POLÍTICA EXTERNA
De olho no próprio umbigo
Ricardo Noblat
O Globo Online, 29/04/2015
No governo Dilma o Itamaraty não tem qualquer relevância. Estamos não apenas perdendo o bonde da história, mas também este legado
Poucas vezes na história brasileira o país foi tão ausente do cenário internacional como agora. É como se não tivéssemos política externa. As crises ética, econômica e política são tão grandes que a presidente Dilma Rousseff simplesmente esqueceu que há um mundo lá fora. Olha apenas para o próprio umbigo.
A irrelevância da política externa do atual governo antecede às crises. Com o fracasso do sonho megalomaníaco de Lula, do Brasil ser um polo alternativo aos Estados Unidos até mesmo no Oriente Médio, sua sucessora fechou-se em um casulo.
O terceiro-mundismo de Lula era proativo. O de Dilma é passivo.
Sua presença no concerto das nações foi até agora meramente protocolar, sem exercer sequer liderança na América do Sul, que dirá no continente.
Durante dois anos ficou de birra com os Estados Unidos, como se ainda vivêssemos nos tempos do “yankees go home”.
No final do semestre vai, finalmente, visitar os EUA, para normalizar uma relação com quem sempre foi um essencial parceiro do ponto de vista comercial.
Não nos iludamos, a presidente vai apenas cumprir tabela. Na volta, o mais provável é que continue de costas para o mundo, como se as crises humanitárias não nos dissessem respeito, como se as cadeias produtivas não fossem uma das grandes tendências do planeta.
Ou como se o Brasil pudesse se dar ao luxo de dispensar acordos bilaterais para se integrar, de fato, na economia mundial.
Todas as apostas do petismo na política externa deram em nada: a prioridade para a relação Sul-Sul e as fichas postas no BRICS, contraposição ao peso da União Europeia e do mercado norteamericano.
O Brasil desindustrializado importa cada vez mais bens manufaturados e exporta matérias primárias, de pouco valor agregado. Por força de erros cometidos no governo Lula e magnificados por Dilma, o petismo está condenando o país a ter uma posição subalterna na divisão internacional do trabalho, a ter uma relação de semi-colônia com os grandes players da economia mundial.
Como se isto fosse pouco, ficamos prisioneiros do Mercosul, dependentes da concordância da Argentina, da Venezuela, da Bolívia para assinar acordos bilaterais com países fora do bloco.
Enquanto isto México, Peru e Chile nadam de braçada, intensificam relações com os Estados Unidos e outros mercados.
E a Argentina, claro, impõe condições às exportações brasileiras e celebra acordo de cooperação econômica e de investimentos com a China.
Em política externa, as coisas acontecem assim. Cada país prioriza seus interesses. Cristina Kirchner, portanto, não está errada.
Quem erra é a nossa presidente, que não observa um princípio elementar de qualquer política externa soberana.
O Itamaraty sempre teve uma política altiva, pautada pela defesa dos interesses nacionais, pela construção de relações pacíficas entre os países e a rigorosa observância dos princípios da não ingerência, da democracia e do respeito aos direitos humanos. Além de um certo pragmatismo no comércio exterior como foi o caso das gestões de Luiz Felipe Lampreia ou Fernando Henrique Cardoso como chanceleres.
No governo Dilma o Itamaraty não tem qualquer relevância. Estamos não apenas perdendo o bonde da história, mas também este legado.
E por falar em irrelevância, quem, de bate-pronto, sabe dizer o nome do atual chanceler?
