O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Uniceub Direito: excelencia confirmada

Recebo a seguinte mensagem do coordenador, Marcelo Varella, dos programas de mestrado e doutorado em Direito do Uniceub, ao qual estou associado:

"Prezados colegas, o resultado da avaliação quadrienal foi publicado e foi confirmada nossa nota 5.
Nosso curso foi o segundo mais produtivo do país.
Alguns dados importantes para nossa estratégia de agora em diante:
"MUITO BOM - programas com desempenho acima de 523 pontos por Docente Permanente na produção intelectual e mais de 232 pontos por Docente Permanente na produção intelectual nos estratos mais elevados."
Em outras palavras, acertamos na nossa meta de 200 pontos/ano.
No entanto, atenção para o outro requisito:
MUITO BOM: o programa no qual pelo menos 60% do corpo docente permanente atingiu mais de 400 pontos por ano;
Parece que conseguimos também, mas graças ao fato que 60% professores estão com mais do dobro do mínimo que exigimos."

O que posso dizer?
Faço parte dessa equipe e também ofereci minha contribuição para esse itinerário de busca de excelência na acumulação "primitiva" de pontos, ou seja, colaborei para a pontuação final e global, mesmo não sendo eu do Direito, e sim um modesto sociólogo e economista aprendiz.
Paulo Roberto de Almeida

A reconstrucao do Brasil, com a ajuda da globalizacao: livro de Jose Fucs - Paulo Roberto de Almeida


A reconstrução do Brasil, com a ajuda da globalização

Paulo Roberto de Almeida

Tenho em mãos este livro: José Fucs, A Reconstrução do Brasil: os grandes desafios do País para alcançar o desenvolvimento sustentável, a estabilidade política e o bem-estar social (São Paulo: O Estado de S. Paulo, 2017, 149 p.), que foi elaborado a partir das muitas reportagens feitas pelo repórter especial do Estadão entre setembro de 2016 e janeiro deste ano, às quais foram acrescidos alguns editoriais do jornal, feitos justamente a propósito de temas especiais levantados nas matérias sobre inúmeros problemas do Brasil nesta fase de transição para uma nova situação que ainda não sabemos exatamente do que será feita. Partimos da suposição de que esse futuro será melhor do que a atual fase de crise econômica, política, social (e profundamente moral), na verdade a maior recessão já enfrentada pelo Brasil em toda a sua história econômica, um legado maldito do governo companheiro anterior.
Como é meu hábito, e vício profissional enquanto diplomata, busquei no livro quais seriam os problemas detectáveis neste série de reportagens que teriam origem no cenário internacional ou que poderiam ser atribuídos a questões externas ao Brasil. Para minha frustração, não encontro nenhum: simplesmente não existem, nos diversos problemas focados por José Fucs, com base em pesquisas extensas, leituras intensas e conversas com especialistas em cada uma das áreas selecionada, qualquer um que possa ser vinculado a algum obstáculo internacional, a alguma característica negativa do sistema de comércio mundial, alguma defecção de investidores estrangeiros, sabotagem dos centros financeiros, má vontade de organismos internacionais; simplesmente não consigo detectar qualquer restrição externa ao Brasil enquanto economia emergente. Na verdade, existe sim, uma questão, que é a da questão da abertura comercial (objeto de um editorial do jornal publicado em 8/12/2016, com base numa das matérias feitas por Fucs), mas que não constitui de fato um problema, e sim trata-se de uma solução, ou seja, é algo que o Brasil precisa fazer em seu próprio benefício, não para fazer favor a qualquer exportador externo, ou atender a acordos comerciais.
Todos os demais problemas detectados, e objeto de uma quinzena de capítulos, segundo as matérias publicadas, são problemas perfeitamente brasileiros, totalmente construídos no Brasil, inteiramente made in Brazil, a 150%, se ouso dizer. Listo aqui, pela ordem: a reforma das reformas (a tal de Constituição cidadã, que é propriamente esquizofrênica do ponto de vista econômico), o ajuste fiscal, a batalha contra os privilégios, o rombo recorde da Previdência, a flexibilização do trabalho (parcialmente empreendida recentemente), a luta contra a burocracia, o cerco à roubalheira, o peso colossal dos tributos, um ambiente mais amigável para os negócios, o peso absurdo do protecionismo comercial (incorporado sob o conceito de “renascimento na arena global”, e que foi justamente objeto do editorial mencionado acima), o desmonte do Leviatã, os desafios da retomada do crescimento, a descentralização do poder e a modernização dos sindicatos (uma tarefa que eu mesmo julgo impossível, pois eles se converteram em “máquinas de extração de dinheiro” e em obstrutores das reformas).
Segundo depreendo do conjunto das matérias preparadas e muito bem editadas por José Fucs, a totalidade dos problemas e a integralidade das reformas necessárias são devidas única e exclusivamente a nós mesmos, erros, equívocos, deformações de nossas políticas públicas e de funcionamento das instituições, questões que cabem apenas ao Brasil e aos brasileiros resolver, para superar o atual quadro pavoroso feito de milhões de desempregados, o crescimento medíocre ou inexistente, as desigualdades sociais e regionais persistentes e a infraestrutura deficiente. O mundo, a globalização, o sistema internacional, como constatado pela experiência de crescimento de países emergentes, na própria região e especialmente na Ásia Pacífico, são absolutamente favoráveis à retomada de um processo sustentado (e sustentável) de crescimento no Brasil. Sob qualquer critério que se examine, cabe reconhecer uma massa colossal de liquidez ávida de aplicação, sob a forma de investimentos diretos ou de capitais de empréstimos, a permanência de um protecionismo comercial setorial ou limitado ((com a possível exceção da área agrícola), um ambiente cada vez mais favorável à interdependência entre economias abertas e propensas a aceitar os novos requerimentos dos intercâmbios globais (que não se limitam a tarifas ou acesso a mercados, mas passam por regras e padrões em serviços, propriedade intelectual e normas relativas a investimentos e fluxos de capitais). O mundo, enfim, está aberto a quem é aberto e participante, o que talvez não seja o caso atual do Brasil.
A recente decisão tomada pelo governo Temer, no sentido de solicitar adesão (ou acessão) à OCDE, pode ajudar nesse processo de reformas e retomada do processo de crescimento, desde que o Brasil não adote, como antes no caso do Mercosul, uma atitude defensiva, restritiva ou de abertura limitada. Se TODAS as medidas dependem mesmo do Brasil, cabe ler este livro, ou reler as matérias publicadas, estabelecer uma lista de reformas, e começar a empreender a difícil tarefa de converter o Brasil num país normal, o que ele absolutamente não é, atualmente. Devemos ser gratos a José Fucs por ter começado essa missão, pela listagem absolutamente clara dos problemas: ele já deu a sua contribuição. Cabe a nós, agora, isto é, a cidadania ativa, para não mencionar os altos responsáveis governamentais, empreender a tarefa de empreender o dever de casa, conscienciosamente. Allons enfants...


