatta

Postado no blog Diplomatizzando, 21/12/2020

Links:

Blog Diplomatizzando: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/12/quando-argentina-foi-para-o-brejo-nao.html

Academia.edu: 

https://www.academia.edu/44747557/O_decl%C3%ADnio_argentino_e_a_trajet%C3%B3ria_do_Brasil_Loris_Zanatta_Paulo_Roberto_de_Almeida

 

Um artigo importante, e peço um pouco de paciência para seguir meu resumo inicial, antes de ler todo o artigo que transcrevo mais abaixo.


A pergunta, logo ao início do artigo, é muito simples: 

¿Cuándo se jodió la Argentina?


Pois é: existem múltiplos fatores, mas uma conclusão provisória, já é esta: 

El declive de la Argentina es un caso único en la historia contemporánea.


Eu acho que o declínio começa bem antes, no golpe de Estado militar contra o presidente Irigoyen em 1930, mas a autora é mais cuidadosa: 

"Medida en términos económicos, la decadencia se volvió evidente en la década de 1970, pero tenía raíces bien plantadas en la época peronista. Con ella terminó un largo ciclo de crecimiento sostenido, equilibrio macroeconómico, estabilidad cambiaria y comenzó otro de inflación crónica, deuda pública y estancamiento."


Mas ela faz uma referência a um livro que vou tratar de ler o mais rapidamente possível: 

"En retrospectiva, salta a la vista: el peronismo construyó su gloria distribuyendo lo que habían acumulado las generaciones anteriores; al hacerlo, secó las fuentes de la prosperidad. Hace tiempo que estoy convencido de ello, más aún después de leer La economía de Perón, libro recientemente coordinado por Roberto Cortés Conde."


Uma resposta, preliminar, está aqui: 

"Cuando lo veo a Perón comparado con Roosevelt, un deporte bastante difundido, se me va el alma a los pies.¿Ignorancia? ¿Mala fe? Comercio exterior nacionalizado, servicios públicos estatizados, monopolio del crédito, sindicato único, proteccionismo, dirigismo, corporativismo, planificación, clientelismo. ¿Sigo? ¡Lo que no inventan para esquivar el espejo! Más que el New Deal, verían reflejado el fascismo."


Mas, isso não é tudo, pois a autora vê uma razão cultural, ou religiosa: a Argentina se rendeu ao catolicismo antieconômico, o que para mim está perfeitamente refletido na "ideologia econômica" do papa Francisco, que para mim é um homem bom, mas é um "peronista econômico". 

"Precios y ganancias, impuestos e inversiones, libre comercio y propiedad privada fueron supeditados a la cruzada contra el "egoísmo" y el "individualismo", doblegados al imperativo de la "justicia social", el ave fénix siempre agitada y nunca encontrada por los gobiernos.

¿Resultado? Desde el nacional catolicismo de los 30 hasta la teología del pueblo de los 80, pasando por el tercermundismo de los 60, el pauperismo cristiano se convirtió en emblema de "argentinidad", corazón del "ser nacional", levadura de la "cultura" del "pueblo". ¿Los mercaderes? ¡Jesús los había echado del templo! ¿La finanza? Estiércol del diablo. ¿La libre empresa? Sospechosa."

 

Um pouco mais adiante, a autora enverga por uma explicação que me parece pura lição de Deirdre McCloskey: 

 

"Quien sufrió las consecuencias fue la burguesía, la que en otros lugares había sido el silencioso motor de las innovaciones científicas, los avances tecnológicos, las revoluciones comerciales. No tanto la burguesía como clase social, sino sus valores: la mentalidad secular, la autonomía individual, la confianza en el progreso, el espíritu innovador, la libertad de empresa, la aspiración al ascenso social, la inversión en el esfuerzo y en talento."

 

A conclusão está aqui, e ela se abre a consequências que valem também para o Brasil, não que nós tenhamos também "enterrado" a burguesia, como fez o peronismo e os argentinos em geral, ao contrário. No Brasil, a burguesia triunfou em toda a linha, mas no fundo, no fundo, todos aqueles valores que afundaram a Argentina também estão presentes no Brasil, a começar pela própria Constituição.

