segunda-feira, 4 de agosto de 2025

As consequências econômicas de Mister Trump - Paulo Roberto de Almeida (Radar Político)

Trabalho mais recente publicado:
5008. “As consequências econômicas de Mister Trump”, Brasília, julho 2025, 3 p. Artigo para o boletim do Ranking dos Políticos, abordando a destruição da cláusula de nação mais favorecida por Trump. Publicada no Radar Político, boletim do Ranking dos Políticos (n. 229, 4/08/2025).
Vou colocar o texto abaixo e no blog Diplomatizzando:

As consequências econômicas de Mister Trump

Paulo Roberto de Almeida, diplomata, professor.
Artigo para o boletim do Ranking dos Políticos, abordando a destruição da cláusula de nação mais favorecida por Trump. Publicada no Radar Político (n. 229, 4/08/2025)

        As Consequências Econômicas de Mr. Churchill foi um segundo “panfleto”, que o já famoso economista Keynes publicou, em 1925, contra a decisão do então ministro do Tesouro britânico, Winston Churchill, de voltar a cotar a libra em ouro na mesma paridade que existia no período anterior à Grande Guerra, o que Keynes considerava uma decisão fundamentalmente errada, pois não levava em conta a inflação acumulada durante a guerra e no pós-guerra. O título aproveitava, é claro, o sucesso do primeiro livro, As Consequências Econômicas da Paz, publicado em 1919, contra o Tratado de Versalhes, que atribuía toda a culpa da guerra à Alemanha e lhe impunha compensações financeiras extremamente pesadas, que se estenderiam durante 40 anos, ou seja, até os anos 1960. Keynes dizia que tão severas imposições poderiam precipitar uma nova guerra mais adiante: ele foi, de certa forma, um profeta, apenas que com 20 anos de antecipação.
        Keynes também tinha razão quanto à paridade de 1925: a decisão causou uma crise tão grave no ano seguinte, que precipitou uma greve geral e a saída de Churchill do governo. O presidente Trump está em vias de precipitar uma crise nos Estados Unidos provavelmente tão grave quanto a crise e a recessão derivadas da paridade equivocada da libra britânica em 1926. A grande diferença está em que as medidas de Trump afetarão não apenas o seu país, mas praticamente o mundo inteiro, dada a enorme interface entre a economia americana com os demais 195 países contra os quais ele está impondo uma nova “paridade” para as tarifas aduaneiras até o ano passado protocoladas na OMC em nome dos EUA para regular o seu comércio com o universo completo de parceiros comerciais do país, ou seja, o mundo todo.
        Para compreender a enormidade e a gravidade das medidas totalmente mal concebidas e erraticamente aplicadas pela sua segunda administração bastaria dizer que Trump está simplesmente implodindo o sistema multilateral de comércio existente desde o final da Segunda Guerra Mundial, ao ignorar completamente a principal cláusula do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, na sigla em inglês), a de nação mais favorecida, muito mais antiga e consolidada do que os 78 anos do GATT e os 31 anos da OMC. A cláusula NMF constitui o eixo central do moderno sistema de comércio multilateral, ao lado dos demais princípios nele integrados (tratamento nacional, reciprocidade, não discriminação e a eliminação de restrições quantitativas). Provavelmente por ignorância rudimentar em história econômica, mais provavelmente por arrogância autoritária, Trump desprezou por completo o conjunto de regras existentes, estabelecidas pelos próprios Estados Unidos e seus principais parceiros, primeiro em Bretton Woods (1944), depois em Genebra, em 1947, como forma de superar a Grande Depressão dos anos 1930, produzidas justamente pelo protecionismo dos EUA desde aquele ano, aprofundado pelas restrições cambiais e de pagamentos adotadas pelos demais países como resultado das crises bancárias em 1931. A ordem econômica global atualmente existente foi principalmente construída pelos “pais fundadores” americanos do sistema multilateral de comércio nos anos finais da Segunda Guerra Mundial e nos primeiros tempos da ONU e do GATT. Trump disparou mísseis protecionistas contra tudo isso, o que justificaria, plenamente, que todos os demais membros do sistema multilateral de comércio expulsassem os EUA do GATT e da OMC, como primeiro passo para a reconstrução de uma arquitetura absolutamente essencial para o funcionamento adequado dos intercâmbios em bens e serviços, para a prosperidade do mundo, para a previsibilidade das trocas comerciais.
        A cláusula de nação mais favorecida deita raízes em plena idade média, como uma espécie de tendência natural da Lex Mercatoria, fazendo com os estados em construção naquele período adotassem como regra prática a equalização de suas tarifas aduaneiras, para evitar conflitos em função de tratamentos diversos para os diferentes parceiros comerciais. Ela foi sendo aplicada de maneira condicional e restrita, nos acordos bilaterais de comércio e navegação, até ser adotada de maneira ilimitada, incondicional e irrestrita nos acordos contraídos ao abrigo do primeiro GATT (reformado, mas não quanto a isso, em 1994, quando se criou a OMC, o terceiro pé da ordem econômica concebido em Bretton Woods).
        Trump ignora, despreza, confronta tudo o que seus antecessores das administrações americanas das últimas oito décadas fizeram para trazer paz e prosperidade a um mundo dilacerado, primeiro pelas restrições comerciais e cambiais introduzidas desde 1930, depois pela mais terrível guerra global até então conhecida pela comunidade internacional. O chamado “tarifaço” que ele introduziu, de forma unilateral contra TODOS os parceiros comerciais dos EUA é, antes de tudo, ilegal e irracional, contrário ao próprio bem-estar dos EUA e seus habitantes, e ao Direito Internacional Econômico, penosamente construído ao longo dessas décadas. As medidas são principalmente contraditórias com o suposto objetivo declarado do presidente, introduzir reciprocidade nos tratamentos tarifários bilaterais e fazer com que os EUA reduzam o seu déficit comercial e tornem novamente o país um grande produtor próprio dos produtos atualmente importados, o que é uma missão impossível.
        A ignorância econômica de Trump se revela, em primeiro lugar, no que concerne as possibilidades de transformar os EUA, uma economia atualmente de serviços (e superavitária nesse aspecto), novamente em grande país industrial. O que Trump pretende, bizarramente, é fazer os EUA retornarem à época da segunda revolução industrial, a do carvão, a do petróleo, a do motor à explosão, um estágio da evolução econômica do seu país ultrapassado nos cem últimos anos, já disputando com a China a liderança tecnológica na quarta ou na quinta revolução industrial. O segundo equívoco é o de acreditar que tarifas aduaneiras – que são pagas exatamente pelos importadores e consumidos americanos – sejam capazes de trazer de volta indústrias nas quais os EUA não mais possuem mais vantagens comparativas, nem podem recuperar por um ato governamental de duvidosa legalidade ou utilidade para tal.             Trump está criando as condições para um surto inflacionário nos EUA, e construindo um atraso econômico jamais visto no país desde a Grande Depressão dos anos 1930.

[Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 5008, 29 julho 2025, 3 p.]

 


A difícil geopolítica do (ou para o) Brasil - Carlos Alberto Torres

Qual a única alternativa para que o Brasil possa exercer plenamente a sua soberania?

Carlos Alberto Torres

Em primeiro lugar, precisamos partir de uma premissa: não somos uma potência bélica ou nuclear.

Considerada essa premissa como um fato, precisamos nos perguntar: a emergência da China como potência econômica, bélica e nuclear acabou com o mundo unipolar sob a hegemonia dos EUA?

Se isto é verdade, passaremos a viver uma nova guerra fria entre os EUA e a China? Será reproduzida a velha guerra fria do passado entre os EUA e a URSS? Lembremos que estas não  entraram em guerra diretamente apenas porque possuíam capacidades dissuasórias suficientes para se amedrontarem mutuamente!

Se o mundo que se configura é esse – o da bipolaridade –, as nossas chances de soberania são diminutas. Os US possuem uma longa experiência de derrubar governos, democratas ou não, que tentaram se alinhar dubiamente em sua área de influência. É este o mundo que está na cabeça do Trump.

Mas existe uma outra alternativa, e apenas uma: a de que o mundo que esteja sendo formatado seja o da multipolaridade. É este o desejado pela China, por concepção histórica, necessidade (já que emerge pegando de susto o atual hegemon) e por estratégia.

Neste espaço instável, soberania significa neutralidade. Conseguiríamos formar um sistema de aliança com outros países, também neutros, que pudessem escapar, digamos assim, do fogo cruzado entre as grandes potências? Ou, na tentativa de fazer isso com uma política independente, seremos abatidos em pleno vôo?

Este é o nosso dilema. Se o governo que será eleito em 2026 continuar a ser o da bipolarização “Lula x Bolsonaro”, teremos pouca chance de soberania. Um porque será derrubado, o outro porque já nascerá vassalo!