Paulo Roberto de Almeida
São Paulo, 20 de setembro de 2017

Matriz energetica mundial e americana: o que vem pela frente? - Meghan O'Sullivan

Colleagues and Friends,
Energy has always been a big driver of international affairs. Just think how the shift from wood to coal helped catalyze the industrial revolution. Could today’s unprecedented, American-led energy boom lead to similarly seismic shifts?
My new book, Windfall: How the New Energy Abundance Upends Global Politics and Strengthens America’s Power, argues that it already has. Indeed, America’s homegrown energy prowess is affecting much more than domestic consumers – it is reshaping power politics around the world.
Expanded U.S. oil and natural gas production has transformed energy markets, bringing new political and market forces to bear that affect Russia, China, and the countries of Europe and the Middle East in particular. For example, today’s energy dynamics have not only damaged the finances of Middle Eastern governments, but they have also propelled new efforts at major reforms. Moreover, the strategic partnership between Russia and China is now strained by the surfeit of global energy, whereas just a few years ago, analysts anticipated energy could be the lubricant to a better relationship. And though Russia will remain a major exporter of natural gas to Europe, its political leverage from this trade has been weakened by the fact that natural gas markets are now more flush with supplies, more integrated, and offer their customers more choices.
In writing and researching Windfall, I traveled to more than two dozen countries and conducted hundreds of interviews with policymakers, activists, industry officials, academics, and opinion leaders. In every place, my sources had pressing stories to tell about how the changing energy landscape has created new political challenges or opportunities. In bringing these stories together with extensive analysis and research into energy trends and technologies, I hope to convince my readers that they cannot fully understand what is happening in the world today without taking energy and energy markets into account. Energy is – and has been – a much more important driver of foreign affairs than so many other factors given much more attention by pundits, policymakers, and academics.
You can get a taste for the book by reading my op-ed in last Friday’s New York Times, which argues that the Trump Administration needs to take into account the many ways in which its non-energy policies are hurting America’s ability to capitalize on its energy fortunes. You could also check out last Friday’s Bloomberg View, which is running a short excerpt from Windfall.
I invite you to read Windfall. And I welcome your comments, criticisms, and questions.
Meghan O'Sullivan | Follow Me on Twitter
Jeane Kirkpatrick Professor of the Practice of International Affairs, Harvard Kennedy School
Director, Geopolitics of Energy Project, Belfer Center
Adjunct Senior Fellow, Council on Foreign Relations

terça-feira, 19 de setembro de 2017

International Adam Smith Society - conference January 2018 - Vina del Mar, Chile

Dear Friends and Members of the International Adam Smith Society:

Adam Smith Chile Conference - January 2018, Viña del Mar, Chile
 
A diverse and distinguished group of Smith scholars will gather in Chile. Deirdre McCloskey will be our first keynote speaker with her lecture entitled “Smith the Non-Utopian vs. His Followers since 1848.” Additional plenary lectures will be delivered by Samuel Fleischacker, speaking on "Empathy and Perspective: A Smithian Conception of Humanity," and James Otteson, addressing “Adam Smith's Libertarian Paternalism." Other prominent academics who will attend and present papers include María Alejandra Carrasco, Fonna Forman, Christel Fricke, Leonidas Montes, Maria Pia Paganelli, Sandra Peart, Dennis Rasmussen, Craig Smith, Barry Weingast, and Jeffrey Young.
 
While submissions in English are certainly welcome, Spanish speaking academics are particularly invited to apply given the location of the conference and its special, though non-exclusive, focus on Smith's reception in Latin America; several sessions at least will be conducted in Spanish. Young scholars should also know that the Universidad Adolfo Ibáñez has a limited number of competitive grants available (of $1,000 USD each) to support their attendance.  These are open to all, though some preference will be given to scholars from Latin America.  To be considered for these grants applicants need only note as much in their proposal email, or alternatively can directly contact carolina.aplablazam@uai.cl to apply.
  
More information about the conference, and an abstract submission form, can be found on the Society's website here.  Applicants can also email abstracts directly to the Society's secretary at internationaladamsmithsociety@gmail.com.

Sincere regards,

The IASS/Chile Organizing Committee

OCDE publishing house: uma grande concorrente 'a Funag - livros recentes

Parece que eles ganham da Funag em matéria de publicações:

The following OECD publications are hot off the press!:
More information
Tax Policy Reforms 2017
OECD and Selected Partner Economies
Tax Policy Reforms: OECD and Selected Partner Economies is an annual publication providing comparative information on tax reforms across countries and tracking tax policy developments over time. This year’s report covers the tax reforms that were implemented, legislated or announced in 2016.
 