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quarta-feira, 29 de abril de 2015
O Brasil e a agenda economica internacional 3: qual seria a agenda ideal? - Paulo Roberto de Almeida
O Brasil e a agenda econômica internacional: como e qual seria uma (ou a) agenda ideal para o Brasil?, por Paulo Roberto de Almeida
Mundorama, 29/04/2015

Rate This
A agenda econômica externa do Brasil concerne, basicamente, a dimensão multilateral, pois esta é a principal plataforma negociadora internacional na área econômica desde Bretton Woods e a criação do Gatt, depois incorporado à OMC. Mas essa agenda também compreende as relações que se estabelecem no âmbito regional, pois este é o locus dos acordos de integração econômica, que são essencialmente comerciais, mas que nos últimos doze anos de reino dos companheiros acabou se transformando num aglomerado de compromissos políticos e sociais que pouca relação guardam com os tratados originais. Finalmente, também coexiste com essas duas dimensões, uma agenda no plano bilateral, mas seus componentes estão constituídos por acordos de cooperação, que também têm sua importância na capacitação de recursos humanos e na implementação de projetos setoriais, que geralmente complementam os acordos alcançados nos dois primeiros planos, mas que podem também ser ainda mais ambiciosos do que aqueles (cooperação nuclear, espacial, tecnológica, por exemplo).
Pois bem, vejamos qual poderia ser uma agenda, talvez não ideal, mas pelo menos necessária para que o Brasil realize um enorme potencial hoje represado pelo peso enorme que o Estado exerce sobre cidadãos e empresas, potencial que também foi desviado de um curso que seria quase “natural” em função de uma agenda esdrúxula e exótica, imposta ao país nos últimos doze anos, quando os interesses nacionais foram sacrificados em favor de opções estritamente ideológicas e partidárias, que hoje se revelam estar igualmente vinculadas ao mais gigantesco processo de corrupção jamais visto em nosso país. A “importação” indevida de milhares de “médicos” cubanos, por exemplo, não obedece exatamente a um grande plano de prevenção em saúde da população brasileira, mas tem muito a ver com a situação falimentar da ilha-prisão dos irmãos Castro, que hoje depende de aliados obsequiosos por mantê-la à tona.
O plano multilateral apresenta inúmeras facetas, mas as principais são as de caráter comercial e de tipo financeiro. Neste último capítulo, não existem propriamente negociações a serem feitas, uma vez que o Brasil – depois de enfrentar historicamente crises de insolvência externa, e até uma ou duas moratórias – parece ter aprendido a respeitar os fundamentos de seus equilíbrios nas transações correntes e na balança de capitais; a despeito de déficits constantes nas transações externas, estas têm sido compensadas por investimentos diretos e, em situações normais, por saldos superavitários na frente comercial, o que contudo foi revertido nos últimos anos. A origem dos déficits atuais não é, entretanto, alguma deterioração do cenário mundial – mesmo se alguns keynesianos de botequim vivem alegando um ambiente de crise externa para justificar sua péssima condução da política econômica nacional – e sim a perda lamentável de competitividade por parte das empresas brasileiras vinculadas à exportação. Elas não são tão penalizadas pelo câmbio – uma variável que pode ser contornada por contratos de hedge – quanto pela absurda carga fiscal que é imposta às empresas brasileiras por um Estado extrator e extorsivo.
Esta questão nos remete ao plano comercial multilateral, hoje totalmente paralisado pela incapacidade dos principais atores em dar continuidade à Rodada Doha, nas premissas otimistas em que foi lançada, no início da década passada. Mesmo que, por um milagre, se lograsse concluir essa rodada de negociações com compromissos mais ou menos moderados de liberalização recíproca de mercados e com padrões ainda mais moderados na regulação do acesso às demais áreas – serviços, investimentos, propriedade intelectual, etc. – o Brasil talvez não esteja preparado para desfrutar com maior vigor dessa abertura, tendo em vista sua já mencionada perda de competitividade por razões de ordem inteiramente doméstica. Trata-se de um dever de casa que ninguém e nenhuma negociação multilateral pode cumprir em seu lugar, ou seja, no do governo.
