domingo, 1 de julho de 2012

Uma entrevista inedita incompleta - dos arquivos secretos de PRA (2005)

De vez em quando aparecem coisas ainda mais estranhas nos meus implacáveis arquivos ainda não devassados pela CIA, KGB, ABIN, MI6, DGI e outros candidatos menos qualificados. Esta entrevista, por exemplo, que comecei a dar e não sei por que raios nunca foi terminada. Falta de tempo, mais provavelmente. Mas como não me cobraram, ficou por isso mesmo.
Um dia eu termino, e atualizo o que já tinha feito...
Não preciso revelar o órgão de imprensa, não é mesmo?
Paulo Roberto de Almeida


Uma entrevista incompleta sobre Mercosul e a política externa (2005)
Entrevista a Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 11 agosto 2005

IMPORTANTE!        1 - A ordem das questões poderá ser alterada por motivo de edição;
2 – A edição da entrevista será enviada para os senhores prévia à publicação para possíveis correções;
3 – Estima-se que publiquemos a entrevista no mês de Agosto de 2005.

PERGUNTAS:
1-Como o senhor analisa a política externa brasileira atual? Existiria um modelo ideal de política externa para o Brasil?
PRA: Em princípio deve-se desconfiar de “modelos ideais”. Por definição, eles não existem, pois a realidade, sobretudo no plano internacional, não se deixa dominar ou influenciar por qualquer modelo que se estabeleça a priori.
            Na verdade, não há e nem deve haver modelos ideais para política externa como para qualquer outra política, macro ou setorial. Modelos são construções teóricas, geralmente feitas ex-post, que permitem sistematizar determinadas ações políticas ou sociais que no geral foram bem sucedidas, e daí viram modelos. Ninguém transforma um fracasso em modelo, isso parece claro. No caso da política externa, a política a ser eventualmente seguida comporta variáveis que não são inteiramente ou basicamente determinadas pelo próprio governo do país que a implementa, uma vez que elas são influenciadas ou mesmo determinadas pelo ambiente internacional ou mesmo por interações diversas que esse país mantém no cenário mundial ou com outros atores relevantes.
            A política externa atual, como qualquer outra, de outros países ou deste país em outras épocas, possui elementos de continuidade e de inovação ou ruptura, estas últimas como seria normal de esperar no caso de uma mudança tão significativa de maioria política e de orientação partidária, como a que ocorreu em 2002.
            Os elementos de continuidade estão evidenciados na centralidade do Mercosul para a política externa brasileira, na chamada relação estratégica com a Argentina, na prioridade dada ao multilateralismo econômico em geral e às negociações comerciais em particular, na confirmação da América do Sul como o espaço privilegiado de atuação da diplomacia brasileira, inclusive no que se refere à integração física, bem como no relacionamento seletivo com alguns grandes parceiros em desenvolvimento (Índia, África do Sul e China, embora, anteriormente, de modo menos enfático).
            Os elementos de ruptura ou de relativa inovação também claros, uma vez que foram repetida e reiteradamente afirmados, no plano de propostas programáticas ou de plataformas eleitorais, em documentos, declarações e posicionamentos adotados pelos principais líderes do Partido dos Trabalhadores ao longo de 20 anos de caminhada em direção do poder. Esses elementos de “diplomacia partidária”, digamos assim, estão documentados em diversos trabalhos que eu mesmo elaborei sobre a “política externa” dos partidos políticos ao longo desse período. Quais são esses elementos de ruptura? Eles são marcados por uma opção preferencial pelo relacionamento com os países do Sul, de modo geral, e com os latino-americanos de maneira especial (embora isso não seja totalmente inédito para os padrões habituais da diplomacia brasileira), por uma preferência seletiva com um número restrito de parceiros ditos estratégicos (designados antecipadamente como sendo a Índia, a África do Sul e a China, aos quais poderiam igualmente ser agregados a Rússia e alguns países europeus, geralmente rebeldes ao hegemonismo americano), na forte ênfase atribuída à conquista de uma cadeira permanente no CSNU em caso de reforma da Carta da ONU, numa recusa (em parte disfarçada no governo, mas evidente no âmbito do PT) da Alca e na preferência a priori por um acordo comercial entre o Mercosul e a União Européia, bem como numa vontade geral de transformar as relações políticas internacionais de modo geral, tal como evidenciado vários vezes pelos líderes do PT no sentido de “mudar as relações de força no mundo”, ou pelo próprio presidente da República, que tem reiteradas vezes enfatizado seu desejo de “mudar a geografia comercial” do mundo.
            Essa nova diplomacia já foi por ela mesma designada como sendo “ativa e altiva”, e de fato ela multiplicou iniciativas e ações em novos campos de atuação que colocaram o Brasil em posição de realce ou de vanguarda em vários foros multilaterais, regionais, assim como no terreno bilateral. Ela foi especialmente ativa no projeto de uma cadeira permanente no CSNU, tendo constituído um novo grupo de interesse, o G-4, ainda que a sensibilidade da questão poderia indicar um tratamento mais discreto dessa pretensão, como recomendaria a diplomacia profissional. Ela o foi igualmente em várias tentativas de coordenar as posições dos países do Mercosul e de outros da América do Sul nos processos de negociação comercial como os da Alca e na OMC, mas aqui novamente com sucesso relativo. Os esforços de coordenação se traduziram, por exemplo, na constituição da Comunidade Sul-Americana de Nações, que é um órgão essencialmente político, mas destinado a realizar tarefas complexas nos terrenos da integração física e comercial.
  