More information
OECD Handbook for Internationally Comparative Education Statistics
Concepts, Standards, Definitions and Classifications
For well over two decades, the OECD has developed and published a broad range of comparative indicators published yearly in the flagship publication Education at a Glance.
 
More information
Education at a Glance 2017
OECD Indicators
Education at a Glance: OECD Indicators is the authoritative source for information on the state of education around the world. With more than 125 charts and 145 tables included in the publication and much more data available on the educational database.
 
More information
OECD Economic Surveys: Slovenia 2017
The 2017 Survey makes key policy recommendations to secure fiscal sustainability through pension and health care reform. In addition, the Survey recommends measures to enhance economic growth by boosting investment incentives in human and physical capital.
 
More information
OECD Economic Surveys: France 2017
GDP is set to grow fairly strongly in 2017-18, supported by private consumption and investment. The labour market has started to improve. However, productivity gains are too low to sustain social protection, high-quality public services and rising incomes in the long run.
 
More information
OECD Economic Surveys: Estonia 2017
The Estonian economy displays numerous strengths, including an excellent business environment, high educational attainment, and solid public finances. However, around a quarter of the population is still at risk of poverty and productivity growth has slowed down.
 
More information
OECD Economic Surveys: Latvia 2017
Latvia’s economy has grown robustly in recent years on the back of a strong track record in implementing structural reforms, despite a challenging international environment. Rising wages have supported household consumption.
 
More information
Main Economic Indicators, Volume 2017 Issue 9
The monthly Main Economic Indicators (MEI) presents comparative statistics that provide an overview of recent international economic developments for the 35 OECD countries, the euro zone and a number of non-member economies. This indispensable and unique source of key short-term...
  • Read and Share
  • Download (for institutions with a subscription to OECD iLibrary)
  • Subscribe to the periodical
 
More information
OECD Journal on Budgeting, Volume 16 Issue 3
This issue of the OECD Journal on Budgeting includes articles on the budgeting in Chile, the gender budgeting, and the strengthening budget institution is Public Management Peer Assisted Learning (PEMPAL countries: Results of the 2012 OECD PEMPAL Budget Practices and Procedures Survey).
  • Download (for institutions with a subscription to OECD iLibrary)

Mamona no diesel: o primeiro crime econômico do lulopetismo - Estado de Minas, 18/09/2017

Quando a ignorância, ou até mesmo a estupidez, para não dizer que poderia haver coisa ainda mais estarrecedora, vira "política de Estado", o resultado só pode ser o desastre. Este foi o primeiro "CRIME ECONÔMICO" do lulopetismo, que é como eu designo os grandes equívocos de políticas públicas que redudaram em desastres econômicos, quando não em grandes perdas de oportunidade para a sociedade e a economia, ao se ter adotado um caminho condenado ao fracasso, por razões puramente técnicas e de racionalidade econômica, mas onde pode ter estado associado também uma grande dose de patifaria. No caso da "mamona assassina", o produto menos indicado para produzir biodiesel, pode ter havido um cálculo político criminoso de transferir renda, indevidamente, para o MST -- dominado pelos neobolcheviques inimigos do agronegócio -- ao obrigar a Petrobras, que já era obrigada a adicionar biodiesel no diesel fóssil, a comprar especificamente biodiesel de mamona, e ainda mais especificamente de "famílias camponesas". Nunca vi tamanha estupidez, pois justamente se tratava do produto menos indicado para servir de base produtiva para o biodiesel. Mas, como sempre ocorre no caso do lulopetismo, por trás da estupidez econômica, e do crime econômico, havia um crime comum: a "esperteza" de transferir dinheiro para os bolsos dos terroristas agrários.

 Cultivo de mamona para biodiesel definha no Norte de Minas

Oito anos após planta ter sido apelidada de ouro verde do sertão, a matéria-prima está sendo preterida por itens mais baratos

postado em 18/09/2017 06:00 / 

Estado de Minas, 18/09/2017 08:13

http://www.em.com.br/app/noticia/economia/2017/09/18/internas_economia,901307/cultivo-de-mamona-para-biodiesel-definha-no-norte-de-minas.shtml 

Cerca de 10 mil agricultores assinaram contrato para a produção de mamona em 2009(foto: Divulgacao )

Cerca de 10 mil agricultores assinaram contrato para a produção de mamona em 2009 (foto: Divulgacao )
 
Da expectativa de lucro, à decepção. Este foi o desfecho que o projeto de plantio de mamona em Minas para o fornecimento de matéria-prima para a Usina de Biodiesel da Petrobras, em Montes Claros, trouxe para pequenos produtores rurais. A instalação da planta de fabricação no Norte de Minas foi cercada de promessas de emprego e renda para a região, dando um novo impulso à agricultura familiar. A ideia foi reforçada pelo então presidente Luiz Inácio da Silva ao inaugurar a indústria, em 6 de abril de 2009, ao lado de sua ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff. Porém, ao entrar em produção, a usina de biodiesel passou a usar outras matérias-primas, por serem mais baratas, principalmente o óleo de soja, trazido de outras regiões mineiras e até de outros estados, o que condenou ao fracasso as lavouras de mamona.
 
Com o anúncio da instalação da usina de biodiesel, oficializado por Lula em dezembro de 2005 em evento em Montes Claros, a euforia com o “novo negócio” foi tanta que a mamona chegou a ser chamada de ouro verde do sertão mineiro. A Prefeitura de Montes Claros, então comandada pelo prefeito Athos Avelino, divulgou que a indústria geraria 15 mil empregos na zona rural. Além de Montes Claros, foram inauguradas plantas de biodiesel em Candeias (BA) e em Quixadá (CE).