Mas se a nossa inteligência adaptativa conseguir produzir um governo soberano de unidade nacional, ocidental e democrático teremos chance! Seremos capazes disso?

(Lido em 1/08/2025)

Uma revolução geopolítica apresentada ao Parlamento francês pela Deputada Sophia Chikirou - Arnoud Bertrand

Arnoud Bertrand escreveu:

Este pode ser o documento geopolítico mais notável que já vi sair de uma grande instituição europeia neste século.

O Parlamento francês acaba de produzir um relatório extraordinário de 153 páginas que pede nada menos que um realinhamento estratégico completo da Europa.

O documento desmantela sistematicamente o atual posicionamento geopolítico da UE — "vassalado" aos EUA, nas palavras do relatório — como um fracasso catastrófico que levou a UE a ver "sua influência diminuir e seus interesses mal protegidos".

O relatório detalha 50 recomendações, desde a "criação de uma moeda mundial comum" (recomendação nº 14) para desdolarizar a economia global até "substituir a estratégia da UE na região Indo-Pacífico por uma abordagem cooperativa que inclua a China" (recomendação nº 11).

Em geral, a recomendação central do relatório é que a Europa se liberte da subordinação atlântica e, em vez disso, alcance autonomia estratégica por meio de uma parceria com a China.

Isso marcaria uma reversão histórica completa: pela primeira vez desde a era colonial, o Ocidente histórico escolheria uma parceria estratégica igualitária com uma nação do Sul Global como alternativa às estruturas de aliança ocidentais.

O relatório está em francês, então escrevi um artigo detalhado detalhando suas descobertas e recomendações mais explosivas e explicando por que esta pode ser sua última chance de evitar a irrelevância em um mundo multipolar.

Veja o relatório aqui:

https://www.assemblee-nationale.fr/dyn/17/rapports/due/l17b1588_rapport-information.pdf

RAPPORT D’INFORMATION

DÉPOSÉ PAR LA COMMISSION DES AFFAIRES EUROPÉENNES (1)sur les relations entre l’Union européenne et la Chine, 

ET PRÉSENTÉ PAR MME SOPHIA CHIKIROU, Députée

Vou dar um tempo: boa sorte a todos - Paulo Roberto de Almeida

De onde menos se espera é que não vem nada mesmo, dizia o Barão de Itararé. 

Alguém já ouviu falar de barata tonta?

Ou de geleia geral?

Seria por acaso o Brasil?

Escrever sobre o Brasil atual — seus problemas políticos, suas realizações em muitas áreas (que também as há), seus embates comerciais e diplomáticos, a confusão que existe em diversas pautas das políticas públicas — está ficando cada vez mais difícil, tamanhas são as indefinições vindas das supostas elites governantes (dos três poderes).

Tenho a impressão de que, em virtude do sociopata que pretende ser o imperador do mundo, a confusão vai continuar no futuro previsivel, e o Brasil vai enfrentar novas frustrações em breve tempo.

Creio que vou me limitar, nos próximos meses, a leituras sobre o Brasil do século XIX, no máximo a primeira metade do século XX. Coisas do passado.

O mundo que veio depois disso não mais existe, e nem sabemos o que vai ser colocado no lugar: Putin, Trump, ditadores variados, populistas de esquerda e direita estão convertendo o planeta num lugar muito complicado. 

Por isso, acho que nem adianta ficar comentando cada nova burrice que aparece no noticiário, do Brasil e do mundo. 

Vou me retirar para minhas bibliotecas e ficar quietinho. Divirtam-se, vcs que ainda persistem. 

Boa sorte a todos…

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4/08/2025

Livro: História e historiografia das relações internacionais do Brasil: dos descobrimentos ao final do Império - Paulo Roberto de Almeida (finalizando)

Um novo livro quase terminado:

Paulo Roberto de Almeida
História e historiografia das relações internacionais do Brasil: dos Descobrimentos ao final do Império

Índice

Prefácio, 5

Introdução: cinco séculos de construção da nação
1. Relações internacionais e inserção econômica global no longo prazo, 9

