quinta-feira, 16 de abril de 2020

Das vantagens de ser um diplomata acidental - Paulo Roberto de Almeida (2017)



A melhor diplomacia não se sustenta sem uma boa governança doméstica.
Seria a diplomacia brasileira um ponto fora da curva?
Paulo Roberto de Almeida
Apresentação ao livro
Quinze anos de política externa: ensaios sobre a diplomacia brasileira, 2002-2017
Brasília: Edição do Autor, 2017, 366 p. 
Disponível na plataforma Academia.edu; link:


Este livro de ensaios foi montado de maneira improvisada, e pode sofrer de alguma repetição, sobretudo nos trabalhos voltados para a análise dessa coisa que eu chamei de lulopetismo diplomático. Mas ele reflete, com certa acuidade, minha produção intelectual sobre a diplomacia brasileira ao longo desta primeira década e meia do século XXI. Tentando terminar rapidamente esta assemblagem de alguns dos muitos artigos que elaborei, desde 2002, não contei com o tempo adequado para escrever uma apresentação formal. Consoante, entretanto, meu forte espírito contrarianista, permito-me revelar aqui – o que não é exatamente uma confissão – que sou uma espécie de contestador das verdades reveladas, aquilo que os franceses chamam de idées reçues, ou seja, o pensamento banal, aceito como correto nos mais diferentes meios em que essas ideias se aplicam, mas geralmente de forma equivocada ou, talvez, ingênua.
E por que digo isto, ao iniciar a apresentação de um livro de “ideias já recebidas”, ou pelo menos de ensaios já publicados? É porque eu já fui chamado, certa vez, de accident prone diplomat, ou seja, alguém que busca confusão, o barulho, no meu caso, de fato, mais a expressão de um ceticismo sadio do que uma simples provocação ou a contestação gratuita. Com efeito, eu não me deixo convencer com certas idées reçues nos meios que frequento, e estou sempre à busca de seus fundamentos, justificações, provas empíricas, testemunhos de sua adequação e funcionamento no ambiente em que deveriam operar, em condições normais de pressão e temperatura, enfim, o entendimento convencional de como é ou de como deve funcionar a diplomacia, em especial, a nossa, esta tida por excelente e que, aparentemente, não improvisa. Talvez devesse fazê-lo, em certas ocasiões...
Na verdade, antes de ser um accident prone diplomat, se isto é correto (o que duvido), creio ser um diplomata acidental, alguém que se dava bem na academia, e que resolveu, num estalo, ser diplomata. Posso até recomendar esta profissão, aos que gostam de inteligência, de cultura, de viagens, de debates sobre como consertar este nosso mundo tão sofrido, aos que são nômades por natureza (como é o meu caso e, mais ainda, o de Carmen Lícia), menos talvez aos que pouco apreciam um ambiente meio estilo Vaticano, meio espírito Forças Armadas. Com efeito, hierarquia e disciplina são os dois princípios que estão sempre sendo lembrados aos jovens diplomatas como sendo a base de funcionamento desta Casa aparentemente tão austera, tão correta, tão eficiente no tratamento das mais diversas questões da nossa diplomacia. Confesso, também, que nunca fui um adepto zeloso desse rigorismo no trato de pessoas segundo convenções estabelecidas.
Atenção, acima eu disse diplomacia, que é uma técnica, e não política externa, que pode ser qualquer uma que seja posta em marcha pelas forças políticas temporariamente dominantes no espectro eleitoral do país. Política externa pertence a um governo, a um partido; a diplomacia pertence a um Estado, que possui instituições permanentes, entre elas essa que aplica a política externa de um governo por meio da diplomacia. E por que então o conceito de “acidental” que inaugura esta apresentação? Não preciso responder agora, e provavelmente nem depois, mas a resposta talvez esteja em cada um dos ensaios reunidos nesta coletânea de artigos escritos desde o início do milênio. Ninguém, por exemplo, há de recusar o fato de que, desde 2003 pelo menos, o Brasil vive tempos não convencionais, nos quais assistimos coisas nunca antes vistas na diplomacia, que por acaso é o título de meu livro mais recente: Nunca antes na diplomacia...: a política externa brasileira em tempos não convencionais (Curitiba: Appris, 2014). Aliás, nossos tempos são decididamente não convencionais menos pela diplomacia do que por uma série de práticas exacerbadas naquele terreno que pertence ao domínio da moral.