O ex-técnico da Empresa de Assistência Técnica de Extensão Rural (Emater-MG) Reinaldo Nunes de Oliveira coordenou um programa criado pelo órgão estadual para o plantio de mamona como matéria-prima do biodiesel. Hoje aposentado, o consultor diz ter alertado na época os técnicos da Petrobras sobre a inviabilidade do projeto.

Ele conta que cerca de 10 mil pequenos produtores de 50 municípios do Norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha assinaram contratos com a Petrobras, visando o cultivo de mamona, alcançando 30 mil hectares plantados. Porém, como não foi viável o uso da matéria-prima, dentro de pouco tempo, os agricultores se viram obrigados a parar de plantar a oleaginosa, por não terem para quem vender a produção. Os últimos plantios de mamona da região foram feitos na safra 2015/2016, quando a Petrobras suspendeu de vez a compra da oleaginosa dos pequenos agricultores.

Declínio

A derrocada das lavouras de mamonas para biodiesel é percebida nos levantamentos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que aponta um recuo do plantio em todo país da ordem de 11,9% na safra 2016/2017 (28 mil hectares cultivados) em relação à anterior. “Em Minas, desmotivados pelo fracasso do programa de biodiesel, poucos agricultores cultivam mamona, mais precisamente na região Norte do estado, visto que as áreas remanescentes têm sua produção destinada à indústria rícino química”, descreve relatório da Conab. Apenas dois municípios ainda contam com as áreas plantadas da espécie, mas com o registro de perdas de 66,7% na produção.

A impressão que se tem é que o projeto da produção de biodiesel com o uso de óleo de mamona foi feito por executivos de gabinete, que não conhecem a realidade”, afirma Reinaldo Nunes de Oliveira. O consultor diz que apontou a possibilidade de fracasso do projeto na época por causa de uma característica da espécie. Apesar do alto teor de óleo, a mamona tem uma produtividade muito baixa no semiárido, por causa da falta de chuvas. Neste caso, antes da implantação do projeto, segundo o consultor, deveriam ter sido feitas pesquisas para aumentar a produtividade da planta.

O técnico lembra que a mamona de sequeiro no Norte de Minas atingiu uma produtividade média de 1,5 mil quilos por hectare. “Para ser viável como matéria-prima para o biodiesel, a cultura deveria ter atingido menos oito mil quilos por hectare”, explica Reinaldo.


Além disso, ele relata que, mesmo com a Petrobras fornecendo kits de semente e adubo, o preço firmado nos contratos não era atrativo para o agricultor, em função dos custos de produção. Segundo Reinaldo, os agricultores do Norte de Minas envolvidos no projeto chegaram a plantar 30 mil hectares de mamona. Para ter uma produção suficiente abastecer a usina de biodiesel, a região deveria chegar a pelo menos 200 mil hectares plantados da oleaginosa.

Outra barreira foi dificuldade de logística com a falta de uma unidade beneficiadora para a produção do óleo de mamona no Norte de Minas. Com isso, a oleaginosa era levada para ser levada e esmagada no interior da Bahia. Depois, o óleo era transportado para Montes Claros, o que elevou o custo da matéria-prima para a indústria.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

A diplomacia na construcao do Brasil – uma entrevista com Rubens Ricupero

A diplomacia na construção do Brasil – uma entrevista com Rubens Ricupero, por Paulo Roberto de Almeida 