        Parte I: Da Colônia à Independência
2. A diplomacia dos descobrimentos: de Colombo a Tordesilhas, 33
3. A formação econômica brasileira antes da autonomia política. 53
4. Hipólito da Costa e o nascimento do pensamento econômico brasileiro, 79
5. A revolução liberal de 1820 como precursora da independência do Brasil, 101
6. Hipólito da Costa, a censura ao Correio Braziliense e a independência do Brasil, 113
7. Um imenso Portugal? A hipótese do império luso-brasileiro no século XIX, 131
8. A diplomacia brasileira da independência: heranças e permanências, 163

        Parte II: Da Diplomacia Imperial ao Século XX
9. O reconhecimento internacional da independência do Brasil, 191
10. Os primeiros passos da diplomacia imperial, 205
11. A construção da diplomacia imperial por um de seus fundadores: Paulino, 215
12. A diplomacia da escravidão, 227
13. A diplomacia da imigração, 257
14. A diplomacia financeira, 271

     Parte III: Historiografia e história das relações internacionais do Brasil
15. A historiografia da independência: revisão bibliográfica, 309
16. A historiografia econômica do Brasil, 333
17. Uma síntese da historiografia diplomática até a primeira metade do século XX, 347
18. Uma geopolítica avant la lettre: Varnhagen e a reforma do Império, 381
19. Uma história da política externa brasileira apresentada aos militares, 421

        Anexos: cronologia e documentos históricos
20. Cronologia histórica até a independência do Brasil, 445
21. Documentos fundadores do território brasileiro, 459
    a) Tratado de Tordesilhas, 1494, 459
    b) Carta de El-Rei de Portugal D. Manuel aos Reis Católicos, 1501, 461
    c) Tratado de Madri, 1750, 463
    d) Manifesto às nações amigas, 1822, 467

Referências bibliográficas, 479


Livro: Oswald Brierly: diários de viagens ao Rio de Janeiro, 1842–1867 - Pedro da Cunha e Menezes (org.)

Oswald Brierly: diários de viagens ao Rio de Janeiro, 1842–1867

Rio de Janeiro: Estúdio Andrea Jakobsson, 2025

https://loja.jakobssonestudio.com.br/wp-content/uploads/2021/05/Oswald.jpg 

Descrição:

O Rio de Janeiro da segunda metade do século XIX, visto da Baía de Guanabara – com seus contornos e exuberante floresta – já fazia jus ao título de Cidade Maravilhosa. Oswald Brierly, um dos maiores pintores marinhistas britânicos, passou por aqui três vezes, entre 1942 e 1867, e ficou fascinado. Brierly era desenhista oficial de navios ingleses que tinham como destino a Austrália, então colônia inglesa, que se reabasteciam no Rio, um dos portos mais movimentados do mundo naquela época. Os relatos e desenhos das suas duas primeiras viagens, a bordo das embarcações Wanderer (1841) e Meander (1852) estavam esquecidos na Biblioteca Estadual de Nova Gales do Sul, na Austrália, e permaneceram inéditos, até serem descobertos por Pedro da Cunha e Menezes. Diplomata baseado em Sydney, Pedro realizou um verdadeiro trabalho de ourivesaria para decifrar, traduzir e organizar os manuscritos que compõem os dois primeiros capítulos do livro. Na terceira parte, são reproduzidos trechos do diário do cruzeiro do H.M.S. Galatea, publicado em Londres, em 1869.

“Em meados do século XIX, dava-se a corrida pela descoberta e colonização da Oceania e Ilhas do Pacífico Sul. Inglaterra e França sucediam-se no envio de expedições destinadas a inventariar a fauna e a flora, bem como a mapear e a avaliar a fertilidade dos solos, o estoque de madeira e o potencial econômico geral daqueles cantos do globo”, explica Pedro da Cunha e Menezes em sua apresentação do livro.

Brierly deu a volta ao mundo duas vezes e foi um dos artistas mais viajados de sua época. Além de conceituado desenhista e pintor, foi um bem sucedido cronista, baleeiro, etnógrafo e historiador. Apaixonado pelo mar, Briely passou grande parte de seu tempo nele, onde dormia, fazia as refeições, trabalhava e desenhava. É pelo mar que o jovem de 24 anos avista pela primeira vez o Rio em 1841. Brierly retratou os contornos da cidade e o movimento das embarcações na Baía de Guanabara, a paisagem e a natureza da Floresta da Tijuca e da Serra dos Órgãos. Em seus diários, abordou também questões diplomáticas entre Brasil e Inglaterra e o tráfico de escravos.