Mesmo na área em que ele é notoriamente competitivo, que é a grande agricultura de exportação – ou seja, commodities agrícolas e carnes, mas podendo evoluir para alimentos processados – os produtores e exportadores brasileiros são penalizados por deficiências ainda mais notórias, a jusante, em sua infraestrutura, como na própria cadeia produtiva, a montante, portanto, em função da tributação generalizada aplicada a praticamente todos os insumos do setor. Como se sabe, a alta produtividade na produção de grãos (mas em outras linhas produtivas também) é neutralizada pelos altos custos, e perdas, no transporte, por uma infraestrutura portuária lamentável, ou por diversos outros aspectos regulatórios e impositivos que fazem com que o produto brasileiro, mais barato do que o dos concorrentes diretos na porteira da fazenda, chegue ao porto de embarque ou de destino bem mais caro em vista dessas deficiências. Sobre isso, se agregam as dificuldades do setor em termos de seguro agrícola e as conhecidas lacunas no rastreamento e prevenção de epizootias e outras endemias típicas da produção comercial primária, sempre mendigando recursos de um governo que tem uma nítida inclinação ideológica por invasores de terras e outros pretensos agricultores familiares (na verdade de subsistência, e sempre assistidos por um ministério espelho ao da agricultura de exportação, que defende uma agenda totalmente diversa deste último).
De resto, no terreno do comércio internacional, qualquer ganho em termos de liberalização agrícola teria de ser barganhado contra uma oferta brasileira de redução do seu próprio protecionismo industrial – sem mencionar a adesão a códigos proprietários mais elevados – o que parece notoriamente difícil a um governo que seguidamente vem implementando “políticas industriais” (aparentemente já foram cinco, sucessivamente) cuja principal característica é a de isolar o Brasil dos circuitos produtivos internacionais. O exemplo mais notório é a indústria automobilística, que permanece “infante”, e portanto protegida, desde mais de meio século. Por fim, ainda nesse terreno, os grandes parceiros parecem ter abandonado de vez qualquer entusiasmo por acordos abrangentes no âmbito da OMC, preferindo em troca negociar acordos minilateralistas, ou seja, tratados plurilaterais de livre comércio engajando os “like-minded countries”, que podem, ou não, situar-se na mesma região geográfica (as distâncias encurtaram, de toda forma). Dois exemplos disso, são o acordo transatlântico – entre EUA e UE – e o trans-Pacífico, que reúne um número variado de países da Orla do oceano, inclusive sul-americanos como Peru e Chile.
O ideal, para o Brasil, e os brasileiros – empresas e trabalhadores – seria que o Brasil participasse ativamente de todas essas frentes de trabalho de maneira aberta e receptiva, mas a condição para isso seria uma alteração drástica de quase todas as suas políticas setoriais, industrial, comercial e de investimentos em infraestrutura, algo que parece fora do alcance do atual governo. A parte industrial e de infraestrutura compete inteiramente, e soberanamente, ao Brasil, podendo portanto ser implementada por uma decisão política de alta inteligência econômica (o que não necessariamente é assegurado pela coalizão de protecionistas atualmente no poder).
Mas a parte comercial não pode, simplesmente, ser sequer considerada sem um entendimento de princípio, e prévio, com os demais membros do Mercosul, essa frágil construção integracionista que, nos últimos doze anos, serviu mais para exercícios de retórica grandiloquente, ou para discursos vazios, do que para, pelo menos, voltar a dar importância aos objetivos básicos e fundamentais desse bloco. Sem isso, ficam carentes de conteúdo tanto as negociações multilaterais, quanto as regionais (de que é exemplo o longuíssimo processo negociador com a UE, que não parece ter pressa de concluí-lo, depois que os três grandes membros do Mercosul implodiram, de modo gratuito e voluntário, o projeto americano de uma área de livre comércio hemisférica).