1 – Por que o sr. escreveu A diplomacia na construção do Brasil?
Porque não consegui encontrar nas livrarias o livro que procurava quando comecei a dar aulas de história das relações internacionais do Brasil, quarenta anos atrás. Precisava de um texto que me ajudasse a ensinar como a política externa era um fio inseparável da trama da história nacional, uma parte integral de tudo o que acontecia naquele momento, ligada, não separada da sociedade como um todo.
2 – Não havia nenhuma obra que tratasse desse tema?
Na época, as obras gerais sobre história do Brasil quase não falavam da política externa, no máximo alguns parágrafos ou notas ao pé da página. O mundo exterior não existia, era como se a história de um país constituísse um todo suficiente, fechado em si mesmo. Já as histórias diplomáticas cometiam o erro oposto: só tratavam da diplomacia, sem mencionar a política interna e a economia, como se a política externa funcionasse dentro de um vácuo. Uma das originalidades desta obra é que ela tenta não separar diplomacia, política e economia interna. Sobretudo nos capítulos sobre os períodos mais recentes, a atenção dedicada à economia e à política é quase igual ao espaço da diplomacia.
3 – Qual a linha mestra do livro?
Além de narrar uma história, a da política externa, procurei mostrar como a diplomacia ajudou a dar forma à história e à identidade do Brasil, como vieram da diplomacia alguns dos valores e ideais básicos da imagem que os brasileiros fazem de si próprios. Por exemplo, o pacifismo, a tendência de resolver conflitos pela conciliação, a negociação, a transação, a repulsa à violência, ao militarismo, à conquista pela força, a opressão de outros povos. Ainda que essa imagem seja interesseira, que não corresponda inteiramente à realidade, a própria escolha desses valores é melhor do que se imaginar como povo conquistador, predestinado a impor a democracia ao mundo, com direito a anexar território dos vizinhos, ideologias frequentes em muitos países.
4 – A que tipo de leitor se destina a obra?
O livro se dirige não apenas aos professores, estudantes de relações internacionais, ciências sociais, diplomatas, internacionalistas, mas aos leitores que se interessam pela história do Brasil e querem compreender como o país se relacionou com o mundo exterior e foi influenciado por acontecimentos e tendências externas. Mesmo aqueles que tentam entender porque o Brasil mergulhou na profunda crise atual talvez encontrem no texto algumas reflexões úteis. Evitei o tom apologético das histórias antigas, para as quais o governo brasileiro sempre tinha razão. Há um esforço de compreender e valorizar as perspectivas do outro, de nossos vizinhos, às vezes adversários, e a disposição de assumir que em alguns casos, tivemos uma parcela de culpa nos conflitos e guerras na região do Rio da Prata.
5 – Qual o papel da diplomacia brasileira para a conformação de nosso atual território?
Se não fosse o êxito da diplomacia brasileira, o Brasil teria hoje um território de apenas um terço do atual e não seria um país continental capaz de fazer parte dos BRICS. A aceitação pacífica e a legalização da expansão territorial foram o produto da perseverança com que a diplomacia se dedicou à questão até 1910 mais ou menos. Atribui-se ao barão do Rio Branco a frase “território é poder”. É óbvio que território apenas, sem desenvolvimento, não representa grande coisa. O território, porém, é a condição que torna possível não só o poder, mas a soberania. Definir o território constitui o ato inaugural do relacionamento do país com o mundo. Sua importância é fundamental: a maioria das guerras teve origem em disputas territoriais. Consolidar o território pela diplomacia, sem guerra, faz uma diferença enorme no destino histórico de qualquer nação.
6 – O sr. enaltece no livro a chamada “diplomacia do conhecimento”. Por que?
Entre as histórias que conto no livro, uma ilustra bem como nossa diplomacia se baseou sempre no conhecimento. Uma vez, o médico de Rio Branco chegou de manhã ao Itamaraty e o encontrou de roupa amassada. Constrangido, o Barão apontou para um enorme mapa desdobrado no chão e confessou que tinha querido examinar detalhes do mapa e adormecera em cima dele. Esse episódio verídico explica o êxito da diplomacia na negociação dos limites do Brasil. As vitórias nas negociações e nas arbitragens foram preparadas por anos de busca e estudo de velhos mapas e documentos em arquivos e bibliotecas.
Foi graças a essa “diplomacia do conhecimento” e a métodos de “poder suave” como a negociação que o Brasil, país sem grande poder militar ou econômico, conquistou um território de vastidão continental e imensas riquezas naturais. Jamais teríamos chegado perto desse patrimônio se tivéssemos recorrido a meios militares.
 7 – Qual o balanço que o sr. faz de nossa diplomacia de 1750 até os dias de hoje?
Com seus acertos e erros, a diplomacia marcou profundamente cada uma das etapas definidoras de nossa história: a abertura dos portos, a independência, o fim do tráfico de escravos, a inserção no mundo pelo comércio, os fluxos migratórios, voluntários ou não, base da população, a consolidação da unidade nacional ameaçada pela instabilidade na região platina, a modernização, a industrialização e o desenvolvimento econômico.
 8 – A maior parte dos problemas enfrentados por nossos diplomatas durante o século XIX foi com os nossos vizinhos sul-americanos. Como o sr. avalia essa relação?
O que distingue o caráter internacional do Brasil é o grande número de vizinhos, dez, comparados aos Estados Unidos (dois), ao Canadá (um), à Austrália (nenhum). Além de muitos, esses vizinhos são heterogêneos, vão da Guiana Francesa ao Uruguai, do Suriname à Bolívia, do Peru à Guiana ex-inglesa. Conseguir estabelecer limites com todos por meio de negociação, transação, arbitragem, sem guerra de conquista, não é tarefa menor a ser subestimada. Basta comparar a experiência brasileira com a de outros países com numerosos vizinhos (Rússia, China, por exemplo). Em março de 2020, aniversário do fim da Guerra do Paraguai, o Brasil completará 150 anos sem nenhuma guerra com um vizinho. Quantos países poderão dizer o mesmo?
9 – E como o sr. explica esse êxito da política de fronteiras?
Pela opção não violenta da delimitação, a preparação cuidadosa, a continuidade na defesa de uma linha coerente de ação diplomática, a perseverança. A definição pacífica poupou ao Brasil a condição de refém de litígios fronteiriços que teriam paralisado boa parte da nossa capacidade de iniciativa diplomática. Também o senso de oportunidade de resolver relativamente cedo todas as questões pendentes criou condições para desenvolver diplomacia voltada não para resolver conflitos, mas para dar ao relacionamento com os vizinhos conteúdo concreto de cooperação e de comércio. A diplomacia precisa, para isso, saber captar a realidade exterior, interpretar corretamente o mundo e suas oportunidades. Em sentido inverso, necessita igualmente explicar o país ao mundo, torná-lo admirado, digno de atrair apoio político, de receber capitais, imigrantes, tecnologia.