Pois bem, reunindo tudo o que eu escrevi nos parágrafos anteriores – diplomata acidental, hierarquia, disciplina, ideias de senso comum, etc. – e juntando tais conceitos aos ensaios aqui compilados, os leitores terão uma explicação para o sentido geral de minha obra, anárquica, dispersa, contestadora, por vezes contrarianista, mas explorando o lado menos convencional da diplomacia, aquele que destrincha certas verdades reveladas e ousa apresentar outras ideias que não necessariamente fazem parte do discurso oficial. Esta talvez também seja a razão de eu apreciar, muitíssimo, uma seção da revista Foreign Policy, desde a sua reorganização por Moisés Naím, que se chama “Think Again”, ou seja, reconsidere, ou pense duas vezes, pois a resposta, ou a explicação pode não estar do lado que você costuma encontrar, mas que talvez esteja escondida em alguma dobra da realidade, por uma dessas surpresas do raciocínio lógico, por alguma astúcia da razão ou por algum outro motivo que se encontra enterrado, e quase esquecido, na história.
A vantagem de ser um diplomata acidental está justamente no fato de poder perseguir (nem sempre impunemente) o outro lado das coisas, e de poder contestar algumas dessas idées reçues que passam por certezas consagradas, ou pela única postura possível no funcionamento convencional da grande burocracia vaticana, que também leva jeito de quartel (mas acordando um pouco mais tarde). Durante todos estes anos em que venho escrevendo sobre política externa, tenho podido exercer meu lado irreverente e pouco convencional para tratar de aspectos muito pouco convencionais de nossa diplomacia nestes anos do nunca antes (agora, felizmente, terminados). 
Atenção: muitos dos ensaios aqui coletados não brotaram, originalmente, de trabalhos de pesquisa, ou daquilo que se chama, usualmente, de scholarly work, isto é, o produto derivado de estudos meticulosos, ou objeto de revisão cega por pares, material que está mais propriamente coletado em meus livros publicados. Eles são, eu diria, peças de simples divertimento intelectual, ainda que vários deles contenham aparato referencial (notas de rodapé, bibliografia, citações doutas, etc.) e também sejam o reflexo de muitas leituras sérias e anotadas ao longo de meus anos de estudo e trabalho. Mas, destinados a veículos mais leves, e não a revistas científicas, eles constituem reflexões de um momento, de um problema, de uma conjuntura, de algum evento que valia a pena registrar em um artigo mais curto.
Vários ensaios foram publicados em veículos como Mundorama ou Meridiano 47, ambos dirigidos por meu amigo Antonio Carlos Lessa, do IRel-UnB. Mas o que vai aqui compilado foi retirado de meus próprios arquivos, em processador usual de texto, para contornar os problemas de formatação de texto em suporte digital, mas corresponde, em princípio, aos originais, embora não necessariamente ao que foi publicado. Nem tudo o que publiquei vai aqui reproduzido, em ordem cronológica sequencial. Ficaram de fora diversos artigos circunstanciais, todas as resenhas de livros – já coletadas em outras publicações digitais que organizei – e alguns textos de menor importância.  Coloquei uma listagem seletiva dos ensaios mais importantes num apêndice, ao final do volume, onde também figuram os respectivos links para revisão eventual das publicações. Essa lista representa uma pequena parte de uma produção mais ampla, que se dedica também às relações econômicas internacionais do Brasil, à globalização, a temas regionais (como a integração, e dentro desta ao Mercosul), questões diversas da política internacional e da economia mundial.
O lado divertido de ser um diplomata acidental está justamente na possibilidade de se poder escrever livremente sobre assuntos sérios e menos sérios, com a liberdade editorial que só existe nos veículos leves, sem precisar cumprir todo o ritual passavelmente aborrecido dos requisitos acadêmicos ligados às revistas “sérias” – como a RBPI, por exemplo, com a qual também colaboro, de diversas maneiras – e sem precisar atentar para a langue de bois normalmente associada às publicações oficiais, onde aquele lado Vaticano inevitavelmente predomina. Foi nestes ensaios que eu explorei o lado meio escondido de certas verdades reveladas do meio profissional, uma atividade que sempre me deu imenso prazer por combinar com meu jeito contrarianista de ser. 
Dito isto, preciso voltar minhas energias para coisas mais sérias, como por exemplo o segundo volume de minha história das relações econômicas internacionais do Brasil, que me espera desde vários anos a partir da conclusão do primeiro volume (Formação da Diplomacia Econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império; 2001, 2005, 2017). Em todo caso, sempre que posso estou me divertindo com este tipo de exercício intelectual, aqui representado por uma dezena e meia de textos supostamente “diplomáticos”, vários publicados apenas em revistas digitais, alguns outros em publicações mais sérias, inclusive em meus próprios veículos de divulgação. Tenho como regra coletar no blog Diplomatizzando (que me serviu de “quilombo de resistência intelectual” nos anos patéticos do lulopetismo), tudo o que encontro de inteligente circulando pelo mundo, o que também compreende vários dos textos aqui reproduzidos. Espero que eles sirvam a um debate igualmente inteligente.
Vale!

