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sábado, 2 de julho de 2011
Wikileaks-Brasil: China pensa que Brasil nao tem peso internacional
A matéria abaixo (e o telegrama transcrito) sobre opiniões de um ex-embaixador da China no Brasil sobre nosso pequeno peso internacional apenas confirma, de modo mais explícito, o que já se sabia: a China não pretende apoiar o Brasil em sua pretensão de ocupar uma cadeira permanente no CSNU. Este nem é o problema principal, pois a China não pretende ampliar o CSNU para ninguém, pois isso diminuiria relativamente seu próprio peso internacional. Se trata, obviamente, de uma posição conservadora, como é, geralmente a das grandes potências (apenas quando elas não conseguem mais pagar a conta, como parece ser o caso dos EUA, atualmente, elas pretendem que outros o façam), e no caso da China, ela pouco se preocupa com a estabilidade do sistema internacional, e não pretende assumir um papel que a engaje mais de perto com certas responsabilidades "imperiais", digamos assim.
No caso do Brasil, porém, ela apenas explicita o que pensam de nós muitos imperiais e outros menos imperiais: não temos peso, ainda.
Pois é, parece que a solução mesmo é: cresça e apareça, mas isso não depende do mundo. Depende de nós mesmos, ou seja de reformas internas e de crescimento econômico e militar. A China só é o que é, hoje, por se tratar, de fato, de uma grande potência (já era antes, mas decaiu durante dois séculos), que cresceu enormemente nas últimas três décadas e vem se afirmando cada vez mais nos planos econômico e financeiro. Falta se afirmar no plano militar, mas isso assusta muita gente...
Paulo Roberto de Almeida
A) Matéria da Agência A Pública, sobre telegrama Wikileaks, sobre relações China-Brazil (neste link):
WIKILEAKS: China pensa que Brasil não tem “capacidade” para ser líder
Por João Peres, especial para a Pública, June 29th, 2011
Telegramas revelam conversa entre embaixadores da China e dos Estados Unidos na qual se pondera que o Brasil tampouco está qualificado para um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU
Segundo o ex-embaixador chinês no Brasil, a China acredita que o Brasil não tem “capacidade e influência” para ser líder e que as ambições do país excedem seu verdadeiro peso no cenário internacional. Telegramas de agosto de 2008 obtidos pelo Wikileaks mostram a conversa de Chen Duqing, que ficou no cargo até 2009, com o ex-embaixador dos Estados Unidos, Clifford Sobel.
Àquela ocasião, Duqing manifestou a Sobel que o Brasil não estaria qualificado para suas aspirações de ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) e estava “interessado apenas em algumas áreas, e não em paz ou em segurança”.
Para Paulo Vizentini, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é preciso fazer a ressalva que a afirmação foi feita em 2008, começo da grande crise financeira que catalisaria as mudanças no quadro geopolítico internacional – e o Brasil ganhou força. Porém, admite ele, “o Brasil demonstra uma série de fragilidades quanto a seu projeto. Não temos um pacto de poder mínimo que assegure uma agenda comum que sobreviva a mudanças de governos”.
Conselho de Segurança
Em outro telegrama, os Estados Unidos ponderavam que a principal relutância chinesa quanto à reforma no Conselho de Segurança dizia respeito à possível entrada do Japão no conselho. Para os diplomatas, se a China apoiasse o Brasil em seu antigo anseio por uma inserção mais profunda no principal organismo multilateral, estaria por tabela beneficiando os rivais asiáticos. “Pode haver uma manobra chinesa no sentido de não deixar ninguém entrar. É fato que a China tem ficado incomodada com a reaproximação entre Japão e Estados Unidos”, pondera o professor.
A questão foi parcialmente alterada este ano, quando, em viagem a Pequim, a presidenta Dilma Rousseff conseguiu a inclusão, no comunicado bilateral, do apoio chinês a uma reforma no Conselho de Segurança para incluir nações emergentes. Falta obter, por parte da China, dos Estados Unidos e da própria ONU, uma defesa enfática do direito do Brasil de ingressar no órgão multilateral mais importante do mundo.
No campo interno, o embaixador chinês criticava os problemas de infraestrutura, classificando o porto de Santos como “o pior do mundo”. Ele apontou na conversa com Sobel que a burocracia nacional é muito confusa e que há uma sobreposição de funções. Para Duqing, merece especial atenção o fato de o Brasil não ter consolidado suas bases para dar conta de um desenvolvimento prolongado, indicando que, sem mais crescimento econômico, não se consolidará a meta de reduzir a desigualdade social.