Esta é a conclusão da autora: 

 

"Moraleja: peronistas, nacionalistas, marxistas, católicos, militares, ¡la historia argentina está llena de enemigos de la burguesía! La han derrotado una, diez, cien veces. Que disfruten el triunfo."

 

Pois é, acho que temos algo a aprender com o fracasso, o declínio, a decadência argentina, pois ela fala também de nós.

Como disse Marx, em alguma de suas obras (talvez no próprio Capital), comparando o relativo atraso da Alemanha em face da "triunfante" Inglaterra do seu tempo: "De te fabula narratur", a história fala de você...

Marx previa, claro, os horrores do capitalismo do seu tempo, que se transformaram em triunfo em última instância. Marx estava errado, e a Alemanha não só alcançou como superou a Inglaterra, como o Brasil, de certa forma, alcançou a Argentina em industrialização, mas ainda não superou a Argentina naquilo que realmente importa, em renda per capita. Ainda estamos atrás, não cinco vezes, como um século atrás, mas apenas 15 ou 20%.

Qual é a razão dessa diferença? EDUCAÇÃO!

Pensem! Basicamente educação, mas ainda preciso explicar algo também inexplicável para mim (e algo deve estar errado na medição): a Argentina está atrás do Brasil no PISA da OCDE. Algo deve estar errado: com o Brasil, com a Argentina, com o PISA. Ainda não sei o que é: preciso descobrir, explicar, e tentar evitar que o Brasil siga o triste caminho da Argentina.


Paulo Roberto de Almeida

PS: Grato a meu amigo Pedro Luiz Rodrigues, quem me trouxe este importante artigo para leitura e reflexão. 

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El declive argentino, un caso único en la historia contemporánea

Loris Zanatta

La Nación, Buenos Aires – 20/12/2020

 

¿Cuándo se jodió la Argentina? ¿Por qué perdió el rumbo? ¿Cuándo y por qué comenzó a caer por la pendiente de la decadencia? La pregunta, lo sé, no es nueva ni original. Es más bien vieja y rancia. También está mal planteada. ¿De qué decadencia estamos hablando? ¿Económica, civil, institucional? ¿Moral? Quizás sea inútil: no hay una respuesta única, ni habrá consenso. Sin embargo, no hay forma de evitarla, la realidad la impone: el declive de la Argentina es un caso único en la historia contemporánea.

Medida en términos económicos, la decadencia se volvió evidente en la década de 1970, pero tenía raíces bien plantadas en la época peronistaCon ella terminó un largo ciclo de crecimiento sostenido, equilibrio macroeconómico, estabilidad cambiaria y comenzó otro de inflación crónica, deuda pública y estancamiento. La confianza en el comercio dio paso al mito de la autarquía. En retrospectiva, salta a la vista: el peronismo construyó su gloria distribuyendo lo que habían acumulado las generaciones anterioresal hacerlo, secó las fuentes de la prosperidad. Hace tiempo que estoy convencido de ello, más aún después de leer La economía de Perón, libro recientemente coordinado por Roberto Cortés Conde.

Se dirá que el Estado, el gran Moloch que hoy todos vuelven a invocar, movía entonces los hilos de la economía en todas partes, que la Argentina no fue la excepción. Claro. Pero hay Estado y Estado. Cuando lo veo a Perón comparado con Roosevelt, un deporte bastante difundido, se me va el alma a los pies. ¿Ignorancia? ¿Mala fe? Comercio exterior nacionalizado, servicios públicos estatizados, monopolio del crédito, sindicato único, proteccionismo, dirigismo, corporativismo, planificación, clientelismo. ¿Sigo? ¡Lo que no inventan para esquivar el espejo! Más que el New Deal, verían reflejado el fascismo.

Pero olvídelo, no es ese el punto, no es la razón más profunda del declive de la Argentina. De ser así, habría bastado con cambiar el paradigma económico. Pero nada, los pilares ideológicos e institucionales de la economía peronista se han resistido a la evidencia de sus fracasos. Más: son compartidos por muchos que peronistas no son ni nunca lo serán. Mutatis mutandis, están todavía allí y ¡ay de tocarlos! ¿Habrá una razón?