Paulo Roberto de Almeida

quarta-feira, 15 de abril de 2020

China: o que eu penso sobre ela - Paulo Roberto de Almeida

Na sequência da postagem anterior, que transcreveu editorial do jornal de direita Gazeta do Povo (que fazia propaganda de sua própria genialidade e queria capturar assinaturas), coloco aqui o que já escrevi no plano bilateral: 


Sobre a China e seu suposto “desejo” de levar uma “guerra irrestrita” contra o Ocidente
A um amigo, militar, que me questionou sobre a questão do título desta nota, respondi o seguinte:

Os EUA do imediato pós-guerra (em muito estimulados por Churchill) estavam empenhados numa longa “guerra de contenção” contra um inimigo poderoso: o stalinismo. Isso conformava não apenas uma luta pela existência de democracias de mercado, mas um combate mortal pela própria sobrevivência da sociedade livre e civilizada, contra os novos bárbaros do comunismo. Eles resistiram e a eles devemos ser gratos pela nossa liberdade.
Mas a China representa uma realidade muito diferente, e lamento que os mais brilhantes analistas ocidentais, pelo menos americanos, se tenham deixado seduzir pela paranoia (normal) do Pentágono e pelo anticomunismo primário (que é estúpido) da velha e da nova direita, o que também contaminou os néscios novos bárbaros do olavo-bolsonarismo e seus asseclas oportunistas e beócios que pululam em volta da miserável “governança” que é a nossa atualmente.
Esqueça o “comunismo”, que é apenas um pequeno parênteses histórico de meros 70 anos na milenar trajetória cultural e civilizatória da China. Ela é, sempre foi, aquele “despotismo oriental” de que falava o marxista Karl Witfogel, ou, antes dele, o sociólogo Max Weber.
A China não quer exportar o seu regime político ou sequer “dominar o mundo”, como acreditam os paranoicos e os muito mal informados. Ela só quer ficar rica, como é o seu direito, e para isso utiliza-se de todos os meios ao seu dispor no sistema internacional, inclusive com um recurso malicioso dos mecanismos do sistema multilateral de comércio. Nisso os americanos estão na defensiva, algo canhestramente, pois suas indústrias e consumidores precisam desesperadamente da China.
Quanto ao “fabuloso” poderio militar chinês, ele (ainda?) não foi concebido para qualquer projeção externa (exceto para se livrar dos piratas que infestam certos mares e que atacam navios cargueiros com suas preciosas manufaturas): ele apenas se destina a garantir que a gloriosa China não seja mais humilhada pelas potências ocidentais (até de segunda ordem), como ocorreu no século XIX (guerras do ópio, tratados desiguais, que se prolongaram até 1943), ou com as bárbaras invasões japonesas no século XX, e o cortejo de horrores como se viu em Nanjing (1937). 
A China é uma autocracia para si e “contente” de sê-lo. 
Os bolsonaristas idiotas ainda não aprenderam isso, a despeito de, no fundo, terem o mesmo ânimo autocrático, como aliás os lulopetistas neobolcheviques (também havia os simplesmente ignorantes, como é a maioria dos bolsonaristas).
Creio que sintetizei o meu pensamento sobre a China, mas tem muito mais a dizer sobre os imensos benefícios à Humanidade que decorrem do fato de ser a China, hoje, a maior potência capitalista do mundo (o que não tem nada a ver com democracia ou direitos humanos, que pertencem a uma outra esfera).