No Mercosul, em lugar da liberalização recíproca – ou seja, a zona de livre comércio – e da coordenação de políticas macroeconômicas – desejável para o objetivo da união aduaneira –, o que se teve foi uma variedade não essencial de iniciativas secundárias, sobretudo em areas tidas por “sociais”, que não atenderam em nada aos requisitos da integração econômica, que permanece, ou deveria ser, o foco dos tratados originais. O bloco foi inclusive distorcido de sua arquitetura contratual – que requer a plena aceitação da Tarifa Externa Comum e das demais regras de política comercial – primeira pela adesão política, e altamente questionável, da Venezuela (que não cumpriu praticamente nenhum dos requisitos inerentes à união aduaneira), e logo em seguida pelas adesões também duvidosas de Bolívia e Equador, que tampouco parecem propensos a aceitar a estrutura regulatória comercial do Mercosul. Não é preciso mencionar, por outro lado, todas as infrações cometidas pela Argentina contra o espírito e a letra do Tratado de Assunção, ao impor salvaguardas e diversos outros tipos de barreiras contra produtos dos demais países membros, numa derrogação unilateral – e também contrária às próprias regras do Gatt – dos compromissos solenemente firmados.
O ideal, neste caso, seria que o Brasil liderasse um esforço – a ser concluído por nova conferência diplomática – de revisão completa do Mercosul, com vistas a determinar se ele deve continuar com seu atual perfil de união aduaneira incompleta – ou em “implementação”, como pudicamente se proclama – ou se cabe fazê-lo retroceder a uma simples zona de livre comércio, concedendo, assim, liberdade, a cada um dos associados, para negociar acordos comerciais com quem lhes aprouvesse. O Chile, em lugar de ingressar no Mercosul, e ficar amarrado a uma institucionalidade precária, preferiu permanecer isento de qualquer compromisso mais “íntimo” com qualquer bloco – como aliás também é a prática dos Estados Unidos – o que lhe habilita a negociar esquemas de liberalização com ampla gama de parceiros: o país andino possui acordos de livre comércio com algo em torno de 80%, ou mais, do PIB mundial, assegurando ampla penetração de seus bens nos maiores mercados do mundo, compreendendo todo o hemisfério, a UE e boa parte da Ásia e Oceania).
Esse ideal, no entanto, parece difícil de ser concretizado nas atuais condições políticas e econômicas do Brasil, pois implicaria em séria revisão de toda a sua política comercial, industrial e em vasta gama de disposições setoriais regulatórias. Ademais, seria indispensável contar com lideranças políticas com visão de estadista, armadas de estudos econômicos da mais alta competência técnica, para poder decidir, em total conhecimento de causa, quais políticas de desenvolvimento e de relacionamento nessas diversas dimensões seria importante impulsionar na agenda econômica externa. O Brasil precisaria estar disposto a modificar aspectos importantes de seu sistema tributário, de modo a tornar suas empresas mais competitivas, assim como dispor-se a ficar sozinho, no Mercosul, por exemplo, quando decisões de estrita racionalidade econômica e de seu exclusivo interesse nacional assim o determinar.
Da mesma forma, mesmo acordos bilaterais de maior escopo econômico – como podem ser as áreas de tecnologias sensíveis: nuclear, espacial, militar – podem requerer uma mudança fundamental de postura, o que esteve longe de acontecer nos últimos doze anos (ou mesmo antes). O Brasil recusou, por exemplo, todos os acordos de proteção de investimentos estrangeiros, em nome de um vetusto, arcaico, ridículo soberanismo jurídico, que tende a negar soluções arbitrais independentes nessa área, ou que se opõe ao princípio mesmo das controvérsias investidor-Estado a respeito de um investimento qualquer, como se este devesse sempre confrontar interesses privados e se opor a normas por ele mesmo estabelecidas para regular a atividade dos empresários estrangeiros.
Algo semelhante ocorreu com o acordo de salvaguardas tecnológicas com os Estados Unidos, visando viabilizar o lançamento de satélites com componentes – próprios ou no foguete de lançamento – resguardados por segredos comerciais ou com tecnologias sensíveis, em nome, mais uma vez, de um soberanismo tecnológico totalmente equivocado; isso também acarretou imensas perdas tecnológicas ao país, e grandes prejuízos comerciais, pois inviabilizou totalmente a exploração comercial da base de lançamentos de Alcântara. Nessas duas áreas, o ideal seria que o Brasil – ou uma direção mais esclarecida – revisasse totalmente a postura restritiva que se manteve inalterada durante mais de uma década, atrasando de fato o país nesses campos.