Parceiro importante, parceiro ocasional
Em diversos telegramas, os diplomatas estadunidenses avaliam que o Brasil vê a China como um aliado fundamental, mas advertem que a relação não é marcada por reciprocidade. “O governo Lula considera a China um parceiro para contrabalancear a influência de nações mais ricas em instituições multilaterais”, anota a então embaixadora, Donna Hrinak, em despacho de 14 de maio de 2004 no qual resume, em poucas palavras, a tônica desta relação bilateral: “Para o Brasil, mesmo um casamento de conveniência é preferível a um eterno encontro”.
Naquele momento, chamava atenção a viagem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia realizado à nação asiática acompanhado por uma enorme delegação de 400 empresários. Os telegramas indicavam que a relação era desigual em termos de trocas comerciais, com envio de commodities brasileiras em troca de produtos industriais chineses.
Dados divulgados em abril pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) constatam que a desigualdade se aprofundou, e atualmente 86% da exportação brasileira ao parceiro é baseada em produtos primários.
Desconfianças de parte a parte
“Este é um grupo muito heterogêneo de países com diferentes metas”, anotava em 19 de fevereiro de 2010 o subsecretário-geral de política do Itamaraty, Roberto Jaguaribe, em conversa com o embaixador Thomas Shannon, na qual confirmava que a China não queria que o BRIC se transformasse em porta-voz das nações em desenvolvimento.
Na mesma conversa, o diplomata estadunidense demonstrava surpresa com a rapidez com que a China se engajou em negócios na América do Sul, passando de um envolvimento meramente econômico a uma relação política que se aprofundava constantemente. “China será uma forte concorrente, para os Estados Unidos e para o Brasil”, advertia Shannon, segundo telegrama de 22 de abril de 2008.
Os documentos são parte de 2.500 relatórios diplomáticos referentes ao Brasil ainda inéditos, que foram analisados por 15 jornalistas independentes e estão sendo publicados nesta semana pela agência Pública.
Esse posts foi publicado em Wednesday, June 29th, 2011 at 3:13 pm. Está arquivado como +. Você pode acompanhar quaisquer respostas a esse post através do RSS feed.
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B) Telegrama da Embaixada dos EUA em Brasilia (1/08/2008), sobre conversa do Embaixador Sobel com Embaixador da China, Chen Duqing (neste link):
08BRASILIA48
136585 1/8/2008 13:01 08BRASILIA48 Embassy Brasilia CONFIDENTIAL
C O N F I D E N T I A L SECTION 01 OF 03
BRASILIA 000048
SIPDIS
SIPDIS E FOR TOM PIERCE; EPSC FOR LISA KUBISKE
E.O. 12958: DECL: 01/07/2018
TAGS: ETRD, EINV, PREL, BR, CH
SUBJECT: CHINESE AMBASSADOR DISCUSSES HIS PRIORITIES, BRAZILIAN ASPIRATIONS
REF: A. STATE 164790
B. SAO PAULO 718
C. BRASILIA 918
D. RIO DE JANEIRO 598
E. BRASILIA 990
Classified By: Ambassador Clifford Sobel, reasons 1.4 b and d.
1. (C) Summary. Chen Duqing, Chinese Ambassador to Brazil, told Ambassador Sobel on October 19 that his top priorities are to create a more favorable environment for economic relations and to promote Chinese interests in the Brazilian Congress. Ambassador Chen described an economic relationship of growing bilateral trade and investment characterized by an unbalanced exchange of finished industrial goods from China for Brazilian raw materials, and said Brazilian political international ambitions exceed Brazil’s political weight. End summary.
2. (C) Chen told Ambassador Sobel that he travels extensively throughout Brazil in pursuit of his top priority of creating favorable conditions to increase the trade relationship, mainly to Rio de Janeiro and Sao Paulo, but also to northern states such as Para. He is increasing his ability to pursue his other top priority by adding a counselor to his staff to work full-time on congressional engagement.
“Brazil Must Open Its Mind More” – - – - – - – - – - – - – - – - -
3. (C) Sino-Brazilian relations are getting to be quite good, he explained, even if the only important Chinese visitor this year was the then-Deputy Foreign Minister (now Foreign Minister). But an outdated view of the Chinese political system blurs Brazil’s perception of China and “Brazil must open its mind more,” he said. The Chinese Communist Party was now taking historic steps at its National Congress, as President Hu noted when he said that China must be more open, and Brazil needed to understand this change, Chen stated. (Note: The 17th National Congress of the Communist Party of China took place October 15-21, 2007. End note.)