El peronismo fue sobre todo la revancha de la Argentina católica contra la Argentina liberal, del terruño contra el cosmopolitismo, de lo rural contra lo urbano, del interior contra el puerto, de la herencia hispánica contra las influencias ilustradas. De paso, fue también el triunfo del cristianismo integralista y antimoderno sobre la esperanza de un "catolicismo razonable" abierto a la modernidad. No lo digo yo, lo gritaban a todo pulmón los protagonistas de la revolución peronista.

Para comprenderlo, habrá que recordar el significado histórico del advenimiento del peronismo, a menudo perdido en la bruma del pasado, distorsionado por los manuales de historia. No fue tanto la transición de la política de unos pocos a la política de todos, de la agricultura a la industria, de la "oligarquía" al "pueblo". Hacía tiempo que las masas participaban, la industria progresaba, el Estado se expandía y entre el llamado pueblo y la llamada oligarquía crecían las clases medias. 

¿Por qué es tan importante recordarlo? ¿Qué tiene que ver con la decadencia argentina? Veamos. Si la riqueza de las naciones debió tanto a la separación entre economía y teología, política y religión, ciencia y fe, es evidente que con el peronismo, brazo secular de la "nación católica", la teología colonizó la economía, la religión absorbió la política, la fe se impuso a la ciencia. Mientras que en los países más desarrollados la teología se convirtió en conciencia ética de la economía, en la Argentina la economía se doblegó frente a la teología, se convirtió en instrumento del Estado ético para moralizar al "pueblo". Precios y ganancias, impuestos e inversiones, libre comercio y propiedad privada fueron supeditados a la cruzada contra el "egoísmo" y el "individualismo", doblegados al imperativo de la "justicia social", el ave fénix siempre agitada y nunca encontrada por los gobiernos.

¿Resultado? Desde el nacional catolicismo de los 30 hasta la teología del pueblo de los 80, pasando por el tercermundismo de los 60, el pauperismo cristiano se convirtió en emblema de "argentinidad", corazón del "ser nacional", levadura de la "cultura" del "pueblo". ¿Los mercaderes? ¡Jesús los había echado del templo! ¿La finanza? Estiércol del diablo. ¿La libre empresa? Sospechosa. La "nación católica", habría dicho Antonio Gramsci, goza de una sólida hegemonía. Vender, comprar, ganar se han vuelto verbos inmundos, impulsos inmorales, actividades impropiasLos enemigos del comercio han triunfado, su hacha moralista ha cortado las raíces de la prosperidad, fuente primordial del pecado. Y mientras los "pobres" ascendían al arquetipo de pureza y nacionalidad, a buen salvaje que el buen revolucionario se comprometía a salvar de la civilización, el estigma recaía sobre los demás: clases coloniales, ajenas al "sentir del pueblo".

Quien sufrió las consecuencias fue la burguesía, la que en otros lugares había sido el silencioso motor de las innovaciones científicas, los avances tecnológicos, las revoluciones comerciales. No tanto la burguesía como clase social, sino sus valores: la mentalidad secular, la autonomía individual, la confianza en el progreso, el espíritu innovador, la libertad de empresa, la aspiración al ascenso social, la inversión en el esfuerzo y en talento. ¿Podría la "nación católica" no ir a buscar su cabellera? ¡La burguesía era a sus ojos el vehículo de los "vicios" que desfiguraban la "identidad" de la nación y contaminaban la inocencia del "pueblo"! ¡Era el caballo de Troya de las "ideas extranjeras"! El peronismo la decapitó de raíz. En su lugar, protegida del progreso y de la competencia, de la historia y del pecado, la nueva clase dirigente alistó clientes del Estado, advenedizos del oportunismo político, rentistas de la lealtad al "pueblo". Moraleja: peronistas, nacionalistas, marxistas, católicos, militares, ¡la historia argentina está llena de enemigos de la burguesía! La han derrotado una, diez, cien veces. Que disfruten el triunfo.