Em novo questionamento sobre a "dependência" em que muitos países estariam hoje da China, e sobre a necessidade de "autonomia produtiva", respondi o seguinte: 

"... não creio que a China seja nacionalista no plano do comércio internacional. A despeito de recusar ingressar na OCDE e no Clube de Paris, ela é atualmente a mais internacionalista das economias de mercado.
Hoje em dia, e cada vez mais, todos os países são “dependentes” da China. Deveriam aprender a ser complementares.
Eu fico com Adam Smith na divisão social do trabalho e com David Ricardo na teoria das vantagens comparativas relativas. Quaisquer outras posições, ou seja, nacionalistas, são antieconômicas, ou seja, diminuem o bem-estar. Pode ser que haja um preço a pagar em certas esferas, mas a racionalidade dos mercados integrados ainda me parece a melhor solução."

E sobre um novo argumento sobre a "concorrência", ou efeitos "danosos" de certas políticas econômicas, voltei a expor o seguinte: 

"... esse último argumento NÃO TEM NADA A VER com o que faz ou deixa de fazer a China: depende única e exclusivamente de nós mesmos, ou seja, de nossa (in)capacidade de sermos produtivos e competitivos.
Até algumas décadas atrás, éramos (ainda somos em várias esferas) inteiramente dependentes dos EUA e países europeus, para capitais, tecnologia, know-how, patentes, comércio, finanças, educação, TUDO. Que agora sejam os chineses a fornecer um pouco disso tudo, o que muda, na prática? A política econômica é NOSSA, não determinada pela China ou pelos EUA."

Paulo Roberto de Almeida

China: o que pensa a direita sobre ela - Gazeta do Povo

Transcrevo, como sempre faço neste espaço plural, aberto a todas as discussões inteligentes sobre temas relevantes, mas sem endossar estas palavras e conceitos, a postura do jornal de direita Gazeta do Povo sobre a China.
Em postagem subsequente expressarei a minha opinião.
Paulo Roberto de Almeida
 A cobertura exclusiva da Gazeta do Povo não ficou presa à condenação do termo “vírus chinês”
Para muita gente, o debate sobre o papel da China na atual crise do coronavírus ficou restrito ao termo “vírus chinês”, prontamente desqualificado como uma forma de preconceito pela plateia politicamente correta.

Pode até parecer indelicado usar o termo “vírus chinês”, mas encerrar a discussão por aí seria prematuro. O governo chinês teve papel ativo em como o mundo encarou a epidemia provocada pelo coronavírus em seu princípio. Em seguida, passou a usar seu poderio industrial para dar início a uma espécie de “diplomacia sanitária” para ajudar países durante a crise da Covid-19.

Mesmo quem se opõe ao uso da expressão “vírus chinês” não pode ignorar alguns fatos dos últimos meses. A reação das autoridades chinesas, em um primeiro momento, foi de abafar as notícias sobre o aparecimento de um novo vírus na província de Wuhan.

Também é um fato que a resposta da Organização Mundial da Saúde (OMS) inicialmente foi errática. O diretor da entidade, o etíope Tedros Ghebreyesus, foi apoiado pela China na eleição na qual derrubou um outro candidato britânico.

A imprensa não tem trânsito livre na China e teve dificuldades para cobrir a extensão da epidemia, incluindo seus efeitos sobre a circulação dos cidadãos chineses. Mesmo assim, está claro que o custo para a contenção da doença foi uma restrição ainda maior de liberdades. E não é possível ter segurança sobre a real situação em todas as regiões do país.

Falar sobre a China no Brasil virou um tabu porque o país tem sido defendido fortemente pela esquerda. Mas é preciso conversar sobre o regime chinês e seu papel na atual crise de uma maneira séria.

A Gazeta do Povo, buscando garantir o direito à informação de seus leitores e a manutenção de uma linha editorial independente, abriu um amplo espaço para a discussão desse tema na atual cobertura sobre o coronavírus.

Para começar, publicamos um artigo de Ben Shapiro em que ele argumenta que não existe nada de errado em usar a expressão “vírus chinês”.

