A Receita sempre vai bem
Editorial - O Estado de S.Paulo
24 de julho de 2011
Embora tenha como uma de suas características mais nocivas o fato de não acompanhar o desempenho do setor produtivo, e por isso crescer sempre e muito sob praticamente todas as circunstâncias, a arrecadação federal ainda consegue causar surpresas, com resultados como o que alcançou em junho. Os contribuintes sabem que, quando a economia vai bem, a receita tributária vai muito melhor e cresce proporcionalmente muito mais do que a produção; e que, quando a atividade econômica se desacelera ou recua, a receita desacelera ou cai muito mais lentamente. O que ocorreu em junho - e também no primeiro semestre deste ano -, porém, era desconhecido do público.
No mês passado, a arrecadação de impostos e contribuições federais alcançou R$ 82,73 bilhões, com uma alta real, isto é, descontada a inflação, de 23,07% sobre o resultado de junho de 2010. Nenhuma das projeções feitas por mais de uma dezena de instituições financeiras consultadas pela Agência Estado chegou a esse resultado.
O secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, não poupou adjetivos para tentar mostrar o caráter inusitado do resultado da arrecadação em junho: a alta, segundo ele, foi "extraordinária, atípica e fora da curva". De fato, o crescimento excepcional do mês não deve se repetir - o que, se ocorresse mais vezes, acabaria sendo desastroso para os contribuintes que já são obrigados a pagar tanto imposto. Mas os dados da arrecadação nos seis primeiros meses de 2011 não deixam dúvida quanto ao caráter perverso do sistema tributário brasileiro: ele é montado para assegurar receitas crescentes ao governo, o que faz aumentar ilimitadamente a carga tributária que as famílias e as empresas têm de suportar. Esse regime tributário contém o crescimento da economia nos períodos bons e tolhe ainda mais a atividade produtiva nos momentos de dificuldades.
Os resultados de cada um dos seis primeiros meses do ano foram recordes da série da Receita. Assim, o acumulado do primeiro semestre de 2011 foi, igualmente, o maior da série, tendo alcançado R$ 465,61 bilhões, ou 12,7% mais do que nos seis primeiros meses de 2010 em valores reais. Isso quer dizer que a arrecadação de tributos federais está crescendo a um ritmo que corresponde ao triplo da velocidade de crescimento do PIB, que, no primeiro trimestre, foi de 4,2%.
O aumento conjunto da arrecadação do Imposto de Renda Pessoa Jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, de 22,12% sobre 2010, se deveu ao bom desempenho das empresas no ano passado, durante o qual elas melhoraram sensivelmente seus resultados na comparação com 2009, quando a crise atingiu mais severamente a economia brasileira. O aumento das receitas previdenciárias, o segundo maior entre os principais tributos federais, se deveu ao crescimento do emprego com carteira assinada.
Curiosamente, embora o governo tenha aumentado para 3% ao ano, a partir de abril, o IOF nas operações de crédito para as pessoas físicas, com o objetivo de reduzir o consumo, a arrecadação desse tributo cresceu fortemente. Em junho, por exemplo, foi nada menos do que 70,76% maior do que a de junho do ano passado. É uma demonstração de que a medida não foi eficaz: as pessoas continuaram a tomar dinheiro emprestado de instituições financeiras para fazer as compras que haviam planejado
Um fator extraordinário pesou na arrecadação de junho: o início do pagamento parcelado de débitos tributários propiciado aos devedores do Fisco pelo Refis da Crise.
Como não espera a repetição de resultados mensais como o de junho, a Receita projeta, para todo o ano, um crescimento real da arrecadação menor do que o do primeiro semestre. A estimativa da receita é de aumento de 10,5% em termos reais, mais do que a previsão feita em maio, de 9% a 10%. Quanto ao PIB, as projeções para 2011 não diferem muito do resultado do primeiro trimestre, de cerca de 4%. Essas projeções indicam novo aumento da carga tributária neste ano, fato que vem se registrando há muitos anos.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Postagem em destaque
Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida
Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...
-
Uma preparação de longo curso e uma vida nômade Paulo Roberto de Almeida A carreira diplomática tem atraído número crescente de jovens, em ...
-
FAQ do Candidato a Diplomata por Renato Domith Godinho TEMAS: Concurso do Instituto Rio Branco, Itamaraty, Carreira Diplomática, MRE, Diplom...
-
Países de Maior Acesso aos textos PRA em Academia.edu (apenas os superiores a 100 acessos) Compilação Paulo Roberto de Almeida (15/12/2025) ...
-
Mercado Comum da Guerra? O Mercosul deveria ser, em princípio, uma zona de livre comércio e também uma zona de paz, entre seus próprios memb...
-
Reproduzo novamente uma postagem minha de 2020, quando foi publicado o livro de Dennys Xavier sobre Thomas Sowell quarta-feira, 4 de março...
-
Israel Products in India: Check the Complete list of Israeli Brands! Several Israeli companies have established themselves in the Indian m...
-
Itamaraty 'Memórias', do embaixador Marcos Azambuja, é uma aula de diplomacia Embaixador foi um grande contador de histórias, ...
-
Desde el post de José Antonio Sanahuja Persles (Linkedin) Con Camilo López Burian, de la Universidad de la República, estudiamos el ascens...
-
O Brics vai de vento em popa, ao que parece. Como eu nunca fui de tomar as coisas pelo seu valor de face, nunca deixei de expressar meu pen...
Nenhum comentário:
Postar um comentário