10 – Apesar do caráter pacífico de nossa diplomacia, o Brasil interveio em territórios vizinhos.
É verdade, mas as intervenções se concentraram em período relativamente curto, entre 1850 e 1870. Com razão ou sem ela, os estadistas da monarquia se resignaram a intervir no Uruguai e, de modo mais limitado, na Argentina de Rosas, devido à percepção defensiva de que as guerras civis na fronteira do Rio Grande do Sul e dentro daquela província ameaçavam a unidade do Império. Havia o temor de que a hegemonia de Rosas conduzisse à anexação do Uruguai e do Paraguai pela Argentina, impedisse o acesso fluvial a Mato Grosso e atraísse a adesão de revolucionários gaúchos. Fora esses exemplos, prevaleceu na prática diplomática brasileira obediência ao princípio de não intervenção. Só em época muito recente, a afinidade ideológica e partidária motivou afastamentos quase sempre controvertidos da posição tradicional.
11 – E a Guerra do Paraguai? Não foi uma intervenção?
Nesse caso, a iniciativa da guerra partiu de Assunção. Não se registrou nenhum ataque ou ameaça direta ao Paraguai da parte do Brasil. A intervenção brasileira no Uruguai (1864) foi utilizada pelo ditador paraguaio Solano López como motivo sincero ou pretexto para um ataque surpresa ao Brasil, que estava totalmente despreparado. Não há dúvida de que Solano López assumiu a responsabilidade de desencadear a guerra que custaria a vida a milhares de pessoas, inclusive a dele próprio. Dos 140 mil brasileiros que participaram da guerra, 50 mil – mais de um terço – morreram. As informações sobre as perdas paraguaias são precárias. Estimativas indicam o máximo de 279 mil vidas. Nada que se aproxime do número fantasioso de um milhão de mortos, às vezes citado, mais que o dobro da população do país no início da guerra.
12 – Juntamente com a Inglaterra e a Argentina, os Estados Unidos são o outro ator decisivo na história da diplomacia brasileira. No livro o sr. trata das diferenças diplomáticas entre o Brasil e os EUA. Quais são elas?
A experiência diplomática do Brasil contrasta com a dos Estados Unidos primeiro em relação à expansão territorial. Tanto o Brasil como os EUA começaram com uma estreita margem de terras ao longo da costa leste que foi sendo expandida para o oeste. A semelhança, porém, termina nesse ponto. A expansão dos EUA começa com a independência, em 1776, enquanto a nossa estava praticamente encerrada no momento em que nos separamos de Portugal. Se não fosse a incorporação do Acre (1903), o território do Brasil seria hoje menor do que na época da independência, em 1822, quando incluía a Província Cisplatina, o Uruguai de nossos dias, que se separou em 1828. Quando se fala em “expansionismo brasileiro”, é bom precisar que o expansionismo foi mais português que brasileiro. Outra diferença foi o método. A expansão norte-americana se deu muito mais por compras de territórios e de guerras seguidas de anexação, sobretudo contra o México, ao passo que a nossa resultou de negociações e arbitramentos.
13 – Que outras diferenças podem ser apontadas entre a diplomacia norte-americana e a nossa?
A principal é a atitude em relação ao poder. Desde o começo, os norte-americanos tiveram uma experiência frequente com guerras internacionais. Um historiador da política externa dos EUA escreveu que cada geração norte-americana desde a Independência teve sua própria guerra e existe mesmo um livro sobre os Estados Unidos intitulado “Um país feito pela guerra” (“A country made by war”). O sucesso nos conflitos com o México, na Guerra contra Espanha, com a enorme expansão territorial resultante, fortaleceu nos norte-americanos uma propensão ao uso do chamado “poder duro”, isto é, ao recurso a métodos militares ou de pressão econômica para resolver conflitos. Em contraste, o Brasil foi em quase toda sua história país de recursos militares e econômicos muito modestos e limitados. O insucesso na Guerra da Cisplatina, as dificuldades nas intervenções no Rio da Prata, os penosos sacrifícios da Guerra do Paraguai alimentaram na consciência brasileira aversão à guerra e relutância em recorrer à diplomacia da força. A política exterior do Brasil se edificou sobre a base do Direito Internacional, das doutrinas jurídicas a respeito do nosso direito às fronteiras, à busca de consenso, de compromissos, de soluções por negociações e arbitragens. O Brasil construiu sua diplomacia com argumentos intelectuais, jurídicos, históricos, com o “poder suave” dos métodos de persuasão.
14 – Por que o sr. inicia o livro em 1750?
A maioria das histórias diplomáticas de nações das Américas começa pela independência, uma vez que, na era colonial, as decisões podem às vezes ser tomadas no país, mas não pertencem ao país, como escreveu o diplomata e historiador Paulo Roberto de Almeida. No caso do Brasil, existe uma especificidade diferente dos outros países. A expansão do território até aos limites atuais já se encontrava praticamente concluída e mais ou menos aceita no momento da assinatura do Tratado de Madri (1750), muito antes do fim do regime colonial. É preciso, portanto, recuar várias décadas prévias à independência para entender como se definiu o território. A narrativa se inicia por isso nos primórdios da ocupação e ampliação do território e toma como exemplo simbólico da diplomacia de outrora a preparação e as consequências do Tratado de Madri (1750), mais de setenta anos antes da independência formal.
15 – No livro o sr. opina que o barão do Rio Branco foi o fundador da política externa do Brasil na era republicana ao definir o primeiro conceito abrangente para a diplomacia. Em que consistia esse conceito?
O barão do Rio Branco é, de fato, o fundador da política externa do moderno Brasil. Deve-se a ele não somente a resolução sistemática de todas as questões fronteiriças ainda pendentes no começo do século XX, a “construção do mapa do Brasil”. Também foi ele que criou a primeira fórmula abrangente da política externa brasileira articulando as relações com os EUA, a América Latina e as grandes potências europeias. Rio Branco era pragmático, sabia da fraqueza do Brasil, das ameaças potenciais de nossa vizinhança com três potências europeias, duas das quais a Inglaterra e a França, as maiores da época. Tinha também consciência do antagonismo latente dos vizinhos hispano-americanos com os quais tínhamos problemas fronteiriços. Concebeu uma política pela qual o Brasil se aproximou dos Estados Unidos, a potência mundial em ascensão, pela qual apoiava as posições norte-americanas no hemisfério em troca de apoio americano em relação aos europeus, o que se denominou às vezes de uma “aliança não escrita”. Esperava também que, nas disputas fronteiriças com os vizinhos, os norte-americanos veriam com simpatia nossa posição ou ao menos ficariam neutros, não sustentariam nossos rivais. Com isso, definiu o que se poderia chamar de primeiro “paradigma abrangente da política exterior”, que duraria até o começo da década de 1960.