Diz ele: “É inacreditável que o termo seja controverso. O vírus realmente teve origem na China. Mais do que isso, a ideia de que o governo chinês deveria ser protegido das consequências de suas medidas tirânicas e seu governo patológico é de uma perversidade sem igual.”

O colunista Rodrigo Constantino vai mais longe: "A ditadura chinesa tinha que indenizar o mundo todo pelo #VirusChines que virou pandemia por comportamento criminoso do regime.

Essas são algumas opiniões que você só encontra na Gazeta do Povo, que também publicou análises sobre o novo momento da diplomacia da China, que tem uma face truculenta. Assinantes têm acesso ilimitado ao conteúdo.

Veja outras sugestões de leitura:

Só um veículo com coragem e convicções fortes publica conteúdos sem vergonha de falar sobre a ditadura chinesa dessa forma.

Em outras reportagens exclusivas, contamos quem é o diretor da OMS amigo da China e explicamos por que a próxima pandemia provavelmente virá do país oriental.

É preciso reconhecer que o regime chinês colocou para funcionar a máquina de monitoramento de seus cidadãos e que isso representa um risco também em países democráticos, onde pode haver a tentação da cópia.

A Gazeta do Povo defende a democracia e a liberdade promovida pela economia de mercado. E justamente por isso tem dado espaço para análises e reportagens exclusivas sobre o que acontece na China. Esta crise é transitória e não podemos correr o risco de trazer um problema maior de longo prazo: o autoritarismo.

Esse trabalho jornalístico único na imprensa brasileira é fruto do apoio direto de uma comunidade muito engajada de assinantes. São pessoas comprometidas com o futuro do Brasil e que acreditam na força do capitalismo, do empreendedorismo e da liberdade.
(...)


terça-feira, 14 de abril de 2020

Trajetória do pensamento brasileiro: dois séculos de produção intelectual (2) - Paulo Roberto de Almeida

Segunda parte de meu curso especial no Uniceub, com disponibilização do Power Point de apresentação e debate – pois a apostila está reservada aos alunos – para os que se interessam pela nossa trajetória intelectual: 

3365.“Trajetória do pensamento brasileiro: dois séculos de produção intelectual (2)”, Brasília, 14 abril 2020, 11 slides. Apresentação da segunda parte da aula online, na continuidade do trabalho 3616 (de 3/04/2020), no quadro de Seminário Jurídico Avançado no Mestrado em Direito do Uniceub. Distribuído em Power Point para os alunos. Disponibilizado em Academia.edu (link pdf: https://www.academia.edu/42739379/Trajetoria_do_pensamento_brasileiro_dois_seculos_de_producao_intelectual_2_2020_; link em PP: https://www.academia.edu/42739454/Trajetoria_do_pensamento_brasileiro_dois_seculos_de_producao_intelectual_2_2020_).

A primeira aula foi esta: 

3616. “Trajetória do pensamento brasileiro: dois séculos de produção intelectual”, Brasília, 2 abril 2020, 9 slides. Apresentação da primeira parte da aula online dada em 3/04/2020, no quadro de Seminário Jurídico Avançado no Mestrado em Direito do Uniceub. Distribuído em Power Point para os alunos. Disponibilizado em Academia.edu (link pdf: https://www.academia.edu/42573925/Trajetoria_do_Pensamento_Brasileiro_dois_seculos_de_producao_intelectual_-_Aula_1; link em PP: https://www.academia.edu/42573926/Trajetoria_do_Pensamento_Brasileiro_dois_seculos_de_producao_intelectual_-_Aula_1_PP_).  






