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sábado, 4 de junho de 2011
Brasil Sem Miseria: um plano improvisado - Editorial OESP
Editorial - O Estado de S.Paulo
04 de junho de 2011
A presidente Dilma Rousseff é uma pessoa séria, assim como são sérios os seus compromissos com a mudança do sombrio panorama social brasileiro. O País se orgulha de ser uma das 10 maiores economias do mundo e, ao mesmo tempo, tolera a perpetuação da extrema pobreza em escala incompatível com o seu grau de desenvolvimento. Era, portanto, para também serem levadas a sério as informações de que, cumprindo o que a então candidata prometera na campanha eleitoral, o novo governo preparava, em regime de prioridade, um programa articulado de resgate, em 4 anos, dos 16,2 milhões de pessoas cuja renda familiar per capita não ultrapassa R$ 70, conforme a "nota de corte" estabelecida com base nos dados do último Censo do IBGE.
Mas não pode ser considerado sério, nos termos em que foi apresentado, o programa Brasil Sem Miséria. Ficou claro que o seu lançamento, quinta-feira - numa solenidade em que a presidente se viu obrigada a proclamar que não é "refém do medo", ao lado de um desenxabido ministro Antonio Palocci, responsável pela crise que assusta o Planalto -, foi uma precipitação. No esforço por mostrar que o governo governa e que a presidente preside, não se deixando travar pelo escândalo que expôs a fortuna do seu braço direito, o titular da sua Casa Civil, incluiu-se a apresentação do plano de combate à miséria entre as aparições públicas de Dilma, destinadas a exibir, ao longo da semana, um quadro de normalidade política e eficiência administrativa no Executivo.
O que se viu, porém, foi uma simples colagem, ao que tudo indica improvisada, de projetos que parecem ser um mix das iniciativas do governo Lula no campo social, lembrando o ajuntamento de projetos a que ele deu o pomposo nome de Programa de Aceleração do Crescimento. E essa é ainda uma hipótese benigna. Pior será se se vier a saber que a crise não forçou o lançamento do Sem Miséria antes da hora, no estado em que estivesse, mas que ele é isso mesmo, ou seja, o produto de um trabalho que chegou, sim, ao seu término e espelha o que a equipe da presidente tem a oferecer na matéria. Porque, se este for o caso, o resultado será uma oportunidade perdida de obter o apoio da sociedade a uma causa que deve prevalecer sobre antagonismos políticos.
O governo anunciou que investirá no programa R$ 20 bilhões por ano, mas não alardeou, evidentemente, que desse total R$ 16 bilhões já são gastos com o Bolsa-Família. Completando o vexame, não definiu de onde sairão os R$ 4 bilhões restantes. Só isso mais do que basta para se considerar o plano um mero factoide, uma descosturada carregação para ajudar a presidente a desfilar boa aparência política. Nada contra, em princípio, à ideia de agregar 800 mil famílias aos 12,9 milhões que formam atualmente a clientela desse programa de transferência de renda. Mas a distância entre a intenção e os meios faz duvidar da viabilidade da meta - que está longe, aliás, da eliminação da miséria.
O ceticismo se justifica ainda mais em relação ao desejo do governo de instalar cursos de qualificação profissional, em parceria com Estados e municípios, destinados a abrir portas de saída a membros da clientela do Bolsa-Família. Essas parcerias só funcionam, quando funcionam, se o Tesouro arca com a fatura - e isso, como se sabe, são sempre outros 500. Da lista de intenções do Planalto faz parte ainda a criação de uma Bolsa Verde de R$ 300 por trimestre para cerca de 70 mil famílias que vivem em áreas de floresta. Trata-se de um programa de preservação ambiental anunciado por Lula em 2009. Há, ainda, uma ajuda de R$ 2.400, a ser paga em 4 parcelas ao longo de 2 anos a até 100 mil famílias de lavradores.
No evento de quinta-feira, a presidente afirmou: "Não vamos mais esperar que os pobres corram atrás do Estado brasileiro. O Estado brasileiro deve correr atrás da miséria e dos pobres deste país". Ou seja, o programa terá de localizar os 16,2 milhões de brasileiros visados. Por sua própria condição socioeconômica, vivem à margem ou, quando muito, na periferia das instituições que canalizam as políticas públicas na frente social. Resta saber se o governo tem preparo para completar essa corrida a tempo.
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