A componente dos investimentos, assim como a dos movimentos de capitais também comportam aspectos multilaterais, mas a postura do Brasil infelizmente tem sido, invariavelmente, igualmente restritiva quanto a códigos multilaterais podendo enquadrar esses fluxos financeiros e cambiais (assim como intangíveis de modo geral). O Brasil se opôs, no passado, ao Acordo Multilateral de Investimentos, em negociação (frustrada) na OCDE, bem como sempre se opôs a qualquer regulação multilateral – ou seja, no âmbito do FMI – no tocante a capitais financeiros, ambos elementos possuindo aspectos sensíveis, é verdade, para as políticas monetárias, cambiais ou a respeito de ativos de não residentes. Moeda e finanças constituem os últimos redutos da soberania estatal, mas é preciso reconhecer que a abertura aos movimentos de capitais, a uma maior competição no sistema bancário nacional, a colaboração fiscal internacional (inclusive para prevenir crimes transnacionais, como lavagem de dinheiro e o próprio terrorismo internacional) fazem parte de um mesmo processo de elevação do grau de inserção do país na economia mundial, o que levará, em última instância, à plena conversibilidade do real, um aspecto que beneficiaria amplamente indivíduos e empresas (mas não necessariamente o Estado, que teria de ater-se a normas mais rígidas em todas essas áreas).
Em qualquer hipótese, o que está em consideração em todos esses capítulos, é o aumento das liberdades econômicas dos agentes primários da criação de riquezas, que são as empresas e os próprios indivíduos, uma evolução não apenas natura, como absolutamente necessária se o Brasil pretende se alçar ao batalhão de frente das nações economicamente avançadas e abertas à interdependência global. A recente assinatura de um acordo marco do Brasil com a OCDE, concluído por decisão do novo ministro da Fazenda – contrariando, nisso, a antiga orientação anacrônica de dirigentes econômicos anteriores – é um fato auspicioso, pois significa que o Brasil pode começar a se enquadrar numa moldura de políticas econômicas sólidas, estáveis, e confiáveis, deixando para trás a volatilidade implícita nas mudanças bruscas, improvisadas, setoriais, que costumavam caracterizar os keynesianos de botequim que comandaram a economia brasileira durante vários anos. A OCDE representa, justamente, um tipo de racionalidade econômica estrito senso que há muito faltava às políticas públicas – macro e setoriais – do Brasil, ainda que contrarie todo o arcabouço mental antiquado dos “economistas” que pontificaram no governo desde a década passada.
Amplas camadas de economistas, e de empresários, já se convenceram de que o que cria volatilidade no país não são os capitais externos, mas é o caráter errático das políticas econômicas e das medidas regulatórias, que traz insegurança aos investidores externos, assim como aos próprios domésticos, e torna o ambiente regulatório pouco transparente e previsível. Uma agenda de abertura e de atratividade aos investimentos, que possa maximizar as chances do Brasil nas negociações internacionais tem de começar primeiro pela estabilidade de regras no plano interno, o que esteve longe de ocorrer nos últimos anos. Em consequência de políticas altamente distorcidas e extremamente intrusivas na vida das empresas, a acumulação de capital e os ganhos de produtividade sofreram enorme queda no Brasil, ao mesmo tempo em que se aprofundaram os desequilíbrios orçamentários internos e os de transações correntes no plano externo, trazendo o atual quadro de alta inflação, baixo crescimento, paralisia dos investimentos e perspectivas sombrias de ajuste e de desemprego. Talvez até mais grave do que as dificuldades materiais do presente seja o atraso mental dos seus dirigentes, a falta de lideranças políticas esclarecidas que consigam colocar o Brasil em compasso com o mundo globalizado.