Recessões e recessões no Brasil: as importadas e as nossas

Recessões no Brasil: separando os choques externos de internos


Nem todas as recessões se parecem, e cabe separar aquelas derivadas de choques externos.
Deixo de lado a de 1908, bastante severa, pois tenho de fazer ainda algumas investigações históricas.
Vou direto para a “mãe de todas as crises”, a de 1929, que nos afetou em  1930-31, mas da qual nos recuperamos rapidamente, com algumas medidas “keynesianas avant la lettre”, ou seja, sem qualquer teorização ou instrução do mestre de Cambridge, que ainda estava tentando se recuperar das suas especulações em Bolsa, depois de queda de 1929.
Não foi culpa nossa, obviamente, e aproveitamos para avançar no processo de substituição de importações. Houve uma queda em plena Segunda Guerra, o que é absolutamente normal.
A próxima, a de 1981, resulta diretamente do segundo choque do petróleo, em 1979 (e não tínhamos feito o dever de casa no primeiro choque), mas mais exatamente do aumento dos juros americanos no mesmo momento, pelo presidente do Fed, Paul Volcker. O Brasil não conseguiu mais pagar os juros da dívida, que triplicaram, e teve de apelar a empréstimos-ponte dos banqueiros comerciais, e o fez pela recorrente negociação de acordos de créditos stand-by do FMI, nenhum deles implementado corretamente ou completamente, pois nunca cumprimos as condições.
Nossa decadência econômica começou aí mesmo, pois NUNCA mais conseguimos crescer a taxas vigorosas e sustentadas. 
A crise de 1990 deriva tanto do Plano Collor, que sequestrou poupanças e congelou a economia, como da hiperinflação deixada por Sarney: quando este passou o poder a Collor, a inflação rodava a a80% ao mês.
A dupla crise de 2015-16, essa sim, NÃO TEM NADA a ver com choques externos ou hiperinflacionários, mas sim deriva inteiramente da INCOMPETÊNCIA economica de Dona Dilma e seus meninos amestrados, que produziu a mais grave recessão de nossa história feita inteiramente no país: no total, um déficit orçamentário que chegou a 10% do PIB, um decréscimo no PIB de 8% no total e de 10% no PIB per capita, que deixou 12 milhões de desempregados, e a mais violenta confusão nas contas públicas do Brasil.
A que se anuncia agora, inédita sob qualquer critério, foi produzida pela pandemia, mas ocorre no contexto de um país com baixo crescimento, déficits elevados sem solução na presente conjuntura, desemprego em elevação, e sem perspectivas no futuro imediato.

Paulo Roberto de Almeida
Leitor de história econômica
Brasília, 14 de abril de 2020

Anti-China phobia in USA and another countries - Ishaan Tharoor (WP)

 By Ishaan Tharoor
with Ruby Mellen
 Email
The Washington Post, April 14, 2020

It’s not just Trump who’s angry at China

President Trump at the White House on Monday. (Leah Millis/Reuters)
President Trump at the White House on Monday. (Leah Millis/Reuters)
In Washington, it’s politically expedient to point a finger at China. Though President Trump has softened his rhetoric about Beijing’s initial concealing of the novel coronavirus that then sparked a global pandemic, he is now directing his scorn at the World Health Organizationfor the U.N. body’s role in praising China’s handling of the crisis and endorsing a narrative of the outbreak’s spread that suited the Chinese regime.
Blaming China and international agencies helps Trump obscure the evidence of how his administration early on failed to prepare for the virus’s spread through the United States — preparations that could have savedlives.
For hawks in Congress, the pandemic has provided epochal proof of China’s perfidy and alleged dishonesty. Bipartisan anti-China bills are circulating, including one condemning Chinese censorship and blaming Beijing for the spread of the virus and another that demands China shut down its wet markets (where the disease is thought to have emerged from animal-to-human transmission). The most vociferous anti-Beijing voices are pressing for measures to decouple the two nations’ economies and sharpen the lines of geopolitical confrontation. Sen. Tom Cotton (R-Ark.) declared over the weekend that it’s time “to quarantine China from the civilized world.”
Chinese officials and the country’s state-controlled media launched a counteroffensive, aggressively pushing back against foreign criticism while proliferating conspiracy theories that alleged a U.S. origin to the virus. At the same time, Chinese authorities see the pandemic as a vehicle with which to exercise their fledgling soft power, offering its experience in curtailing the spread of the virus as a model for others and casting itself as a benign global actor eager to come to the rest of the world’s rescue.
But it’s not just the Americans who have their doubts about Beijing’s approach. “It is obvious that such narratives are being worked on,” said German foreign minister Heiko Maas in an interview with Der Spiegel last week. “But I can only warn against anyone falling for it."
Throughout the world, various governments and politicians have directly challenged China or are now more wary of engagement with its regime.
The pandemic has prompted Britain’s two main spy agencies to reportedly warn the government about Beijing’s assertive behavior and call for tighter control of Britain’s digital communications and artificial intelligence industries.
As part of its coronavirus stimulus, the Japanese government allocated at least $2 billion to encourage its companies to shift production supply chains out of China. Meanwhile, both Taiwan and Vietnam have undercut Beijing’s coronavirus diplomacy, dispatching their own shipments of medical aid to beleaguered countries in the West.
 