Trade and Investment – - – - – - – - – - -
4. (C) China would soon pass Argentina and Germany to become Brazil’s number two trading partner, after the U.S., Chen noted, offering a figure of two-way Chinese trade with Brazil at USD 20 billion in 2006. (Note: Chinese Foreign Ministry officials cited the same bilateral trade figure at the U.S.-China Sub-Dialogue on Latin America in late November, as reported ref A. According to the Sao Paulo State Federation of Industries, total bilateral trade in 2006 was USD 16.4 billion, as reported ref B. End note.) China’s exports to Brazil are mainly finished goods, especially electronics; Ambassador Chen said Brazil complains of dumping, but Chen added that “this is part of our process of increasing our relationship,” implying Brazilian dumping accusations are a natural part of a growing trade relationship.
5. (C) Brazil’s top exports to China are soy and iron ore. Seventy million tons of iron ore and 11 million tons of soy a year go to China, according to Chen, and China always runs a trade deficit with Brazil, now at about USD 4 billion a year. (Note: China buys about a third of Brazil’s iron ore exports, introducing “an obvious vulnerability” for Brazil, according to the November 2007 issue of Brazil Focus, published by Menas Associates, www.menas.co.uk. Ref C reported Brazilian mining executives’ concerns about China’s influence over Latin American natural resources. End note.)
BRASILIA 00000048 002 OF 003
Chen said that if you calculate undercounting on the Brazilian side the deficit is even greater. His principal concern about the economic relationship is that “Brazil has not consolidated its basis for more development” because “without more economic growth, it will not achieve greater income distribution.” He noted Brazil’s poor infrastructure, calling Santos the “world’s worst port,” and said China is interested in railroad projects in Brazil. Chen said Brazilian bureaucracy is “confused” and has no model, in comparison with China’s, where top bureaucrats must go through the Central Committee Party School.
Major Steel Investment – - – - – - – - – - – -
6. (C) Chen told Ambassador Sobel that China had signed a major joint venture agreement on October 3 with the Companhia Vale do Rio Doce (CVRD, now “Vale”) to construct a steel plant in Vitoria, Espirito Santo, making China a majority partner in the Companhia Siderurgica de Vitoria (CSV) with an investment of USD 5.5 billion (ref D). Chen said China would like to make more such investments, but there is political resistance in some circles in Brazil. (Note: Ref E reported Brazilian fears of China. Nonetheless, Brazilian leaders continue to court Chinese investment. Bahia governor Jaques Wagner led a trade mission November 15-25 to China in search of investment in tourism, ports, railroads, mining, ethanol, and semiconductors. Also in November, Amazonas Governor Eduardo Braga and a large entourage embarked on a 20-day Asian trade and investment mission to Japan, China (including Macau), Malaysia, and Indonesia. A Chinese trade and investment mission to Amazonas in 2008 was announced during Braga’s visit to China. End note.) In the northeast of Brazil, for example, Chen continued, there are many opportunities, but China will limit itself to equipment sales. Moreover, in spite of the large size of many Brazilian firms, there is little money for equipment purchases and Brazilian importation of Chinese goods became somewhat more difficult after China increased the exchange rate value of its currency 8.27 percent, he noted. China cannot revalue its currency as fast as the U.S. would like because it will produce a negative impact on the Chinese economy, Chen added.
7. (SBU) China’s domestic steel production accounts for the majority of China’s needs, but China must import certain specialized steels. The trade with Brazil has not grown in the last 20 years and remains at about 30 million dollars a year, according to Chen. (Note: According to the Brazilian Institute of Steel, 2006 Brazilian exports of steel and steel products to China were USD 52.7 million (66,628 metric tons) and have dropped significantly since 2005. Conversely, Brazilian imports of Chinese steel have increased from USD 27.5 million in 2005 to USD 92.7 million in 2006. End note.)
Biofuels – - – - -
8. (SBU) Asked about Chinese interest in Brazilian biofuels, Chen replied that China produces its own biofuel and does not buy any fuels from Brazil, only some heavy oil.
Brazilian Leadership Aspirations – - – - – - – - – - – - – - – - -
9. (C) Ambassador Chen said he has observed the growth in the U.S.-Brazilian bilateral relationship over the last year, and understands that Brazil wants to be a leader, but it has “no capacity or influence.” Chen dismissed Brazil’s UN Security Council aspirations, saying it is not qualified, and is “interested in only some areas, and not in peace and security.”
BRASILIA 00000048 003 OF 003
Biographical notes – - – - – - – - – -
10. (SBU) Ambassador Chen said he has never been on an official visit to the U.S. and has spent most of his career in lusophone assignments. He began his career in Brazil in 1974, and returned in the period 1981-84. He was Ambassador in Mozambique, and came to Brazil after a year and a half assignment in East Timor. He said he is 60 years old, can retire at any time, and will finish his career in Brazil. He speaks English. Sobel
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