Daí a necessidade de o país adotar uma agenda de modernização em todas as áreas do terreno econômico, como condição para aproveitar as chances abertas pela globalização (como fizeram, aliás, desde muito tempo, o Chile, na América Latina, e diversos países asiáticos da franja do Pacífico). A adoção dessa agenda não depende do mundo, mas apenas de próprio Brasil ou de suas lideranças políticas e empresariais. Não se trata de empreendimento fácil, mas ele é absolutamente indispensável para que o país encontre seu espaço na interdependência global. Reformas são necessárias e elas são sempre controversas, colocando em confronto interesses diversos, como se vê ainda agora mesmo em países tão diversos quanto a França, o México, a própria China.
Pode ser que os mecanismos de governança global – ou seja, a agenda dos organismos econômicos multilaterais, como os de Bretton Woods e a OMC – nos induzam a isso, mas é muito pouco provável. O mais provável é que ameaças de crises internas, ou sobressaltos nos planos financeiro e de balanço de pagamentos nos induzam a correções de rota. Afinal de contas, todas as reformas internas são difíceis e os países só são levados a mudanças profundas e significativas em seu ordenamento econômico e social sob a pressão de eventos desafortunados. O Brasil já acumulou todo um pacote de equívocos sistêmicos (a começar pela sua Constituição) e de erros monumentais de política econômica (como o distributivismo exacerbado, e demagógico, da atual “república sindical”) que está simplesmente atrasando nosso desenvolvimento, ou pelo menos reduzindo as taxas de crescimento econômico. Romper com essas amarras mentais é indispensável para que o país recupere um processo sustentado de expansão de sua economia, única base possível para o aumento da prosperidade nacional.
Quanto antes melhor…
Este é o terceiro de uma série de quatro artigos. O próximo será o seguinte:
- O que o Brasil deveria exatamente fazer para maximizar a “sua” agenda?
Leia os demais artigos da série:
- O Brasil e a agenda econômica internacional:Como se apresenta o cenário econômico internacional da atualidade?
- O Brasil e a agenda econômica internacional: como o Brasil se insere no cenário mundial, agora e no futuro próximo?
Paulo Roberto de Almeida é diplomata e professor do Centro Universitário de Brasília – Uniceub (@pauloalmeida53).
- 2Clique para compartilhar no Twitter(abre em nova janela)
- Compartilhe no Google+(abre em nova janela)
- 19Compartilhar no Facebook(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Pocket(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Pinterest(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no Tumblr(abre em nova janela)
- Clique para compartilhar no LinkedIn(abre em nova janela)
- Clique para enviar por email a um amigo(abre em nova janela)
- Clique para imprimir(abre em nova janela)
Corrupcao no Brasil: sempre vencendo a "justica"; Petralhabras respira aliviada
STF dá um tiro no pé do juiz Sérgio Moro. Valha a pergunta: a quem serve a decisão?
1 Blog Do Orlando Tambosi, 28/04/2015
A interpretação dos ministros do STF pendeu para o cumprimento estrito da lei. A decisão foi por 3 a 2. Apenas um voto de Minerva decidiu, o de Gilmar Mendes. Se a minoria da turma 2 do STF tomou posição contrária é porque entendeu que a gravidade política, social e econômica em que vive o país, imerso na corrupção petista, apresenta risco institucional, já que a "organização criminosa" age dentro do governo e de suas empresas. Bom juiz é aquele que sabe pesar os danos de sua decisão - e que, portanto, na interpretação da lei, nem sempre pode ser tão literal.
Importante lembrar, também, que a prisão preventiva dos réus, na esfera em que atua o juiz federal Sérgio Moro, tem sido fundamental para o aggiornamento que ele trouxe ao Direito brasileiro através da delação premiada - que desbaratou quadrilhas em vários países. Os corruptos, por certo, são radicalmente contra, dentro e fora do governo. Nada de "seguir o dinheiro".