 
In some places, nationalist politicos are echoing American grievances. Some officials in India’s ruling BJP party — and their legion of online supporters — have embraced the stigmatizing rhetoric of the “Chinese” or “Wuhan” virus popular in America’s right-wing media sphere.
As part of his own feuds with rival factions in Rome, Matteo Salvini, the far-right Italian leader, scoffed at Chinese offers of assistance and accused Chinese authorities of engineering new viruses in their laboratories to spring on the world, a claim that has no evidence. “If the Chinese government knew [about the virus] and didn’t tell it publicly, it committed a crime against humanity,” Salvini said during a debate last month.
Allies of far-right Brazilian President Jair Bolsonaro — another leader accused of bungling his country’s response to the pandemic — have sought to turn media attention east. “It’s China’s fault,” Eduardo Bolsonaro, one of the president’s sons, tweeted last month, while retweeting a message that said: “The blame for the global coronavirus pandemic has a name and surname: the Chinese Communist Party.”
The tweet drew a tough response from the Chinese Embassy in Brasilia, which demanded an apology for the “evil insult” and suggested the president’s son had contracted a “mental virus.” But there was more to come.
Last week, Brazil’s education minister Abraham Weintraub, who, unlike some other cabinet-level officials, remains staunchly loyal to the president, warned of Beijing manipulating the crisis to its advantage. “Geopolitically, who will come out stronger from this global crisis?” he wrote in a tweet that was later deleted, which in its original Portuguese replaced the “r” in “Brazil” with an “l” — an apparent mockery of a Chinese accent. “Who in Brazil is allied with this infallible plan for world domination?”
 
Chinese officials once more protested, aggrieved by Weintraub’s perceived racism. But it is actions in China that have governments in Africa accusing Beijing of xenophobia. Social media was agog over the weekend with footage of African expatriates living in China’s major cities — particularly Guangzhou, a southern metropolis with possibly the biggest African diaspora in Asia — sleeping on sidewalks or huddled outside the buildings from which they had been arbitrarily evicted by authorities.
An intensifying nationalist climate within China has also led to reports of foreigners, especially Africans, being refused entry at bars and restaurants or forcibly quarantined in their apartments, even if they haven’t traveled anywhere where they would have contracted the virus.
“The Chinese authorities’ actions triggered protests from African governments — an embarrassment for Beijing as it seeks to woo African states with promises of loans and investment — and prompted U.S. diplomats over the weekend to warn African Americans to avoid the Guangzhou area,” noted my colleague Anna Fifield.

A insustentável estratégia da diplomacia brasileira - Hussein Kalout

A diplomacia olavo-bolsonarista é de uma incompetência tão atroz, tão estúpida e tão nefasta, do ponto de vista dos interesses nacionais, que sequer o conceito clássico de “alinhamento automático” serve para caracterizar sua submissão abjeta aos interesses pessoais do presidente Trump. Alinhamento com o quê? Não aos Estados Unidos, que tampouco possuem uma política externa definida, racional; o que prevalece nos EUA são os instintos primitivos do pior presidente americano, assim como também não temos NENHUMA política externa, apenas os instintos primitivos do pior presidente da nossa história. O que existe é um adesismo sabujo ao personagem, exemplificado pelo boné “Trump 2920” do inepto 03 — que nunca ouviu falar de Kissinger —, a quem se submete vergonhosamente o chanceler acidental.
Paulo Roberto de Almeida

A insustentável estratégia da diplomacia brasileira
Políticos, diplomatas, militares, acadêmicos e empresários imaginaram que a realidade iria servir como barreira natural para a nova doutrina das relações exteriores do País. Se enganaram.  
Hussein Kalout 
O Estado de S.Paulo13 de abril de 2020

Desde que o presidente Jair Bolsonaro venceu a eleição presidencial de 2018, foi exibido ao teatro político nacional uma inédita moldura de como o Brasil pretendia defender os seus interesses estratégicos e projetar o seu poder nas relações internacionais. 