2- A política econômica adotada pelo governo brasileiro, é bastante diferente do principal parceiro daquele que é, segundo o Itamaraty, o principal projeto de política externa do país, o MERCOSUL, chegando a gerar desconfortos entre eles. É possível ampliar a integração, reafirmando o compromisso do Itamaraty, adotando uma política econômica diferente ou o Brasil deve buscar outro "projeto principal"?
            PRA: Políticas econômicas nacionais respondem a ciclos econômicos nacionais e possuem as características de cada economia nacional. Nos últimos dez ou 20 anos, Brasil e Argentina tiveram itinerários relativamente similares, mas não semelhantes, em seus respectivos
(...)

[Parte não respondida]
3- O senhor diz que o neoliberalismo não encerra em si uma política distributiva, mas que a redução da inflação foi algo bom. Segundo Celso Furtado, em entrevista ao Merconsulta em 2002, esta redução acabou com uma das ferramentas do governo de financiamento (chegou a render 5% do Produto Nacional) e teve que ser compensada por outros meios, como, por exemplo, aumento de impostos, resultando numa situação fiscal que o próprio Prof. Celso Furtado classifica como grave, pela extrema elevação da taxa de tributos e pela deformação de sua carga sobre pobres e ricos, incidindo mais sobre os pobres, por conta dos impostos indiretos que recaem sobre a base da população. Como o Sr. analisa esta questão?
4-A desigualdade social persiste (0,6 em 93 e 0,6 em 03, segundo dados do IBGE/IPEA), acompanhada de uma queda na renda do trabalhador, segundo dados do livro Radar (a renda média do trabalhador caiu 15% entre 96 e 2003), queda esta que se refere apenas aos empregados, com ou sem carteira assinada. Também ao longo do período, o nível de homicídios cresceu mais de 30% e o desemprego passou de 6,4% para 10% da PEA. A que o Sr. atribui o mal desempenho deste índices? Quais alternativas teríamos para revertê-los?
5-O Sr. diz que o Brasil teve alguns “czares econômicos da ditadura”  (Roberto Campos, Delfim Netto, Simonsen etc.) e outros ministros políticos da Fazenda na “república populista”. Quais seriam suas críticas em linhas gerais a estes modelos/projetos?
6-O longo período de recessão que houve na América Latina fez com que os países se voltassem muito para a idéia de uma abertura externa. O argumento apresentado era o de que essas economias eram demasiadamente fechadas, muito controladas, e que para terem mais dinamismo deveriam se abrir ao exterior. Segundo Celso Furtado, muitos governantes acreditaram que seus países se encaminhariam para uma fase de progresso, avanço e desenvolvimento, mas o que ocorreu na prática foi justamente o inverso. O economista Gabriel Palma disse que as políticas econômicas não devem ser baseadas em proposições simplistas como “openness is good for growth and development”. O sr. acredita que haja coerência nas colocações destes dois economistas? Quais seriam as coerências ou incoerências dos mesmos?
7-Este mês de agosto, no Rio de Janeiro, ocorreu o Fórum IBAS (Índia Brasil e África do Sul), um Seminário de Desenvolvimento Econômico com Eqüidade Social, com a missão de promover o intercâmbio de visões acerca dos grandes desafios do desenvolvimento sustentável para esses países e compartilhamento de políticas/programas adotados nos 3 países para combate à pobreza, desenvolvimento igualitário, cooperação tecnológica, etc.. Qual a sua opinião sobre este tipo de iniciativa?
8-Como o Sr. avalia o desempenho dos programas sociais adotados no atual governo, tais como o Fome Zero, Bolsa Família, Microcrédito, etc.? Quais são os pontos favoráveis e os negativos? 
9-E sobre a questão da integração com os países industrializados, o senhor acredita que é melhor a integração com estes países ou com países em desenvolvimento?

Caso queira expor algum outro tema adicional que julgue pertinente, favor adicionar.

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