Por último, cabe a pergunta: a quem aproveita tal decisão (Cui prodest, segundo o latim)? Obviamente, aos corruptos, começando pelos próprios empreiteiros presos e os políticos envolvidos, além de Lula, amigo do chefe do Clube do Bilhão, Ricardo Pessoa, que estava se dispondo à delação premiada.
Agora, com prisão domiciliar, é duvidoso que ele prossiga as negociações - sem contar que estará mais sujeito às pressões dos figurões que temem o petrolão: ele já bate às portas dos poderosos. Afinal, basta "seguir o dinheiro".
Diante disso tudo, a conclusão é óbvia: a decisão do STF foi, na verdade, um tiro no pé de Sérgio Moro e dos investigadores da Operação Lava Jato.
terça-feira, 28 de abril de 2015
O Brasil e os 70 anos de Bretton Woods - Paulo Roberto de Almeida (GV Direito)
Apenas hoje, e isto graças ao Google Scholar, que "descubro", de surpresa, que um artigo meu de meados do ano passado, fazendo um balanço da longa história de relacionamento (com altos e baixos) do Brasil com as instituições de Bretton Woods, especificamente com o FMI, foi finalmente publicado, como anotado agora em minha ficha:
Abstract: The
purpose of this historical essay is to follow Brazil’s relationship with IMF,
in the context of the international monetary order, since Bretton Woods up to
our days. The essay starts by IMF’s itinerary, emphasizing the 1971 change in
the exchange regime pattern, follows the development of its relationship with
Brazil, the various formal stand-by agreements contracted under different
economic policies, arising from current transactions crises; a first agreement
was adopted in 1958, and discontinued for political reasons, but the last one,
concluded in 2003, was also interrupted for political reasons two years later.
Attention was given to the main problems facing the IMF –exchange stability,
liquidity, and the monitoring of the national economies – and to the
circumstances that forced Brazil to enter into formal agreements with the IMF.
Brazil’s relationship with the IMF was somewhat erratic, with phases of
attraction
followed by others of
repulsion; there was a cooperative stance – at the beginning and during the
whole military regime, as well as around the turn of the millennium –, another
confrontational or adversarial – in the Kubitschek government and at the
redemocratization –to arrive at a transformation from dependent borrower to a
creditor pushing for reforms in order to enhance its voting rights in both
Bretton Woods institutions; a final table summarizes those agreements and the
amounts involved in each one.
Introdução: o Brasil e o FMI, desde
Bretton Woods
Tabela – Brasil: acordos formais estabelecidos com o FMI, 1958-2010
“O Brasil e
o FMI desde Bretton Woods: 70 anos de História”
Revista Direito GV (vol. 10, n. 2, 2014, p. 469-495; ISSN: 1808-2432;
Relação de Originais n. 2636; Publicados n. 1160.
O BRASIL E O FMI DESDE
BRETTON WOODS: 70 ANOS DE HISTÓRIA*
BRAZIL AND IMF SINCE BRETTON WOODS: A 70 YEARS HISTORY
Paulo
Roberto de Almeida
Diplomata de carreira; Professor no programa de
mestrado e doutoramento em Direito do Centro Universitário de Brasília
(Uniceub).