Na terceira e última vez que visitou a cidade, em 1867, acompanhando o Príncipe Alfred, Duque de Edimburgo, foi a bailes de gala e jantares oficiais com a presença de D. Pedro II; freqüentou o Paço da Cidade e a Quinta da Boa Vista, e tomou sorvete com a Princesa Isabel e com o Conde d’Eu no palácio que hoje abriga a sede do Governo do Estado do Rio de Janeiro, em Laranjeiras.

“Sua visão do Rio de Janeiro é marcada, tanto nos traços pictóricos quanto nos relatos, por um encantamento com a natureza maravilhosa, vista principalmente do mar em oposição a uma cidade caótica e simplória”, escreve Pedro.


domingo, 3 de agosto de 2025

Trump está vencendo? - Samuel Pessoa (FSP)

 Samuel Pessôa

Pesquisador do BTG Pactual e do FGV IBRE e doutor em economia 


Trump está vencendo? 


Republicano tem conseguido fechar acordos comerciais favoráveis a ele 

Trump tem fechado acordos em que os Estados Unidosimpõem uma tarifa de importação e a contraparte não tarifa os americanos. Foi assim com o Japão e com a União Europeia. É necessário sabermos os detalhes dos acordos, as letras miúdas, mas tudo sugere que há, sim, certa assimetria. Somente com a China parece não haver essa discrepância.

Esse desfecho não é surpreendente. Pela escala da economia americana e por ter um déficit estrutural, a perda de bem-estar resultante de uma guerra comercial é menor para os EUA.

As simulações sugerem que, em uma guerra comercial aberta —todos contra todos—, as perdas dos EUA são bem menores do que as dos demais países. Os EUA perdem em bem-estar o equivalente a 1% do consumo. A América do Sul perde 3%, e a Europa, de 7,5% a 10%. A China perde de 13% a 20%.

Os autores do estudo, publicado no volume 4 (de 2014) do Handbook of International Economics, consideram, em suas simulações, a América do Norte conjuntamente. O estudo é rico o suficiente para considerar competição imperfeita e a existência de cadeias globais de valores, além de heterogeneidade entre as empresas dentro de um mesmo país.

O ponto importante a reter é que os EUA têm um maior poder de barganha. E o está exercendo. É essa a explicação para os acordos com o Japão e a União Europeia.

O maior poder de barganha, no entanto, parece que não tem funcionado para a China. Também esperado. O poder de barganha segue da perda de bem-estar em caso de guerra tarifária aberta. Ora, perda de bem-estar é uma ameaça crível entre democracias. Não é o caso chinês. Xi não terá de enfrentar eleições nos próximos anos. Merkel já havia incorrido no mesmo erro com Putin: vínculos comerciais não moderam ditadores.

Trump também tem sido bem-sucedido em seu empenho em desvalorizar o dólar. A ver os efeitos de longo prazo que colherá. Mas em um primeiro momento ajuda na competitividade da economia, um dos seus objetivos mais importantes.

Então podemos afirmar que Trump está ganhando? Penso que não. Há sinais de que a desaceleração chegou. O crescimento da economia americana no primeiro semestre foi de 0,6%, ou 1,2% se anualizarmos a taxa. A economia antes de Trump crescia a 2,5% a 3%.

Parte da desaceleração é fruto da política monetária que finalmente parece bater na demanda. O crescimento do consumo no primeiro semestre foi de somente 1%, já considerando a taxa anualizada. Antes de Trump, rodava em média a 3%.

De qualquer forma, o choque inflacionário fruto da política tarifária, que começa a aparecer nas estatísticas —de março a junho a inflação ao consumidor acumulada em 12 meses cresceu 0,3 ponto percentual—, atrasará e reduzirá a intensidade do ciclo de queda de juros. 

Mas o mais importante é que a trumponomics, em prazos maiores, matará a força do crescimento americano das últimas décadas. A taxa de crescimento da produtividade, maior do que na Europa, deverá cair como consequência da desglobalização induzida por Trump. O ataque às universidades somente agravará a longo prazo o desempenho da produtividade americana.

Para a esquerda brasileira, parece-me que sobram duas lições. A primeira é que ninguém ganha quando o presidente da República ataca diretamente o presidente do Banco Central.

Em segundo lugar, vale lembrar todo o ruído e a campanha contra a globalização capitaneada pela esquerda nas últimas décadas. Tanto se pediu que apareceu um líder empenhado em realizar o desejo da esquerda brasileira. Não parece ser positivo para o Brasil ou para o mundo.

 

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...