16 – Qual foi o destino desse paradigma?
O extraordinário sucesso do Barão, que triunfou em praticamente todas as questões muitas vezes perigosas e delicadas que enfrentou por mais de nove anos (1902-1912) tornou sua herança algo de intocável. Assim como ele foi o Chanceler de todos os governos que se sucederam enquanto viveu, da mesma forma sua política foi rigorosamente seguida pelos sucessores, nem sempre com o mesmo pragmatismo e inteligência. O ponto mais alto e positivo dessa herança se deu durante a Segunda Guerra Mundial, quando Getúlio Vargas e seu ministro do Exterior Oswaldo Aranha fizeram o Brasil se aliar política e militarmente aos Estados Unidos. O país saiu do conflito muito mais forte militarmente, aumentou seu prestígio internacional, recebeu ajuda econômica para construir a usina siderúrgica de Volta Redonda, início da indústria pesada. Após a guerra, contudo, o Brasil deixou de receber o apoio econômico que esperava em decorrência de sua participação no conflito. Apesar do desapontamento com a falta do auxílio a que se julgava com direito para seu desenvolvimento, o governo continuou alinhado à política norte-americana em razão do anticomunismo na época da Guerra Fria.
17 – Como se deu a ruptura com a política de estreita colaboração política com os Estados Unidos?
A ruptura vai ocorrer com a Política Externa Independente do presidente Jânio Quadros (1961), continuada pelos chanceleres do governo João Goulart, principalmente San Thiago Dantas e Araújo Castro (1961-1964). A nova política recusava o alinhamento automático às posições dos EUA na ONU, na OEA e em relação a Cuba. Deixou de enxergar o mundo através do prisma ideológico da Guerra Fria. Por exemplo, as revoltas contra o colonialismo na Argélia, em Angola, Moçambique, em outros países da África e da Ásia, não eram mais vistas apenas como conflito entre movimentos apoiados pelos comunistas e pela URSS contra países colonizadores aliados dos EUA. Além disso, o Brasil restabeleceu relações diplomáticas com a União Soviética e outros países comunistas, começou a se aproximar da China, esforçou-se em evitar o isolamento do regime de Fidel Castro. O golpe militar de 1964 abandonou essa orientação e retornou ao alinhamento e colaboração com os EUA até que no governo do general Ernesto Geisel (1974-1979), o chanceler Azeredo da Silveira retomou o espírito da Política Independente. O Brasil foi o primeiro país a reconhecer a independência de Angola sob o governo de movimento então considerado alinhado a Moscou, o MPLA. O governo estabeleceu relações diplomáticas com a China, iniciou aproximação com os países árabes. Desde então, a linha de afirmação da autonomia diplomática brasileira passou a constituir o novo paradigma da política externa do Brasil, que se manteve após o fim do regime militar. Com inovações e expansões, sobretudo nos governos FHC e Lula, mas sem rupturas essenciais, tal paradigma constitui até nossos dias a base da diplomacia brasileira.
 18 – Como o sr. vê o Brasil neste momento?
Para o Brasil, vale neste momento a exortação dirigida pelo poeta italiano Giacomo Leopardi: “Se queremos algum dia despertar e retomar o espírito de nação, nossa primeira atitude deve ser não a soberba nem a estima das coisas presentes, mas a vergonha”. Também em nosso caso, a primeira atitude terá de ser a vergonha das coisas presentes como condição para despertar o espírito da nação. Reformar e purificar as instituições políticas, reaprender a crescer para poder suprimir a miséria e reduzir a desigualdade e a injustiça, integrar os excluídos, humanizar a vida social.
19 – Qual o papel da diplomacia neste momento?
Em todo este livro, procurei não separar a narrativa da evolução da política externa da História com maiúscula, envolvente e global, política, social, econômica. Durante 200 anos, a diplomacia em geral fez sua parte e até deu ao país contribuição maior que a de muitos outros setores. No entanto, a crise política, econômica e moral a que se chegou é de tal gravidade que não é mais possível a um setor isolado como a diplomacia ou algumas outras poucas “ilhas de excelência” continuarem a construir, se o sistema político e partidário agrava a desmoralização e enfraquecimento das instituições. A partir de agora, mais ainda que no passado, a construção do Brasil vai depender da capacidade do Executivo, do Congresso, do Judiciário, das instituições públicas, de adotarem as reformas indispensáveis à sobrevivência do sistema. A diplomacia terá muito a contribuir nessa reforma profunda das instituições, mas o esforço terá de ser universal, sem exceções.
 20 – Com que sentimentos o sr. escreveu este livro?
Concluí o texto do livro pouco depois do impeachment de Dilma Rousseff. Escrevi o fecho definitivo durante a sucessão de crises que ameaçavam (e ainda ameaçam) engolir Michel Temer. Durante esse pesadelo de meses, escrever a cada dia um pedacinho da relação do Brasil com o mundo me forneceu o antídoto de que precisava contra a desesperança. Tentei narrar como um país fraco e pobre, colônia de uma quase colônia, construído sobre o trabalho dos escravos e o sofrimento dos humildes, gradualmente aprendeu a afirmar um espaço crescente de autonomia na busca de seus interesses.
Antonio Candido comentava que “comparada às grandes, a nossa literatura é pobre e fraca. Mas é ela, não outra, que nos exprime. Se não for amada, não revelará a sua mensagem; e se não a amarmos, ninguém o fará por nós”. Esse pensamento ilumina também o caminho para lidar com o que a nossa história tem de sombras: a escravidão, a exclusão, a injustiça, a corrupção, a falta de acesso à educação. Ninguém por nós poderá superar a herança madrasta de nossa história e criar em nosso lugar uma sociedade justa e fraterna. Justificativa, destino e meta de quem nasceu ou escolheu ser brasileiro, o sonho perene da construção do Brasil é que torna a existência humana digna de ser vivida em nossa terra.
21 – E qual o caminho para essa sociedade justa e fraterna?
O Brasil só conseguirá enfrentar a complexidade social contemporânea com um grande contingente de pessoas formadas com educação de qualidade e a superação das carências e dos desequilíbrios econômicos. Estamos longe disso. Mas se levarmos em conta que no início do século passado éramos 17 milhões de brasileiros, dos quais 84% analfabetos, com expectativa de vida pouco inferior aos 30 anos, é razoável pensar que estamos mais afastados do país da escravidão e mais próximos da nação próspera e justa que sonhamos alcançar um dia.