Apesar das desconfianças e da perplexidade com a heterodoxia da nova orientação da “política exterior” do País, políticos, diplomatas, militares, acadêmicos e empresários imaginaram que a realidade iria servir como barreira natural de contenção para as descalibradas aventuras que se prenunciavam e o pragmatismo, logo acabaria, com o tempo, predominando sobre a frívola proposta que foi apresentada à Nação. 

O novo corolário doutrinário das relações exteriores do País trazia consigo um equívoco de concepção: desprezar na largada os tabuleiros de fácil e imediata maximização dos interesses nacionais em troca da projeção de hipotéticas vitórias em tabuleiros mais volúveis e de alta complexidade – e isso, obviamente, sem os necessários recursos que delimitam o poder real de dissuasão de um país. 

China e EUA foram transformados em dilema. O presidente, durante a campanha e após a campanha, não poupou esforços para atacar um país e louvar o outro. O inquilino da Casa Branca tornou-se referência moral e padrão estratégico a ser seguido pelo Palácio do Planalto. Até os erros, inertemente, são macaqueados.

No marco dessa difusa equação, a reafirmação de lealdade a esse alinhamento passou a estar consubstanciado no constante antagonismo com a China, na agressividade retórica na América do Sul e no abandono do equilíbrio dos temas médio orientais.  

O bolsolavismo acreditava que poderia modular duas narrativas, que, apesar de ambivalentes, poderiam funcionar sem custo diplomático. Erro crasso! Em seu torpe ideário, provocar um choque frontal com os chineses serviria a dois propósitos: 1) alimentar os ignorantes agitadores digitais de sua bolha ilusória nas redes sociais; e 2) reforçar os laços com Washington de aliado obediente e comprometido com a causa anti-China. A sua turva visão não alcançou, até o momento, a compreensão de que os EUA querem seguidores e não sócios na partilha de qualquer espólio comercial envolvendo o mercado chinês.  

Irritar a China publicamente e contemporizar os danos nos bastidores – para capitalizar com americanos e aplacar a ira dos chineses – é uma estratégia falida. É como caminhar no fio da navalha com uma granada na cintura.

Os bolsolavistas não sopesaram em seus cálculos a virulência da reação chinesa. Julgaram que o pragmatismo chinês amorteceria a sua infantilidade institucional e o que prevaleceria, ao fim e ao cabo, são os negócios – puxados sempre pelos competentes adultos do Ministério da Agricultura e pela prudência dos generais.  

O governo Bolsonaro criou um falso e desnecessário dilema para definir o papel do Brasil no contexto das relações do Brasil-China-EUA. Elevar as relações entre Brasília e Washington ao patamar de uma parceria estratégica – ou mesmo uma aproximação nos termos imaginados por Bolsonaro – não deveria excluir a expansão da relação política e comercial com Pequim. Uma agenda profícua com a China não deveria implicar, por outro lado, distanciamento dos EUA. 

Para jogar no tabuleiro geoestratégico em meio às duas superpotências mundiais – cujos recursos de poder são superiores aos nossos –, o Brasil precisa ter clareza das consequências. Atacar Pequim, sem ter para onde escoar as suas commodities e sem saber como substituir os investimentos no setor energético e de infraestrutura do País, é de um amadorismo atroz.

Enquanto o bolsolavismo não quebrar a criptografia das regras de engajamento que regulam as relações sino-americanas, é melhor o Brasil manter uma distância segura em relação a esse embate.

A diplomacia do governo Bolsonaro não dá sinal de querer ser governada pela razão, pelo pragmatismo ou em defesa dos interesses estratégicos do País, mas, sim, monetizar em votos apoiadores fanáticos a serviço de seu projeto de poder – mesmo que isso arruine a relação do Brasil com China, França, Alemanha, Argentina ou o inimigo fabricado da vez.

HUSSEIN KALOUT, 43, é Cientista Político, Professor de Relações Internacionais e Pesquisador da Universidade Harvard. Foi Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (2016-2018) e atuou como consultor das Nações Unidas e do Banco Mundial. Escreve semanalmente, às segundas-feiras.

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