Resumo: O objetivo deste ensaio histórico é o de acompanhar o relacionamento do
Brasil com o FMI, no contexto da evolução do sistema monetário internacional,
desde Bretton Woods até a atualidade. O ensaio começa por retraçar o itinerário
do FMI, com destaque para a mudança de padrão cambial em 1971, e segue com o
exame das relações entre o Brasil e a instituição, com ênfase nos acordos
contraídos sob diferentes políticas econômicas e em momentos diversos de crises
nas transações externas; o primeiro acordo foi rompido por razões políticas em
1958, e o mais recente, de 2003, foi suspenso em 2005, antes de sua conclusão,
também por motivos políticos. São destacados os problemas enfrentados pelo FMI
no período – estabilidade cambial, liquidez, monitoramento das economias
nacionais – e as circunstâncias que levaram o Brasil a contrair seus muitos
acordos com a instituição. O país manteve uma relação errática com o FMI, com
aproximações e distanciamentos ao longo do período, oscilando entre uma postura
cooperativa – no início e durante a maior parte do regime militar, bem como no
final dos anos 1990 e início do novo milênio –, e uma outra de rejeição ou
confrontação – no governo Kubitschek e na redemocratização –, finalizando por
uma passagem da situação de devedor dependente, na maior parte desse longo
período, a uma de credor e demandante por reformas na instituição, na fase
recente, quando o país busca aumentar seu poder de voto nas instituições de
Bretton Woods; uma tabela final lista os acordos concluídos pelo Brasil com o
FMI e os valores envolvidos em cada um.
Palavras-chave: Brasil; FMI; acordos; regimes cambiais; dívida
externa; crises de transações correntes.
Keywords: Brazil; IMF; agreements; exchange regimes; external debt; current
transactions crises.
* Este artigo conta, para além da análise da literatura secundária, com
uma revisão de fontes primárias e de materiais constantes do acervo pessoal do
autor, envolvendo negociações e discussões preparatórias para negociações
internacionais nesta área da política financeira externa do Brasil. Destaca-se,
em especial, o acompanhamento direto do assunto como chefe da Divisão de
Política Financeira do Itamaraty, nos anos 1995 a 1999 e, depois, na Embaixada
do Brasil em Washington, de 1999 a 2003. Todas as posições aqui apresentadas
são, no entanto, de responsabilidade exclusiva do autor.
Sumário:
1 O FMI
começou no Brasil, dois anos antes de Bretton Woods...
2 Os direitos
especiais de saque também
começaram no Brasil
3 Os
desequilíbrios acumulam-se e Nixon
corta o nó górdio de Bretton
Woods
4 Os choques
do petróleo e a crise da dívida latino-americana dos anos 1980
5 Encontros e
desencontros entre o Brasil e o FMI nas duas décadas perdidas
6 As crises
asiáticas e a moratória russa: o Brasil volta ao FMI
8 A esquerda anti-FMI e o fim dos acordos formais
Conclusões:
70 anos de um relacionamento errático
Tabela – Brasil: acordos formais estabelecidos com o FMI, 1958-2010
Assinar:
Comentários (Atom)
Postagem em destaque
Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida
Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...
-
Rewriting the Rules of Foreign Aid: Geopolitics, Power, and the New Diplomacy In the world of international relations, foreign aid is not si...
-
FAQ do Candidato a Diplomata por Renato Domith Godinho TEMAS: Concurso do Instituto Rio Branco, Itamaraty, Carreira Diplomática, MRE, Diplom...
-
Israel Products in India: Check the Complete list of Israeli Brands! Several Israeli companies have established themselves in the Indian m...
-
Países de Maior Acesso aos textos PRA em Academia.edu (apenas os superiores a 100 acessos) Compilação Paulo Roberto de Almeida (15/12/2025) ...
-
Uma preparação de longo curso e uma vida nômade Paulo Roberto de Almeida A carreira diplomática tem atraído número crescente de jovens, em ...
-
Mais uma listagem de antigos trabalhos sobre paz e segurança, em vista deste debate próximo: 17h30 – Evento online – transmissão ao vivo no...
-
Reproduzo novamente uma postagem minha de 2020, quando foi publicado o livro de Dennys Xavier sobre Thomas Sowell quarta-feira, 4 de março...
-
Pequeno manual prático da decadência (recomendável em caráter preventivo...) Paulo Roberto de Almeida Colaboração a número especial da rev...
-
Itamaraty 'Memórias', do embaixador Marcos Azambuja, é uma aula de diplomacia Embaixador foi um grande contador de histórias, ...