Sobre os autores

Rubens Ricupero é embaixador aposentado e autor do livro “A diplomacia na construção do Brasil – 1750-2016” (Rio de Janeiro: Versal Editores, 2017).
Paulo Roberto de Almeida é diplomata de carreira e diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais – IPRI-MRE.

Como citar este artigo

Mundorama. "A diplomacia na construção do Brasil – uma entrevista com Rubens Ricupero, por Paulo Roberto de Almeida". Mundorama - Revista de Divulgação Científica em Relações Internacionais,. [Acessado em 18/09/2017]. Disponível em: <http://www.mundorama.net/?p=23942>.

domingo, 17 de setembro de 2017

Venezuela: sancoes financeiras americanas devem abalar o regime chavista - Lourival Sant'Anna

Agora vai? Talvez, mas com novos sofrimentos da população.

Sanções à Venezuela

Sanções implementadas pelos EUA serão eficazes para estrangular economia do país

Lourival Sant'Anna, 
 O Estado de S.Paulo, 17 Setembro 2017
Representantes do governo e da oposição da Venezuela se reuniram quarta e quinta-feira em Santo Domingo, para explorar a possibilidade de negociação. Um novo encontro foi marcado para o dia 27, também na capital dominicana. Deverão participar também México, Chile, Bolívia e Nicarágua – dois países críticos ao regime chavista e dois aliados, respectivamente.
Nos últimos dois anos, houve muitas reuniões com esse propósito, sem resultado. Desta vez pode ser diferente, como sugere o próprio formato da negociação, fora da Venezuela, com robusta intermediação internacional e a participação de dirigentes importantes de ambos os lados.
Chavistas fazem protestos em Caracas com cartazes ironizando os opositores Henry Ramos Allup e Lilian Tintori, chamados de
Chavistas fazem protestos em Caracas com cartazes ironizando os opositores Henry Ramos Allup e Lilian Tintori, chamados de 'vende pátria' Foto: EFE/MIGUEL GUTIÉRREZ
As sanções financeiras impostas pelo governo americano dia 25 começam a surtir efeito. Nenhum banco relevante quer transacionar com a Venezuela e com isso correr o risco de não poder mais ter negócios com os EUA.
 
Como o próprio presidente Nicolás Maduro se queixou, a Venezuela tem dinheiro depositado em bancos, mas não consegue sacá-lo para importar alimentos e remédios. Isso, num quadro já de brutal escassez de produtos básicos. Ao cobrir a eleição para a Assembleia Constituinte em 31 de julho, analistas me disseram que o que faria diferença seriam não sanções comerciais sobre a venda de petróleo, mas sanções financeiras como as que foram aplicadas. Embora os EUA sejam o maior comprador de petróleo da Venezuela, ela teria condições de reorientar suas vendas para outros compradores. Perderia receita, mas não ficaria tão asfixiada. Já com sanções financeiras, não há o que fazer. Não adianta vender, porque não recebe o pagamento; não adianta ter dinheiro, porque não consegue comprar. 
O Irã viveu esse drama entre 2008 e 2015, quando sanções financeiras e também medidas para monitorar os cargueiros iranianos causaram o estrangulamento de sua economia. Houve inflação e perda de poder aquisitivo da população. A teocracia iraniana se sentiu abalada a ponto de permitir a eleição do conservador moderado Hassan Rohani, em 2013. A retórica provocativa de Mahmoud Ahmadinejad deu lugar à atitude serena e pragmática de Rohani, educado em Glasgow, possibilitando o acordo nuclear de 2015. 
As eleições no Irã são controladas pelo líder espiritual Ali Khamenei, desde a seleção dos candidatos até a contagem dos votos, como ficou claro na fraude de 2009 que garantiu a reeleição de Ahmadinejad. Rohani foi reeleito este ano por ampla margem, derrotando o nacionalista Ebrahim Raisi, que poderia colocar em risco o acordo. Sua maior ameaça hoje é Donald Trump, que o denunciou durante a campanha como um “péssimo acordo”, mas até agora não moveu uma palha para rasgá-lo, apesar das pressões de Israel nesse sentido.
Há diferenças entre as situações do Irã e da Venezuela. O conflito venezuelano é interno. O programa nuclear iraniano tem um caráter não só de governo, mas de Estado. E chegou a unir uma parte da população em seu favor, embora houvesse críticas tanto na opinião pública quanto no interior do regime contra a retórica abrasiva de Ahmadinejad, que atraía as preocupações internacionais e com isso punha em risco o próprio programa. 



A perda de qualidade de vida causada pelas sanções mudou o humor dos iranianos com relação ao sonho nuclear, tornado pesadelo. Na Venezuela, a população já estava sofrendo antes das sanções, com desabastecimento e hiperinflação, além da truculência do regime. E os chavistas já haviam posto em prática uma estratégia bem-sucedida de permanência no poder, garantindo o apoio dos generais, que lucram com a distribuição dos produtos. Agora a situação vai se deteriorar na Venezuela, empurrando para um limite a capacidade até mesmo das forças de segurança de conter a insatisfação da população e de setores do próprio regime.